Poison – Native Tongue [1993]
Isso até ouvir seu quarto álbum, Native Tongue, lançado em 1993. Aqueles eram tempos diferentes da época onde o pop metal era o mais prolífico gênero dentro do rock em se tratando de colocar álbuns e singles no topo das paradas. Nevermind, do Nirvana, e Ten, do Pearl Jam, já haviam sido lançados há dois anos, e os grupos eram os queridinhos da mídia roqueira da época, elevando o status de todas as bandas tidas como pertencentes ao movimento grunge. A maioria dos artistas de hard rock haviam encerrado suas atividades ou se encontravam em forte descenso, lançando álbuns de pouca repercussão e tocando para plateias mais reduzidas. Um dos pouquíssimos grupos que conseguiu ainda se manter em evidência foi justamente o Poison, que, com a demissão do guitarrista original, C.C. DeVille, encontrou no jovem Richie Kotzen a força motriz que precisava para atualizar sua musicalidade e ainda demonstrar alguma relevância no diferente cenário dos anos 90.
Kotzen, que com apenas 23 anos já havia lançado três álbuns solo, demonstrando toda sua proficiência no instrumento e um crescente talento para a composição, na época ainda voltado para o lado mais shredder, não entrou no grupo como um músico contratado, mas como um membro com participação ativa nos rumos que o Poison tomou em Native Tongue. Os hinos festivos cunhados pela banda até então cederam espaço a um tom mais sério, inclusive nas letras. O pop metal de melodias fáceis e grudentas foi, na maior parte do disco, substituído por um hard rock com fortes influências de blues, funk e até da soul music norte-americana. A chegada de um guitarrista de elevada técnica também impulsionou os outros membros do grupo a se esforçarem mais na demonstração de suas habilidades. Até mesmo Bret Michaels, um vocalista bastante limitado, mostrou amadurecimento, além de tocar violão, guitarra e harmônica em algumas faixas. Mais importante ainda: em Native Tongue estão duas canções que, sem exagero, por si só já servem para justificar toda a carreira do Poison: “Stand” e “Until You Suffer Some (Fire and Ice)”.
A exemplo do álbum anterior, Flesh & Blood (1990), Native Tongue abre com uma introdução instrumental, dessa vez com uma levada percussiva praticamente tribal, cheia de vozes ao fundo proferindo palavras e gritos ininteligíveis, até abrir espaço para a segunda faixa, “The Scream”, que se inicia demonstrando a colossal diferença de estilos entre C.C. DeVille e Richie Kotzen, que executa riffs funkeados, mas sem perder uma essência quase heavy metal. Rikki Rockett, baterista acostumado a executar linhas mais quadradas, demonstra um swing bastante atípico, ponto positivo da música, além do excelente solo de Kotzen.
Poison em 1993: Bobby Dall, Rikki Rockett, Richie Kotzen (acima) e Bret Michaels (abaixo). |
“Stand”, a primeira das duas faixas que citei como grandes destaques do disco, surge como um sopro de ousadia e renovação. O início acústico, contando com Kotzen ao bandolim e Bret Michaels entoando uma letra de qualidade superior ao que estava acostumado, logo revela o excelente refrão qua conta com um coro gospel executando backing vocals. Após esse primeiro refrão, toda a banda entra em ação, configurando “Stand” como uma das mais inspiradas composições que já ouvi. Esqueça o Poison festeiro: apesar da vibração super positiva da canção, aqui temos uma banda demonstrando seriedade e compromisso maior com a música do que com a imagem. A faixa seguinte, “Stay Alive”, continua no excelente astral da anterior, mas em um formato rock mais tradicional. Rica em backing vocals na ponte e no refrão, traz uma letra otimista, lidando com problemas recorrentes a uma banda de rock, inclusive incentivando o ouvinte a se manter longe da cocaína (It don’t do you no good with your face in the cocaine).
O segundo inegável destaque é “Until You Suffer Some (Fire and Ice)”, música que mostra que uma canção sobre amor e perda não precisa necessariamente ser brega. De início acústico, vai crescendo até atingir o êxtase em seu fantástico refrão rico em backing vocals, especialmente de Richie Kotzen, que se revela um vocalista melhor que Bret. Infelizmente, com a mudança no cenário musical, a faixa, lançada como single, foi bem sucedida apenas no Reino Unido, onde alcançou a 32ª posição, mas abaixo do que o grupo estava acostumado. Se o Poison precisava provar que era uma banda a ser levada a sério, é em “Until You Suffer Some (Fire and Ice)” que ela dá mostras de maturidade e talento. Não é exagero apontá-la como o melhor trabalho do grupo.
Aberta por riffs de guitarra e por um baixo bem timbrado, “Body Talk” é das que mais remetem ao antigo Poison, versando sobre mulheres e sacanagem. Richie se mostra muito mais que um simples virtuoso, trabalhando em função da música e dosando com sapiência sua técnica. Não à toa posso facilmente considerá-lo um dos melhores guitarristas surgidos nos últimos 25 anos, superando em habilidade e bom gosto a grande maioria de seus contemporâneos. Há de se destacar também o trabalho do produtor Richie Zito, que ao lado do grupo cunhou uma sonoridade limpa, sem exagerar nas distorções. “Bring It Home” é possuidora das guitarras mais pesadas do disco, mas mesmo assim traz riffs suingados, além de uma linha vocal que os acompanham muito bem. Richie Kotzen canta o refrão junto a Bret, adicionando cor ao trabalho.
Richie Kotzen na sua época de Poison |
Contando com um coro gospel e com a participação da seção de metais do tradicional grupo de funk e rhythm’n’blues Tower of Power, “7 Days Over You” escancara as influências negras do grupo, provavelmente cortesia de Kotzen. Além disso, também participa da faixa o pianista Billy Powell, falecido membro do grandioso Lynyrd Skynyrd. Excelente motivo para que mesmo os mais resistentes dêem uma chance ao “novo” (à época) Poison. “Richie’s Acoustic Thang” é o momento no qual Kotzen brilha ao violão, executando uma curta instrumental. Com riffs e vocais na linha do Aerosmith, “Ain’t That the Truth” traz o Poison soando mais setentista do que nunca, mas sem abandonar os fortes backing vocals.
“Strike Up the Band” é repleta de riffs bem sacados e de uma performance muito boa em geral por parte de todo o grupo, em especial do baterista Rikki Rockett. “Ride Child Ride” configura-se em um hard rock mais simples mas agradabilíssimo de se ouvir, repleta de backing vocals, incrementando a voz limitada do esforçado Bret. Outra canção digna de destaque é “Blind Faith”, de refrão rico em coros, também contando com mais uma das otimistas letras do álbum. Aliás, é difícil imaginar como um álbum em um tom tão “pra cima” conseguiu vender cerca de 2 milhões de cópias em meio a uma época onde as posições mais elevadas das paradas eram ocupadas por grupos acostumados com letras um tanto depressivas e negativas, fosse no rock ou no rap.
O disco é finalizado com “Bastard Son of a Thousand Blues”, que, como o nome indica, carrega nas influências do gênero musical em questão, mostrando a versatilidade de Kotzen. Billy Powell também participa dessa faixa, que conta com a forte presença da harmônica, tocada por Bret Michaels, além de um excelente solo de Richie. Uma ótima maneira de encerrar um álbum que ignorou o cenário musical de meados dos anos 90 e se preocupou em mostrar conteúdo.
Infelizmente essa formação do Poison durou pouco tempo, abruptamente esfacelada ainda no decorrer da turnê para o álbum devido à descoberta de que Richie estaria envolvido com a noiva de Rikki Rockett, fato que determinou sua expulsão do grupo. Blues Saraceno ocuparia seu posto, mas a carreira do Poison ficou interrompida por vários anos devido a um acidente automobilístico envolvendo Bret Michaels, que sofreu diversos ferimentos, e também pelo interesse de Bret na produção e direção cinematográfica. Richie Kotzen logo continuou sua carreira solo e lançou em 1994 seu quarto álbum, Mother Head’s Family Reunion, que continuou na veia funkeada de Native Tongue. Sua carreira prossegue até hoje, lançando excelentes álbuns, além de ter passado pelo Mr. Big, onde gravou os discos de estúdio Get Over It e Actual Size, além de ter registrado dois álbuns junto ao guitarrista Greg Howe e participado do projeto Vertú, ao lado dos músicos de jazz fusion Stanley Clarke e Lenny White. Richie encontra-se em turnê pelo Brasil, e quem tiver a oportunidade de poder assisti-lo, não a perca, pois verá ao vivo um artista como poucos atualmente.
Este álbum tem uma musicalidade fantastica , e o maior credito por isso é o incrivel Ritchie Kotzen , sou mega fã dele
Grande álbum, acho que o melhor da banda…Diogo, parabéns pelo ótimo texto.
O legal desse blog é que temos todos um gosto em comum que é o rock! Mas cada um vai para uma vertente e bandas diferentes.
Duvido qualquer meio musical ter um abrangencia como a que temos aqui…
E outra, falar bem do POISON não é para qualquer um… tem que ser MACHO de se expor e publicar!
Um disco excelente e traz um Poison mais sério… Obvio que quem não gosta, não adianta… não vai gostar mesmo…
Mas esse é aquele disco tipico para um WAR ROOM… pode não gostar, mas falar MAL já é pentelhação de criticos metidos a besta!
Sugiro a quem não gosta e está aqui lendo, inclusive os comentários, clicar nos links, aumentar o som, deixar o preconceito e curtir, pelo menos dar uma chance ao disco!
Verdade , aqui temos uma amostra do mesmo Poison , mais sem a viadagem
Ouvi o disco e achei muito parecido com Bon Jovi. Como eu adoro Bon Jovi, gostei do disco! xD
Também notei essa influência de soul/funk. Fiquei até pensando em como pode o Daniel gostar disso…
O Daniel gosta porque é o POISON fazendo. Tira o nome da banda e coloca…sei lá…Glenn Hughes (que faz essa mistura de sol/funk a muito tempo) no lugar. O Daniel não vai gostar automaticamente…rs
Melhor disco do Poison…creditos ao grande Kotzen…grande musico, compositor, vocalista, etc…
Desculpe a brincadeira, Diogo, mas qual é desses cantores que gostam ao vivo de encostar a bunda nos guitarristas e trocar sorrisos marotos? Coisa mais jaggeriana. Agora, esse Kotzen realmente toca muito.
HAHA, olha, acredito que sejam vários, incluindo Jagger e meu amigo Jon Bon Jovi, mas o Bret Michaels era mais metido a garoto bombadinho, conforme a ibagen lá no alto, hehe.
Sobre o Kotzen, vou reforçar: quem perdeu o show acústico que ele executou em São Paulo na semana passada, com um set list magnífico, NÃO PERCA de maneira alguma seu show elétrico nesta semana. Já havia o visto no ano passado e o vi novamente anteontem. O que o cara toca e canta é coisa de outro mundo, sem falar no magnífico bom gosto.
Diogo, vc só faltou nomear o post como "Richie Kotzen – Native Tongue [1993]"! Que injustiça com o Poison…
Claro que toda a banda tem méritos, mas o Kotzen é um músico e compositor superior, não adianta. No entanto, valorizo sim o que o grupo fez, em especial o fato de Bret Michaels superar seus limites e oferecer uma boa performance, além de Rikki Rockett, que está tocando bem mais nesse disco. Os créditos das composições são distribuídos igualmente entre os quatro membros, mas está na cara a o peso da influência de Richie.
Eu fui no show do RJ do grande Richie Kotzen…fiquei de boca aberta com o que o cara faz com a guitarra…técnica, feeling, criatividade, tudo no mais alto nível…isso sem falar na voz marcante que ele tem. Canta muito!!! Um dos melhores vocalistas da atualidade, junto com Jeff Scott Soto, Glenn Hughes e Jorn…e claro mais alguns outros…Kotzen faz o show realmente valer a pena!
Do pouco que gosto de poison, sempre acabo comparando com Bon Jovi e, dai nao da. Lembrar de Bon Jovi é sempre cair na desgraça. Essa foi uma fase que durou apenas alguns meses no meu gosto musical. Mesmo assim, o texto esta muito bom, e talvez um dia eu ouça a fase com o Kotzen com outros ouvidos, mas hj ainda não da.
Lembrar de Bon Jovi é sempre cair na desgraça.
Lembre-me de envenenar sua comida no próximo churrasco da Consultoria.
Esse disco é do Kotzen … o restom está ali fazendo pose (rs) … tanto que depois desse … voltaram para o limbo !!