Por Diogo Bizotto
No decorrer dos artigos que publiquei nesta coluna, procurei por diversas vezes deixar claro quão errônea é a classificação do AOR como um gênero pré-formatado, calcado apenas, como muitos imaginam, na grande profusão de teclados. Inclusive, já citei a relação diversas vezes estabelecida com o próprio heavy metal, como foi o caso do que escrevi a respeito de
Saxon,
Ten e
Place Vendome.
O caso de hoje não é diferente. Desde 1984 em carreira solo, o guitarrista sueco Yngwie Malmsteen e sua banda, a Rising Force, primavam por executar uma espécie de heavy metal com diversos elementos tomados diretamente de compositores clássicos, como Paganini e Bach, influências tão preciosas para Yngwie quanto Jimi Hendrix e Ritchie Blackmore (Deep Purple, Rainbow). Apesar do fato de que outros guitarristas já haviam incorporado elementos clássicos em sua música desde os anos 70, caso do próprio Ritchie Blackmore e de Uli Jon Roth (Scorpions), Malmsteen foi o primeiro a levar essa fusão a caminhos tão extremos, configurando-se não apenas em um pioneiro do que acabou por ser rotulado como “heavy metal neoclássico”, mas o desbravador do caminho a ser seguido por diversos outros guitarristas virtuosos que surgiram nos anos 80, como Paul Gilbert, Vinnie Moore, Tony MacAlpine, Jason Becker e tantos outros.
Após o lançamento do pioneiro
debut,
Rising Force (1984), majoritariamente instrumental, e da sequência com o excelente
Marching Out (1985), onde o jovem vocalista Jeff Scott Soto teve a oportunidade de brilhar com muito mais intensidade, a banda sofreu uma mudança significativa, que foi a entrada de Mark Boals no lugar de Jeff, vindo a gravar
Trilogy (1986), que, apesar de manter o estilo neoclássico intacto, apresentou fortes pitadas de AOR em faixas como “
You Don’t Remember, I’ll Never Forget“, “Queen in Love” e “Fire”.
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Yngwie Malmsteen em 1989 |
No álbum seguinte, Odyssey, o passo dado nessa direção foi ainda maior. Logo na escolha do vocalista a gravar o disco, a decisão apontou para esse caminho, recaindo sobre o norte-americano Joe Lynn Turner (famoso por ter integrado o Rainbow em sua fase mais AOR) a missão de colocar sua voz nas músicas e escrever as letras. Na bateria e no teclado, respectivamente, mantiveram-se os irmãos Anders e Jens Johansson, companheiros de Yngwie havia anos. O baixo, geralmente registrado apenas pelo guitarrista, foi dividido com o mais que experiente Bob Daisley (Ozzy Osbourne, Rainbow, Black Sabbath).
O resultado, por mais que hoje em dia rejeitado por Yngwie, que já declarou diversas vezes não gostar do álbum, foi mais que satisfatório. Não apenas seu maior sucesso comercial, atingindo a 40ª posição na Billboard, Odyssey é facilmente um dos melhores lançamentos em seus quase 30 anos de carreira. A performance de Yngwie, menos furiosa e mais melódica que nos antecessores, resultado talvez da fase de recuperação de um acidente automobilístico sofrido em 1987, casou perfeitamente com as linhas vocais trabalhadas por Joe Lynn Turner, odiado por muitos que sequer lhe deram uma chance de ouvi-lo trabalhar fora do Deep Purple, onde gravou o fraco Slaves and Masters (1990).
Apesar do álbum
Rising Force ter sido lançado em 1984, foi somente em 1988 que surgiu a faixa de mesmo nome, que abre
Odyssey de maneira majestosa, configurando-se em uma perfeita canção para iniciar concertos. A introdução climática ao teclado misturada a vozes que ecoam, tomada de assalto por um andamento marcial de Anders Johansson e do fantástico riff desferido por Malmsteen, fizeram de “
Rising Force” um clássico instantâneo, solicitado e executado até hoje. Os vocais de Joe Lynn Turner fluem com facilidade, culminando em um refrão que tem como ápice o entoar do nome da canção, que, pesada na medida certa, constitui um dos pontos mais altos da carreira do guitarrista.
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Yngwie J. Malmsteen’s Rising Force: Anders Johansson, Joe Lynn Turner, Yngwie e Jens Johansson |
Apesar de uma música como “Rising Force” poder erguer a expectativa do ouvinte a níveis difíceis de corresponder, o track list de
Odyssey não o frustra de maneira alguma. Uma trinca de alto nível dá sequência ao disco, mantendo nossos ouvidos próximos aos alto-falantes: “Hold On” segue a linha mais melódica de “Queen in Love” (de
Trilogy), enquanto a música mais bem sucedida do disco, “
Heaven Tonight“, é um AOR safado de refrão extremamente grudento, com Jens Johansson tocando mais simples, mas em evidência. Turner, especialista no estilo, soa confortável em uma canção que é a sua cara. “Dreaming (Tell Me)” é uma balada que une o violão de Malmsteen ao teclado de Jens de maneira mais delicada que o habitual, e tem como clímax os solos do guitarrista, soando certeiros, sem os exageros que lhe caracterizariam posteriormente.
Aliás, é necessário frisar que, apesar de hoje em dia ser lugar comum diminuir a importância e o talento de Yngwie, seus primeiros trabalhos são a prova de que sua extraordinária técnica já rendeu excelentes resultados quando unida a boas composições. Ténica essa demonstrada na curta instrumental “Bite the Bullet”, que é seguida da pesada “
Riot in the Dungeons“, cujo combustível são os pungentes riffs de Malmsteen. Subestimadíssima, a faixa mereceria ser presença constante nos shows do sueco até hoje. Mais lembrada é “Deja Vu”, outra ótima canção, dona de melodias vocais tipicamente AOR postadas sobre um instrumental hardeiro.
Outra que mantém a pegada AOR é “Crystal Ball“, datadíssima, mas sem deixar de ser um destaque do disco, assim como a seguinte, “Now Is the Time”, aberta pelos teclados de Jens Johansson em um estilo que utilizaria depois com frequência no Stratovarius, banda que integra até hoje. Como explícito em seu nome, “Faster Than the Speed of Light” é acelerada e traz Joe Lynn Turner cantando de maneira análoga a de faixas do gênero gravadas por ele no Rainbw, como “Death Alley Driver” e “Spotlight Kid”. Duas instrumentais, a longa e virtuosa “Krakatau”, e a curta “Memories”, encerram um disco que deixa o ouvinte se perguntando a respeito do motivo para que Malmsteen não o aprecie.
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Trial By Fire: Live in Leningrad |
Odyssey renderia uma bem sucedida turnê que passou por diversos países, incluindo a ex-União Soviética, onde foi registrado o álbum ao vivo e VHS Trial By Fire: Live in Leningrad, lançado em 1989 (o VHS só viu a luz do dia em 1991), de onde foram retirados os vídeos presentes neste artigo. Yngwie continuou trilhando, sem a mesma qualidade, um caminho semelhante nos álbuns seguintes, Eclipse (1990) e Fire and Ice (1992), mas sem a Rising Force, trabalhando com outros músicos, entre eles o vocalista Göran Edman, que gravou os dois discos citados. Entre retornos ao heavy metal mais puro, discos de qualidade duvidosa, incursões com orquestra e demonstrações de seu inflado ego, Malmsteen levaria dali em diante uma carreira de altos e baixos, tornando-se para muitos apenas uma sombra daquilo que outrora fora. Mas, no mínimo, o que fica é seu testamento de pioneirismo e inovação no rock pesado, em especial para os guitarristas, que muito lhe devem. Odyssey certamente é parte importante desse testamento.
Deste cara, gosto bastante dos dois primeiros discos de estúdio…depois não me desce…já tentei ouvir…mas não acho legal… ao vivo é outra coisa…é sempre impressionante ver como ele e suas bandas tocam muito… este vídeo de Leningrado captura todos os músicos em grande fase técnica…
Pois é, Fábio… falem mal, falem mal, mas mesmo em fases de descenso, além de continuar tocando bem com muita facilidade ao vivo, sua banda reunia alguns músicos muito bons. Para mim é indiscutível que a melhor fase se encerra após ese primeiro ao vivo, mas depois houveram alguns momentos muito bons, como é o caso do álbum "The Seventh Sign", com Mike Vescera no vocal.
Conheço pouco da carreira do Malmsteen, mas sua importância é notável. Uma pena que seu ego tenha inflado tanto quanto o corpo. O Rising Force é um dos grandes trabalhos de guitarra desse estilo (ao lado do Sufing with the Alien e do passion and warfare).
Será que ele um dia voltará a fazer o que fazia nos anos 80?
acho q o oddisey é o melhor disco do malmstenn..
pelo dos q eu já ouvi com o cara é o melhor..
tá certo q eu acho o JLT "o cara", mas neste CD os dois capricharam..
tb acho este CD um dos melhores da carreira do JLT…
E eu fiquei puto da cara pelo fato do Joe Lynn Turner não ter tocado (se bem me lembro) sequer uma música desse disco em sua mais recente turnê, ao menos no show de Porto Alegre!
Em um show aqui no Rio, o JLT tocou Deja Vu… E o guitarrista penou!!!