Direto do Forno: Cris Lobo – A Mágica da Vida (2018)
Por Davi Pascale
De tempos em tempos, recebemos CD´s de artistas que estão em busca de um espaço, que estão lutando por um sonho. Sempre ouvi com enorme atenção cada disco que me enviam, cada ítem que recebo. Sempre fui assim. Quando trabalhei na revista RockLife, por mais de uma vez, resenhei álbuns 100% independentes e cheguei, inclusive, a fazer reportagem com bandas iniciantes. Era muito bacana ver a alegria desse pessoal quando viam a reportagem na revista…
Cris Lobo é mais uma dessas artistas sonhadoras, que levam a música como segunda profissão, desejando que um dia possa ser a sua principal. Se isso nunca foi raro, agora então está ficando quase que rotineiro. Não é raro descobrirmos que muitos de nossos ídolos possuem uma segunda profissão. Dentro da cena heavy brasileira, por exemplo, é quase unanimidade. E ela segue firme e forte por mais de uma década e chega agora ao seu quarto CD.
Lobo já disse algumas vezes que não pensa em desistir e que seu prazer está no trabalho autoral. Mágica da Vida é um lançamento 100% independente. A moça colocou a mão em tudo. Desde a elaboração dos arranjos, passando pela criação das letras, até chegar à produção do álbum. A qualidade de gravação é boa, está dentro do padrão que esperamos dentro de um artista que deseja seguir adiante. Teria deixado o som do baixo pouca coisa mais alto, apenas.
Os músicos também são bons. Vale destacar aqui o trabalho de guitarra de Renato Ribeiro e Marcos Falcão, além da participação do experiente e extremamente competente Claudio Infante em “Tempo” e “A Mágica da Vida”. Quem já era ligado em música nos anos 80, vai se lembrar dele segurando as baquetas para grandes nomes do pop/rock brasileiro como Kid Abelha e Paulo Ricardo.
“Folha de Papel” inicia o CD com aquele pop/rock guiado pela guitarra levemente distorcida, em um clima que me remeteu um pouco ao debut da carioca Mariana Davies. A diferença está no estilo de cantar. Mariana canta em um estilo mais desleixado, enquanto Cris canta com a voz mais para cima. Algo que irei comentar mais para frente. “Haverá Amanhãs” já aposta em uma sonoridade mais rock n roll, mas o primeiro destaque do disco vai para “Uma Longa Caminhada”. Uma balada pop/rock criada na dose certa.
Um problema que o artista encontra quando resolve fazer um álbum por sua conta e risco é selecionar repertório. Optar entre o que colocar e o que deixar de fora. O criador costuma ter um grande carinho por tudo aquilo que produziu. E um dos problemas desse álbum é o excesso. Até por contar com algumas músicas de 6 ou 7 minutos de duração, teria fechado o repertório em 10 faixas. O álbum é muito longo e a audição, em determinado momento, torna-se cansativa. Vale fazer uma pesquisa nos shows que realiza ou até perguntar para os amigos, quais suas favoritas…
“O Amor” conta com uma levada bacana. “Sonhos Refeitos” deve agradar a garotada. Linha vocal bem na linha da Tiê. Manja aquela pegada onde a cada 3 palavras, duas têm a sílaba prolongada? A neta da Vida Alves é mestre nisso. A introdução de “O Que Será, Será” por muito pouco não se torna um plágio de “Heroes” (David Bowie). O riffzinho inicial é bem similar e suspeito que sejam as mesmas notas, inclusive. “Com e Sem Você” também inicia com uma linha vocal bem similar de uma conhecida canção. Cuidado com essas influências descaradas…
Tenho escutado um monte de discos onde o sentimento é o mesmo: falta um bom produtor. Isso não apenas nos CDs independentes que a gente recebe, mas mesmo entre os lançamentos de grandes nomes. Está faltando gente com talento para direcionar os artistas em relação à expansão e elaboração de suas ideias.
“Um Dia de Lenhador” é a típica balada que os grupos de rock brasileiro gostam de fazer mesclando guitarra e violão e usando aquela palhetada no estilo de “Kamizake” (Capital Inicial). “A Mágica da Vida”, faixa que leva o nome do disco, acredito que seja uma das mais rock do disco. Vale destacar a levada de Claudio Infante aqui.
Os arranjos das músicas estão ok. Trabalharia mais a questão de elaboração de refrão. Algo importante dentro desse cenário pop/rock, que ajudaria a se diferenciar dos demais artistas da cena underground brasileira. Os guitarristas fizeram um trabalho competente, alguns solos bonitos. O trabalho de teclado também está bacana. Minha puxada de orelha vai para o trabalho vocal pela seguinte razão: ela canta o tempo todo para cima e quase sempre na mesma região. Algo que cansa o ouvinte, gasta a voz e não explora todos os recursos que os arranjos permitem. Aconselharia arranjar as músicas um tom abaixo e trabalhar mais a linha vocal. Cantar os versos para baixo e o refrão para cima (e quando fala verso mais para baixo é bem mais para baixo), cantar o trecho de alguma música com algum efeito, quebrar o clima criando uma ponte com uma diferente técnica… Enfim, as possibilidades são infinitas.
De um modo geral, o trabalho da garota é bem feito, mas carece de alguns ajustes. Alguém que possa ajudar na definição do tracklist e que pudesse ajuda-la a equacionar melhor a questão vocal seria bem-vindo. A produção do CD, para um produto independente, é boa. Gravação de boa qualidade, encarte bem elaborado com todas as letras e nome dos músicos participantes, enfim…
O mercado de pop/rock sempre teve um grande público no Brasil e a cena está carente de novos nomes no gênero. Tem muito artista bom surgindo, mas a maioria ou está indo para o lado mais heavy metal ou está indo para o lado mais alternativo, mais indie. Existe uma importante fatia aí a ser explorada. Lapidando aqui e ali, dá para chegar lá.
Faixas:
- Folha de Papel
- Haverá Amanhãs
- Nossa Velha Bandeira
- Uma Longa Caminhada
- Pedras Preciosas
- O Amor
- Novamente
- Sonhos Refeitos
- O Que Será, Será
- Nada É Perdido
- Tempo
- Com e Sem Você
- Um Dia de Lenhador
- A Mágica da Vida
O Davi fez uma bela resenha para esse disco. Particularmente, não gostei do que ouvi. Mas o Davi conseguiu pontuar muito bem os elogios e, principalmente, as sugestões de melhorias para o vocal da Cris Lobo. Parabéns mesmo, meu caro!