Discografias Comentadas: UFO [Parte II]
Por Mairon Machado
Os anos 80 chegaram, e o UFO passava pelo dilema de encontrar um substituto para Michael Schenker, que agora estava à frente de sua Michael Schenker Group (MSG). A solução encontrada ainda em 1979 foi voltar ao passado, e efetivar Paul Chapman como o líder das seis cordas. De cara, partem para uma turnê pelos Estados Unidos, ao lado do Judas Priest e do AC/DC, encerrando a mesma em junho de 79. Em agosto, mudam-se para a ilha caribenha de Montserrat, e com a produção de nada mais nada menos que George Martin, começam a gravar o novo álbum do grupo.
No Place To Run [1980]
Concluído em apenas dois meses, em 8 de janeiro de 1980, chegava as lojas o primeiro álbum pós-Schenker. No Place To Run traz bons momentos, começando com a instrumental “Alpha Centauri”, com forte presença de sintetizadores, levando a “Lettin’ Go”, faixa que virou single e fez certo sucesso, contendo um grudento refrão entoando o nome da canção, e o solo de Chapman é em um estilo bem diferente do de Schenker, apostando em palhetadas rápidas e vibratos. Das faixas que lembram o UFO setentista, destaca-se “Gone in The Night” e seu pesado riff, além do trabalho musical com o piano de Raymond se sobressaindo, “Youngblood”, único single, que cairia tranquilamente em Obsession, e “Anyday”, ótima faixa que faz nos lembrar daquele UFO influenciado por Led Zeppelin. O álbum apresenta canções bem oitentistas, como “Money, Money”, que mesmo com o baixo galopante de Way, não consegue agradar, a própria faixa-título, a suave “This Fire Burns Tonight”, recheada de teclados, e a baladaça “Take It Or Leave It”. Destaque também para a cover de “Mystery Train” (Junior Parker e Sam Philips), apresentando uma interessante introdução ao violão. Bem mais americanizado que a fase Schenker, o disco alcançou a posição 51 na Billboard, surpreendendo até mesmo o grupo. A versão em CD de 2009 trouxe vários bônus, os quais são uma versão alternativa para “Gone in the Night” e mais três faixas gravadas no Marquee em 16/11/1980: “Lettin’ Go”, “Mystery Train” e “No Place to Run”, além de um grande livreto contando histórias da época de gravação do mesmo. Faixas inéditas dessa turnê estão no box The Chrysalis Years 1980-1986, destacando uma apresentação da banda na BBC em 04 de fevereiro de 1980, como lembra este texto. Um detalhe curioso sobre o lançamento deste álbum é que na capa, o nome do mesmo foi lançado em seis diferentes versões, cada uma com uma cor diferente (verde, azul, amarelo, púrpura, laranja e negro) além também da posição do nome do álbum, aumentando ainda mais as buscas dos colecionadores. Na Coréia, o álbum acabou saindo ainda com a capa inteira em cor diferente, totalmente rosa.
Antes da turnê de divulgação de No Place To Run começar, mais uma troca, agora com Neil Carter (ex-Wild Horses) substituindo Paul Raymond. Carter tocava teclados, guitarra, saxofone e ainda fazia arranjos orquestrais, e acabou empregando todos os seus dotes já na primeira participação com a banda, levando o UFO a se tornar quase uma banda AOR, mas ainda pesada graças a Parker e Way.
The Wild, The Willing and the Innocent [1981]
Lançado em 6 de janeiro de 1981, The Wild, The Willing and the Innocent é o primeiro disco auto-produzido do UFO, e traz um rock fácil e sem inspiração, caracterizando-se pela fraca participação de solos de guitarra. Curto bastante a pesada “Chains Chains”, com boa presença de Way e Parker, e também a novidade do saxofone na boa “Lonely Heart”, tocado por Carter. Os arranjos orquestrais de Paul Buckmaster também surpreendem, os quais estão na faixa-título, faixa bem aquém do esperado para uma música do UFO, na bela “Procession Of Violence”, talvez a mais linda faixa do grupo desde então, e com certeza tendo o melhor solo de Chapman na banda, e “Long Gone”, com um excelente refrão e um ritmo muito interessante. “Makin’ Moves” também é uma faixa bem legal, destacando novamente o refrão. “Couldn’t Get It Right” e “It’s Killing Me” soam arrastadas e repetitivas, pouco contribuindo para o resultado final de um disco bem mediano. Na versão digital de 2009, The Wild, The Willing and the Innocent ganhou um caprichado livreto e o bônus de “Hot ‘n’ Ready” gravada ao vivo durante o Reading Festival. O disco vendeu bem nos EUA, obtendo a posição 71, e na Inglaterra, dois singles foram lançados: “Couldn’t Get it Right” / “Hot ‘n’ Ready” e “Lonely Heart / Long Gone”, com o último conseguindo um relativo sucesso de vendas, alcançando a posição 19, a mesma do LP. Consta que John Sloman fez participações no álbum, mas as mesmas não foram creditadas. A capa original, onde um homem aparece atacando uma mulher pelas costas com uma espécie de soldador, foi vetada nos Estados Unidos, ficando apenas uma chama entre várias imagens não identificáveis, exatamente uma parte da capa original.
O UFO partiu em turnê novamente pelos Estados Unidos, agora abrindo para Ozzy Osbourne, e no Mountain Studios da Suíça, gravam o álbum mais bem sucedido dessa fase da banda.
Mechanix [1982]
Este álbum, produzido por Gary Lions, segue seu antecessor, empregando cada vez menos solos, e com um pé forte no AOR. Lançado em fevereiro de 1982, é um disco bem oscilante entre faixas boas e esquecíveis, e que representabem os anos 80. Das primeiras, ficam a boa revisão para”Somethin’ Else” (Eddie Cochran), o ritmo de “We Belong To The Night”, o bom solo de Chapman na mediana “Doing It All For You”, e a marcante presença do saxofone de Carter, e a grande faixa de Mechanix na ótima abertura, a paulada “The Writer”, outra com a participação de Carter no saxofone, além de fazer um interessante solo nos sintetizadores. Das esquecíveis, temos o hit “Back In To My Life”, com Mogg acompanhado por vocalizações femininas no refrão, e um terrível solo de Chapman (não sei como isso fez algum sucesso), a balada “Terri”, também com vocalizações femininas, a repleta de sintetizadores “Let It Rain”, na modernosa (e tinhosa) “You’ll Get Love”, com um riff nada inspirado de Chapman, e o rock básico e nada convincente de “Feel It”. Certamente, a ótima “Dreaming” é talvez a única faixa a merecer um rótulo UFO anos 70, graças ao socamento sem piedade na bateria Parker e o bom riff de Chapman. Não à toa, é disparada a melhor do disco. A versão japonesa deste álbum trouxe a faixa “Heel of a Stranger”, e o re-lançamento oficial de 2009 tem esta como bônus “We Belong To The Night” e “Let It Rain” (ambas gravadas ao vivo em Oxford), e “Doing It All For You”, gravada em uma passagem de som em Birmingham. Aqui ocorre a separação com a Hipgnosis, com a capa agora a cargo de John Pasche. Apesar de ser considerado um álbum mais mediano pelos fãs mais antigos, Mechanix agradou e muito a geração saúde dos anos 80, sendo o segundo álbum mais vendido na Inglaterra dentro da história do grupo, alcançando a posição 8 nas paradas dos charts da Billboard britânica (Strangers In The Night atingiu a sétima posição) puxado pelo compacto de “Back Into My Life”, tendo “The Writer” no lado B. Outro single retirado deste disco foi “Let It Rain”, “Heel Of A Stranger” e “You’ll Get Love” no lado B. Nos EUA porém, Mechanix atingiu a posição 82.
O UFO batalhava com a NWOBHM (sendo um dos precursores da mesma), e observava cada vez mais seus fãs originais irem em busca dos sons de Saxon, Angel Witch, Venom e Iron Maiden, enquanto que os novos fãs pouco ligavam para a longa e importante carreira do grupo. A turnê de Mechanix foi um fracasso de público, tendo poucos shows com lotação esgotada. Desanimado e desiludido, Mogg afundava-se em álcool, enquanto Way, que sempre usou e abusou de drogas pesadas, estava viajando muito em heroína. O pior de tudo para Way, e principalmente Mogg, era o fato de Schenker estar se saindo muito bem com a MSG, vendendo muito mais discos na América do que o próprio UFO, principalmente com o sensacional One Night At Budokan, gravado ao vivo no Japão.
Acabado pelas drogas e pelo cansaço, Way, o membro fundador da nave espacial, pede arrego e larga o UFO no fim de 1982, indo trabalhar em outros projetos, como a produção do álbum de estreia do Twisted Sister, participar rapidamente da banda de Ozzy Osbourne e montar o projeto Fastway, ao lado de Fast Eddie Clarke, ex-guitarrista do Motörhead. Pouco depois, Way construiu sua própria banda, o Waysted. Mogg ainda tinha um contrato a cumprir sob a alcunha UFO, e em total desânimo, vai para os estúdios registrar seu décimo primeiro disco.
Making Contact [1983]
Lançado em 14 de fevereiro de 1983, este álbum tem um domínio total de composições por Neil Carter (9 das 10 faixas tem a participação do músico), agora efetivado também a baixista. Produzido por Mick Glossop, o disco finca os pés do UFO no AOR, trazendo um excesso de sintetizadores em faixas como “Blinded By A Lie”, “No Getaway”, a romântica “Call My Name” ou a tinhosa “You And Me”. “A Fool For Love” e “All Over You” são canções que poderiam tranquilamente estar em Mechanix. As lembranças de um UFO setentista vai para momentos pesados na bateria, e breves passagens de guitarra, durante a pesada “The Way The Wind Blows”, a veloz “Diesel In The Dust”, a boa “When It’s Time To Rock” (único single do álbum), que mesmo com o cheirão de naftalina oitentista, consegue se destacar positivamente, e a pedrada “Push It’s Love”, com seu ótimo riff de baixo e um grudento refrão. Destaque total para Parker, o único que teve dignidade de tocar pesado e forte como nos bons tempos. A versão em CD de Making Contact trouxe apenas “Everybody Knows” como bônus, e o disco vendeu relativamente bem na Inglaterra, com a posição 32. Em compensação, nos EUA, o UFO ficou na humilhante 153.
Apesar da gravadora dizer não, Mogg tentou fazer uma excursão para divulgar o LP, contratando Billy Sheehan para o baixo. Porém, em um show na cidade de Atenas, Mogg desmaiou no palco devido ao abuso das drogas. A plateia acabou destruindo o local e quase linchando seguranças e banda, com Sheehan sendo atingido por uma garrafa. David Grey (ex-Damned e Eddie And The Hot Rods) ainda chegou a substituir Sheehan, mas já era tarde, e em abril de 1983, Mogg anunciava ao mundo o fim do UFO. Pouco depois, a Chrysalis largou no mercado a coletânea dupla Headstone – The Best of UFO, contando com 18 canções e cobrindo o período desde a entrada de Schenker até o fim do grupo, sendo o lado D gravado ao vivo no Hammersmith Odeon, no show de despedida do UFO. Entre as canções nos demais lados, músicas relacionadas aos ex-membros da banda, como “Fool For Your Lovin1” (Whitesnake), “She Said” (Lonestar), “Lovedrive” (Scorpions), “Armed and Ready” (MSG) e “Criminal Tendencies” (Wild Horses), sendo as mesmas belamente explicadas na incrível árvore genealógica incluída na capa interna do LP.
Dois anos se passaram e Mogg teve a ideia de trazer o UFO das cinzas. Para isso, chamou o velho companheiro Paul Raymond para os teclados, e agregou novos e virtuosos instrumentistas para as demais posições, com Paul Gray no baixo, “Atomik” Tommy McClendon (Tommy M) nas guitarras e Jim Simpson na bateria. Os ensaios começam e logo um novo contrato com a Chrysalis é feito, permitindo o lançamento do primeiro álbum do grupo em 2 anos.
Misdemeanor [1985]
Lançado em novembro de 1985, Misdemeanor pode ser tratado mais como um disco solo de Mogg do que da carreira do UFO. É um álbum marcado por canções de refrãos repetitivos, uma bateria quadrada como manda o som dos anos 80, e muita fritação nos solos de Tommy M, além da forte presença de sintetizadores. São raros os momentos dignos de nota aqui, vide o bom riff de “Meanstreets”, a chiclete, mas boa, “Blue”, trazendo um bom trabalho de construção musical, ou a surpreendente “Wreckless”, única com uma pegada de baixo e bateria lembrando a dupla Way/Parker. Mesmo com o single “This Time” chegando na posição 47 dos charts britânicos, é uma faixa aquém dos grandes momentos da banda. Outro single, “Night Run”, chegou na posição 94, mas também não tem atrativos além dos virtuosos solos de guitarra. Além disso, há baladas bem esquecíveis, vide “The Only Ones”, que fez parte da trilha do filme Car Trouble (1986), ou a terrível “Dream The Dream”, e faixas que criam expectativas positivas, e se tornam frustradas, vide “Name Of Love”, com seu empolgante riff inicial, mas chatíssimo andamento musical, ou “Heaven’s Gate” e “One Heart”, que caberiam perfeitamente em uma propaganda de cigarros dos anos 80. No Japão, Misdemeanor saiu com três bônus: “Night Run”, “This Time” e “Heaven’s Gate”, todas em versão remix. Existe uma rara versão promocional deste álbum onde a capa apresenta apenas a garota com a arma e sem a parte branca, com a capa traseira feita com uma fina folha de ouro.
Misdemeanor foi um fracasso em vendas, conseguindo apenas a posição 106 nos EUA, onde foi lançado em março de 1986, e 74 na Inglaterra. Mesmo assim, o UFO saiu em turnê pelos dois países e também Japão, o que ficou registrado no DVD Misdemeanor Tour. No Japão ainda saiu um CD promocional chamado Misdemeanour Tour Live 1985, muito cobiçado pelos fãs. Vale ressaltar que em alguns shows, a tecladista era nada mais nada menos que Barbara Schenker, irmã mais nova dos irmãos Schenker.
Ain’t Misbehavin’ [1988]
Como quarteto, já que Raymond saiu do UFO pouco depois da turnê, gravam seis faixas que viram o EP Ain’t Misbehavin’, lançado em 02 de fevereiro de 1988. É um álbum que mantém a linha AOR de Misdemeanor, como atestam “Between A Rock And Hard Place”, trazendo vocalizações femininas e um grande solo de Tommy M, e “Hunger In The Night”, com um refrão extremamente grudento, destacando outro bom solo de Tommy M. “Another Saturday Night” é um rock oitentista sem inspiração, também carregado de vocalizações femininas, e que faria Yahoo virar banda de metal, e “At War With The World” também traz vocais femininos, mas é uma canção mais agradável que as demais. Melhor faixa vai para “Easy Money”, onde Tommy M usa vários efeitos em um ótimo riff, lembrando bastante Van Halen fase Sammy Hagar, assim como a interessante “Rock Boyz, Rock”, inclusive com Tommy M brincando com os harmônicos que nem Eddie Van Halen. A versão em CD traz uma faixa extra, “Lonely Cities (Of The Heart)” que não acrescenta nada a carreira do UFO. A capa original com a mulher nua foi vetada nos EUA, onde o EP saiu com uma capa bem diferente.
Sem obter nenhum sucesso, Mogg novamente acaba com o UFO, mas não por muito tempo, como veremos mês que vem, na terceira parte da Discografia Comentada do grupo.
A segunda fase da carreira do UFO é prejudicada pelo excesso de mudanças de formação, com a perda de músicos importantes como Pete Way e Paul Raymond, e pelo fato de que a banda não conseguiu se adaptar aos novos tempos do heavy metal, tornando-se mais pop. Ainda assim, acho que tem coisa muito boa aí! “No Place to Run” não faz feio diante dos discos com Schenker, em especial porque Paul Chapman era muito bom e estava louco para mostrar serviço. “The Wild, The WIlling & The Innocent” muda profundamente o som da banda, mas, junto com o “Mechanix”, ainda consegue soar interessante. Particularmente, no “The Wild…”, acho que as músicas perderam força em estúdio, pois “Couldn’t Get it Right”, por exemplo, soa bem ao vivo, como se pode conferir na edição em CD de “Headstone”, que traz apenas o material ao vivo gravado no Hammersmith Odeon (mas também não traz o show completo). Enfim, na minha opinião o tropeço está mesmo em “Misdemeanor” e “Ain’t Misbehavin'”, porque Tommy M não encaixou com a banda – é só conferir o material ao vivo lançado pela banda posteriormente. Bom é que posteriormente o UFO limparia seu nome! Aguardando a terceira parte da discografia!
Grande banda o UFO, com seus altos e baixos como a maior parte dos grandes grupos de rock. Tentei encontrar a discografia comentada do UFO parte I e não apareceu nada. Utilizei o espaço onde tem a lupa, que diz “procurar”, e não consegui encontrar. Será que a parte I da discografia comentada foi deletada do site? Se puderem me ajudar agradeço muito, pois o momento mais marcante da carreira deles é a década de 1970. Obrigado e abraço.
Obrigado pelo comentário meu caro. Abraços
Olá Rodrigo, tudo bom? Segue o link para a primeira parte da discografia comentada do Ufo. https://www.consultoriadorock.com/2022/08/24/discografia-comentada-ufo-parte-i/ Abraço