Maravilhas do Mundo Prog: Recordando O Vale das Maçãs – As Crianças da Nova Floresta [1978]
Por Mairon Machado
O ano de 1977 viu nascer no Brasil um dos grupos mais fantásticos do rock progressivo nacional. Através do álbum As Crianças da Nova Floresta, o Recordando o Vale das Maçãs estabeleceu-se como um dos principais nomes da música na virada da década de 70 e para os 80, com canções que remetiam para as origens do rock progressivo, mas sem exagerar em técnica ou virtuosismo, apenas empregando letras sensacionais em arranjos belíssimos e encantandoramente trabalhados.
Recordando o Vale das Maçãs |
O Recordando o Vale das Maçãs foi formado em 1973, em Santos (SP) através dos amigos Fernando Pacheco (violões e voz), Fernando Motta (violões e percussão) e Domingos Mariotti (flauta, voz), com a ideia de tentar mostrar o som da natureza através da música. Motta e Pacheco já haviam tocado juntos nos grupos Os Lobos e End Up Six.
Com o passar dos anos novos músicos uniram-se ao grupo, sendo que Domingos saiu em 1977. Pacheco, Motta, Luis Aranha (violino), Moacir Amaral (flautas), Eliseu de Oliveira (teclados), Ronaldo Mesquita (baixo) e Milton Bernardes (bateria) gravaram As Crianças da Nova Floresta, gravado em 1977, mas lançado em 1978, e que é considerado por muitos (eu incluso) o melhor disco de rock progressivo brasileiro já lançado (na frente de qualquer um de O Terço, Mutantes, O Som Nosso de Cada Dia e Módulo 1000).
O grupo em ação |
De uma forma geral, o disco apresenta letras similares às do Yes, contando histórias de alegria, superação, força de vontade e também alguns momentos de misticismo, sempre passando um lado “natureza” em todas as faixas, destacando o excelente trabalho entre flauta, violões e percussão. As canções do Lado A de As Crianças da Nova Floresta, tratam sobre esperança (“Rancho, Filhos e Mulher”, mitologia (“Besteira”), loucura (“Olhar de Um Louco”) e vida (“Raio de Sol”).
Jornal divulgando matéria sobre o RVM |
Mas é justamente quando você coloca a agulha no lado 2 que você sente o diferencial do Recordando o Vale das Maçãs para as demais bandas do rock progressivo nacional daquela época. Tudo bem, “1974” é um clássico do Terço, “O A E O Z” é uma canção que caberia muito bem em qualquer disco do Yes, mas “As Crianças da Nova Floresta” está muito acima de todas as citadas.
O começo suave, com a flauta e os violinos sendo introduzidos ao mesmo tempo do violão e do baixo (que merece destaque em todo o álbum), dão sequência ao estribilho de teclados que leva ao início a letra (“quando eu penso nas voltas, que a vida, nos leva a dar …”). O ritmo lento, com a flauta fazendo intervenções junto com a voz, é simplesmente encantador. A bateria segura de Milton marca a canção quase com uma precisão cirúrgica, enquanto a letra vai descorrendo sobre como se livrar dos problemas, vendo que outras pessoas tem problemas piores que você, que você precisa mudar algumas situações/opiniões para ser mais feliz. Enfim, um quase “Close to the Edge” brasileiro.
Recordando o Vale das Maçãs, ao vivo na TV |
As harmonias vocais juntamente dos tecados vão aumentando o ritmo da canção, até chegarmos no momento onde você “encara os problemas de frente”, com um belo solo de baixo seguido por uma sequência de solos de teclado e baixo. A flauta soa mais forte, acompanhada pelo violão de 12 cordas de Pacheco, onde as verdades que precisam ser vistas são mostradas.
“Olhe tudo do jeito que você quiser ver, mas antes olhe pra dentro de você, o caminho começa por aí” é o ponto mais forte da canção, que segue no mesmo ritmo, com o baixo tomando conta da canção juntamente com a letra e os acompanhamentos dos violões. Por fim, “unam-se as mãos e venham conhecer essas crianças, por que essas crianças são vocês” encerra a letra, mostrando que todos somos crianças, que temos que evoluir e não criar problemas, mas sim aprender a solucioná-los. Uma bela letra para uma bela canção, que termina com uma voz feminina angelical, que não dá pra saber se é de uma mulher ou de uma menina, mas que fecha com chave de ouro essa canção. Esses vocais foram feitos pela cantora Cristina Lobão, que saiu do grupo ainda em 1977.
O grupo acabou sendo contratado exclusivo da TV TUPI, chegando inclusive a ter um clip que passava 6 vezes por dia na TV, durante 3 meses. Paralelo a isso, o Recordando o Vale das Maçãs participavou regularmente de um dos maiores programas de audiencia na época, “Almoço com as Estrelas”, apresentado por Lolita Rodrigues e Airton Rodrigues.
Em 1982, o grupo lançou o compacto “Sorriso de Verão/Flores na Estrada”, que segue a mesma linha do LP lançado quatro anos antes, agora com o baterista Lourenço Gotti, mas infelizmente a banda não atingiu o sucesso que merecia. A TV TUPI já havia fechado, e o Recordando o Vale das Maçãs passou a gravar especiais para TV Cultura, e participando de programas na Bandeirantes e Globo, com “Sorriso de Verão” levando-os ao primeiro lugar nas rádios (FM) de Santos, onde permaneceram durante 6 meses.
Compacto de “Sorriso de Verão” |
Depois disso, o grupo separou-se. Em 1987, Fernando Pacheco lançou o excelente Himalaia, que conta com a participação de alguns músicos do RVM no lado A. Com certeza eu irei falar desse disco aqui em breve.
As Crianças da Nova Floresta II |
Nos anos 90, voltaram a fazer shows pelo Brasil, culminando no lançamento de As Crianças da Nova Floresta II (1994), o qual resgata canções de As Crianças da Nova Floresta e também de Himala, porém em versões instrumentais. O grupo foi descoberto na europa e no Japão, já que As Crianças da Nova Floresta havia sido lançado por lá, em 1994, os leitores da revista francesa Big Bang elegeram As Crianças da Nova Floresta II como o melhor álbum de progressivo daquele ano, recebendo então o convite, através da embaixada francesa, de participar do Fête de la Musique em Paris, em 1997. Em 2006, foi lançado Spirals of Time, que apesar de não conter o nome do grupo, foi gravado pelos mesmos integrantes que mantém o nome Recordando o Vale das Maçãs na ativa.
Atualmente a banda faz shows em Minas Gerais,ao mesmo tempo que Domingos e Motta acabaram de lançar o excelente Reunião, mantendo o charme e a pureza dos anos 70, cultivadas através da semigual suíte “As Crianças da Nova Floresta”.
RVM é simplesmente maravilhoso!! As crianças da nova floresta, não é apenas uma música para se deliciar, mas traz uma introspecção, uma análise sobre a vida e as nossas prioridades!! É maravilhoso!!
Um dos melhores discos do rock nacional. Abraços Ívia, e acompanhe-nos agora no site consultoriadorock.com
Obrigado