Guns N’ Roses – 21 Anos de Use Your Illusion
Por Davi Pascale
O Guns n´ Roses é tido como uma das bandas mais emblemáticas da década de 80 e uma das mais polêmicas da história do rock. Para alguns, isso pode soar exagero. No entanto, não são poucas as atitudes controversas do seu líder Axl Rose. E também não é pouca a influência que o grupo exerceu na juventude e em futuras bandas de rock ao redor do planeta. Falem o que quiserem, mas a banda fez história e possui credibilidade. Axl pode ser uma pessoa difícil de lidar e, por vezes, arrogante, mas o cara tem talento. Carismático, excelente showman, ótimo compositor, estilo de cantar bem característico. Todas essas qualidades são associadas quando falamos do rapaz. Tudo isso e, claro, suas atitudes malucas, megalomaníacas e, por vezes, inexplicáveis.
Em 17 de Setembro de 1991, 4 anos após o lançamento de Appetite for Destruction, chegava às lojas o álbum Use Your Illusion. Divididos em duas partes: I (capa amarela) e II (capa azul). Ainda me recordo de uma reportagem que assisti na MTV na época de seu lançamento, onde mostrava centenas de pessoas dormindo na frente das lojas de discos, esperando abrir para comprarem em primeira mão seu exemplar. Quando a loja abriu, a fila dava volta no quarteirão. O mais impressionante, contudo, é que o repórter mostrava que 90% das pessoas não se contentavam em comprar apenas um dos discos. A maior parte dos fãs comprava a parte I e a parte II no mesmo dia. E os LP´s eram duplos…
Todo esse fanatismo é algo que não existe mais nos dias de hoje. Assim como essa característica de causar incômodo, sendo amados por uns e odiados por outros (que viria a se repetir na década de 1990 com pelo menos mais 3 artistas – Nirvana, Oasis e Marylin Manson) também parece estar cada vez mais distante de nossa juventude. A geração de hoje acha um crime pagar por música e não consegue respeitar aqueles que possuem uma opinião forte. Portanto, é no mínimo curioso notar que o cantor dessa banda de L.A. ainda consiga encantar a atual geração, mesmo mantendo sua arrogância.
A polêmica já começava na capa dos discos. Idealizada por Mark Kostabi, a imagem (que é a mesma nos dois volumes) nada mais é do que um trecho da obra “Escola de Atenas” do pintor italiano renascentista Raphael. As músicas mais pesadas, em sua maioria, estavam no disco I. As mais trabalhadas e, algumas vezes, mais pop faziam parte do segundo CD. Isso foi proposital e a capa já dava a dica. O volume I utilizava cores quentes – consideradas excitantes – enquanto o volume II utilizava cores frias – consideradas calmantes. Na época, poucos perceberam a indireta da capa e só perceberam isso após a audição. Poucos perceberam também a semelhança com a obra do italiano.
Outra polêmica veio nas composições. No disco Appetite For Destruction todas as músicas foram creditadas como autoria do Guns. Ou seja, o dinheiro arrecadado em direitos autorais era repartido de maneira igualitária entre os integrantes e ninguém sabia quem havia escrito o que. Em Use Your Illusion, fizeram diferente. As canções vieram creditadas. E isso levou a uma infinita discussão. Axl Rose e Slash vinham sendo tratados pela imprensa como os dois pilares do Guns. Algo como Jagger/Richards, guardadas as devidas proporções.
No entanto, ao analisarmos os créditos de composição, notávamos que o principal compositor era o guitarrista Izzy Stradlin. Isso não quer dizer que Slash e Axl não compusessem ou não tivessem a manha. Axl Rose chegou a escrever bastante coisa sozinho, principalmente no disco II. Entre suas contribuições estava a megabalada November Rain. Slash, por outro lado, aparecia em várias composições, mas sempre como co-autor. Tal fato levantou uma discussão que dura até os dias de hoje sobre quem é o melhor guitarrista do Guns. Curiosamente, Izzy não conseguiu mais ter grande popularidade em seus discos solo enquanto Slash voltou à mídia com o Velvet Revolver (depois do relativamente bem sucedido Slash´s Snakepit) e lota suas apresentações como artista solo. Mais uma vez as discussões voltaram com força. Basta entrar em qualquer fórum que fale sobre o Guns e começar a ler os comentários. Curiosamente também, a carreira solo de Slash é mais sólida e mais próxima da sonoridade do Guns do que a de Izzy.
Ainda havia mais uma discussão sobre o fato da banda ter recorrido a antigas demos para montar o material de seu mais novo trabalho. Embora isso seja uma verdade, muitos fãs não ligaram. Nem deveriam… Afinal, qual é o problema? Se as músicas são boas e são suas, o que muda? Aliás, se os grupos fossem levar isso à ferro e fogo, muitos discos não teriam visto a luz do dia.
Em termos de sonoridade, Use Your Illusion era um pouco mais ousado do que o disco que tornou o grupo famoso. Trazem aqui diversas influências, entre elas blues (Bad Obssession), musica clássica (November Rain) e até rap (My World). Como curiosidade, vale lembrar que o disco traz Izzy cantando em 4 músicas, além da gravação final de Steven Adler com a banda (a canção Civil War que havia sido lançada pouco antes na coletânea beneficente Nobody´s Child).
A turnê do álbum é repleta de altos e baixos. Foi aqui que começaram os shows de 3 horas, os atrasos de 3 horas e a ideia do grupo ser uma empresa. Tudo isso assustou os músicos e fez com que Izzy Stradlin abandonasse o barco. O músico declarou para a revista Hard Rock Magazine: “Após a primeira parte da turnê, Axl queria me fazer assinar um contrato que me colocava um pouco de lado. Axl disse para mim: ‘Agora se trata de negócios’. Por que continuar? Fatos antecedentes também me fizeram optar pela saída: durante nosso primeiro show em Londres, jovens morreram. Isso é rock n´roll? Divertir-se e depois ler no jornal de um aeroporto que pessoas morreram no seu show? É divertido tocar em um estádio e começar uma desordem, como em St Louis, porque o cantor teve um ataque?” Fora esses problemas citados, Stradlin estava tentando se livrar das drogas – e acreditava que a vida na estrada dificultava – e também não concordava com Matt Sorum na banda. Achava que seu estilo não combinava com o grupo. Esse show de St Louis trouxe uma experiência até então inédita para os músicos. As apresentações seguintes, que ocorreriam em 13 e 14 de Abril, foram canceladas por conta da emissão de um mandato de prisão do cantor, devido ao tumulto causado na apresentação.
Esses exemplos dados pelo guitarrista foram apenas alguns dos muitos ocorridos. Outro tumulto com o público ocorreu na tour Metallica/Guns em Montreal. James Hetfield havia se machucado durante os efeitos pirotécnicos de “Fade to Black”. Com isso, o Metallica encerrou o show antes da hora. Depois de um atraso, o Guns entrou em cena. Os músicos reclamavam que o som no palco estava muito ruim. Em determinado momento, Axl cismou que havia machucado sua garganta e resolveu encurtar o set do Guns também. Sem ter assistido nenhum dos dois shows completos, os fãs quebraram o local, causando tumulto na rua, inclusive. Chegaram a quebrar janelas, avançar nos carros e até atear fogo. Outro caso conhecido, dessa mesma época, ocorreu aqui em nosso país. Mais precisamente em São Paulo, um dia antes de sua apresentação no Anhembi em 1992. Axl Rose, mais uma vez ele, atirou uma cadeira do seu quarto nos jornalistas que estavam rondando o hotel Maksoud Plaza. Axl já havia dito que não iria ceder entrevistas e não queria ser incomodado. Esse foi o modo que ele encontrou de mandar o recado. Cada vez mais o rapaz queria fazer justiça ao slogan de “banda mais perigosa do mundo”.
Nessa apresentação, Izzy Stradlin não estava mais na banda. O guitarrista Gilby Clarke (ex-Kill For Thrills) foi contratado para substituí-lo e integrar o grupo a partir de então. Pelo menos, essa era ideia. Pelo visto, não iria durar muito. A última gravação da Era Slash foi uma versão que o grupo fez para “Sympathy for the Devil” (Rolling Stones) para a trilha de Entrevista com o Vampiro. A gravação contou com o guitarrista Paul Huge no lugar de Clarke e já falava-se sobre a possibilidade do rapaz integrar a banda, o que não agradava Slash. A partir daí, um a um foi saindo do Guns (cada um por seu motivo) até que sobrou somente Axl. Seus fãs tiveram que aguardar por 17 anos até que o rapaz soltasse um novo disco, o não menos polêmico “Chinese Democrary”. Mas aí já é outra história…
Hoje em dia valorizo muito mais esses dois discos do que há alguns anos. Aprendi a escutá-los de uma maneira mais atenta e sem me ater a comparações com o magnífico "Appetite For Destruction", e ganhei muito com isso. "Use Your Illusion" é, mais que dois álbuns duplos, um projeto belíssimo, ousado, de uma época em que as gravadoras ainda estavam dispostas a investir altas somas em carreiras que ainda necessitavam de afirmação, correndo o risco do prejuízo, mas também de criar entidades tão grandes que praticamente inexistem no rock hoje em dia. Dizem por aí que "Use Your Illusion" seria melhor se fosse um álbum simples. Eu digo que essas pessoas não captaram o conceito do disco e a amplitude de ideias nele contida. "Estranged", "November Rain", "Civil War", "Coma", "Don't Cry", "14 Years", "Locomotive", "Live and Let Die", "Knockin' on Heaven's Door", "Dust n' Bones", "Yesterdays"… somando com minha favorita do grupo, "You Could Be Mine", acredito que a barreira do que se pode registrar em apenas um disco já seria superada. Você disse bem, Davi: em que pese todas as críticas negativas a Axl Rose, tudo ao redor dele e da banda segue gerando assunto em diversos cantos do mundo, para tristeza dos detratores.
Também gosto bastante desses discos. Sempre gostei. Nunca fiquei comparando ele com o Appetite. Fora todas essas que você citou, ainda citaria como destaque "Bad Obsession", "Dead Horses", "Pretty Tied Up" e "Back Off Bitch".
Estes discos mostraram uma grande evolução na banda, pena não ter havido continuidade na formação, bem tocados, compostos e arranjados, pra mim são clássicos…NORA