Shows Inesquecíveis: Yes (Porto Alegre, 19 de maio de 1998)

Shows Inesquecíveis: Yes (Porto Alegre, 19 de maio de 1998)

Por Mairon Machado

O tempo passa, o tempo voa… Como a propaganda do banco Bamerindus profetizava, realmente isso acontece, e já faz 13 anos que lembro praticamente todas as noites de um fato inesquecível na minha vida, quando realizei o sonho de ver meu maior ídolo da guitarra ao vivo, na minha frente. Esse cara é nada mais nada menos que Steve Howe, do Yes, Asia, GTR e Anderson Bruford Wakeman Howe.
As lembranças desse show são tamanhas que eu poderia passar horas escrevendo, mas vou tentar simplificar o texto para não torná-lo maçante. Conheci o Yes quando tinha nove anos, através de um programa chamado Hollywood Rock in Concert, que era exibido na TV Bandeirantes todo sábado. Esse programa sempre mostrava um VHS de uma banda famosa, não na íntegra, apenas partes, o suficiente para deixar um curioso atiçado em busca de material de tal banda.
Nele eu conheci grupos como Genesis, Supertramp, Mötley Crüe, Firehouse, Asia, Dire Straits e Def Leppard, entre tantos outros. Em um determinado dia, a Bandeirantes anunciou o show Around the World in 80 Dates, do Yes. Lembro de, sentado à frente da TV do quarto, assistir a abertura com as capas de disco do Yes passando ao som da introdução de “Lift Me Up”, além da primeira imagem do show, a de um senhor cabeludo com uma gigantesca guitarra Gibson semiacústica fazendo os acordes de “Yours Is No Disgrace”. Paixão à primeira vista!
Esse senhor era Steve Howe, e “Yours is No Disgrace” foi a primeira de muitas canções do Yes que eu ouvi repetidamente, até saber de cor cada detalhe de qualquer um dos instrumentos presentes na canção. Desesperado, eu saí atrás de tudo que fosse ligado ao Yes, mas achar vinis da banda era algo difícil em Pelotas, única cidade que vendia discos na região de minha terra natal, Pedro Osório. 

Parte da minha coleção do Yes
Foi graças ao Micael, meu irmão, que já morando em Porto Alegre, começou a “importar” das lojas da Capital os discos do Yes. Primeiro veio Classic Yes, por conter “Yours is No Disgrace”, “Roundabout” e “And You And I”, três das minhas favoritas. Mas daí, surgiu o problema: Classic Yes também conta com “Heart of the Sunrise”, então não tive escolha, o seguinte foi Fragile.
Vieram 90125, Union, Going For the One, Yes, Yessongs, Time and a Word e Yesshows, quando conheci “Ritual” e “The Gates of Dellirium”. Meu mundo caiu. Essas duas suítes eram muito melhores do que tudo o que eu pensava se tratar de suíte até então (lembrando que eu tinha cerca de 11 anos nessa época, e conhecia as suítes “Atom Heart Mother”, “Echoes”, “Supper’s Ready” e “Lizard”). Bah, não parei enquanto não adquiri Tales from Topographic Oceans e Relayer, o que veio quando completei 12 anos (presentes de aniversário e natal em 1994, respectivamente). Com a aquisição de Close to the Edge logo em seguida, eu me tornei um aficcionado por Yes, que achava Steve Howe o maior guitarrista da história, e largava meu lado metal do Possessed, Sepultura, Slayer e Black Sabbath, com o qual convivi durante muito tempo, para apreciar aquelas maravilhas.
Em março de 1998, Micael já trabalhava em uma grande firma da região metropolitana de Porto Alegre, e com um bom salário (para a época), desfrutava da vida. Eis que surgiu o anúncio mais que inesperado: o Yes tocaria em Porto Alegre com uma de suas formações consagradas. 
Apenas para ressaltar, ao que eu lembre essa informação surgiu em um jornal local. Na época, internet era algo raríssimo. Tudo o que se adquiria de informação era ou da revista Rock Brigade, ou da revista ShowBizz. Em março de 1998, completou-se cinco meses do último album do grupo, Keys to Ascension 2, que conta com Howe, Jon Anderson (vocais), Alan White (bateria), Chris Squire (baixo) e Rick Wakeman (teclados).

Open Your Eyes, o álbum da turnê de um show inesquecível
Cara, quando eu recebi a carta do Micael avisando do show, vibrei de alegria, e implorei para pai, mãe, padrinho, a cadela da vizinha, todos, para conseguir ir. Na mesma carta, fiquei sabendo que havia um novo álbum, Open Your Eyes, saído há pouco, cujas informações a seu respeito eram escassas. Mas, a princípio, era a formação de Keys to Ascension que tocaria em Porto Alegre.
Através da interferência monetária do Micael, os ingressos, que custaram caríssimos 50 reais, foram adquiridos. Pela mão de meu pai, a passagem de ida e volta para Porto Alegre (uma bagatela de 30 reais, que hoje custa 110 reais) me foi propiciada. Larguei sozinho de Pedro Osório para Pelotas, com 15 anos, e já em Pelotas fui direto em uma banca comprar um jornal para saber notícias a respeito show.
Steve Howe, Billy Sherwood, Chris Squire, Jon Anderson, Alan White e Igor Khoroshev (1999)
No Segundo Caderno de um famoso jornal local, estava estampada a foto do Yes que abre esse artigo, com seis integrantes, sem Wakeman e com a formação de Open Your Eyes, ou seja, Howe, White, Squire e Anderson, mais Billy Sherwood (guitarra) e Igor Khoroshev (teclados). Lembro que na hora em que li a manchete, fiquei triste por não ver Wakeman, mas por outro lado, achei curioso o fato do jornal citar o Yes como uma das primeiras bandas a lançar em um novo formato que começava a chegar as lojas americanas, o DVD. Afinal, eu não tinha nem ideia do que era um DVD, e CD era artigo de luxo em Pedro Osório.
Às 16 horas saí de Pelotas. Ainda lembro de um cidadão que precisava ir para Porto Alegre naquele horário, e não tinha mais passagem. O cara ofereceu o dobro do valor da passagem, e eu pensei duas vezes, mas por diversas questões, fui às 16 horas mesmo. Chegando em Porto Alegre, lá estava o Micael. Comemos algo na rodoviária e nos mandamos para o Bar Opinião, local do show.
Lembro direitinho do trajeto e da chegada no Opinião, com uma fila de senhores onde eu parecia um bebê. O Micael encontrou algum conhecido, mas no fim das contas, dentro do local, fomos para o segundo piso, já que a ideia era que, na pista, eu não veria nada, e como esse era o meu primeiro show, ainda mais do Yes, eu precisava ver.
No segundo andar, paramos perto da grade de proteção, apenas com um gigante e repórteres a minha frente. Apesar de uma ou outra confusão, eu estava embasbacado com a pressão. Nunca tinha visto tanta gente em um lugar tão pequeno. Eu estava esmagado. Dizem que havia 1,8 mil pessoas no Opinião, mas pelo que acabei conhecendo do lugar depois que passei a morar em Porto Alegre, acredito que havia mais.
O show começou com a clássica “Opening: Firebird Suite”, e o Yes já veio detonando “Siberian Khatru”. Eu fiquei quieto o tempo inteiro, achando que era mentira, já que estava ouvindo a sequência de abertura de um dos meus álbuns ao vivo favoritos, o Yessongs, ali, na minha frente. O primeiro solo de Howe, que não por menos entrou com a mesma semi-acústica de quando eu conheci o Yes na TV Bandeirantes, foi como o primeiro beijo da mulher amada. Aquilo me acalmou, e eu cantei as vocalizações finais da canção.
O Opinião vibrou, e então vieram mais e mais clássicos, onde eu me surpreendi diversas vezes, como em “Owner of a Lonely Heart” (com Sherwood se destacando), “America” (essa eu lembro que cantei inteira com um cara reclamando que tinha ido ao show para ver o Jon Anderson cantar, não eu) e “And You And I”, onde eu descobri como uma música pode te fazer chorar.
White, Squire e Sherwood
Os momentos mais marcantes foram três. O primeiro deles, quando “Heart of the Sunrise” começou a ser tocada, e Squire chegou na frente do palco, com seu baixo empunhado, pedindo para a galera cantar o solo junto com ele, enquanto Howe, quietinho no seu canto, fazia o tema central. Lembro de Khoroshev com os braços abertos tocando dois teclados ao mesmo tempo, algo que eu achava que somente Wakeman fazia (quanta inocência).
Steve Howe
Depois, foi o solo de Steve Howe ao violão. O Opinião inteiro em silêncio quando ele começou a tocar “Mood For a Day”. Me senti no paraíso. Para tornar tudo ainda mais especial, no começo da canção o responsável pelo canhão de luz jogou a luz direto no rosto de Howe. Ele seguiu tocando e visivelmente desconfortável, começou a correr pelo palco tocando ao mesmo tempo uma das mais lindas peças que já cômpos. Cara, aquilo foi demais. O Opinião vibrava como em uma final de futebol. Depois, Howe deu a xingada do ano no cidadão, mas o estrago já havia sido feito, ele tocou uma das peças mais lindas de toda sua carreira correndo pelo palco. Uma “barbada”!! Depois foi a vez de levantar a gauchada com “The Clap”, em um dos momentos mais legais, onde Howe agradeceu ao público pelo carinho e por ter acompanhado a canção com palmas.

Por fim, o solo de Squire foi algo digno de se registrar eternamente em um DVD. Squire, com camisa e calça preta, começou “The Fish” da mesma forma do que está registrado no LP Yessongs, ou seja, após “Long Distance Runaround”. A partir de então, vieram as conhecidas linhas de “Whitefish”, e quando chegou em “Amazing Grace”, se ajoelhou em frente a Alan White, em posição de reverência, e White soltou o braço em um longo solo. Depois do solo de White, Squire se levantou, e junto com Howe e Khoroshev, interpretaram algumas linhas de “Ritual”. Eu lembro de ficar parado e do Micael me gritando: “Viu, ‘Ritual’, viu!!!”.

Igor Khoroshev

Outro momento que me marcou bastante foi o solo de Khoroshev. Como ele começou a solar depois de “Wonderous Stories”, a expectativa era de que ele seguisse o álbum Going for the One, comandando-se “Awaken”, mas tudo não passou mesmo de expectativa, já que o tecladista russo enveredou por outros campos e não passou nem perto da melhor canção que o Yes gravou depois de 1975.

O show acabou com “I’ve Seen All Good People”, quando Anderson apresentou os membros conforme o álbum Classic Yes, e “Roundabout”. Ficou aquela frustração por nem “Close to the Edge”, nem “Awaken” terem sido tocadas, além do fato de que em “And You And I” Howe não usou a guitarra de dois braços que costumava usar nos anos 70. Mas mesmo assim, o impacto do show foi tão grande que depois de toda a viagem de volta para Pedro Osório (mais de cinco horas de ônibus), eu lembrava do repertório na ordem que foi tocado, e tenho até hoje comigo o mesmo anotado nos meus papéis referentes à carreira do Yes.

Jon Anderson
Infelizmente, naquela época câmera fotográfica digital era coisa de outro mundo, e também não fiquei com o ingresso do show, que foi recolhido pela produção logo na entrada. A única recordação material do show é a camisa da turnê, comprada por absurdos 25 reais (lembro que o Micael tentou um desconto, pois aquele valor era muito caro mesmo). Entretanto, em compensação, a cada dia que eu ouço Yes e fecho os olhos, parece que um CTRL+F surge no meu cérebro, e lá ele encontra os mpegs do show de 1998, com Howe de camisa azul e calça negra dando os seus pulinhos tradicionais pelo palco, Anderson e seu carisma mais que conquistador, Khoroshev se distribuindo em braços para fazer as canções de Wakeman, Sherwood praticamente estático no canto direito do palco, Squire sorrindo muito para o público e White jogando as baquetas para o pessoal que estava no gargarejo do Opinião, além da emoção de ter visto aquele que musicalmente até hoje foi o melhor show da minha vida, e que eu agradeço e muito ao Micael por ter me propiciado, sendo o primeiro de muitos shows que posteriormente curtimos juntos.

O bolha com a camisa do show
Set list:

1. Firebird
2. Siberian Khatru
3. Rhythm of Love
4. America
5. Open Your Eyes
6. And You and I
7. Heart of the Sunrise
8. Mood For a Day
9. The Clap
10. Wonderous Stories
11. Khoroshev Solo
12. Long Distance Runaround
13. Whitefish
14. Amazing Grace
15. Excerpts from ‘Ritual’
16. Owner of a Lonely Heart
Bis:

17. I’ve Seen All Good People
18. Roundabout

13 comentários sobre “Shows Inesquecíveis: Yes (Porto Alegre, 19 de maio de 1998)

  1. ^
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    Já que amanhã é dia das mães…hehehe

    O Yes é uma daquelas bandas que está na categoria de minhas favoritas que eu nunca vou ver ao vivo. Isso eu já me conformei…

  2. Maravilha, mairon… relato de guri emocionado mesmo, e não foi por pouca coisa, ver na frente uma banda que compôs tantas e tantas músicas que fazem parte da trilha sonora das nossas vidas pode parecer pouco para alguns, mas para quem sabe valorizar a arte como transformadora de vidas, faz todo o sentido do mundo.

  3. Valeu a todos. Até a mãe apareceu por aqui, hehehehe

    Os méritos se devem principalmente ao Micael. Se não fosse ele ter metido a pilha no meu pai para deixar eu ir no show, e conseguir o ingresso tb, eu jamais teria visto esse baita show. Valeu Micael!

  4. Cara, lembrei de como foi para mim, ter visto esse show wm SP> Tenho os ingressos guardados ate hoje. Yes é paixão mesmo. Fui em todos os shows deles aqui em SP e se vierem vou novamente. Ando ja com meus 51 anos, mas continuo fã deles e transmitindo isso para meus filhos. Abç e felicidades

  5. Que delícia de relato! Eu já tinha 30 anos, já era mãe (mas hoje vejo que era uma menina, rs!) portoalegrense da gema que cresceu com os irmãos mais velhos ouvindo o Yes (e outros dinossauros maravilhosos!). Lamento tanto não ter tirado fotos deles e de nós no show! Tem um momento inesquecível pra mim! FIcamos bem na frente do palco, visíveis para eles (eu e várias amigas). Joguei um beijo pro guitarrista, com a mão (beijei a mão e joguei pra ele) e ele viu e fez como se estivesse caindo, extasiado!!! Cara, que momento!!!!

  6. Eu hoje com 60 anos estava la sou de SP tava construindo o Aeroporto Salgado Filho. Fui no Show. Inesquecivel……bons tempos….so faltou tocar sun……bela historia.

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