A Little Respect: Kon Kan
Compacto de “Harry Houdini” |
O disco abre com os sintetizadores de “Art’s in D Minor” apresentando os acordes iniciais, com o tema em cima do acorde Dm sendo feito pelos teclados, em uma das introduções mais conhecidas do synthpop, que se repete durante pouco mais de três minutos, levando ao tema de “Harry Houdini“, um dos maiores sucessos do Kon Kan, tendo sempre ao fundo o acompanhamento da bateria e da bateria eletrônica. Kevin começa a cantar a canção acompanhado pelos eletrônicos, e os teclados fazem os acordes ao fundo, sempre em cima do tema inicial, modificando o tom no tema central, mas mantendo sempre a mesma linha construtiva da canção até o seu final, com vocalizações feitas por Debra Dobkin, Jon Lind, Julia Waters, Maxine Waters, cantando o nome da canção. Essa canção tem também a participação de Mark Goldenberg nas guitarras.
Compacto de “Move to Move” |
O LP segue com os barulhos da faixa-título, trazendo a voz de Kevin para uma balada oitentista bem pop, levada por bateria eletrônica, teclados e sintetizadores, apresentando um bom solo de guitarra feito por Mark Goldenberg, uma novidade nas canções do synthpop.
Compacto de “I Beg Your Pardon” |
O lado B abre com outro clássico, “I Beg Your Pardon (I Never Promised You a Rose Garden)“, que apresenta o sampler das canções “(I Never Promised You a) Rose Garden”, de Lynn Anderson, lançada em 1971, “Get Up and Boogie (That’s Right)”, lançada pelo Silver Convention em 1976 e “Call Me”, do grupo Spagna, lançada em 1987, bem como linhas do tema do filme The Magnificent Seven, famoso por ser trilha dos cigarros Marlboro nos anos 60 e 70.
Compacto de “Puss N’ Boots” |
O LP encerra-se com “Puss N’ Boots/These Boots (Are Made For Walking)”, a qual apresenta samplers para “Immigrant Song”, lançada pelo Led Zeppelin em 1970, e “These Boots are Made for Walkin'”, lançada por Nancy Sinatra em 1966. A canção começa com o pesado riff da guitarra de Goldenberg e do baixo de Simeon Pillich, seguida por bateria, baixo, sintetizadores e os gritos de Plant em “Immigrant Song”, em uma levada hip-hop, com muitos scratches (aquela mexida no vinil “arranhando-o” no toca-discos), feitos por Afrika Islam. A canção de Nancy aparece no tema central da canção, que retoma o seu início com o riff pesado, o sampler de “Immigrant Song” e novamente “These Boots are Made for Walkin'”. O rap de BX Style Bob traz novamente as frases de “These Boots are Made for Walkin'”, encerrando com uma embalada sessão de sintetizadores, scratches, baixo e bateria.
A fraca sequência de Move to Move |
Syntonic não é a sequência perfeita para Move to Move. Com a adição de diversos convidados/as para os vocais, O LP abre com um grande clássico da carreira do Kon Kan, “Liberty!“, outra canção que tocou bastante nas rádios e festas do início dos anos 90. Os sintetizadores da introdução e a bateria eletrônica dão o ritmo “espacial” dessa canção, trazendo os vocais de Barry acompanhados por muitos eletrônicos, seguido pelos belos vocais de Debbie Cole, os quais aparecem na ponte que leva ao refrão. O nome da canção é daqueles para grudar na cabeça quando cantado, e apesar do andamento chiclete , essa canção tem seus méritos como uma das melhores já construídas por Barry para as pistas de dança, tendo no solo de trompete o momento mais controverso, mas mesmo assim, muito interessante.
Cassete de “(Could’ve Said) I Told You So” |
Depois disso, cai bastante, começando com “(Could’ve Said) I Told You So”, onde os vocais gospel do refrão trazem percussão, sintetizadores e bateria eletrônica. O saxofone introduz os vocais de Barry, em uma canção que apesar de dançante, e dos vocais de Joy Winter, não chama tanto a atenção quando “Liberty!”, mas não é de toda ruim. Ela apresenta o sampler para “If You Wanna be Happy”, de Jimmy Soul.
A faixa seguinte, “Victorius”, é uma repugnante balada/hip-hop, que mesmo com a participação de guitarra, teclados e os vocais de Debbe Cole, não chega aos pés de uma boa canção do Kon Kan, se escapando apenas a leve investida jazzística na ponte que muda o tom da canção. “Time” resgata os sintetizadores de “Harry Houdini”, em outra conhecida canção, onde os eletrônicos predominam mas não chegam a empolgar, e, com a exceção dos teclados nostálgicos e dos solos de guitarra e saxofone, é uma verdadeira bomba. Essa canção contém, no seu trecho central, um sampler para “We’re Here for a Good Time”, do grupo Trooper.
O lado A encerra com a balada “Heaven Knows”, repleta de dedilhados com guitarra sintetizada, eletrônicos e uma xarope linha vocal, que não deixa a mínima saudade para a posteridade.
“Victim”, com os vocais de Carole Pope, abre o lado B com muita percussão, gritos e apitos, misturando música africana e hip-hop, em uma receita que não agrada em princípio, mas que com a entrada da guitarra, já torna a canção um pouco mais atraente, principalmente pelo embalo da guitarra e dos sintetizadores. Porém, os quase sete minutos da canção acabam tornando-a uma maçante terapia de technopop.
“I’ll Find Another Love” é outra bomba arrepiantemente horrível, mesmo contando com guitarra, saxofone, baixo e bateria. Nada aproveitável e totalmente esquecível, principalmente pelos vocais de rap feito pelo grupo vocal Protege. “My Camera” e seu piano elétrico introdutório é uma canção mais sensual, misturando sonoridades brasileiras (cowbell e cuíca) com sintetizadores que imitam o som de um trompete, tendo um interessante solo de um sintetizador imitando o som de uma marimba, e a entrada dos vocais de Barry, acompanhado pelos vocais de Debbie Cole, mantém a canção em um nível até aceitável perto das demais.
O LP segue com “Can’t Stop the Fire”, mais uma canção que rodou bastante nas vitrolas dos DJs brazucas, com uma boa levada pop, similar as canções de Move to Move, além de um grudento refrão, e encerra-se com “Better Day”, outro pop bem interessante, repleto de sintetizadores, tendo os vocais de Barry divididos com os vocais de India durante o refrão, fechando o LP em uma tentativa de resgatar os melhores momentos do álbum de estreia, destacando outro solo de saxofone.
Barry acabou se dedicando a produção de outros materiais, até que em 93, foi despedido da Atlantic, indo parar no selo Hypnotic, onde ainda com o nome Kon Kan, lançou aquele que eu considero o melhor álbum do grupo.
Vida!…, recheado de bons rocks anos 90 |
Vida!…, com Barry dividindo os direitos das composições com Bob Mitchell, é praticamente um álbum de rock feitos nos anos 90, sem as explorações eletrônicas de Syntonic ou os samplers de Move to Move, as quais aparecem em uma que outra canção, e são os pontos mais fracos do disco. Barry e Mitchell fizeram no geral canções diretas, simples, que não fizeram sucesso justamente por soar tão rock’n’roll em relação ao som do Kon Kan. Barry chamou como convidados Michael Hampson (guitarra), Anton Cook (bateria), Seri Gee (teclados, vocais), Lorrie Tice (vocais) e assumiu teclados, baixo e vocais.
O álbum abre com a vinheta “The Introdome”, tendo a participação do Kon Kan no programa Transamérica, e assim, começam os sintetizadores de “Sinful Wishes“, onde a guitarra repleta de wah-wah, bateria e baixo fazem o acompanhamento para os vocais de Barry, em um rock na linha de bandas como EMF e Jesus Jones, dois grandes grupos do rock feito no início dos anos 90, com uma levada muito boa e com um grudentíssimo refrão, além de um insinuante solo de guitarra. A bateria dessa canção é tocada por Mark Santers.
“Mr. Fleming” segue a linha de batidas dançantes da bateria, com o órgão puxando o riff de outra swingada faixa, com destaque para as passagens do órgão e das linhas de baixo e guitarra, tendo também um bom refrão, além da guitarra com distorção aparecendo na ponte central que leva para o ótimo solo de guitarra, com muito virtuosismo e peso (para as proporções do Kon Kan).
A guitarra também é destaque na ótima “Should’ve Known Me (Better Than That)”, um rock oitentista que parece ter saído de algum álbum da Legião Urbana ou dos Smiths, com violões dedilhados, teclados e o andamento quadrado da bateria e do baixo, destacando a participação dos vocais femininos.
Então, uma das melhores canção já feita pelo Kon Kan, no caso, a cover para “Moonage Daydream”, de David Bowie, surpreende positivamente em um CD que já vinha bem. Comparar essa versão com a de Bowie é uma covardia, mas tirando a paixão pelo vocalista britânico, Barry reconstruiu “Moonage Daydream” com um toque particular da sua voz. A canção começa com o violão e a bateria, e desenvolve-se na mesma linha do original. Está tudo lá: os vocais durante o refrão, o excelete solo de guitarra de Mick Ronson, reproduzido aqui pelos sintetizadores de Barry, os arranjos orquestrais, conduzidos aqui por Seri Gee, a ótima levada de bateria e baixo, e claro, a voz sussurrada de Barry, que diferencia-se da de Bowie, mas não torna a canção ruim de jeito nenhum. O solo final feito por Hampson é fantástico, com muitos bends e sustains na guitarra, tendo as orquestrações ao fundo, em uma bonita homenagem para Mick Ronson, que faleceu semanas antes do lançamento de Vida!…, no dia 29 de abril de 1993, reproduzindo as clássicas notas de seu solo original, encerrando a canção de forma emocionante, apenas com os violões dedilhados fazendo os acordes principais.
“January Man” tem violões e palmas fazendo a introdução seguida pelos vocais sussurrados de Barry, tendo acordes dedilhados do piano elétrico ao fundo, em uma canção boa para aquele fim de tarde preguiçoso, em um embalo do violão similar as canções swingadas de Jack Johnson.
Barry Harris |
A partir de então, o álbum cai de nível, começando com a introdução de “S. O. L.”, onde gritos de rap a capela transformam-se em um samba/rock com a entrada de violão e percussões, na pior canção do álbum. O Kon Kan ainda gravou uma versão dance para “Sinful Wishes”, que é melhor não passar por perto se você admira a versão original, enquanto “In Silk” é desesperadoramente ruim, com apenas os vocais de Lorrie Tice entre muitos eletrônicos, fugindo totalmente do conceito geral do álbum e sendo uma das piores coisas já ouvidas na história da música de fundamento.
Por fim “When Hope is Gone” é um atestado da perda na esperança de que o Kon Kan poderia fazer um disco inteiramente bom, sendo uma canção instrumental mediana, com os sintetizadores de Barry aparecendo com destaque, e que talvez, se fosse um pouco mais curta, agradaria mais.
O que fica é um álbum cujo 70% do material é de muito bom gosto e de fácil apreciação para os admiradores de rock, mas que tem nas suas quatro últimas faixas verdadeiras provas de que nem sempre um grupo de technopop consegue soar bem, mesmo fazendo algo do estilo.
“Sinful Wishes” e “S. O. L.” foram lançadas em singles, que assim como o CD, fracassaram em vendas. Barry Harris encerrou as atividades com o Kon Kan, se tornando um famoso produtor da cena pop, trabalhando com diversas mixagens para singles de 12″. Harris formou o grupo Outta Control, ao lado de Kimberley Wetmore e Rachid Webbi, que lançou um único álbum em 1996, o homônimo Outta Control, apresentando uma cover para “Sinful Wishes”, e voltou a fazer sucesso ao lado do DJ Chris Cox no Thunderpuss, remixando dezenas de hits da dance music no final dos anos 90 e início dos anos 2000, e alcançando novamente posição entre as 40 mais dos Estaos Unidos através de “Funk Like Dat”, que estourou naquele país no ano de 1997.
Video-clip de “I Beg Your Pardon” |
De qualquer forma, o Kon Kan entrou para a história através do sucesso de seu primeiro disco e graças a hits como “Liberty!”, “I Beg Your Pardon”, “Harry Houdini” e “Sinful Whishes”. Todos que vivenciaram o final dos anos 80 e início dos anos 90, seja na adolescência ou na infância, conhecem ao menos uma dessas canções. Por puro preconceito contra o pop, as pessoas acabam não tendo a pretensão de ouvir os três álbuns do grupo, mas, se você é cabeça-aberta, dedique um pouco de sua vontade para Vida!…, e claro, não deixe de prestar a devida atenção para um dos maiores clássicos do synthpop, Move to Move, que apenas por ele, já faz do Kon Kan mais uma banda digna de se merecer um pouco de respeito.
Excelente.
Curti muito o Kon Kan… Adoro a voz de Liberty, a voz feminina é magnífica
☺
Valeu Leandro. Vc chegou a conhecer o terceiro disco? É bem diferente. Abraços