Discografias Comentadas: Black Flag (Parte I)
Uma das formações clássicas do Black Flag: Chuck Dukowski, Dez Cadena, Greg Ginn, Henry Rollins e Bill Stevenson.
por Bruno Marise
Os Ramones deram o pontapé pro Punk Rock com seu primeiro disco em 1976. A influência nos garotos da época foi imensa. De repente não paravam de pipocar grupos e mais grupos novos, seguindo a risca a filosofia DIY. “Faça você mesmo, mesmo que não saiba fazer direito”. A Califórnia foi um dos principais polos do então chamado Hardcore Punk, uma versão mais agressiva e rápida do Punk tradicional, com letras quase sempre políticas e críticas sociais ácidas. Criado em 1976 pelo hiperativo guitarrista Gregg Ginn, o Black Flag logo se destacou pelos shows apocalípticos, e por capitanear todo o movimento Hardcore dos anos 80, fazendo crescer a cena independente e tornando-se uma das mais importantes bandas do estilo. Nessa primeira parte de sua Discografia Comentada, vamos abordar a fase mais tradicional da banda, focada apenas no Hardcore.
Com uma de suas formações mais reverenciadas (Greg Ginn, Chuck Dukowski, Brian Migdol e o lendário Keith Morris nos vocais) o Black Flag gravou seu primeiro registro em 1978, o EP Nervous Breakdown. Em apenas quatro faixas, e 5 minutos de duração a banda destila toda sua agressividade, e cria pelo menos dois clássicos: A faixa-título e “Wasted“. Apesar de linhas de guitarra simples, Gregg Ginn já se destaca pela urgência dos riffs. Alguns consideram essa a melhor formação do Black Flag, mesmo tendo gravado pouquíssimo material.
Cansado dos mandos e desmandos do “chefe” Greg Ginn, Keith Morris deixa a banda em meio as sessões de gravação do segundo EP (Mais tarde ele formaria o Circle Jerks) junto com o baterista Brian Migdol que é substituído por Robo. O ex-Redd Kross, Ron Reyes (creditado como Chavo Pederast) assume os vocais, com um timbre mais rasgado e agressivo, diferente do estilo debochado de Morris. Jealous Againtraz em suas quatro faixas, quatro clássicos do Black Flag, e mostra uma banda ganhando cada vez mais personalidade. Gregg Ginn começa a investir em solos atonais, algo raramente visto no gênero.
Durante um show em Redondo Beach em 1980, Ron Reyes deixa a banda no meio do concerto, irritado com a violência da platéia. Em seu lugar entra Dez Cadena, fã do Black Flag. Com essa formação, lançam mais um EP, contendo três novas músicas e mais três porradas. A faixa–título é um dos maiores clássicos da banda, e seria regravada no primeiro álbum full length. Cadena segue o estilo vocal mais agressivo de Reyes, tornando o som do Black Flag cada vez mais brutal.
Após uma turnê extenuante, os berros de Dez Cadena na hora de cantar lhe custaram a voz, obrigando-o a deixar o posto e assumir a guitarra base. Um fã da banda de 20 anos, vocalista do S.O.A., de Washington já se correspondia com os membros do Black Flag há algum tempo. Durante uma excursão da banda pela Costa Leste, o jovem Henry Rollins finalmente conheceu os membros pessoalmente. Durante uma apresentação lhe ofereceram para cantar a música “Cloked In”. Com a transição de Dez Cadena para a guitarra, os caras convidaram o garoto para assumir de vez a vaga de vocalista. Com a nova formação, sai em 1981 o primeiro Full Length do Black Flag e a entrada do garoto foi crucial para a banda. A sonoridade do disco segue a linha dos EPs já lançados, mas Rollins canta com uma violência impressionante. Se as primeiras letras falavam de rebeldia adolescente, tédio e paranóia, em Damaged a banda assume de vez uma postura mais política e de crítica a sociedade. Essa nova faceta já fica evidente na faixa de abertura, o hino “Rise Above” (Braços de controle da sociedade/Derrubar/Nós vamos derrubar/Pensam que são espertos/Não podem pensar por si próprios/Derrubar/ Nós vamos derrubar/Riem de nós pela nossas costas/Eu me satisfaço com o que eles estão perdendo). “Police Story” também dá o tom do que a onda conservadora e a Era Reagan despertava na juventude da época: (Essa porra de cidade/ é comandada por porcos/Eles tiram os direitos/De todos os jovens/Entenda, nós estamos lutando uma guerra que não podemos vencer/Eles nos odeiam, nós odiamos eles/Não podemos vencer de jeito nenhum”). Apesar de uma produção inferior a dos primeiros registros, Damaged É considerado o melhor disco do Black Flag e é um dos pilares do Hardcore, sendo definindo todo um gênero. Curiosidade: É o primeiro e um dos únicos trabalhos a não conter a arte característica de Raymond Pettibon (irmão de Gregg Ginn) na capa, responsável por toda a identidade visual da banda.
TV Party (EP) [1982]
Já registrada em Damaged, “TV Party” foi regravada no EP homônimo e lançada juntamente com o hilário clipe. A música é uma crítica às pessoas que passam o tempo todo vendo TV, e acabam sendo sugados para um mundo inexistente: (“Eu não seria nada sem a minha TV por um dia… nem por um minuto/Eu não me importo mais em usar meu cérebro/Não há mais nada nele”). Apesar do tom sério, a canção tem um clima bem humorado e de deboche. O compacto também marca a entrada do baterista Bill Stevenson.
TV Party encerra a fase hardcore clássica do Black Flag, que em seus próximos trabalhos passaria a incorporar cada vez mais os experimentalismos, principalmente nas linhas de guitarra de Greg Ginn. Mas isso é assunto para a próxima semana. Até lá!