Direto do Forno: Angra – Ømni [2018]
Por Felipe Lemos
Um dos dois grandes pilares do Metal nacional, o Angra sempre é lembrado por ser uma banda que, mesmo com grandes mudanças em suas formações, consegue se renovar e lançar materiais com grande qualidade. O mais recente trabalho do grupo, ØMNI chega para tentar estabelecer mais uma vez uma nova formação. Segundo o próprio Rafael Bittencourt (único membro remanescente da formação original e clássica), este é o álbum que inicia a terceira grande era da banda.
ØMNI é um disco conceitual, se baseando liricamente em histórias de um futuro não tão distante (mais precisamente 2046), onde será possível aos humanos se comunicarem com outros que viveram há milhões de anos, ou até os que viverão daqui a outros milhões de anos. Como se trata de um assunto muito abrangente, Rafael conseguiu agrupar vários temas já abordados em álbuns clássicos da banda e até fazer pequenas citações aos mesmos, conectados a um “todo” (OMNI em latim significa “tudo”).
Diferentemente da maioria de seus trabalhos, o disco inicia-se sem nenhum prelúdio instrumental, seguindo direto para “Light of Transcendence”, que é a clássica composição Power Metal do grupo. Veloz, com um refrão pegajoso, e solos técnicos, a faixa abre muito bem o disco. Porém, assim como no seu predecessor Secret Garden (2014), o som da bateria deixa a desejar. Caixa soando abafada, assim como os pratos e algumas de suas peças, fazendo com que se perca muito da “pegada” característica de uma bateria de Power Metal. Acredito que isto se deva, além da produção, ao fato de Bruno Valverde insistir em tocar sempre com “traditional grip”, o que vez ou outra faz com que o som perca em peso. Basta ouvir, por exemplo, a bateria em Temple of Shadows (2004) para notar a grande diferença no som. Em compensação, as guitarras soam pesadas e cristalinas, características estas da produção de Jens Bogren, que já trabalhou com Arch Enemy, Opeth, Amon Amarth, entre outros, e é o responsável por “modernizar” o som da banda desde Secret Garden (2014).
“Travelers of Time” foi a primeira faixa divulgada pela banda antes do lançamento. Outra ótima composição que começa com um ritmo “abrasileirado”, característico do Angra. Ótima linha vocal nos versos e no refrão. Nesta faixa temos um interlúdio cantado por Rafael, interpretando outro personagem na música, que aqui funcionou bem. Solos bem elaborados de Marcelo Barbosa (substituto de Kiko Loureiro, atual Megadeth) que demonstra qualidade como compositor.
A melhor música do disco é também aquela que se tornou a mais conhecida por um fato em particular: “Black Widows Web” traz Sandy como convidada especial, que participa cantando a introdução e o final da canção. Sua voz se encaixou muito bem com a ideia da música, que mostra as duas faces da viúva negra, uma sedutora e outra diabólica (Sandy interpreta a sedutora). A outra participação não menos impactante fica por conta de Alissa White-Gluz do Arch Enemy, que interpreta brilhantemente suas partes, com guturais rasgados e marcantes (sendo a face diabólica da aranha), apresentando uma qualidade absurda, já conhecida em seus trabalhos na sua banda principal. Esta é primeira vez que o Angra traz vocais guturais em uma composição. Liricamente a faixa é excelente, na qual a teia da viúva negra representa as redes sociais, que, ao mesmo tempo em que seduz o indivíduo com “likes, emoticons, views, etc.”, prende cada vez mais as pessoas em um mundo vazio, falso e longe da realidade. Muitos criticaram a escolha de Sandy para a canção, argumentando que dentro do estilo existem inúmeras vocalistas que poderiam estar no disco, até mesmo desmerecendo a voz da cantora Pop. Mas a verdade é que, além de ser também uma excelente cantora (querendo ou não os mais troos do metal), sua participação funcionou como uma boa alavanca para a divulgação da banda e do estilo para a grande mídia, e pode até ter atraído novos admiradores. Recentemente, a banda lançou um clipe muito bem produzido desta música, com as participações já citadas de Sandy e Alissa.
“Insania” dá continuidade em alto nível. Refrão maravilhoso, linhas de baixo muito criativas e de ótimo gosto por parte de Felipe Andreoli, além de solos muito bem compostos e cativantes. A faixa funciona muito bem ao vivo, dada à grandiosidade já citada de seu refrão. Também teve um clipe lançado, mas com impacto bem abaixo do já citado “Black Widows Web”.
A única faixa cantada apenas por Rafael é “The Bottom of My Soul”. Acredito que canção melhoraria muito mais se fosse cantada por Lione, o que não significa que Rafael seja um vocalista ruim. Sua voz funciona muito bem fazendo backs e contrapontos para Lione, mas, para assumir totalmente uma música, acredito não ser a melhor opção. Todos os vocalistas que passaram pelo grupo são excepcionais, onde não basta ser apenas um bom vocalista para cantar na banda. Assim, acaba sendo um desperdício ter canções em álbum que não são cantadas pelo vocalista. Secret Garden (2014), que exagerou nisto, mais parecia um álbum do Bittencourt Project com inúmeros convidados especiais.
Kiko Loureiro aparece com um solo em “War Horns”, a outra faixa mais rápida do disco. Nada memorável como os solos de “Nova Era” (Rebirth – 2000) ou “The Shadow Hunter” (Temple of Shadows – 2004), mas cumpre bem seu papel na música, sendo um solo bem característico de seu criador, com velocidade e melodia. Mais uma faixa que ganhou clipe, visto o forte trabalho de divulgação deste álbum, mas com produção bem mais simples que os outros dois já citados.
A partir daqui as composições são apenas boas ou medianas e o disco perde um pouco do brilho. “Caveman” vem para representar os traços brasileiros, sempre presentes nos álbuns do grupo. Versos em português, percussão típica tupiniquim e cadência marcante. Outra boa canção, mas que também está longe de outras com esta mesma sonoridade já lançadas pelo Angra. Seguindo temos “Magic Mirror” que vem para mostrar as influências progressivas da banda. Outra que é apenas mediana e fica abaixo de sua “irmã” “Upper Levels” (Secret Garden – 2014).
“Always More” é outra balada, só que cantada por Fabio Lione, demonstrando versatilidade em sua voz e até mesmo comprovando como “The Bottom of my Soul” poderia ter ficado melhor. Com arranjos mais simples, a música aposta em climas até crescer para outro refrão bem escrito. “ØMNI – Silence Inside” é a primeira parte da faixa título que encerra o álbum. Acredito ser a música mais fraca de todo álbum e que pouco empolga o ouvinte. É a mais longa e que também atrai as raízes progressivas da banda, mas com pouca inspiração. “ØMNI – Infinite Nothing” é a segunda parte da mesma. Trata-se de uma faixa orquestrada, com a combinação das melodias marcantes de cada canção do disco, sendo uma “cópia” de menor qualidade da ideia já presente no encerramento “Gate XIII” do Temple of Shadows (2004).
ØMNI é um bom disco, superior ao lançamento anterior, mas que ainda fica longe das grandes obras lançadas pela banda. A nova formação mantém o nível técnico de excelência que o Angra sempre teve, mas nota-se aqui a falta de inspiração em alguns momentos, onde algumas ideias soaram um pouco forçadas. A ausência de Kiko também é sentida nas composições, onde é eminente o domínio dos arranjos típicos feitos por Rafael, antes contrabalanceados pela complexidade e eruditismo das composições de Loureiro. Aguardemos então os novos passos desta formação que representa a terceira grande era do grupo, que tem tudo para produzir obras notáveis, mas que precisa de mais tempo para se consolidar.
Tracklist
- Light of Transcendence
- Travelers of Time
- Black Widow’s Web
- Insania
- The Bottom of My Soul
- War Horns
- Caveman
- Magic Mirror
- Always More
- OMNI – Silence Inside
- OMNI – Infinite Nothing
Concordo com o texto todo. Tb acho Omni melhor que o anterior, algumas passagens são realmente abaixo do que o grupo já produziu, Rafael tem que parar de querer cantar faixas sozinho (grave um outro disco solo pô!) e Black Widow´s Web é não só a melhor música do disco como é um destaques do ano. Tivessem convidado uma cantora do metal não teríamos o perfeito contraponto proposto pelo conceito da música. Afinal a Sandy não tem somente a voz doce, mas também tem sua imagem que todos viram crescer. Além do mais ela vindo de um estilo fora do metal traz uma relação maior com as mídias sociais que são bastante pop, sendo que o metal é mais underground. A musica pop também é mais sedutora para o grosso da população. Isso sem contar que ela é uma tremenda cantora. Outro fato que muito esquecem é que a Sandy faz parte do grupo de amizades dos caras da banda. A ligação que eles têm com a Família Lima é enorme e quando soube que ela iria participar achei muito natural por conta disso. Porém, a versão que entrou no disco acabou dando muito mais destaque para a Alissa do que a Sandy, algo que, ao meu ver, tentaram “corrigir” no clipe.
Na minha opinião, está entre os melhores da banda. Produção, músicas, letras…tudo se encaixa perfeitamente! Parabéns por esse belo texto!
Disco apenas mediano que a crítica tenta empurrar goela abaixo das pessoas! Mesmo no sofrido e cabisbaixo contexto do metal nacional atual este lançamento leva pau…
Acho um álbum bem forte e melhor do que os últimos que a banda lançou com sobras… Curti muito o disco, e espero que a banda consiga se manter estável…