Discos e suas sequências
Por Fernando Bueno
No cinema é muito normal existir uma pressão para uma sequência após um filme de sucesso. São infinitos os exemplos. Depois da adaptação de O Senhor dos Anéis então; ficaram famosas as trilogias. Em um momento parece que todos os filmes que tinham algum potencial eram planejados em trilogias. Os próprios filmes de heróis que saem quase todos os dias são assim. Foram três filmes solo do Homem de Ferro, três Thor, três do Capitão América, três do Hulk e assim por diante. Sequencias clássicas de filmes até hoje são referência: Rambo 2, De Volta para o Futuro 2, Exterminador do Futuro 2 e muitas outras.
No metal tivemos também algumas sequencias de álbuns de sucesso. No caso da música uma banda quando faz uma sequencia de um disco normalmente é para tentar ganhar um fôlego em sua carreira na esteira de uma nostalgia de fã, ou para coroar aquilo que chamam de volta às origens ou à uma fase de sucesso. Ou seja, quase sempre em um período de baixa na carreira da própria banda. Entretanto, assim como os filmes, quase sempre as sequencias resultam em discos inferiores ao original. Mas, diz-se que para qualquer regra existe uma exceção. Assim como os filmes citados no fim do primeiro parágrafo – os três são sequencias sempre citadas como um filme melhor que o primeiro – existe um disco em que a segunda parte é melhor que a primeira, mesmo que isso não seja uma opinião tão unânime. O Helloween quando lançou seu clássico Keeper of the Seven Keys em 1987 queria que o álbum fosse duplo, mas a ideia foi barrada pela gravadora. Assim o material foi dividido em duas partes e Keeper of the Seven Keys Part II ficou com uma coleção de músicas superiores à primeira (essa história completa você pode ler aqui). Entretanto, como foi lançado logo em seguida e com “sobras” do material da primeira parte talvez eu esteja apelando e forçando para encontrar uma exceção à regra que citei acima.
Começarei a citar os exemplos por um álbum gravado por alguém que também participou da empreitada de sucesso do Helloween. O disco de maior sucesso do grupo seguinte de Kai Hansen, Gamma Ray, é Land of the Free de 1995. A banda continuou lançando bons discos depois disso, mas doze anos depois Land of the Free II veio e nem de longe conseguiu o mesmo resultado do original. O pior é que isso deve ter desequilibrado um pouco as coisas pois a banda ainda entregou o disco mais fraco de sua carreira logo em seguida: To the Metal! (2010). Para ficar na Alemanha ainda temos o exemplo do Grave Digger que tem em seus grandes álbuns a trinca de discos históricos Tunes of War de 1996 sobre a guerra de independência dos escoceses, Knights of the Cross de 1998 sobre os cavaleiros templários e Excalibur de 1999 sobre as lendas do Rei Arthur. Em 2010, depois de uma sequência de discos não tão boa, sai The Clans Will Rise Again, apostando em repetir o sucesso do clássico de 1996, mas apesar de não ser um disco ruim, não conseguiu a repercussão que almejava. O Sinner, do incansável baixista Matt Sinner veio em 1985 com Touch of Sin, que trazia em seu line up o então ex-guitarrista do Accept Herman Frank. Essa era a primeira vez que Frank deixava o Accept. Quase 30 anos depois Touch of Sin 2 veio como um modo de reviver os bons momentos da década de 80. Aparentemente não deu muito certo.
Os italianos do Rapshody, pelo menos enquanto a banda não tinha suas ramificações, fizeram sua obra definitiva em Symphony of Enchanted Lands de 1998, seu segundo disco. São ao todo seis discos conceituais que usam uma saga criada por Luca Turilli, porém o fôlego dos italianos foi diminuindo ao longo dos discos que vieram em seguida. O capítulo final foi então chamado de Symphony of Enchanted Lands II: The Dark Secret. Certamente as vendas estavam caindo e usaram desse artifício para tentar dar uma inflada nesses números. Acredito que se não fosse assim teriam usado apenas o nome The Dark Secret. Não deu muito certo, o álbum é mediano e depois disso a banda se separou e se tornou um caso de confusão em seus nomes e idas e vindas de integrantes.
Um exemplo que deve ter vindo à cabeça de todos foi a continuação da história criada por King Diamond para seu segundo disco solo lançado em 1987, o super clássico Abigail. A história de terror muito bem amarrada ao longo do álbum acabou tendo uma continuação e, como vários filmes de terror que tentam repetir uma fórmula mas perdem o fator surpresa, foi uma decepção. A história continua forte, mas sem a força suficiente para conseguir levar a música em si. O Rei Diamante ainda se recuperou com o álbum seguinte, The Puppet Master, mas alguns anos depois ficou doente e ficou vários anos parado. Em sua retomada de carreira acabou usando seu clássico de 1987 de uma forma diferente, como base para uma turnê de retorno que rendeu um recém lançado DVD ao vivo que era muito esperado pelos fãs.
O Stratovarius construiu sua boa carreira emprestando diversos elementos do som do Helloween, principalmente daqueles trazidos nos já citados clássicos Keeper of the Seven Keys. Na fase final da carreira do grupo com Timo Tolki mais alguns elementos foram emprestados. A ideia de registrar em duas partes um conjunto grande músicas que estavam prontas para serem gravadas. Assim surgiram Elements Pt 1 e Elements Pt2, ambos de 2003. Coincidentemente o guitarrista, ex-vocalista e fundador da banda também deixou o grupo após os discos pouco depois, mas nem de longe são álbuns que vão ficar para a história como os do Helloween.
Trago aqui também um exemplo em que nenhuma das partes me agrada. Estou falando dos dois discos intitulados The Marriage of Heaven and Hell dos americanos do Virgin Steele, que saíram em 1994 e 1995, respectivamente. A segunda parte é considerada a obra prima da banda, mas por algum motivo não gostei. Diferente do que acontece com Welcome to My Nightmare, clássico da tia Alice Cooper de 1975, quando ele assumiu de vez a persona do nome de seu grupo para si – até então Alice Cooper ainda era tratada como uma banda, mas esse entendimento é mesmo um pouco confuso. Em Welcome 2 My Nightmare de 2011, a melhor parte é o trocadilho inteligente no nome do disco, mas se o disco não é um clássico, pelo menos é divertido.
Para sair um pouco da seara do heavy metal trago agora alguns exemplos no rock progressivo. A banda alemã Eloy tem diversos discos que são referência do rock progressivo setentista. São pelo menos quatro discos obrigatórios e entre eles Ocean de 1977. Uma maravilha que já começa pela bela capa. Como todos sabem os anos 80 não foram tão bons para bandas do progressivo, ainda mais para aquelas que não se renderam para o lado mais pop da música. Assim no final da década de 90, depois de anos de quase inexpressividade Ocean 2: The Answer (1998) chega às lojas. O curioso é que eles já tinham usado a imagem de ‘oceano’ no álbum anterior com The Tides Return Forever (1994), não sei se com a intenção de remeter ao seu álbum clássico ou não. O fato é que no seguinte eles escancararam a referência. Quem nunca ouviu a trilha, ou parte dela, do fantástico O Exorcista, que desde a década de 70 assusta espectadores e até mesmo criou a ideia e imagem de possessão demoníaca que temos até hoje? Para aqueles que não sabem a trilha do filme foi o álbum do multi-instrumentista Mike Oldfield chamado Tubullar Bells. O disco foi um sucesso enorme tanto de vendas quanto de crítica, catapultando o nome do jovem músico para o estrelato e isso logo em seu disco de estreia. Em 1992 Mike Oldfield lançou Tubular Bells II e foi além; em 1998 saiu Tubular Bells III e Tubullar Bells 2003 cinco anos depois. São tantos que se fosse um filme já estaria no nível da franquia de Sexta Feira 13 ou de Velozes e Furiosos. Por se tratarem de discos instrumentais é mais fácil nessa situação, por não existir a necessidade de criar um conceito lírico para acompanhar a música. Assim, a intenção de tentar resgatar um sucesso se mostra mais explícita ainda. E o mesmo Mike Oldfield usou de novo esse expediente em seu último disco de estúdio lançado em 2017, quando resgatou seu outro clássico setentista, Ommadawn de 1975, com Return to Ommadawn.
Não citei alguns discos que foram planejados para terem mais de uma parte como o Load e Reload do Metallica, os dois Use Your Illusion do Guns and Roses e os últimos discos do Blaze Bayley, pois, ao meu ver, a intenção desses grupos não era resgatar alguma boa experiência dos discos anteriores, pensando bem até mesmo o álbum do Virgin Steele poderia ter ficado de fora. Também não falei em discos em que a banda apenas não colocou nome específicos como os primeiros do Led Zeppelin ou os discos do Danzig, e que o músico apenas usou alguma forma de numerar seus discos, portanto, obviamente, não se tratam de sequencias. O Extreme fez também algo parecido. Entretanto é bem possível que eu não tenha citado aquele exemplo que está na cabeça do leitor que chegou até aqui. Coloque aí nos comentários esse exemplo, diga se gosta mais de um do que do outro ou comente por que gosta mais de alguma sequência do que seu disco original.
Eu sou um caso a parte para falar de Helloween porque nem a primeira e nem a segunda parte são melhores. O que eu gosto mais é a terceira parte, The Legacy. Mas devo ser o único a ter essa opinião. Outros dois que prefiro suas segundas partes do que as primeiras: Rhapsody of Fire e Stratovarius.
Dos italianos, no segundo disco eles fizeram tudo aquilo que me agrada deles: coros épicos, interpretação afetada de Lione, todo aquele romantismo piegas medieval e nada mais do que o Saruman narrando e vestido de rei (lendário Christopher Lee). O Rhapsody foi feito para ser exagerado mesmo e por isso gosto deles, sendo que neste disco levaram tudo isso ao limite. Turilli depois fez alguns discos bons, mas a versão da banda com Staropoli decaiu demais para o meu gosto.
Quanto ao Stratovarius, a meu ver, a parte II ficou com as melhores canções tais como “Alpha & Omega”, “Know the Difference” e possivelmente a minha música favorita de toda a discografia da banda que é “Liberty”. Uma das músicas mais positivas e alto-astral que já ouvi no metal.
Aliás, o senhor esqueceu talvez um dos casos mais notórios de primeiro melhor que o segundo que são os dois Operation: Mindcrime do Queensrÿche. O primeiro Bat out of Hell também é melhor que o segundo do senhor Rocambole de Carne.
Quando bolei a pauta eu anotei todos os discos que me vieram à mente. O terceiro Keeper está nas anotações, mas por algum motivo não cito no texto. O do Meat Loaf me lembrei dois dias antes da matéria ser publicada e resolvi deixar para que alguém os citasse e os do Queensryche eu me esqueci completamente. Valeu André!!!
Gostei das citações de Mike Oldfield e seu clássico Tubular Bells, que foi sem dúvida a maior descoberta musical que eu fiz nos últimos anos. Foi uma experiência incrível ouvir o álbum original de 1973, a versão orquestrada/sinfônica de 1974 chamada “The Orchestral Tubular Bells” (executada pela Royal Philharmonic Orchestra) e sua releitura de 2003 em comemoração aos 30 anos de seu lançamento, porém afirmo que ainda não ouvi as suas três sequências: TB 2, TB 3 e o The Millennium Bell (2000).
“Depois da adaptação de O Senhor dos Anéis então; ficaram famosas as trilogias. ”
Mentira, isso cabe ao Star Wars e principalmente, De Volta Para O Futuro, Karate Kid e Poderoso Chefão, as maiores trilogias da história
Concordo que essas são trilogias mais clássicas, mas depois do Senhor dos Anéis até filme que não deveria ter nem o segundo tiveram três. O próprio Hobbit foi forçado para ter três filmes.
Agora, de discos em sequência, além dos ótimos citados Helloween – Keepers e Mike Oldfield – Tubular Bells, é impossível não citar os dois Racional (Tim Maia), Pete Townshed e seus Scoop, além dos inacreditáveis Beardfish – Sleeping in the Traffic 1 & 2. O primeiro é um disco sensacional, e o segundo, eleito um dos dez melhores discos de 2008, traz a fantástica faixa título, um tour de force de 32 minutos para deixar qualquer apreciador de progressivo de queixo caído.
E no esquema do Led, ainda tem o Queen, com Queen I e Queen II, mas também não conta.
Na minha coleção ainda achei
Introspection do This Van Leer
Bat out of Hell do Meat Loaf
The Neon God do WASP
Joe’s Garage – Frank Zappa
Live Dates – Wishbone Ash
Os Keys to Ascension do Yes não contam né?
Dá para citar também o Peter Gabriel com “Scratch My Bach” e o “And I’ll Scratch Yours”, Santana com seus volumes I, II, III e IV e (fugindo um pouco do Rock) o Jean-Michel Jarre com “Electronica 1”, “Electronica 2” e “Oxygene 1, 2 e 3”.
O caso do Jean Michel Jare poderia ser citado junto dos comentários do Mike Oldfield. Discos instrumentais.
Curioso ninguém ter mencionado Rick Wakeman e o Journey to the Centre of the Earth, um dos mais antigos a render uma sequência!
O Thick as a Brick do Jethro Tull também teve continuidade: 40 anos depois deste lançamento, o mestre Ian Anderson nos conta o que aconteceu com o Gerald Bostock, protagonista da história que veio ao mundo em 1972.
É verdade Igor. Bem lembrado
Caramba!!!
O texto, pelo tanto de coisa que faltou, deveria ter o dobro de tamanho…
Exatamente, meu caros Fernandão e chefão Mairon… Realmente esse texto sobre as sequencias de um respectivo disco merece uma continuidade, e os meus comentários sobre o grande clássico do Jethro Tull valeram muito a pena. Comentei sobre a versão orquestrada de Tubular Bells para complementar as outras sequências de Mike Oldfield citadas e ninguém me respondeu… Qual a opinião de vocês sobre esta versão que a Royal Philharmonic Orchestra fez em 1974 com a grande obra de Oldfield lançada um ano antes?