Cinco Discos Para Conhecer: Rolando Castello Júnior
Por Mairon Machado
Quando falamos em grandes bateristas da história do rock, nomes como John Bonham, Keith Moon, Carl Palmer, Bill Bruford e Neil Peart são sempre lembrados. No Brasil, sem dúvidas o mais importante nome desse instrumento é Rolando Castello Júnior. Com mais de 40 anos de carreira, Júnior fez parte de grandes grupos do rock brasileiro e também da América Latina, sendo inclusive fundador da Patrulha do Espaço, a qual acompanhou Arnaldo Baptista pós saída dos Mutantes.
Nesse Cinco Discos Para Conhecer, trago algumas das principais obras de uma discografia vasta, magnífica e fundamental para quem quer conhecer um dos bateristas mais criativos e geniais do rock nacional, que superou um problema de saúde (poliomelite) para criar uma forma de tocar única e inconfundível, identificado logo nas primeiras batidas. Algo pouco comum no mundo das baquetas.
Made in Brazil – Made in Brazil [1974]
O famoso “Disco da Banana” é um dos mais conceituados álbuns do rock nacional. Rock ‘n’ roll direto, sem frescura, comandado pelos riffs de Celso Vecchione e o vocal rasgado do louquete Cornelius Lucifer. Adicionando tempero a esse preparo tipicamente nacional, a pegada indistinguível de Júnior. Basta ouvir “Anjo da Guarda” para ali reconhecermos todas as principais características de suas batidas, seja nas viradas com os tons, na sequência de batidas nos pratos ou apenas na marcação precisa do bumbo e da caixa. Algo que também aparece claramente em “Menina, Pare de Gritar”, “Você Já Foi Vacinado” e “Vamos Todos à Festa”. Outras faixas que Júnior chama a atenção são a viajante “Doce”, o suingue e malemolência de “Intupitou o Trânsito” e o bluesaço “Tudo Bem, Tudo Bom”. E cara, o que eles fizeram na versão de “Aquarela do Brasil”, outra que Júnior desfila todas as suas armas, é de tirar o chapéu e comê-lo sem nenhuma pitada de sal, acompanhado apenas de uma bela caneca de chopp. Sensacional! É a nata do rock nacional entregue ao ouvinte para deleite sem fim, e uma das obras essenciais que o Brasil produziu como arte.
Cornelius Lucifer (vocais), Oswaldo Vecchione (baixo e vocais), Celso “Kim” Vecchione (guitarra solo, violão de 6 e 12 cordas, vocais), Rolando Castello Jr. (bateria e percussão), Ricardo Fenilli (percussão, efeitos e vocal de fundo), Onisvaldo Scavazzinni (teclados, piano e órgão).
Participações
Tony Babalu – guitarra.
Bolão – saxofone e flauta.
Daniel Salinas – arranjos
- Anjo da Guarda
- A Mina
- Doce
- Aquarela do Brasil
- Intupitou o Trânsito
- Você Já Foi Vacinado
- Tudo Bem, Tudo Bom
- Vamos Todos à Festa
- Menina Pare de Gritar
- Uma Longa Caminhada
Aeroblus – Aeroblus [1977]
Este álbum abriu o mercado latino americano em definitivo para o rock pesado. É a união da pesada mão de Júnior com a pegada portenha de Medina e a técnica inqualificável de Pappo nas seis cordas. Um dos primeiros power trios da América Latina a conquistar um lugar ao sol, e cm pancadas foderosas, chamadas “Aire En Movimiento”, “Buen Tiempo” e “Completamente Nervioso”. Aeroblus deixou registrado também lindas baladas (“Nada Estoy Sabiendo” e “Vendríamos a Buscar”). Júnior dá um show a parte nas canções instrumentais “Árboles Difusores” e “Sofisticuatro”, a primeira com uma introdução matadora, e a segunda, uma complexa peça na qual a bateria é a locomotiva desvairada que conduz o solo hipnótico da guitarra de Pappo. Abrindo os trabalhos, o clássico “Vamos a Buscar La Luz”, com seu final estardaçalhante. Apenas 30 minutos de um hardão setentista que vai virar sua cabeça 180°.
Pappo (vocais e guitarra), Alejandro Medina (baixo e vocais), Rolando Castello Júnior (bateria)
- Vamos a Buscar La Luz
- Completamente Nervioso
- Tema Solisimo
- Árboles Difusores
- Vendríamos a Buscar
- Aire en Movimiento
- Vine Cruzando el Mar
- Nada Estoy Sabiendo
- Sofisticuatro
- Buen Tiempo
Arnaldo Baptista & Patrulha do Espaço – Faremos Uma Noitada Excelente … [1988]
Depois de abandonar os Mutantes em 1973, Arnaldo Baptista criou o grupo Space Patrol, junto do igualmente genial baterista Zé Brasil (Apokalypsis). A formação durou pouco, e Arnaldo seguiu sozinho, para gravar Lóki!. No ano seguinte, formou a Patrulha do Espaço, tendo como principal alicerce a poderosa bateria de Júnior, apresentado a Arnaldo por Zé Brasil. O grupo fez alguns shows, entre 1976 e 1979, e um deles foi registrado no dia 13 de maio de 1978, no famoso Teatro São Pedro de São Paulo, aqui nesse álbum, resgatado pelo selo Baratos Afins em 1988. É uma participação diabólica de Júnior. Ao vivo o homem demole. Basta ouvir a insanidade gerada no longo solo de “Cowboy”, com uma série embasbacante de rufadas, além da condução potente e arrasadora. Júnior também conduz com primazia a viajante “Emergindo da Ciência”, espanca os tons e pratos no pesado blues “Um Pouco Assustador”, e dá um show de viradas e condução em “Hoje de Manhã Eu Acordei”. Ainda por cima, Arnaldo vivia momentos de pura inspiração, o que torna as canções ainda mais atraentes. A qualidade e gravação não é das melhores, mas o conteúdo do álbum é excelente, além de ser um dos raros registros ao vivo de Rolando nos anos 70.
Arnaldo Baptista (piano, vocais), Eduardo Chermont (guitarra, vocais), Osvaldo Gennari (baixo, vocais), Rolando Castello Júnior (bateria)
John Flavin (guitarra, vocais – Faixas 2 e 4)
- Emergindo da Ciência
- Um Pouco Assustador
- Arnaldo Solizta
- I Feel in Love One Day
- Cowboy
- Hoje de Manhã Eu Acordei
Patrulha do Espaço – Patrulha [1982]
Encerrada a temporada ao lado de Arnaldo Baptista, Júnior adquiriu a independência e levou a Patrulha para a estrada. O álbum de estreia, conhecido como “Disco Preto”, é o primeiro álbum independente do rock brasileiro, e era distribuído aos fãs pelos Correios. Mas é seu terceiro disco que faz da Patrulha a maior banda do heavy rock nacional do início dos anos 80. Aqui temos um Rolando soltando a mão, pesadíssimo como nunca antes. A pancada “Meus 26 Anos”, a introdução de “Bomba” e o ritmo desconcertante de “Mar Metálico” são exemplos da potência que é o braço do homem. Júnior novamente também manda bem no blues (“Jeito Agressivo”). Além disso, temos “Columbia”, o maior hino da Patrulha, e um dos principais da cena pesada de nosso país, tanto que a Roadie Crew a elegeu como um dos 200 maiores hinos do heavy rock mundial (uma das raras canções cantadas em português, presentes nessa lista), com o acompanhamento marcante da bateria de Júnior, e os sintetizadores que devem ter delirado com os roqueiros setentistas no início dos anos 80. Dudu e Sergio também eram excelentes músicos. O sucesso foi tamanho que o próprio Eddie Van Halen se rendeu ao trio, e exigiu que eles fossem a banda de abertura dos shows do Van Halen em São Paulo. Meia hora de audição fundamental em qualquer casa que tenha o rock pesado como audição central.
Dudu Chermont (guitarras, cordas e voz), Sergio Santana (baixo, vocais), Rolando Castello Júnior (bateria, percussão e vocais)
- Columbia
- Bomba
- Jeito Agressivo
- Festa Do Rock
- Mar Metalico
- Cão Vadio
- Transcendental
- Meus 26 Anos
Quantum – Quantum [1983]
Ao lado de Bacamarte, Quintal de Clorofila e Recordando o Vale das Maçãs, entre outros, o Quantum é mais uma das gigantes bandas brasileiras formada no início dos anos 80 e que não teve o reconhecimento que merecia. Durou apenas dois anos. Seu único álbum, lançado em 1983, era o contra-ponto do que o BRock fazia naquela época, e um verdadeiro achado para quem aprecia um rock progressivo raiz. Totalmente instrumental, Quantum é uma aula de técnica, maestria e competência dos músicos “Gringo” Rosset, “Dinho” Jr. e Fernando Costa (ver formação abaixo). Teclados viajantes, inspirações que vão de Yes e Mahavishnu Orchestra a Brand X e Weather Report, temos aqui um perfeito exemplar de como unir exímios músicos sem soar pomposo. Júnior participa de apenas uma canção, a longa suíte “Inter Vivos”, que apresenta aos fãs do batera sua inacreditável capacidade de tocar com precisão também no rock progressivo, com muita intrincação, quebradas e as suas tradicionais viradas, duelando com o veloz teclado de Fernando e a enfurecida guitarra de “Gringo”. Uma obscuridade para investigadores de “Arquivo-X” estudarem, e apaixonados pelo rock progressivo entenderem que o estilo ainda respirava no Brasil nos anos 80.
Marcos “Gringo” Rosset (guitarra, violão, baixo na Faixa 4), Reynaldo “Dinho” Rana Jr. (guitarra e violão de 12 cordas), Paulo Eduardo Naddeo (bateria e percussão), Fernando Costa (teclados, guitarra na Faixa 2) e Segis Rodrigues (baixo)
Participação Especial
Rolando Castello Júnior (bateria, Faixa 4)
- Tema Etéreo
- Chuva
- Acapulco
- Inter Vivos
- Sonata
- Quantum
Ótima seleção! o cara é uma fera mesmo e não sei se vc sabe, Mairon, mas ele tem uma deficiência em uma das mãos (acho que em decorrência de uma paralisia infantil)…sensacional como ele faz tudo isso na bateria mesmo com essa limitação. Um cara muito gente boa (já tive oportunidade de conhecê-lo e encontrá-lo algumas vezes), que valoriza o passado e o presente igualmente. Não sabia que ele tinha tocado em uma faixa do Quantum.
Beleza de texto…abraço!
Valeu Ronaldo. Sei sim, inclusive citei no início do texto ” que superou um problema de saúde (poliomelite) para criar uma forma de tocar única e inconfundível”. Essa faixa do Quantum é espetacular. Aliás, esse DISCO é ESPETACULAR.
Abraços
Tres álbuns fundamentais do músico aparecem aqui, sendo um deles o ápice do músico, o melhor trabalho de bateria foi registrado mais precisamente em 1977.
Show Diego. Além do Aeroblus, quais os outros dois que você cita como fundamentais?
Bela lembrança, o Rolando merece.
Mas Mairon, o Quantum nessa lista é um exagero sem limite. Independente da qualidade do disco, o texto deveria ser sobre os 5 discos pra conhecer o Rolando e você me indica um disco em que ele participa de UMA (!!!) faixa?
Muito mais justo teria sido a entrada do único disco lançado pelo Inox, onde ele toca no disco todo…
Mas essa faixa ocupa quase metade de um lado do disco, e é A FAIXA. Merece sim, dá uma chance Diego …
Muito legal, Mairon. Só um toque. O Quantum chegou a lançar mais um disco, nos anos 90 (acho que 1994) com o Paulo Zinner na bateria. Chama Quantum II. Esse não é o único disco deles, não.
Valeu Davi. Esse segundo disco do Quantum eu tinha dado uma pesquisada, e aparecia como não oficial. Mas se você está dizendo, blz
Então, Mairon. Tenho algumas musicas desse segundo disco em uma coletânea chamada Tales of Brazilian Progressive Rock. Quando levei meus discos para o Paulo Zinner assinar (Fickle Pickle, Golpe de Estado, etc), ele perguntou: “Você gosta de progressivo? Eu gravei um CD com uma banda chamada Quantum, que tinha umas quebradas nervosas”. Disse que conhecia a banda, que tinha um LP que não levei porque não era com ele, mas que tinha algumas musicas desse disco naquele CD e mostrei o encarte para ele. E ele me disse: “É isso mesmo, então, existe o CD”. Perguntei: Mas saiu? Porque nunca encontrei esse disco. E ele me afirmou que sim, que foi lançado. Então deve existir. Deve ter saído independente, mas deve ter saído.
O Quantum II saiu pelo selo Record Runner (dá pra ver a capa no discogs). Eu tive um exemplar e vendi ainda no Mister Sebo.
Valeu Marco. Até onde eu sabia, não era oficial, mas se você diz, então sim
Se é oficial ou não, só a banda pode dizer. Na época em que saiu as gravadoras pequenas ficavam atrás de material inédito. Talvez esse material tenha se tornado um suposto segundo disco. Só membros da banda são capazes de dizer se esse material foi gravado com o intuito de lançar um segundo disco. Mas que existe um CD da Record Runner chamado Quantum II, isso existe. Infelizmente não me recordo de maiores informações no CD.
Boa lembrança. Bom ver aqui no site essas matérias sobre músicos e bandas brasileiras que não tem o devido reconhecimento, infelizmente. fiquei curioso pra ouvir esse disco do Quantum, o único citado que não conheço. O disco que ele gravou com o Inox ficaria bem na lista. também gosto muito do Elo Perdido, embora a gravação não seja das melhores. uma pena não ter mais registros ao vivo dessa época da patrulha com o Arnaldo. não sabia que ele tinha um problema em uma das mãos, o que lhe confere ainda mais respeito.
Então meu caro, como mencionei acima, preferi o Quantum por ser uma raridade prog que o Júnior toca. Mas o Inox é muito justo tb
Adoro quando aparecem matérias com discos brasileiros antigos. E esse aí é um gigante, mas gigante baterista das nossas terras!
Vou ver esse Aeroblus que não conheço ainda.
André, corre atrás. Você vai ver que´perdeu um bom tempo sem ter conhecido essa banda. Abraços