Discografias Comentadas: Crowbar [Parte 2]
Nesta segunda parte da discografia comentada, temos mais mudanças de formação e, talvez, o período com os registros mais irregulares já lançados, compensado com o que considero o melhor e mais poderoso disco registrado por Kirk.
Para me ajudar a comentar esse período, delego parte da função ao amigo Bruno Marise, que dispôs seu tempo para comentar o que ele julga seu disco favorito da banda. Para saber como foi essa período, nos acompanhe no texto abaixo, sempre ouvindo os discos do grupo com som no talo.
Equilibrium [2000]
Para a gravação de Equilibrium, Sid Montz acabou substituindo Jimmy Bower no posto de baterista. Provavelmente pelo fato de o Eyehategod estar se preparando, no mesmo período, para as gravações de Confederacy of the Ruined Lives, lançado naquele mesmo ano. Para alguns, é um disco “mais do mesmo” satisfatório. Para mim, o disco já não funciona direito desde a capa, uma montagem estranha que ficou a cargo de John Buttino. Realmente é um disco que apresenta basicamente as mesmas estruturas que funcionaram bem em discos anteriores. Porém, apesar da execução precisa, tudo parece morno demais, sem pegada e inspiração, algo que sobrou nos discos anteriores. Para não dizer que o disco é decepcionante, ele possui algumas músicas que, como diriam alguns, servem para “tirar uma pira”, como “Things You Don’t Understand”, com riffs simples e com aquele ritmo grooveado que só o Crowbar consegue fazer habilmente. “Uncovering”, por sua vez, traz uma simplicidade estrutural refrescante. Para fechar o pacote: encerrando o disco há o cover de “Dream Weaver“, hit nas mãos de Gary Wright (Spooky Tooth, George Harrision). Inesperado talvez seja a melhor palavra que defina esse cover. Se ela é boa? Ouça e tire suas conclusões. Neste caso, me omito de dizer qualquer coisa.
Sonic Excess In Its Purest Form [2001]
Maravilhoso, cavalar e melhor disco do Crowbar. Novamente, ocorreram mudanças de formação neste curto período de tempo. Todd Strange, figura carimbada em pelo menos 70% dos discos de metal gravados em Nova Orleans durante os anos 90, deu lugar à Jeff Okoneski, que não participou de nada muito relevante para ser mencionado aqui. No posto de baterista, sai Sid Montz e entra Tony Constanza, que chegou a gravar a primeira demo do Machine Head, em 1993. Talvez o único motivo que me faça considerar Sonic Excess como o melhor disco da banda seja o fator “coesão”. Nada mudou. As estruturas são as mesmas, os timbres de guitarras são os mesmos e aquele peso absurdo das músicas continuam ali, intactos. Porém, cada música esbanja inspiração e simpatia por serem as músicas mais melodicamente bem feitas de toda a trajetória musical de Kirk. O disco começa extremamente convidativo com “The Lasting Dose”, com um belo trabalho de guitarras, letras confessionais e uma emoção pungente na interpretação vocal de Kirk. Logo na sequência, a melhor música do disco todo, “To Build A Mountain”, com uma cozinha destruidora e letras que são uma espécie de auto-ajuda para a vida. “Awakening” sobressai-se com um ótimo ritmo groove quebrado e refrão pegajosos — por mais estranho que possa parecer –. Para fechar os destaques, “It Pour For Me” traz o doom e melodias para o primeiro plano para uma das mais monumentais composições do disco todo. Como citei anteriormente, este é o trabalho mais coeso e bem construído, e o que considero uma excelente porta de entrada para quem ainda não conhece a banda.
Lifesblood for the Downtrodden [2005]
Mais um disco, mais alterações na formação da banda. Temos a volta de Craig Nunenmacher, que havia saído da banda após a gravação de Time Heals Nothing [1995] para integrar o período de auge do Black Label Society, entre 2000 e 2010. Rex Brown, ex-baixista do Pantera, comanda as quatro cordas aqui, enquanto Steve Gibb, filho de Barry Gibb e técnico de guitarra do próprio Bee Gees, assume as seis cordas. A produção deste registro também fica por conta de Rex Brown, e é um dos pontos que se destacam na audição de Lifesblood for the Downtrodden. Áspera, com timbres de guitarra mais rústicos e saturados e som de baixo seco. A bateria, apesar de alta e até saltar à frente dos outros instrumentos, é mal mixada ao meu ver, principalmente o som de caixa. Raramente uma produção me tira da audição de um disco, mas estranhamente isso ocorre aqui. Todavia, o disco é bem servido de boas canções, algumas que viriam a se converter em clássicos. Para começar, “New Dawn” é cadenciada, com bateria tribal, ótimos riffs e vocais potentes. “Angels Wings” é curta e explosiva com refrão arrasador, enquanto “Fall Back to Zero”, uma das mais lembradas em apresentações ao vivo, volta para o campo das músicas lodentas, com melodias obscuras e ritmo arrastado. Um registro com boas canções, mas que acaba entrando para a ala dos pouco memoráveis. Não chega a ser um deslize, mas fica um pouco abaixo do esperado.
Sever the Wicked Hand [2011]
Após o lançamento de Lifesblood For the Downtrodden, Kirk entrou em hiato com o Crowbar e decidiu focar-se em projetos paralelos. Foi um momento frutífero de sua carreira, onde nos brindou com alguns lançamentos muito interessantes, dentre eles: o terceiro disco do Down, III: Over the Under, de 2007 e os dois discos do Kingdom of Sorrow, projeto de sludge/metalcore com Jamey Jasta, vocalista do Hatebreed. À saber: Kingdom of Sorrow, de 2008, e Behind the Blackest Tears, de 2010.
Fato é que Kirk só retornaria com um disco de inéditas do Crowbar em 2011, e com uma banda completamente reformulada. Matthew Brunson, que não integrou nada tão relevante anteriormente, assumiu as guitarras. Patrick Bruders, baixista do Goathwhore e que viria futuramente a integrar o Down, assume as quatro cordas, enquanto Tommy Buckley, do Soilent Green, assume as baquetas. De forma geral, pode-se dizer que o tempo fez bem à banda. Temos a impressão que as ideias foram melhor trabalhadas, as composições foram melhor lapidadas e os riffs são os mais inspirados desde o Sonic Excess. Aquele clima extremamente áspero e de melodias de certa forma modorrentas deu mais espaço para melodias mais “para cima”. É como se o disco, apesar de falar de assuntos pesados, desse uma espécie de alento ao ouvinte na forma de melodias mais refrescantes. É uma impressão meio doida, mas é facilmente notado durante o transcorrer da audição. Instrumentalmente a banda está impecável. O disco demonstra fluidez e precisão nas execuções. Não por acaso esta formação ainda se mantém parcialmente inalterada até os dias atuais. Diferente dos discos anteriores, prefiro não citar destaques para este. É um disco impecável em todos os aspectos, tanto melódicos, em se tratando de execução e até na produção, bem dosada e mixada. Ouça o disco na íntegra e aprecie um dos melhores trabalhos que Kirk já registrou em sua carreira.
Symmetry in Black [2014] – Por Bruno Marise
Conheci o Crowbar de trás pra frente, através desse disco. Já tinha escutado uma coisa ou outra, mas nada que me chamasse a atenção. Symmetry in Black me pegou logo de cara. Os anos de estrada com o Down fizeram bem à voz de Kirk Windstein, e o próprio afirmou que, além de aprender a cantar melhor, também se aperfeiçoou como compositor, graças à parceria com Phil Anselmo. Por se tratar de um disco quase comemorativo dos 25 anos de carreira da banda, o tracklist passeia por tudo que o Crowbar já fez. Reproduzindo com muita competência e maturidade a mistura de doom, sludge, hardcore, melancolia, interlúdios melódicos e a impressionante capacidade de Kirk de soltar uma cacetada de riffs esmagadores, um atrás do outro. Praticamente uma coletânea involuntária, com produção caprichada, e uma banda de apoio excelente. É uma boa porta de entrada para essa verdadeira instituição do cenário NOLA.
Nota adicional: Para Symmetry in Black, Patrick Bruders deu lugar para Jeff Golden, que veio de uma banda stoner chamada My Undle the Wolf. Essa formação é a que se mantém até os dias atuais, realizando excursões mundo afora.
Material Adicional:
Live +1 [1994]
EP registrado ao vivo durante uma apresentação no New Orleans Music Hall, é o melhor registro para conferir o poderio de fogo que o grupo possui ao vivo. A execução das faixas é precisa e não devem em absolutamente nada às versões originais. A intensidade de faixas como “Self Inflicted” e “Numb Sensitive”apenas ganharam um toque de espontaneidade neste pequeno disco, um item que definitivamente não deve ser relegado caso sua intensão seja conhecer a força de Kirk e cia. em cima dos palcos.
Nunca gostei de DOWN, mas vou dar mais uma chance ao Crowbar.