Discografias Comentadas: Mountain (Parte II)
Por Ronaldo Rodrigues
Na segunda parte deste texto, vamos analisar o canto do cisne da banda na década de 1970 e seus diversos retornos. Ainda que inconstantes no estúdio, o Mountain vem mantendo uma considerável regularidade de apresentações da década de 90 pra cá, na qual sempre é possível atestar a qualidade e a importância da banda para o hard rock.
Twin Peaks [1974]
O Mountain foi obrigado a uma parada forçada – Felix Pappalardi estava perdendo a audição por causa do volume excessivo da banda nos palcos e o ritmo frenético de apresentações. Nesse ínterim, Leslie West e Corky Laing dispensaram Steve Knight e chamaram Jack Bruce para tocar o barco. Jack Bruce aceitou mas quis que a banda assumisse uma nova alcunha e aí formou-se o power trio West, Bruce & Laing. Depois de dois discos, muitos shows, cocaína e desentendimento aos montes, no fim de 1973, Leslie West convoca seu velho parceiro para o retorno do Mountain. Uma tour no Japão é agendada, mas dessa vez Corky Laing não estava bem de saúde e foi substituído por Allan Schwartzberg. Os teclados seriam assumidos por Bob Mann, que fazia também a segunda guitarra. Dessa bem sucedida incursão japonesa, sai o material apresentado no disco Twin Peaks, que revela (novamente) o furor que o Mountain causava nos palcos. A interpretação de Schwartzberg na bateria dá um swing diferenciado a músicas como “Never in my Life”, “Crossroader” e “Blood of the Sun” e Bob Mann não deixa por menos duelando bravamente com Leslie West na indulgente versão de “Nantucket Sleighride”, dessa vez com loucos 32 minutos de duração. A faixa é um tratado sobre os excessos do rock da década de 70.
1. Never in My Life
2. Theme for an Imaginary Western
3. Blood of the Sun
4. Guitar Solo
5. Nantucket Sleigh Ride
6. Crossroader
7. Mississippi Queen
8. Silver Paper
9. Roll Over Beethoven
Avalanche [1974]
O último grande disco de estúdio do Mountain marca o grande hiato que viria para a banda nos 70’s. David Perry assume a segunda guitarra e Corky Laing retoma seu posto na bateria, junto com a dupla Pappalardi-West. O baixista também assume os teclados presentes no disco e canta em algumas faixas, como de praxe. O disco conta com duas poderosas versões – a abertura com “Whole Lotta Shaking Going On” (de Jerry Lee Lewis) e a releitura de “Satisfaction” (dos Rolling Stones) mostram o Mountain também como um grande intérprete. As composições de Pappalardi são bem marcantes e são pontos altos no álbum (as cinzentas “Sister Justice” e “Thumbsucker”) e Leslie West apresenta um violão eficiente em “Alisan” e “I Love to See You Fly”. O grande destaque fica com “You Better Believe It”, que ocupa o topo das melhores músicas da banda, com a levada agressiva de Corky Laing na bateria e a profusão de sons distorcidos das duas guitarras e do baixo. Felix Pappalardi estava mais interessado em voltar para os bastidores e o disco, apesar das qualidades, vende pouco. Além disso, o nível de interesse pelos concertos da banda diminui. Todos estes fatores sepultam momentaneamente a trajetória da banda, com West & Laing indo trabalhar sob a alcunha de Leslie West Band.
1. Whole Lotta Shakin’ Goin’ On
2. Sister Justice
3. Alisan
4. Swamp Boy
5. Satisfaction
6. Thumbsucker
7. You Better Believe It
8. I Love to See You Fly
9. Back Where I Belong
10. Last of the Sunshine Days
Go For Your Life [1985]
Os 10 anos entre o lançamento anterior e este foram trágicos para os músicos da banda. Leslie West afundando-se nas drogas e cada vez mais obeso; já Felix Pappalardi foi assassinado pela ex-mulher em um estúpido crime passional. O Mountain cataria os cacos e se remontaria com Mark Clarke (ex-Colosseum, ex-Tempest e Uriah Heep) para um novo disco, buscando morder o mesmo filão de hard rock que acolhia o sucesso de outros grupos egressos dos 70’s, como Kiss, Scorpions e ZZ Top. Rezando toda a nova cartilha do hard rock oitentista não há como dizer que o Mountain não entrega o que se propõe – o álbum é bastante alinhado ao que se fazia, mas derrapa para a generalidade e desliza nas apostas mais arriscadas. A voz de Leslie West fica mais aguda e menos embebida na influência do blues e duas marcas controversas dos anos 80 aparecem com muita frequência nas músicas – refrões cantados em coro e a presença oblíqua de alguns sintetizadores. Por falar em sintetizadores, “Spark” é uma constragendora lambida do Mountain no synth pop e os primeiros segundos de “She Loves her Rock” lembram (pasmem!) a faixa “Comida” dos Titãs. “Bardot Damage” tem bons momentos, “Makin’ it in your Car” rememora os bons tempos de outrora, com um rock blueseiro e bem cadenciado e “Babe in the Woods” mostra o Mountain em uma praia um pouco distinta da usual, mas com riffs fortes. Junto com a faixa de abertura (“Hard Times”) compõem os momentos mais aproveitáveis do álbum.
1. Hard Times
2. Spark
3. She Loves Her Rock (And She Loves It Hard)
4. Bardot Damage
5. Shimmy on the Footlights
6. I Love Young Girls
7. Makin’ It in Your Car
8. Babe in the Woods
9. Little Bit of Insanity
Man’s World [1996]
Para deixar sua marca nos anos 90, o Mountain reaparece com Man’s World. Já de cara dá pra perceber que Leslie West reencontra-se com a sonoridade clássica de sua Gibson logo na abertura, “In Your Face”, que se conecta facilmente a “Southbound Train” do primeiro álbum. O álbum é bem honesto, relativamente coeso, ainda que careça daqueles momentos que fixem a cabeça do ouvinte ao que está sendo ouvido. “So Fine” e “You’ll Never be Alone” trazem o Mountain revivendo o uso do violão e as influências blues-country. “Hotel Happiness” é uma blues-ballad suculenta e “I Look” tem bons riffs e um trabalho bem instigante de Corky Laing na bateria. “Crest of a Slump” é outro destaque, um rock forte e intenso como nos velhos tempos. O restante do álbum não é essencialmente ruim, mas se assenta na mediocridade.
1. In Your Face
2. Thunder
3. Man’s World
4. So Fine
5. Hotel Happiness
6. I’m Sorry
7. I Look
8. Is That Okay?
9. Crest of a Slump
10. You’ll Never Be Alone
Mystic Fire [2002]
Utilizando afinações mais graves na guitarra e no baixo, a faixa de abertura traz um Mountain mais “cavernoso” digamos assim, aproximando-o do stoner-rock. “Immortal” também se vale de alguns versos da fantástica “Babe I’m Down” do longíquo primeiro álbum. Quem acha que a banda seguirá o pique com perspectiva de melhora se frustra, porque a primeira faixa e a faixa título (logo em seguida) são o máximo que Mystic Fire tem a oferecer. O baixo é praticamente inaudível e de uma irrelevância tal que deixaria Felix Pappalardi bastante decepcionado. Até mesmo os solos de Leslie West ficam devendo e Corky Laing fica no piloto automático em muitos momentos, com sua bateria soando como lata. As composições simplesmente não funcionam para um ouvinte mais experiente. “Marple Peach-Rotten Peach” parece um ensaio de uma música ainda não maturada e nem a tentativa de releitura de “Nantucket Sleighride” salva o álbum de uma avaliação ruim.
1. Immortal
2. Mystic Fire
3. Fever
4. The Sea
5. Mutant X
6. Better Off With the Blues
7. Mountain Express (Oh Boy)
8. Marble Peach
9. Rotten Peach (Part II)
9. When Johnny Comes Marching Home
10. Nantucket Sleighride (Redux)
Masters of War [2007]
Parece que o Mountain perdeu a mão (ou a vontade) nas composições e dedicou toda sua energia rockeira nas releituras, um terreno no qual a banda já havia mostrado competência em outras ocasiões. Neste caso, o disco todo é um tributo a Bob Dylan e aqui a produção sonora joga a favor da banda. O disco já abre com “Masters of War” contando com a negra interpretação de Ozzy Osbourne na faixa, dividindo vocais com Leslie West – o resultado é no mínimo insólito e pesado! Já “Serve Somebody” conta com outro grandalhão da guitarra – Warren Haynes, do Gov’t Mule. “Blowin in the Wind” começa acústica e belamente interpretada por Leslie West, que a propósito estava com a garganta a mil nesta gravação, e termina quase como uma música do Black Sabbath, em tons graves e ritmo marcial. “Everything is Broken” e “Seven Days” chegam em versões bem energéticas e milhares de milhas distantes das versões originais (assim como o é o álbum todo). A banda tenta dar uma “inventada” em “Highway 61 Revisited” com seu jeitão meio declamado e a batida constante de Laing; já “Like a Rolling Stone” é um desastre completo, pois ouve-se apenas Corky Laing tocando bateria e Leslie West proclamando a letra com voz totalmente processada. “This Heart of Mine” é uma bela versão recheada de violões e guitarras sobrepostas e “The Times They are A-Changing” tem um lindo tratamento pela banda, contando com a luxuosa participação de Warren Haynes, numa versão apenas com piano e guitarras. Para fechar “Blowin’ in the Wind” em versão acústica, com incrível interpretação vocal de Leslie West e um solitário violão.
1. Masters of War
2. Serve Somebody
3. Blowin’ in the Wind [heavy]
4. Everything Is Broken
5. Highway 61 Revisited
6. This Heart of Mine
7. Subterranean Homesick Blues
8. The Times They Are A-Changin’
9. Seven Days
10. Mr. Tambourine Man
11. Like a Rolling Stone
12. Blowin’ in the Wind [acoustic]
A discografia do Mountain se tornou muito irregular, virando um projeto de Leslie e Corky com quem estivesse disponível para o baixo, e só Man’s World, dentre os discos gravados sem Felix Pappalardi, pode ser colocado como de bom nível. Destaque também para as duas músicas inéditas da coletânea Over The Top, com a participação do grande Noel Redding no baixo. Nada disso, é lógico, compromete a excelente qualidade da matéria, parabéns!
Twin Peaks é um discaço. Os demais, umdia ainda vou ouvir, ainda mais com esse grande texto de nosso escriba mestre. Valeu Ronaldo, por resgatar essa grandiosa banda!