Cinco Discos Para Conhecer: O Rock Sem Guitarra
Por Fernando Bueno
É tão forte a relação da guitarra com o rock que o instrumento acabou se tornando um símbolo do estilo. Por mais que os outros instrumentistas se esforcem e recebem certo destaque, ainda não chegou ao ponto de criarem um termo para eles como do guitar hero, aquele cara que todos querem ver tocando, que desenvolveu novas técnicas, que tem habilidades invejáveis e que lá no fundo todo mundo queria ser igual. Entretanto, por mais que a guitarra esteja tão vinculada assim ao rock, existe bandas que não possuem o instrumento ou um músico dedicado à ele em seu line up. Depois de um pouco tempo exercitando a memória acabamos lembrando vários deles e aqui trarei alguns exemplos que todos deveria conhecer. Conhece algo diferente dessa lista? Deixe sua indicação nos comentários.
Van der Graaf Generator – H to He Who Am the Only One [1970]
A grande diferença entre o Van der Graaf Generator e outras grandes bandas de progressivo é que, enquanto muitos músicos primavam pelo virtuosismo, Peter Hammil e seus companheiros tinham a melodia e harmonia como o ponto central de suas músicas. “Killer”, a minha música favorita da banda, tem um riff pegajoso feito pelo órgão de Hammil e pelo saxofone de David Jackson. Sua letra conta a história de um peixe que vive sozinho no fundo do oceano sem a companhia de ninguém porque ele simplesmente mata qualquer um que chegue perto. Os solos de guitarra são substituídos por um saxofone tocado freneticamente. As guitarras adicionadas em algumas músicas são sutis e foram gravadas por Robert Fripp do King Crimson. Em um primeiro momento, quando estamos nos iniciando ao mundo do Van der Graaf Generator os álbuns Pawn Hearts e Godbluff nos chamam mais atenção até por serem considerados os melhores por boa parte dos fãs, mas H to He Who Am the Only One com o tempo vai fazer o ouvinte se identificar por conter mais canções e não os temas épicos como os outros álbuns.
Formação: Peter Hammill (vocal, violão e piano), Hugh Banton (teclados, orgão e baixo), Guy Evans (bateria), David Jackson (saxofone, flauta e backing vocals), Nic Potter (baixo) e Robert Fripp (guitarra em “The Emperor In His War Room”)
Track List
- Killer
- House With No Door
- The Emperor In His War Room
- Lost
- Pioneers Over C
Diferentemente do Van der Graaf Generator, o Emerson Lalke and Palmer construia suas canções baseados no virtuosismo de seus músicos. Apesar de termos um violão direcionando “Still…You Turn Me On” é o solo de Emerson que comanda as ações. “Jerusalem” abre o álbum com talvez o melhor exemplo de como os teclados de Emerson preenchiam todos os espaços que talvez caberia à uma guitarra em outras bandas. E para aqueles que ainda não entenderam o que é rock sinfônico “Jerusalem” o exemplo definitivo. O álbum também contém talvez a faixa mais icônica da banda, “Karn Evil 9”, com seus diversos movimentos e a frase mais conhecida da banda: Welcome back my friends to the show that never ends. Um convite ao público ao fantástico show que a banda fazia na época. Para os detratores o “that never ends” refere-se ao longo tempo da música com seus quase 30 minutos. “Benny the Bouncer” é engraçadinha, mas é o ponto baixo do álbum. Já “Toccata” é mais uma adaptação (à exemplo de “Jerusalem”) e é de difícil assimilação para o ouvinte casual ou alguém que está se iniciando ao progressivo devidos aos seus tempos quebrados e a fúria com que o trio se dedicou à seus instrumentos.
Formação: Keith Emerson (teclados), Greg Lake (baixo, voz e violão) e Carl Palmer (bateria)
Track List
- Jerusalem
- Toccata
- Still…You Turn Me On
- Benny the Bouncer
- Karn Evil 9
Guitarra, baixo e bateria? Nenhum deles! Apenas sintetizadores fazem o som do Kraftwerk. Enquanto na época o Queen fazia questão de estampar em suas capas de discos que nos álbuns não existiam sintetizadores o Kraftwerk se fazia apenas deles. Os pais da música eletrônica começaram sendo colocados no bolo do krautrock. Até mesmo os vocais, em alguns momentos bem minimalistas, eram finalizados com o auxilio eletrônico, sendo distorcendo a pronuncia ou até mesmo gerados pelos instrumentos. Os álbuns anteriores são mais roqueiros se formos compará-los, mas foi com Autobahn que eles receberam o reconhecimento artístico e financeiro. O curioso é que eles são muito lembrados pelos músicos da cena eletrônica atual que atuam na linha da música pop, entretanto a faixa título não tem nada de pop com seus 22 minutos de duração. Confesso aos que não conhecem a banda que para se acostumar ao som do Kraftwerk é preciso passar por várias fasesantes, talvez com Vangelis, Mike Oldfield e Tangerine Dream. Mas depois de um pouco de prática o som dos autofalantes ficará mais usual aos seus ouvidos. A cargo de curiosidade ouçam “Heavy Metal Kids”, faixa ao vivo que não está presente nesse álbum e que faz parte de uma das diversas formações da banda que sequer foi chamada de Kraftwerk. Vale a pena pelo peso que eles conseguiram tirar dos sintetizadores.
Formação: Ralf Hütter (vocal e sintetizadores), Florian Schneider (vocal e sintetizadores), Klaus Röder (violino e guitarra) e Wolfgang Flür (percurssão)
Track List
- Autobahn
- Kometenmelodie 1 (Comet Melody 1)
- Kometenmelodie 2 (Comet Melody 2)
- Mitternacht (Midnight)
- Morgenspaziergang (Morning Walk)
Morphine – Cure for Pain [1993]
“Boa música para acompanhar um copo de whisky”. Foi dessa maneira que um amigo me apresentou o Morphine há uns 12 anos atrás. Aqui quem comanda é o saxofone. Em alguns momentos Dana Colley usa dois ao mesmo tempo. Parece inacreditável, mas é verdade. Mark Sandman, líder da banda, será sempre lembrado por ter falecido no palco devido à um ataque cardíaco, mas a música que eles criaram não pode ser esquecida. Cure For Pain é mais diversificado que o álbum anterior, Good (1992). Sua mistura de jazz, blues e rock é melhor trabalhada nas faixas sem se esquecer das levadas quase funk do baterista Jerome Deupree. Para citar uma faixa de destaque fico mesmo com “Cure for Pain”. Algumas pessoas não se acostumam com o saxofone durante a música toda, mas é só questão de costume mesmo. O som do instrumento tem muito a acrescentar ao rock. Outra peculiaridade da banda é o baixo de apenas duas cordas de Mark Chapman.
Formação: Mark Sandman (baixo, organ e vocal), Dana Colley (Saxofone barítono e saxofone tenor), Jerome Deupree (bateria), Billy Conway (bateria nas faixas 9 e 11), Jimmy Ryan (Bandolin na faixa 7) e Ken Winokur (Percurssão na faixa 13)
Track List
- Dawna
- Buena
- I’m Free Now
- All Wrong
- Candy
- A Head with Wings
- In Spite of Me
- Thursday
- Cure for Pain
- Mary Won’t You Call My Name?
- Let’s Take a Trip Together
- Sheila
- Miles Davis’ Funeral
Keane – Hopes and Fears [2004]
É muito provavél que os leitores torçam o nariz para esse disco. O fato da banda fazer parte do brit pop que dominou as paradas no final dos anos 90 e que tinha no Oasis seu maior expoente provavelmente seria o motivo dessa desconfiança. Pura bobagem. Também não concordo com as constantes comparações entre o Keane e o Coldplay. Todas as outras bandas citadas acima a guitarra foi substituída por alguma outro instrumento, mas no mínimo o baixo foi mantido. O caso do Keane é mais curioso ainda já que mesmo sendo um trio o vocalista Thomas Chaplin não faz outra coisa além de cantar. A parte musical fica toda a cargo de Tim Rice-Oxley com seu piano (ou eventualmente um teclado), tornando a música do grupo totalmente desplugada. Mas o melhor é que mesmo sendo apenas um instrumento o piano consegue preencher todos os vazios. Já vi vídeos da banda tocando ao vivo e mantive a mesma opinião. Claro que no álbum a gravação e a produção também influenciam muito nesse sentido. Hopes and Fears é sem dúvida o melhor disco do grupo. Sinceramente não consegui encontrar a mesma qualidade de suas músicas em outros lançamentos. A primeira metade do disco é claramente superior ao restante e se você não gostar de nenhuma das cinco primeiras faixas eu desisto de falar do grupo. “Somewhere Only We Knows”, “This is The Last Time”, “Bend and Break”, “We Might As Weel Be Strangers” e “Everybody’s Changing” têm tudo o que você espera de uma boa canção. Suas melodias fáceis são os que os ingleses e americanos chamam de catchy. Destaque para a voz afinadinha de Chaplin que consegue facilmente atingir tons altos como na melancólica “She Has no Time”.
Formação: Tom Chaplin (vocal), Tim Rice-Oxley (piano, teclado e baixo) e Richard Hughes (bateria)
Track List
- Somewhere Only We Know
- Bend and Break
- We Might as Well Be Strangers
- Everybody’s Changing
- Your Eyes Open
- She Has No Time
- Can’t Stop Now
- Sunshine
- This Is the Last Time
- On a Day Like Today
- Untitled 1
- Bedshaped
À parte o Keane, que não conheço, gostei bastante das indicações. Uma banda que eu acho que tinha um som bem legal sem guitarra (a formação era vocal, órgão, baixo e bateria) era o Still Life, que só lançou um disco pela Vertigo no começo dos anos 70. Também poderia citar o Triumvirat, que na maior parte das suas músicas não apresenta guitarra ou violões, e o Soft Machine, em especial do segundo álbum até o Seven, antes da entrada do Allan Holdsworth.
MUITO BOA LISTA INDICO UM TRIO TOP SETENTISTA CHAMADO QUATERMASS, LANCOU UM DISCO COM UMA CAPA LINDA, DISCAÇO.
Super bem lembrado! Discaço com Johnny Gustafsson, Mick Underwood e Pete Robinson, que rendeu a famosa “Black Sheep of the Family”, pivô da saída do Blackmore do Deep Purple. E de fato a capa era especial!!
Radiohead com três guitarras ficou sem guitarras no Ok Computer (ou Kid A, nunca sei o nome desses dois álbuns)
Indicações boas, Keane é a banda que quero conhecer
☺