Eclipse – Bleed & Scream [2012]

Eclipse – Bleed & Scream [2012]

Por Diogo Bizotto

Nos últimos tempos, uma grande quantidade de grupos suecos tem tentado, muitas vezes com sucesso, emular a sonoridade que outros artistas, especialmente norte-americanos e britânicos, fizeram nas décadas de 70 e 80. Mesmo todo o elemento visual é muitas vezes descaradamente chupinhado a fim de oferecer um produto completo, que remete a épocas importantes, por muitos julgadas como as melhores fases para o rock, especialmente o segmento mais pesado, em termos de reconhecimento no mainstream. Não condeno quem tem essa atitude, afinal, muitos músicos competentes têm lançado discos de qualidade tendo tudo isso em mente, vide álbuns recentes de grupos como Crashdïet, H.E.A.T., Crazy Lixx – em se tratando de anos 80 –, The Night Flight Orchestra, Graveyard e Witchcraft – remetendo aos anos 70. No entanto, parece que o ponto de saturação está cada vez mais próximo.

Dito isso, foi com muito prazer que travei conhecimento com o mais recente disco do Eclipse, liderado pelo vocalista, guitarrista, baixista e compositor Erik Martensson. Bleed & Scream é, não apenas um álbum superior aos lançados pelas bandas supracitadas, como é dotado de uma dose mais generosa de identidade própria, tanto musical quanto visual. É inegável que as influências existem, remetendo principalmente ao hard rock e ao heavy metal dos anos 80. Os álbuns 1987 e Slip of the Tongue (ambos do Whitesnake), por exemplo, parecem ter sido consumidos com farinha por Martensson e seu companheiro das seis cordas, Magnus Henriksson. Mesmo assim, as melodias remetem às origens suecas que pariram o melhor grupo pop de todos os tempos – é óbvio que falo do ABBA – e as linhas vocais não são guiadas por um cantor que se preocupa excessivamente em exagerar interjeições em um idioma estrangeiro nem por letras que soam como feitas por alguém com forte ímpeto de ser norte-americano.

Nenhuma dessas características seria de muita valia se o principal elemento para um grande álbum estivesse faltando: boas composições. É nesse aspecto que o Eclipse, mais especificamente Martensson, se destaca de vez em meio aos outros grupos que estão colocando novos discos na praça. Todas as músicas presentes em Bleed & Scream valem a pena. Sem exceção alguma, o quarteto (completo pelo baterista Robban Bäck e pelo tecladista Johan Berlin) apresenta onze canções de qualidade pouco discutível, bem estruturadas, com capacidade de viciar rapidamente e clamando por reproduções em seguida. Pra completar, a produção – executada por Martensson e Henriksson – e a mixagem é não menos que espetacular, afastando de vez a pecha de álbum datado e oferecendo um lustro de modernidade que transborda qualidade.

Robban Bäck, Magnus Henriksson, Erik Martensson e Johan Berlin

A clareza da produção e a quantidade de melodias agradáveis podem trazer um certo ar AOR ao disco, algo ainda mais em mente quando descobrimos que a gravadora responsável pelo lançamento é a italiana Frontiers, mas não se engane: Bleed & Scream é movido a riffs de guitarra, muitas vezes pendendo para o heavy metal, em músicas vitaminadas por timbres que dão conta desse recado, solos cheios de técnica e um baterista que poderia tranquilamente ocupar a vaga de Scott Travis no Judas Priest. “Wake Me Up”, faixa que abre o álbum, tem tudo isso que citei e funciona muito bem como introdução de um disco que é pura intensidade, sem descanso, destacando ainda mais quão competente Henriksson é na execução de linhas virtuosas, mas que soam fáceis de se ouvir, com muita fluidez. Outra pedrada vem na forma da faixa-título, crivada de guitarras cheias, mas passando longe do irritante som grave tão comum às bandas da já enjoativa onda vintage. Mais cavala ainda é a seguinte, “Ain’t Dead Yet”, que traz uma ótima performance de Martensson, cantando em um tom ainda mais alto que o normal, mostrando que é possível soar agudo sem ser maçante, passando longe dos exageros que o heavy metal melódico produziu entre os seguidores de Michael Kiske (Helloween, Unisonic, Avantasia, Place Vendome), esse sim um ótimo vocalista.

Em “Battlegrounds” é possível perceber mais uma provável influência do grupo, tanto em se tratando de composição quanto instrumentalmente: o guitarrista norte-irlandês Gary Moore, em especial na sua fase quase heavy metal nos anos 80, mais especificamente ainda no álbum Wild Frontier (1987), sendo inclusive possível estabelecer uma certa conexão com sua magnífica faixa-título. “A Bitter Taste” inicia de leve, com cara de balada, mas vai se mostrando aos poucos e revela-se uma música de proporções épicas, com guitarras magníficas, até cair em uma sequência absurda de solos de guitarra, brilhando sobre dois bumbos que martelam incessantemente.

Quer uma mostra definitiva de quão clara e bem executada é a produção em Bleed & Scream? Coloque os fones de ouvido, aumente bem o som e ouça a introdução de bateria presente em “Falling Down”. Sem muito esforço é possível perceber o ressoar da esteira da caixa da bateria, além do tremular dos aros de todas as peças. Tudo fica melhor ainda quando as guitarras entram em cena com riffs totalmente cavalos, executados à perfeição. “S.O.S.” é um raro momento de moderado alívio, pois “Take Back the Fear” restabelece o andamento mais furioso de “Falling Down” e deixa evidente como em nenhuma faixa anterior que o som do baixo também está muito bem registrado, encorpado sem soar invasivo, além de ser o momento mais power metal do disco, uma porrada constante e melódica do início ao fim.

Os quatro anos que separam Bleed & Scream do lançamento anterior do Eclipse, Are You Ready to Rock (2008), fazem todo sentido ao ouvir uma música como “The Unspoken Heroes”, que, em pouco mais de três minutos, traz generosas doses de intensidade e pequenos detalhes que fazem a diferença – uma guitarra solo a mais “enfeitando” a canção, por exemplo –, tudo isso ressaltado pela competente produção. Única verdadeira balada do disco, “About to Break” lembra os momentos mais AOR do projeto W.E.T., levado a cabo por Martensson, pelo vocalista Jeff Scott Soto e pelo guitarrista Robert Säll (Work of Art). “After the End of the World”, por sua vez, encerra o álbum trazendo à tona uma veia mais épica, adequada para finalizar um dos discos mais excitantes de 2012, bom do início ao fim e pronto a estabelecer padrões a serem superados, tanto para o próprio grupo quanto para muitos outros artistas que se arriscam a fazer hard rock e buscam reconhecimento.

A conclusão óbvia ao terminar de ouvir Bleed & Scream é que certamente trata-se de uma das melhores surpresas reservadas por 2012 e que Erik Martensson é um dos compositores mais competentes do hard rock atual. Não à toa, seus préstimos são exigidos por diversos artistas, que têm a felicidade de contar com o talento do sueco em seus recentes lançamentos. Mais do que isso, o Eclipse não segue as recentes tendências retrô, mostrando que é possível apresentar um trabalho como esse sem que seus membros pareçam com lenhadores ou caipiras norte-americanos nem com bonecas regadas a laquê e cobertas por pesada maquiagem. Na minha lista de melhores do ano é uma certeza irrevogável!

Track list:

  1. Wake Me Up
  2. Bleed & Scream
  3. Ain’t Dead Yet
  4. Battlegrounds
  5. A Bitter Taste
  6. Falling Down
  7. S.O.S.
  8. Take Back the Fear
  9. Unspoken Heroes
  10. About to Break
  11. After the End of the World

2 comentários sobre “Eclipse – Bleed & Scream [2012]

  1. Cara, eu estou é perplexo de não estar vendo esse disco nas listas que estão sendo publicadas por aí, enquanto outros de qualidade bem mais duvidosa são citados a todo momento. Claro, cada um tem seus critérios, mas não deixo de ficar surpreso quando vejo, pra ficar no hard rock, o disco mais recente do Slash, que achei mediano (e certamente não tão bom quanto o anterior) em uma penca de listagens, enquanto o Eclipse tem passado longe.

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