Metallica – 72 Seasons [2023]

Metallica – 72 Seasons [2023]

Por Marcello Zapelini

72 Seasons, Ou Como Envelhecer com Dignidade

Ah, o Metallica… A banda que começou modestamente com quatro moleques cheios de espinha na cara nos anos 80 e lançou 40 anos atrás um dos maiores discos de estreia da história do heavy metal, Kill ‘Em All, em abril de 2023 soltou seu 11º álbum de estúdio – ou 12º, se você considerar a colaboração com Lou Reed, Lulu (um disco que ainda será reconhecido pelos seus méritos, podem me cobrar o motivo nos comentários) – 72 Seasons. A banda, desde pelo menos seu álbum homônimo de 1991, habita o panteão dos mitos do rock, e cada lançamento é recebido com a pergunta: terá o Metallica retomado a forma ou terá continuado ladeira abaixo, só com pé mais fundo (ou não) no acelerador?

Venho acompanhando a carreira do Metallica desde 1987, quando uma colega da universidade que adorava Motörhead (como eu) me emprestou o Master of Puppets – LP nacional da antiga gravadora RGE. E eu, que só conhecia a banda das reportagens na Rock Brigade e na Metal, gostei na hora – tanto que quando saiu o … And Justice for All, já tinha comprado os três primeiros discos. Eventualmente, Metallica estaria entre meus primeiros CDs (tenho até hoje, aliás) – importado, custou uma fábula mais de trinta anos atrás. Entretanto, a julgar pelo que vi nos DVDs, nunca senti vontade de assistir a banda ao vivo.

Agora vamos ao disco em si. Em primeiro lugar, as perguntas de sempre: o novo álbum é bom? Está à altura do passado? Ou será que é um novo St. Anger? Após ouvir várias vezes, minhas respostas são: sim; sim, em termos; e não, definitivamente não. 72 Seasons é um bom disco porque é pesado, com produção melhor que seus antecessores imediatos, e bem tocado. Está parcialmente à altura do passado, na medida em que está entre os melhores do grupo desde que o som mudou radicalmente em 1991, mas não é tão bom quanto os três primeiros. Mas definitivamente não é um experimento falhado como St. Anger. O álbum reflete os problemas pessoais que James Hetfield vem enfrentando, o que transparece nas letras amargas do álbum.

Para escrever essa resenha, procurei ouvir todos os discos de estúdio do Metallica novamente; algumas surpresas, como o fato de Kill ‘Em All ter subido ainda mais no meu conceito, Load ter caído um pouquinho, e algumas confirmações, como “St. Anger” continuar não me agradando de jeito nenhum – que diabo de som de lata velha é aquele da bateria do Lars Ulrich? Lembro que quando comprei o disco vinte anos atrás, gostei mais do DVD do que do álbum em si; confesso que não tive vontade de assistir de novo. Mas vamos ao 72 Seasons, que na minha lista atualizada do pior para o melhor ficou exatamente na metade, em sexto lugar.

Ao abrir a embalagem do CD, fiquei meio espantado com as carinhas simpáticas (atenção: ironia intencional) de Hetfield, Ulrich, Hammett e Trujillo – eles parecem mais velhos do que os 60 anos que têm (Hetfield e Hammett) ou estão perto (Ulrich e Trujillo). Foi impossível não lembrar das fotos de Kill ‘Em All, com os rapazes com as caras cheias de espinha, e lembrar que o tempo não espera por ninguém (Time Waits For No One, já diriam os Rolling Stones). A voz de James está envelhecida, mas honestamente prefiro seu vocal atual ao do começo da carreira; Lars está tocando bem, com boa variação na bateria; Kirk está desempenhando bem como quase sempre fez; Robert tem seus momentos de brilho ao longo do disco, mas parece ser impossível escapar da sombra do grande Cliff Burton – talento não lhe falta, mas às vezes penso que não lhe dão espaço para mostrá-lo.

O álbum começa e termina muito bem: “72 Seasons” e “Inamorata” estão indubitavelmente entre as melhores músicas deste novo disco e, em especial a segunda, poderão estar presentes nas setlists futuras da banda sem problemas. “Lux AEterna”, lançada como single quatro meses antes do álbum, é curta (3’22”; de todas as músicas compostas por eles e lançadas oficialmente, só “Motorbreath” e “Hardwired” são mais curtas), direta e pesada, e é outra que poderá permanecer nos setlists das futuras turnês. No outro extremo, “Inamorata”, com 11’10”, tornou-se a música mais longa gravada em estúdio pela banda – mas passa longe de monótona, conseguindo se manter interessante o tempo todo. Hetfield volta a falar de “misery” na letra – e como não lembrar de “My Friend of Misery” do disco de 1991? Mas entre a primeira e a última músicas, felizmente, tem muita coisa boa.

“Too Far Gone” é outra música sem grandes firulas, e mesmo o solo de Kirk é curto e direto. Falando nisso, “Screaming Suicide”, durante o solo me traz à cabeça Ritchie Blackmore no clássico “Speed King” (confira a passagem aos 3’29” e compare com os riffs de Blackmore após o duelo com Lord – na versão ao vivo em “Scandinavian Nights” fica ainda mais nítida a influência). “You Must Burn!” e “Sleepwalk My Life Away” soam como o Metallica do álbum homônimo: a primeira me lembra “Sad But True” e a outra, “Enter Sandman” – não se trata de autoplágio, mas as músicas se assemelham um pouco. Por outro lado, a pesada e rápida “Room of Mirrors” evoca memórias das músicas do começo da carreira, até o Master of Puppets, sem entretanto deixar sensação de dèja-vu. “If Darkness Have a Son” entrou direto na minha lista pessoal das melhores letras do Metallica, com imagens bastante fortes que transmitem a dor e o desespero que James vivia quando do processo de composição, embora a música em si não esteja entre as melhores do álbum.

Como letrista e vocalista seu desempenho é uniformemente bom, e na guitarra rítmica em “Chasing Light” é digno de aplausos pela consistência. Enfim, se alguém deve receber os louros pelo disco, é James Hetfield. Por outro lado, senti falta de uma instrumental; “Orion”, “The Call of Kthulu” e até a mais recente “Suicide and Redemption” sempre estiveram entre as minhas músicas favoritas do Metallica. Além disso, desde “Fade to Black” que a banda mostra que consegue construir uma música a partir de um início lento, quase uma balada, e levá-la ao extremo; essa dinâmica também faltou, no meu ponto de vista, no novo álbum. Isso não o invalida e nem o torna pior, mas deixa aquela sensação de que o disco poderia ser melhor – ou ser mais variado.

72 Seasons está vendendo bem, mas não deixa de ser uma certa decepção comercial, na medida em que não atingiu a 1ª posição da Billboard – quebrando uma sequência de sete primeiros colocados que começara com …And Justice for All (sendo que de Metallica a Hardwire… To Self Destruct, todos os discos da banda estrearam no primeiro lugar da Billboard, um recorde compartilhado com a Dave Matthews Band). A banda tem divulgado o disco em sua turnê M72, e o setlist está bem variado, incluindo músicas de todas as fases da carreira, já tendo apresentado ao vivo oito das doze canções de 72 Seasons de acordo com o Setlist.fm. Se passar por aqui, quem sabe dessa vez vou no show…

72 estações, 18 anos, do nascimento à maturidade. O Metallica amadureceu, quebrou a cara, reergueu-se, e agora enfrenta começa a enfrentar o ocaso da vida, sabendo que sua música demanda força e entusiasmo normalmente associados aos jovens. Lars admitiu que o processo de composição tem se tornado um pouco frustrante, demorando
muito tempo para ficar satisfeito com as músicas. Mas, de minha parte, se vierem mais discos bons como 72 Seasons, espero que os quatro não se aposentem tão cedo – mas se continuarem demorando 7-8 anos para lançar um novo, não me permito ser otimista.

Track list

  1. 72 Seasons
  2. Shadows Follow
  3. Screaming Suicide
  4. Sleepwalk My Life Away
  5. You Must Burn!
  6. Lux Æterna
  7. Crown Of Barbed Wire
  8. Chasing Light
  9. If Darkness Had A Son
  10. Too Far Gone?
  11. Room Of Mirrors
  12. Inamorata

3 comentários sobre “Metallica – 72 Seasons [2023]

  1. ¨…7-8 anos para lançar um novo…¨???!!!!! Fato que o mundo nesse tempos apenas piora, nossa política hipócrita também só piora e ouvir Metallica ajuda a esquecer um pouco essa loucura dos homens que todos os dias vemos na TV…apenas violência e uma política que apenas visa o lucro, triste essa nossa realidade!!!! Sobre 7e Seasons, é um bom disco sim…gosto da arte da capa do disco e vejo com bons olhos essa evolução do Metallica!!!! Infelizmente sempre haverá essa comparação com os discos das antigas, eu não comparo…apenas gosto de ouvir determinadas músicas que me trazem boas lembranças em termos de tudo!!!! Claro que o disco atual do Metallica vai e está recebendo críticas boas e negativas, uma coisa eu digo…independente de ser um disco bom ou ruin, sua legião de fãs apenas cresce mais ainda!!! Valeu!!!!

    1. Legal, cara! Eu bem que tento, mas é difícil não comparar… O bom é que 72 Seasons acabou saindo um disco bem agradável e interessante. O futuro do Metallica, só esperando para ver o que virá…

  2. Concordo com o Marcello. Consegui ouvir o disco esse fim de semana, e o início e o fim são muito bons. Encerrar com uma faixa de 11 minutos é uma ousadia bem grande.

    Como nos discos anteriores, o que acaba cansando é a longa duração. O Metallica podia diminuir algumas faixas, fazendo um álbum de 50 minutos, e mais coeso. Mas sim, é um belo disco, melhor que o Hardwired e o St. Anger com certeza, mas ainda abaixo do Death Magnetic ao meu ver, e certamente vai figurar nas listas de Melhores de 2023

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