Discografias Comentadas: Alan Parsons Project
O The Alan Parsons Project é realmente, como o nome sugere, um projeto, diferente de todos os grupos de sucesso que sem tem notícia, especialmente se tratando do Rock Progressivo e de suas vertentes. Não eram músicos que formaram uma banda, e sim profissionais da música e compositores que empregavam o talento de diversos músicos diferentes para dar às suas composições o que eles precisavam. Provavelmente é daí que vem a diferença principal do grupo.
Trata-se de um duo formado por Alan Parsons – um engenheiro de som respeitado àquela altura do campeonato que já tinha trabalhado em discos dos Beatles, Pink Floyd e sempre no famoso estúdio Abbey Road (Londres) – e Eric Woolfson – compositor, vocalista e pianista que iniciou sua vida na musica como empresário.
O grupo lançou 10 discos nos 11 anos em que a parceria de Parsons/Woolfson durou e vendeu mais de 50 milhões de cópias. Muitos pensam que Alan Parsons era o chefão do grupo. Até mesmo porque ele seguiu em carreira solo posteriormente, coisa que Eric Woolfson só fez anos mais tarde. Na verdade não era bem o caso. Eric explica: “O nome do grupo acabou ficando The Alan Parsons Project porque Alan na época já era uma pessoa conhecida no mundo musical. Era um passo a frente que poderíamos dar logo no início e acertamos”. Eric na verdade é o nome por trás das letras, uma grande parte das músicas, conceitos e vocais em vários hits do grupo.
É bom lembrar também que mesmo que a banda tenha se afastado do Rock Progressivo nos anos 80, que o som tenha se tornado mais pop (mais conhecido como Progressive Pop ou Soft Prog) com o tempo, o The Alan Parsons Project nunca deixou o experimentalismo Progressivo de lado. TODOS os discos do grupo são conceituais! Todos os discos tem um assunto/tema sobre os quais as faixas são narradas. Outro fato marcante do projeto é que nunca há um mesmo vocalista em duas faixas. O mesmo cantor pode aparecer em discos diferentes, mas nunca duas vezes no mesmo álbum. Vamos à eles.
Tales Of Mystery And Imagination Of Edgar Allan Poe (1976)
Esse é o disco mais experimental da dupla. Eu diria que também é o mais rebuscado. Aqui eles tiveram a ajuda de Andrew Powell (que trabalharia com Kate Bush mais tarde), que conduziu todas as orquestrações, mais especificamente na suite “The Fall Of The House Of Usher“.
O primeiro álbum do projeto alcançou o número 38 na parada da Billboard e traz como banda de apoio músicos do Ambrosia, banda americana cujos primeiros discos foram produzidos por Alan Parsons. Originalmente o disco deveria ter narrações, gravadas por Orson Welles. No entanto, isso não aconteceu na edição original.
Somente em 1987 quando a primeira versão em CD foi lançada é que Alan Parsons adicionou as narrações ao disco. Tales Of Mystery And Imagination Of Edgar Allan Poe trata de recontar os poemas e contos de horror do escritor de mesmo nome. A faixa “The Raven” traz pela primeira vez o efeito de um vocoder em um disco de Rock. Destaque para “The Tell-Tale Heart“.
O segundo disco marca uma série de mudanças. Pra começar, Andrew Powell não participa do disco. Logo, as orquestrações praticamente sumiram. O disco, mais variado do que o anterior, alcançou o lugar de número 30 na parada inglesa.
Originalmente, seria baseado na série ‘I, Robot’, de Isaac Asimov. Parsons e Woolfson já tinham acertado tudo com o autor. No entanto, os direitos da obra já tinham sido vendidos. E dessa maneira o título foi alterado (a vírgula foi retirada). As letras, ao invés de tratarem do mundo robótico de Asimov, tratam de um mundo tomado por robôs de uma forma mais genérica.
A faixa final “Genesis Ch.1 v.32” muitas vezes é tida como uma adaptação da Bíblia. No entanto, o livro original só possui 31 versículos.
Com a mudança no mundo Progressivo no final dos anos 70, o The Alan Parsons Project soube como lidar com elas. Fizeram isso muito bem durante toda sua carreira. O terceiro disco é mais suave do que o anterior, mas em nenhum momento isso significa perda de qualidade. Pyramid é um dos meus favoritos.
Nesse trabalho, o duo volta a trabalhar com Andrew Powell em algumas faixas. Como o nome sugere, o disco trata das pirâmides e de todo o mistério que até hoje as cercam. O tema do disco é centrado na pirâmide de Gizé, que se situa no Egito e que é uma estrutura extremamente intrincada, possuindo 3 pirâmides, esculturas gigantes, cemitérios, uma vila de trabalhadores e um complexo industrial. Pyramid chegou ao 26º lugar da Billboard.
O quarto disco, apesar de ainda repleto de qualidade, é o mais fraco antes da chegada dos anos 80. Eve lida com a figura feminina em um mundo dominado pelos homens. Inicialmente, contaria histórias sobre as grandes personagens femininas da história, mas o assunto acabou se abrindo para abranger um maior número de temas.
Pela primeira vez ouvimos vocalistas mulheres como solistas nas faixas “Don’t Hold Back” (Clare Torry) e “If I Could Change Your Mind” (Lesley Duncan). Clare Torry é mais conhecida por ter gravado os vocais de “A Great Gig In The Sky” no clássico disco do Pink Floyd, The Dark Side Of The Moon (1973).
Turn Of A Friendly Card (1980)
O primeiro disco do The Alan Parsons Project a adentrar a nova década ainda não veria a sonoridade típica dessa década (ainda bem). Temos aqui um dos melhores acabamentos quando estamos falando do sub gênero conhecido como Progressive Pop. Ou para nós brasileiros, Pop Progressivo.
Além de clássicos como “Games People Play” e “Time”, temos novamente uma suíte em um disco do duo: “The Turn Of A Friendly Card” e seus 16’24 minutos. O álbum trata do tema ‘aposta’ de um modo geral e conta a história (não muito detalhada) de um homem de meia idade que vai a um Casino e perde tudo que tinha economizado até aquele momento. Pela primeira vez ouvimos o vocal de Eric Woolfson em uma música do APP, justamente em “Time“. O fato acabaria sendo repetido muitas vezes em discos futuros.
O sexto disco do Alan Parsons Project foi, e continua sendo, o maior sucesso comercial do grupo. Também é o disco mais variado da banda. Dessa vez inteiramente imersa na nova década. Isso mudou de forma abrupta o som deles.
Eye In The Sky (1982) trata da crença. Seja ela religiosa, política ou até mesmo na sorte. Basicamente, lida com a crença de que existe alguém lá em cima cuidando de nós todos. A capa do disco traz a imagem do Olho de Horus, um símbolo egípcio de proteção. A primeira edição do disco teve esse símbolo folheado a ouro na capas. O álbum alcançou a sétima posição nas paradas e contém clássicos como a famosa dupla “Sirius/Eye in the Sky“, além de “Old and Wise“.
Após o estrondoso sucesso do disco anterior e a pressão que isso traz a um grupo musical, Ammonia Avenue segue os mesmos passos de Eye In The Sky. Acabou se saindo muito bem, comercialmente falando. “Don’t Answer Me“, que novamente vê Eric Woolfson como vocalista principal, é até hoje uma das faixas mais famosas do grupo.
O título do LP surgiu de uma visita que Eric Woolfson fez ao Imperial Chemical Industries na Inglaterra. A primeira coisa que viu, quando entrou no complexo industrial, foi uma rua com muitos canos, sem nenhuma árvore, sem nenhuma pessoa e uma placa que dizia: Ammonia Avenue (Avenida Amoníaco). O disco fala da possível confusão que o público em geral faz da indústria científica e a falta de entendimento dos cientistas pelo seu público alvo. Ammonia Avenue era para ser um disco duplo, mas o projeto foi abortado por ‘não ser comercialmente viável’. A segunda parte acabou sendo lançado no ano seguinte, com o nome de Vulture Culture.
Como disse, esse era pra ser o segundo disco de Ammonia Avenue (1984). É definitivamente o mais pop de todos que o grupo lançou. Imerso completamente nos anos 80 e no pop que reinava na época. Teve um single que alcançou sucesso na Europa que é “Let’s Talk About Me“. Vulture Culture é um trocadilho usado para nomear alguém que é ‘maldito’ e que está no mundo das artes.
Também fala de como a humanidade se tornou impiedosa em um mundo cada vez mais capitalista. Significa “Cultura Do Urubu”, em uma tradução literal. O símbolo da capa é conhecido como Ouroboros, mas com uma cabeça de Urubu ao invés da tradicional cobra. O título também foi usado como referência no jogo Donkey Kong Country do SNES em 1994, sendo o nome de uma das fases no terceiro mundo.
Esse foi o segundo disco do Alan Parsos Project que ouvi. Inicialmente fiquei chocado com o som. É uma volta às origens, não sonoramente falando, mas em suas ideias. O disco tem uma sonoridade ainda pop, mas as estruturas das músicas não se limitam mais aos quatro acordes e à estrutura ‘tema-refrão-solo-tema’.
O álbum acabou não sendo um sucesso comercial, mas a faixa-título foi relativamente bem tocada nas rádios. A capa, em sua primeira prensagem, era um trabalho elaborado onde duas imagens diferentes em papel especial se juntavam formando uma terceira imagem. Stereotomy fala das pressões que o mundo moderno coloca no ser humano. A palavra ‘Stereotomy’ é um termo científico para o ato de emoldurar pesquisas em cera. Essa palavra foi usada por Edgar Allan Poe no primeiro livro policial que se tem notícia, “The Murders In The Rue Morgue”. A palavra também é uma metáfora para pessoas famosas (atores, cantores, bandas etc) que são moldadas para alcançar a fama.
O último disco oficial do Alan Parsons Project! Depois de onze anos de trabalho ininterrupto, o décimo álbum do duo fecha o ciclo de maneira honesta. Não é o melhor deles, mas definitivamente é uma melhoria nos complicados anos 80 e fecha sua discografia em um lugar mais alto.
O disco fala da vida de Antonio Gaudi, arquiteto Catalão cuja vida foi completamente entregue ao trabalho a tal ponto que era impossível para que ele tivesse uma família como uma pessoa ‘normal’. Ironicamente, seu maior trabalho é a catedral da… Família Sagrada espanhola. O álbum pega Gaudi como exemplo e trata de como o ser humano tem que dividir sua vida entre família e trabalho. As faixas “Closer To Heaven” e “Money Talks” foram usadas em episódios do seriado Miami Vice. Um musical com o mesmo nome, baseado nas músicas do disco, foi inaugurado em 1993 na Alemanha. Minha música favorita é “La Sagrada Família” com seu inconfundível estilo APP.
Ainda há um disco, Freudiana (1990), que era para ter sido o décimo primeiro álbum do grupo, mas diferenças musicais (o disco foi composto por Woolfson como um musical, o que não agradou Parsons) entre o duo acabaram por fazer que o trabalho fosse lançado sem o nome do APP por trás. No entanto, com a mesma participação de sempre. Woolfson é o compositor/letrista/vocalista. Parsons produziu e foi engenheiro de som. É considerado como parte da discografia da dupla.
Alan Parsons lançou outros quatro discos solo até hoje, sem nenhuma participação de Woolfson e com um som completamente pop. O mais recente, A Valid Path, toma um curso quase eletrônico. Sua notícia mais recente é que ele será o engenheiro de som do próximo disco de Steven Wilson que será lançado no começo de 2013.
Eric Woolfson morreu de um câncer no rim no final de 2009. No começo desse mesmo ano, The Alan Parsons Project That Never Was foi lançado por ele. Nesse trabalho, Woolfson canta músicas que foram compostas originalmente para o Alan Parsons Project e que, por um motivo ou outro, acabaram ficando de fora dos discos da dupla.
Legal!! Atualmente eu só tenho o primeiro disco deles, na versão em cd com a narração do Orson Welles. Mas já o tive em vinil.
A quem interessar, existe uma versão dupla (deluxe) desse álbum com as duas versões, a original de 1976 e a remizada de 1987, além de algumas faixas demo.
Eu não sabia que havia essa diferença entre os discos do Alan Parsons Project e os do AP solo… quando li a discografia, pensei "poxa, cadê aquele disco da década de 90, que tem um balão na capa…?". Mas agora, pensando melhor, o enfoque conceitual é bem diferente nas duas fases!
Muito boa a matéria!
Eu gosto demais de APP!!! PAra mim tem uma importância especial. Quando comecei a ouvir rock progressivo lá no fim dos anos 90 eu conheci a banda. Como conheci junto à bandas como Yes, Genesis, ELP, etc… eu achava que o APP tinha o mesmo status dessses grupos. Com o tempo era muito difícil encontrar pessoas que realmente gostavam da banda. Já dos medalhões todos gostavam…Aí fui perceber que na verdade eles não faziam parte do primeiros escalão do prog…Porém meu gosto por eles nunca mudou. Meus preferidos são Turn of Friendly Card e Eye in the Sky. Porém o primeiro e o I Robot também faz muito sucesso lá na minha casa. Tenho que ouvir mais o Pyramid e os dois últimos…
Muito legal Diego!!!
Excelente artigo … só uma pequena correção para enriquecer mais o artigo: alguns vocalistas cantam mais de uma música num mesmo disco.Por exemplo, no Eye in The Sky o Lenny Zakatek canta You're Gonna Get Your Fingers Burned e Step By Step. No mesmo disco o Eric Woolfson canta Eye in The Sky e Silence and I. No The Turn of a Friendly Card o Zakatek canta Games People Play e I don´t Wanna Go Home. São só exemplos, isto acontece em outros discos tb. Abraço
Putz! Verdade mesmo Anônimo, bola fora minha!
É que a minha intenção era deixar claro que os vocalistas eram todos convidados, mas valeu a correção 🙂
É Rafael, sempre tratei os dois a mesma coisa tb, mas ouvindo com atenção, não dá, os discos solo do AP na minha opinião são bem diferentes.
Fernando: começamos ouvindo a banda juntos então, eu conheci eles em 2000 e tb, sempre fui fã e não entendia o porque eles nunca eram citados junto dos outros medalhões. Hoje entendo melhor.
Uma curiosidade a respeito desse álbum de estréia do APP:
sua capa foi feita pela Hipgnosis e fazia parte de uma série de capas dentro do conceito “patterns” inaugurada no álbum do Pink Floyd “Dark Side of The Moon”. Era um conceito que procurava funcionar também como merchandising para os lojistas, pois ao juntar um álbum ao lado do outro, usando as partes internas e externas, era possível formar um pattern (padrão) contínuo muito útil na decoração das lojas e, consequentemente, na venda dos LPs. Além dos patterns, a Hipgnosis criou, com a mesma finalidade, o conceito de Mandalas, desenvolvido para o disco Five Bridges, do Nice e New Life, do East of Eden.
Somente o Mr Gaspa para trazer essa informação. desconhecia a mesma, e pior que coloquei as capas dos discos e ficou muito massa mesmo. Existem outras nesse formato?
Que eu saiba, Mairon, os exemplos são poucos e são esses que eu citei. Não sei se deu muito certo nos pontos de venda porque necessita espaço para as capas se alinharem (principalmente nas vitrines). Se alguém por aqui for colecionador da Poeirazine, escrevi um texto sobre a Hipgnosis para o número 14 da revista (a que tem o Who na capa) e lá existem ilustrações dessas capas fazendo o efeito pattern e mandala.
Muito interessante o artigo, não é sem que algum site de música aborda a excepcional obra de Alan Parsons e Eric Woolfson. O único porém é que o Andrew Powell está sim no álbum I Robot, com arranjos, condução da orquestra e do coral, e inclusive a música “Total Eclipse” é de autoria dele. Com relação ao disco Eve, não acho ele fraco. Aliás, na minha visão é um dos melhores. Não é a primeira vez que ouço alguém comentar que o álbum Eve não é bom, lembra muito algumas opiniões sobre discos de outras bandas que os críticos adoram “detonar”, apenas pelo simples motivo de que o rock sempre esteve em constante mudança ao longo das décadas, e muitos grupos acompanharam essas mudanças com trabalhos diferentes do que faziam, e sofreram com críticas a meu ver injustas, como o álbum “Hot Space”, do Queen, ou o “Signals”, do Rush, os dois de 1982, que na minha modesta opinião são dois discos excelentes, trabalhos diferentes e que seguiam as tendências do Pop Rock vigente nos anos 80. Obrigado pelo espaço e sucesso com seu site, grande abraço.