Iron Maiden – The Book of Souls [2015]
Por Fernando Bueno
Não lembro de ter alimentado expectativa tão grande para um disco do Iron Maiden como esse último. Talvez pelo fato de os músicos terem dito em alguma entrevista há algum tempo que a carreira da banda teria no máximo quinze álbuns e a marca ter ter sido atingida com The Final Frontier ou se o fato da doença de Bruce, anunciada no início do ano, ter pego todo mundo de surpresa. Mas a grande expectativa não era um privilégio meu e o que podemos tirar de tudo isso é que é notável o quanto o Iron Maiden é relevante para a cena metálica mundo afora. Basta ver o burburinho logo após poucas horas que o disco vazou na internet ainda na sexta feira passada (28/08/2015).
Outro destaque se dá ao quanto conseguiram segurar o vazamento do álbum e o fato disso ter acontecido me parece até proposital. Afinal o teaser de 27 segundo de “Speed of Light” e posteriomente seu divertido clipe foram lançados exatamente conforme o planejado, assim desconfio que esse vazamento pode ter sido uma forma de propaganda para o álbum que começará a ser vendido na data de hoje, 04 de setembro de 2015, conforme agendado há bastante tempo. Ainda mais depois daquela notícia que veiculou que os ingleses utilizam dados de downloads ilegais para programarem suas turnês.
Uma melodia, que acredito ser de origem maia, inca ou asteca por conta da temática do álbum, inicia o disco acompanhada da voz de Bruce em “If Eternity Should Fails”. Quando a música entra pra valer alguma coisa de Brave New World me vem à cabeça. A melodia de guitarra ao fundo das estrofes é um detalhe que pode até parecer imperceptível, porém faz toda a diferença. Segundo informações Bruce tinha composto essa música para um álbum solo. “Speed of Light” já era conhecida há alguns dias e é uma daquelas músicas que empolgam e fará muito sucesso nas apresentações ao vivo. O trabalho das três guitarras é fantástico com riffs e frases que remetem aos anos 80, principalmente em seu solo.
“The Great Unknow” poderia estar muito bem em A Matter Of Life And Death e, juntamente de ‘The Red and the Black”, é uma faixa típica do que ele vêem fazendo em alguns dos melhores momentos da carreira da banda pós 1999. Interessante como foram colocados os backing vocals em “When the Rivers Run Deep” já que não é tão normal eles serem tão destacados assim em músicas do Maiden.
Na faixa título há uma orquestração bastante sutil e interessante ao fundo. As levadas de pratos lembram “Mother Russia” – um clássico esquecido – do álbum No Prayer for the Dying (1990). Acredito que seja o melhor trabalho vocal do álbum, principalmente no refrão. Da metade para o fim o andamento se modifica com elementos que poderiam estar em Powerslave.
Muito se fala do problema de relacionamento entre os componentes da banda, mas acredito que isso possa ter no mínimo melhorado, basta ver o quanto são variadas as parcerias das composições. Há apenas uma faixa composta só pelo chefe Steve Harris e duas por Dickinson. Depois disso temos Harris com Janick Gers, Harris com Adrian Smith, Harris com Dave Murray e Smith com Dickinson. Por outro lado não há nenhuma em que Harris e Dickinson trabalharam em conjunto. Algumas delas foram se desenvolvendo quando já estavam todos em estúdio, segundo diz Harris. Na produção o já habitual Kevin Shirley. Tenho a curiosidade de ter um Rick Rubin produzindo um disco do Iron Maiden.
Se “Speed of Light” remete aos anos 80, “Death Or Glory” vai ainda mais longe. Ouço muita coisa da NWOBHM e acredito que esta seja a que mais se encaixaria naquela época. Na alternância dos solos um deles utiliza um efeito que nunca tinha ouvido em um álbum do Iron Maiden. “Shadow of The Valley” é uma das melhores com um daqueles riffs que todos vão querer tocar na guitarra. A semelhança com a abertura de “Waterd Years” é até compreensível, mas eu encontrei a melodia de “Painkiller” também. Bater no Iron Maiden por supostamente se repetir me parece ser bastante cool, já que o que é usado como demérito para a trupe de Harris inverte-se quando se fala de grupos como o Motorhead ou o AC/DC. Os que criticam esquecem-se que isso é natural para bandas que criaram um estilo próprio.
Uma homenagem ao ator Robin Williams foi incluída em “Tears of a Clowns”. Sei disso por ter sido divulgado de antemão. A parte lírica ainda não consegui prestar atenção por não ter tido oportunidade ainda de estar com alguns dos formatos físicos que foram lançados em mãos e assim poder ler os encartes. Falando sobre os formatos físicos muitas resenhas destacam este ser o primeiro álbum duplo do Iron Maiden. Isso depende muito já que em 1992 foi lançado Fear of the Dark em vinil duplo. Como o formato padrão da época ainda era o vinil podemos considerar que este foi o primeiro álbum duplo. Depois disso, quando o CD passou a ser o formato padrão, todos os álbuns ainda foram lançados em vinil duplo. The Book of Souls é o primeiro CD duplo para um álbum e primeiro LP triplo, feito que já foi atingido por artistas do quilate de The Band, Bruce Springsteen e outros.
A utilização de um piano como nunca havia acontecido acontece na música mais longa da história da banda. Aliás, não só o piano se destaca nessa faixa, mas também a orquestração ainda mais evidente quanto em “Paschandale”, de Dance of Death (2003). Composta apenas por Bruce, poderia aparecer num disco solo do cantor já que ele é o destaque quase que sozinho durante boa parte do início da música. Enquanto guitarra e baixo aparecem bem discretamente como um fundo para o piano e o violoncelo na bateria uma levada marcial de Nicko McBrain. Só depois de cerca de sete minutos que entra uma guitarra com um riff com a assinatura inconfundível de Iron Maiden. Eu fiquei positivamente surpreso com a faixa já que quando fiquei sabendo de sua duração antes de ouvir fiquei com a pulga atrás da orelha. Porém a considero uma nova “Close To The Edge” no sentido de ser uma faixa de 18 minutos que parece muito mais curta do que é. Ainda preciso de várias audições para conhecer todas as nuances e passagens como tenho da faixa clássica do Yes, mas certamente em pouco tempo já terei essa condição. Aliás o álbum todo com seus 90 minutos são bastante fáceis de ouvir contrariando um temor que tive quando se divulgou o track list.
Por fim gostaria de comentar sobre a arte gráfica do disco. De início achei muito simples aquele Eddie étnico sobre apenas um fundo negro. Pensei até que poderia ser a arte de um single ou promo. Estranhei ainda mais quando o single (ou promo, ainda não está claro) de “Speed of Light” ficou exatamente com a mesma capa, porém com um Eddie desbotado sem as cores do álbum. O Iron Maiden sempre trabalhou muito bem a imagem de seu mascote e usou com maestria centenas de imagens que ficaram no imaginário dos fãs, assim achei pobre essa repetição. Porém depois de algum tempo fui me acostumando com a imagem do álbum e concluir que apesar de simples ela pode abrir um leque enorme de oportunidades de idéias que podem ser utilizadas em materiais promocionais diversos. Algumas delas foram aparecendo ao longo dos dias e imagino que estarão no encarte. Sobre o single ainda fiquei decepcionado não só pela capa, mas também pela falta de algum material extra como era tradição nos anos 80. Aliás, já tem muito tempo que eles não vão à estúdio gravar um cover ou uma faixa especial para esse tipo de material. Acredito que não tenham mais tempo para isso.
The Book of Souls é UM PUTA DE UM DISCO e espero que não seja o último.
Track List
Disco 1
01. If Eternity Should Fail (Dickinson 8:28)
02. Speed Of Light (Smith/ Dickinson 5:01)
03. The Great Unknown (Smith/ Harris 6:37)
04. The Red And The Black (Harris 13:33)
05. When The River Runs Deep (Smith/ Harris 5:52)
06. The Book Of Souls (Gers/ Harris 10:27)
Disco 2
01. Death Or Glory (Smith/ Dickinson 5:13)
02. Shadows Of The Valley (Gers/ Harris 7:32)
03. Tears Of A Clown (Smith/ Harris 4:59)
04. The Man Of Sorrows (Murray/ Harris 6:28)
05. Empire Of The Clouds (Dickinson 18:01)
Parabéns pela resenha, análise com conteúdo e contexto bem engajado. Up the Irons!!!!
Obrigado pelo elogio Andreo
texto muito bem escrito. Tive mais ou menos a mesma impressão sobre o álbum. Up the Irons.
Obrigado Marckus
Parece ser uma regra: todo mundo é cego em relação a quem ama. Um filho feio é lindo para os pais. Uma esposa sem encantos é no mínimo graciosa para um marido apaixonado. Mas como toda regra tem exceção, não podemos levianamente acusar o Fernando Bueno de ser cego em relação a esse disco do Iron Maiden. Apenas surdo. De toda forma, que bela declaração de amor você escreveu, Fernandinho.
Marco.
Fui totalmente imparcial…
Claro.
Quem gostou do álbum é surdo? A opinião sensata é a sua? Parabéns camarada, viva a internet…
Viva!
Sobre a questão das repetições próprias: é justamente por esse motivo que AC/DC e Motörhead nunca foram prioridade em minhas audições.
Mas eu não me incomodo do Iron Maiden manter seu estilo sempre, até porque não se manteve vide as influências do rock progressivo nos últimos álbuns. O tipo de repetição que me incomoda no caso desse disco do Iron Maiden é ficar rodando e rodando nos mesmos riffs e no mesmo lugar ou ficar naqueles longos solos que se estendem demais quando poderia encerrar a canção sem cansar ali pelos 5 minutos. Diferente das duas outras bandas citadas, o Iron nunca regravou os mesmos discos. Mas repete algo que a própria criatividade da banda fez para esse álbum durante muito mais minutos do que o necessário.
Nesse ponto concordo com você André, algumas repetições de passagens instrumentais poderia sim ter sido reduzidas. Apesar dos pesares, gostei da produção relação aos anteriores, e no final das contas gostei do álbum. Nada que vá mudar o mundo, mas digno de Iron Maiden. Todos têm o pleno direito de não gostar, apenas não gosto quando se menospreza a opinião alheia. Abraço
“poderiam ter sido reduzidas…”
Não costumo menosprezar a opinião de ninguém, mas tento ser assertivo o que para muitos pode soar ofensivo quando a paixão por uma banda é forte demais por parte de alguns. Mas eu mesmo não levo minhas próprias opiniões ao pé da letra porque não é raro eu mudá-las após um bom tempo. Como eu havia dito no test-drive é um bom disco, um pouco melhor que o Final Frontier que também é um bom disco. Só não entrei no hype de muitos que eu andei lendo por aí dizendo que é algo maravilhoso.
E eu nunca critico resenhadores apaixonados por uma banda. Pelo simples fato de que eu sou surdo com o Nightwish também. Não vejo como algo negativo quando a pessoa tem isso em mente e assume, o ruim é quando não assume e depois sai batendo boca na internet. Independente disso, prefiro que o Iron Maiden e bandas velhas continuem lançando discos que sejam bons mesmo não estando à altura dos clássicos do que fiquem tocando velhas canções há duas décadas.
Abraços Andreo, não sei se já conhecia o nosso site, mas nós praticamente temos ainda umas cinco centenas de matérias que não estão disponíveis no site que perdemos na queda do servidor, mas que esperamos recuperar o mais breve possível.
Entendi seu ponto André, está correto. Eu observo que muitos fãs se deixam levar pela paixão, e outros entretanto, criticam somente por criticar… Conheço o site há algum tempo, frequentemente estou por aqui dando uma conferida. Abraço.
André Kaminski e um comentário simplesmente PERFEITO!
Nada a ver comparar “Empire Of The Clouds” com “Close to the Edge”. Já eu comparo essa longa música do Iron com “The Ancient – Giants Under the Sun” ou qualquer outra música longa de qualquer banda prog dos anos 70.
Tenho uma sugestão para o site: para o próximo sábado dia 12, sugiro uma matéria sobre os 40 anos de “Wish You Were Here” o disco que eu mais venero do Pink Floyd (ao lado de “The Wall”) e um dos mais marcantes da minha vida.
Parabéns pelo texto, Fernando. Sabia de antemão que sua opinião seria completamente diferente da dos consultores que participaram do test drive (eu incluso). Apenas complementando o que disse naquele post, pois mudei de ideia e não vou fazer resenha: ouvi o disco pelo menos 5 vezes e mantenho a opinião: o disco não é ruim, mas carece de momentos marcantes, um disco morno e que pouco me empolgou (apenas para não deixar a encheção de saco de alguns passar batido).
Ademais parabenizo novamente o colega Fernando pelo texto mais uma vez.
Obrigado Alisson!!!
Parabens pela resenha, o disco vem ganhando cada vez mais atenção e a mesma vai um pouco de encontro ao que estamos discutindo nas primeiras impressões da bolacha lá no MinutoHM (aliás acabei de comentar apontando para aqui).
http://minutohm.com/2015/08/29/the-book-of-souls-primeiras-impressoes/
E sobre a ultima, já há um post, desvendando a letra, eu recomendo.
http://minutohm.com/2015/09/01/desvendando-empire-of-the-clouds/
Abraços
Flavio
Muito obrigado pela menção Flavio. Li também a matéria sobre Empire of Clouds e achei fantástica.
Achei muito bom este disco !
Aqui, preciso perguntar algo, só eu no mundo que gostou de Final Frontier?
Não caio, tamo junto nessa 🙂
Eu gostei e não gostei desse disco.
Concordo com grande parte, creio que em relação a arte da capa do disco e do single, acho que ficou dessa forma por acharem uma coisa mais assustadora o Eddie clean bem desenhado, é só lembrar da dura lição da capa de DOD que era para ser do o Eddie ai fizeram aquela salada, que ficou horrível, mais é isso.
Bah, quando é que o Maiden vai voltar a fazer um disco mais direto? Músicas muito longas, com passagens requentadas de outros discos onde os caras tem que achar espaço pros solos dos 3 guitarristas. Dá a impressão que o Bruce pode sair, dar uma cochilada e voltar pra terminar a música. Que é isso! Um disco previsível de uma banda que perdeu a inspiração.