Raimundos – Raimundos [1994]
Por Bruno Marise
Em maio desse ano, completaram-se 26 anos de um dos discos de estreia mais impactantes do rock nacional. Mas por que um álbum tosco, barulhento, sujo e completamente desbocado conseguiu fazer tanto sucesso e vender milhares de cópias, agradando até o público de fora do rock? Calma que eu vou explicar. Ou tentar, pelo menos.
Sujeira, barulho, distorção, velocidade, putaria, bagaceira. Era tudo o que o rock brasileiro e a molecada da época precisavam na metade dos anos 90. E os Raimundos tinham isso de sobra, com uma pegada e uma energia elevadas ao extremo. Após uma década repleta de bandas pasteurizadas, megaproduzidas e totalmente comerciais (sem falar do auge do brega e do sertanejo corno), os Raimundos meteram o pé na porta, pegando na veia dos jovens sedentos por algo que fazia falta há muito tempo.
Nascido em Brasília, no final dos anos 80, o grupo tocava basicamente covers de Ramones, (Daí o nome, uma versão abrasileirada da banda nova iorquina) mas logo sacou que forró (todos os integrantes possuíam ascendência nordestina) era possível de ser tocado com guitarras, e passaram a fazer versões hardcore das músicas do forrozeiro Zenílton, mistura que foi intitulada de Forrócore. Com uma fita demo gravada em 1993 dando o que falar e correndo de mão em mão. Não demorou a aparecerem convites para tocar no Rio de Janeiro, e abrir para bandas como Ratos de Porão, Camisa de Vênus e também os Titãs, donos do selo independente Banguela, projeto da banda com o finado produtor Carlos Eduardo Miranda, que prometeu gravar 4 bandas diferentes com o orçamento de produção de apenas um disco dos Titãs.
Lançado em 1994, Raimundos, destilava músicas pesadas, letras recheadas de palavrões e referências a sexo, drogas e violência. Guitarras distorcidas, riffs pegajosos, baixão na cara, bateria frenética e letras cuspidas velozmente por Rodolfo, era como soava a estreia dos brasilienses, hardcore com muito peso e influências nordestinas. Completava a banda Digão(guitarra), Fred (bateria) e Canisso (baixo).
A primeira faixa é a já conhecida pelo público, “Puteiro em João Pessoa”, onde Rodolfo, filho de paraibanos, narra a aventura de sua primeira experiência sexual, proporcionada pelos dois primos mais velhos. Sem dúvida um clássico da banda, com um riff grudento, letra bem humorada e muita energia. “Palhas do Coqueiro” é o exemplo de como uma música de corno deve ser, “Debaixo de um teto de espelhos/É onde tu estás a me chifrar/Eu fico aqui coçando os meus córneos/Imaginando em que motel você está/Eu acho que o grande motivo agora eu sei/Você deve pensar que eu sou broxa ou que eu sou gay (…)”.
A maioria das faixas tem características e pegada muito parecidas, mantendo sempre a sonoridade pesada e as letras escrachadas. Ainda podemos destacar o primeiro single do disco, “Nega Jurema”, que conta a história absurda de uma traficante de maconha, que foi salva por um milagre. Uma verdadeira ode à cannabis que se repete em “Bê a Bá”: “Eu já conheço as pistoleira e cansei de mulher rampeira/A única que não me cansa é a tal de Maria Tonteira/Por ela eu como vidro, subo a nado cachoeira/Se ela vier prensada apertada é mais maneira”.
A temática nordestina é constante no disco, e aparece em praticamente todas as músicas, contendo até versões de canções regionais populares como “Cajueiro/Rio Das Pedras”, “Carro Forte” e “Deixei de Fumar (Cachimbo da Mulher)”, e inclusive o uso de instrumentos típicos como acordeon e triângulo. E não dá pra esquecer das poéticas “Bicharada”, “Cintura Fina” e “Minha Cunhada”, com sua pegada ramônica.
“Selim”, a última faixa, entrou meio a contra gosto dos integrantes, que não queriam uma “balada” enfiada em meio à porradaria. Mas foi ela que ajudou a alavancar as vendas de Raimundos, com sua letra debochada e melodia grudenta. Raimundos vendeu 150 mil cópias, recebendo disco de ouro, e provou que era possível fazer música pesada, com letras em português e ao mesmo tempo pagar as contas, e serviu de influência para inúmeros grupos que viriam depois, mesmo que muito menos relevantes e de qualidade inferior. No ano seguinte veio o disco de platina com Lavô tá Novo (1995) e a consagração nacional, mas foi aqui que os brasilienses botaram o rock pesado de novo no mapa do cenário musical brasileiro.
Track list
- Puteiro Em João Pessoa
- Palhas Do Coqueiro
- MM’s
- Minha Cunhada
- Rapante
- Carro Forte
- Nega Jurema
- Deixei De Fumar Cana Caiana
- Cajueiro Rio Das Pedras
- Bé A Bá
- Bicharada
- Marujo
- Cintura Fina
- Selim