Rainbow – Long Island 1979 [2015]
Por Micael Machado
Há pouco tempo atrás, abordei aqui no site o álbum ao vivo Boston 1981, um dos vários bootlegs do grupo inglês Rainbow “oficializados” no mercado entre 2013 e 2016. Devido à boa repercussão da resenha (agradeço sinceramente aos vários comentários que o texto recebeu e ao engajamento dos nossos leitores com o mesmo), hoje gostaria de abordar outro disco que faz parte deste “pacote” licenciado pelo chefão Ritchie Blackmore à gravadora Purple Pyramid, uma divisão da Cleopatra Records. Trata-se de Long Island 1979 – Down To Earth Tour, registrado a 30 de Novembro de 1979 no Calderone Concert Hall, na cidade de Hempstead, no estado norte-americano de Nova Iorque, apenas dez dias antes do final da turnê americana do grupo naquele ano, e na mesma data do trigésimo quarto aniversário do baixista Roger Glover. A resenha será feita baseada na versão em vinil deste registro, pois o disco, ao que apurei, foi lançado separadamente apenas neste formato (ainda que em diferentes versões nas cores laranja, amarelo e preta), sendo que em CD o mesmo aparece apenas como parte de um box set chamado Down To Earth Tour 1979, que traz a íntegra deste show e do realizado em Denver apenas alguns dias antes (o qual também ganhou uma versão em vinil duplo), além de parte da apresentação em Chicago em outubro daquele ano, não podendo nenhum dos três ser adquirido de forma isolada neste formato de mídia física.
Contando em seu line-up, à época, com o baterista Cozy Powell, o tecladista Don Airey e o cantor Graham Bonnet (que havia substituído Ronnie James Dio alguns meses antes, e registrado o disco Down To Earth naquele mesmo ano), além dos citados Blackmore e Glover, e impulsionado pelo sucesso do single da canção “Since You’ve Been Gone” (sexto lugar na Inglaterra e presente no Top 100 dos Estados Unidos), o grupo fazia sua mais bem sucedida excursão ate então, em termos financeiros e de reconhecimento, nos Estados Unidos (curioso saber que parte dela foi como grupo de abertura do Blue Öyster Cult, o que nos dá uma ideia do “tamanho” do Rainbow no país à época), e o concerto registrado neste disco mostra uma banda já bastante entrosada e adaptada ao material executado, “azeitada” pelo longo período na estrada com seu novo “lead singer“. Infelizmente, a qualidade sonora do álbum em questão é bastante ruim, com o som muito baixo e abafado, os pratos de Powell “sibilando” constantemente nas caixas de som (dá a impressão de um rádio FM ligeiramente fora da sintonia ideal, consigo me fazer entender?), a voz de Bonnet “abafada” em meio aos demais instrumentos e o baixo de Glover por vezes quase sumido na mixagem. Seria possível imaginar que Blackmore e a gravadora simplesmente pegaram um dos muitos bootlegs do show existentes por aí, colocaram algumas fotos do guitarrista nas capas externas e internas (à exceção das capas de três singles da época, a imagem do “poderoso chefão” do Rainbow é a única de um membro da banda a aparecer no disco) e “soltaram” o mesmo no mercado em uma versão diferente das anteriores. Mas um detalhe nos faz pensar diferente: em todas as faixas, a guitarra do Sr. “Ricardinho Maispreto” está alta e cristalina, brilhando à frente da massa sonora dos demais instrumentos, o que nos mostra que alguma coisa em termos de mixagem deve ter sido feita antes da “oficialização” do concerto ao público em geral. Claro que, para os colecionadores de verdade, acostumados a bootlegs mal gravados cujo valor histórico é muito maior do que a qualidade cristalina das gravações digitais atuais, esta alegada “falta de qualidade” na gravação não chegará a atrapalhar muito a audição (eu, por exemplo, tenho discos não oficiais em meu acervo muito mais difíceis de ouvir do que estes, e não me furto de escutá-los e apreciá-los com o mesmo entusiasmo que um disco oficial “ao vivo” lançado pelos artistas), e, lá pela terceira ou quarta música do álbum, este fator já não será mais um problema aos ouvidos menos sensíveis.
E, por falar em “valor histórico”, o deste registro em questão é bastante relevante, Apesar de não contar com a tradicional abertura com a fala de Dorothy no filme do Mágico de Oz e a banda tocando um trecho da canção “Somewhere Over The Rainbow” (ambos citados no texto da capa externa, mas ausentes da versão final do disco), substituídos por alguns “sons eletrônicos” dos teclados de Airey, quando estes revelam os primeiros acordes de “Eyes Of The World” a senha está dada para um belo álbum ao vivo do Rainbow. Seguida pela mais cadenciada “Love’s No Friend”, as duas canções possuem alguns dos melhores solos de Blackmore no disco, e tem na sequência (intercaladas por pequenos trechos instrumentais da citada “Somewhere Over The Rainbow” e da clássica composição de Beethoven “Für Elise”) os dois maiores “hits” de Down To Earth, “Since You’ve Been Gone” e “All Night Long”, que completam o primeiro disco da versão em vinil duplo. Ao final da última, Bonnet anuncia o aniversário de Glover à audiência, e Airey puxa um “Parabéns a Você” cantado entusiasticamente pelo público americano, fazendo o baixista “corar um pouco debaixo de seu tradicional chapéu”, segundo o texto da capa interna.
Os quase vinte e sete minutos de “Lost In Hollywood” ocupam todo o lado C do vinil, e são maiores do que a soma de dois de quaisquer outros lados do disco. Claro que a faixa é um espaço para improvisos, solos e passagens dos músicos por trechos de outras composições. Um dos muitos bootlegs do show encontrados no mercado, chamado Roger’s Birthday Party, lista estes trechos separadamente em seu track list, sendo eles “Lost In Hollywood – Part I”, um trecho de “Beethovens Ninth” (em versão mais lenta, mas com arranjo semelhante, àquela registrada como faixa título do álbum Difficult to Cure), “Keyboard Solo”, “Drum Solo”, “1812 Overture” e “Lost In Hollywood – Part II”. Como visto, a faixa dá espaço para quase todos brilharem individualmente, além de já apontar os caminhos que o Rainbow seguiria logo em seguida em seus próximos registros.
Na última parte do concerto temos uma volta ao passado do grupo e de seu líder. Iniciando com um breve improviso de Blackmore à guitarra (chamado de “Richi’s Tune” no bootleg citado acima) e um curto trecho instrumental de “Lazy”, um dos muitos clássicos do Deep Purple (banda que contava, cabe alertar aos desavisados de plantão, com Ritchie e Roger em suas fileiras), canção citada com entusiasmo na capa interna como “tendo trazido suspiros extras às hordas presentes na beira do palco”, apesar de durar apenas alguns segundos, a “volta no tempo” continua com a vinheta “Blues”, passagem instrumental que Ritchie já executava nos palcos desde seus tempos no Púrpura Profundo, que aparece separando as clássicas “Man On The Silver Mountain” e “Long Live Rock ‘N’ Roll”, ambas remetendo aos tempos em que o baixinho Ronnie James Dio empunhava o microfone do Rainbow, e nas quais a performance de Graham Bonnet, apesar de compreensivelmente inferior à do fantástico cantor anterior, não soa nada decepcionante, pois, mesmo com estilos bastante diferentes entre eles, Graham consegue colocar sua personalidade nas faixas, ao contrário do que ocorreria com seu substituto, como escrevi na resenha do show de Boston citado no começo deste texto. As duas faixas aparecem no lado D do vinil, completando um show que, apesar de contar oficialmente com apenas sete canções, tem mais de uma hora de duração, e deve agradar aos verdadeiros fãs da banda, principalmente Àqueles que conseguirem superar mais facilmente a falta de uma qualidade sonora mais cristalina ressaltada acima.
Menos de nove meses depois, o Rainbow se apresentaria no Monsters Of Rock Festival em Castle Donington, na Inglaterra, naquele que seria o último show de Bonnet e Powell com o grupo, abrindo caminho para uma nova e exitosa (financeiramente falando) fase com Bob Rondinelli na bateria e Joe Lynn Turner nos vocais. O show do Monsters também teve seu lançamento oficializado neste “pacote” de discos, mas isto é conversa para um outro momento…
Track List:
Lado A
1. Eyes Of The World
2. Love’s No Friend
Lado B
1. Since You’ve Been Gone
2. All Night Long
Lado C
1. Lost In Hollywood
Lado D
1. Man On The Silver Mountain
2. Long Live Rock ‘N’ Roll
Impressionante lançarem um disco duplo sendo que dois lados tem menos de quinze minutos. Ver essa patifaria na guitarra do Blackmore, deixando os outros instrumentos sem nenhuma mixagem, me faz pensar quanto Page é um cara que prioriza os ouvidos dos fãs para a banda inteira ser ouvida, e não só ele. E além do que Page é muito mais gente boa.
E quanto ao track list, bom, nada de um “Stargazer” ou “A Light in Black”. Bonnet se apegou nas canções mais fáceis de Dio, e o repertório focado na era Bonnet realmente não me atraia. Vejo o Bonnet como o Lawton do Dio, com a diferença de que os discos de Lawton para o Uriah Heep conseguiram vencer e muito bem ao tempo, mesmo coma difícil tarefa de substituir Byron. Já os do Bonnet …