O Alcatrazz com Doogie White
Por Fernando Bueno
O Alcatrazz foi formado por Graham Bonnet depois da sua saída do Rainbow. Como quase todas as separações envolvendo Richie Blackmore, Bonnet saiu de forma meio conturbada e repentina. O Rainbow estava em fase inicial das gravações de Difficult to Cure, que acabou sendo o álbum de estreia de Joe Lynn Turner na banda do ex-Deep Purple. Com o Alcatrazz, Grahan Bonnet trouxe para o estrelato um jovem Yngwie Malmsteen e vários outros ótimos músicos e fez bastante sucesso ali na primeira metade dos anos 80. Exceto por algumas reuniões para shows específicos e especiais, o grupo ficou vários anos inativo desde a década de 80 até um disco que saiu meio que do nada em 2020, Born Innocent, o que prometia uma volta triunfal da banda. Essa reunião durou exatamente UM disco e poucos meses e se separaram de novo. Graham Bonnet saiu para formar seu próprio Alcatrazz com Jeff Loomis na guitarra, sem nenhum registro em disco ainda, enquanto Jimmy Waldo e Gary Shea, teclados e baixo, respectivamente, oriundos lá da primeira formação seguiram em frete com uma nova formação.
Substituir um guitarrista tão marcante como Yngwie Malmsteen é sempre um problema, mas o Alcatrazz encontrou alguém que desse conta do recado. Malmsteen é bastante lembrado por essa passagem pela banda, mas efetivamente mesmo só gravou o álbum de estreia, No Parole from Rock ‘n’ Roll (1983), e um álbum ao vivo, Live Sentence (1984) – mais material foram saindo ao longo dos anos em resgates de material ao vivo, mas nada de inédito. Aí o grupo encontra um novo jovem guitarrista com habilidades tão fantásticas quando Malmsteen, Steve Vai, recém-saído da banda de Frank Zappa com quem gravam Disturbing the Peace (1985). Depois de Vai mais um guitarrista, agora pouco conhecido, apareceu para o terceiro disco, Dangerous Games (1986), Danny Johnson que estava tocando com o Alice Cooper. Mais informações sobre esses primeiros álbuns você pode ler na Discografia Comentada aqui na Consultoria do Rock por esse link aqui – o texto saiu em 2017, portanto antes de todos esse material da volta.
Detalhei um pouco a troca de guitarrista, pois isso é um fator bastante sensível para os fãs de Alcatrazz. As habilidades dos músicos dessa posição é um fator importante então quando soubemos da volta da banda ainda em meados de 2019 o primeiro nome que chamou atenção foi o de Joe Stump, um guitarrista bastante experiente, com diversos álbuns solos e participação em algumas bandas de menor expressão. Porém seu talento foi provado no álbum já citado acima, Born Innocent.
Para não dizer que não citei sobre os bateristas, acrescento que pelo menos no ínicio da banda houve uma permanência constante com Jan Uvena gravando todos os álbuns dessa primeira fase. Porém ele mesmo substituiu o baterista original que foi nada menos do que o ex-Iron Maiden Clive Burr. Depois disso vários músicos passaram pelo grupo e nenhum ficou por muito tempo.
Depois dessa longa introdução finalmente entraremos no tema do texto, pois apesar da banda ter sido montada por Graham Bonnet ela seguiu carreira sem a figura do seu principal fundador. Porém Gary Shea e Jimmy Waldo também tem todo o direito de ter seu Alcatrazz de estimação. E por que não trazer um vocalista que também já esteve no Rainbow? Ou até mesmo alguém que também já havia substituído Bonnet em outra banda, o Michael Schenker Group? Por outro lado é até injusto classificar o escolhido, Doggie White, simplesmente como ex-vocal do Rainbow, ou ex-MSG. Quando pegamos a lista de bandas e discos que o cantor já gravou é fácil se perder. Desde os primeiros trabalhos com o La Paz, Doggie White já participou de discos do Rainbow, Cornerstone, Yngwie Malmsteen, Praying Mantis, Tank, Michael Schenker, entre outros. Alguns dizem que ele foi um dos que estavam na mesa para escolha do substituto do Bruce Dickinson lá em 1994-1995. Ou seja, não falta informação para o seu currículo. E não basta apenas currículo, Doggie White tem uma ótima voz e isso é indiscutível. Então como ficaram esses discos do Alcatrazz com a voz dele?
De cara podemos definir uma coisa: o Alcatrazz fica bem mais metal com White nos vocais. As músicas do grupo sempre rondaram a tênue linha do limite entre hard rock e heavy metal. Elementos de AOR também foram frequentes em diversos momentos. Em V, álbum lançado em 2021, apenas dez meses depois do álbum anterior ainda com Bonnet, isso já tinha esse direcionamento bem estabelecido. As faixas mais rápidas são frequentes, bumbo duplo e riffs marcantes. Em alguns momentos a banda até se aproxima do power metal, soando como um Stratovarius em seus bons momentos. Nesse caso, tenho que dizer, muito mais por conta da guitarra de Joe Stump do que da voz de Doggie. Sua voz também não tem o range de Graham Bonnet, mas é muito versátil e ele consegue colocar mais agressividade nos momentos em que a música pede do que o antigo cantor. Em vários momentos anos parece Biff Byford cantando em outros até o Dio. Na sua passagem pelo Rainbow e no Praying Mantis ele experimentou essa faceta mais AOR que o Alcatrazz sempre teve e com o Tank o heavy metal mais tradicional é a tônica. Ou seja, sua bagagem anterior trouxe muita coisa e acrescentou bastante ao som do Alcatrazz.
O quinto disco da banda, nomeado apenas de V, tem várias faixas que chamam atenção. “Guardian Angel” abre o disco de forma bastante enérgica, com todos os músicos conseguindo mostrar a que veio. Em “Turn of the Wheel” a lembrança de que Malmsteen já fez parte da banda volta à memória e durante todo o álbum tentamos adivinhar como ele seria com Bonnet. “Dark Day for My Soul” é uma faixa bem diferente do que o Alcatrazz já fez. Iniciando com apenas voz e piano é um estilo de balada um pouco incomum para o estilo do grupo, causa um pouco de estranheza em um primeiro momento, mas com um tempo agrada.
Mas é em Take no Prisoners que essa formação me parece mais azeitada. O nível das músicas é melhor e as características dos músicos foram mais bem aproveitadas. Principalmente quando falamos de Doogie White, mas é em Joe Stump que eu acabei focando minhas atenções. Impossível não citar novamente o sueco voador, mas aqui as características neoclássicas que fez a fama de Malmsteen é executada com muita naturalidade por Stump. E isso não deveria ser uma surpresa já que seus discos solos sempre foram calcados nesse estilo. A participação das integrantes do Girlschool fazendo backing vocals em “Don’t Get Mad…Get Even” deu um frescor para a música. Citei o Dio anteriormente e “Strangers” poderia muito bem estar em um disco do Heaven & Hell e “Power in Numbers” seria uma boa faixa no Perfect Strangers do Deep Purple. Normalmente quando um grupo lança um álbum ou mesmo uma música isolada com o nome da própria banda é uma maneira de estabelecer ao mundo que aquela formação ou até mesmo aquela sonoridade é o que melhor os representa e eu entendi dessa maneira a fixa “Alcatrazz”.
Para finalizar não posso deixar de comentar a criativa capa de Take no Prisoners no melhor estilo de poster de filmes. Lembrei da época que eu pedia os posters para o dono do cinema para depois que o filme fosse tirado de cartaz. Também foi a primeira vez que vi uma banda citar os antigos integrantes em um encarte de disco. Só não consegui me decidir se isso foi um modo de cutucar alguém (pensou no Graham Bonnet?) ou só uma lembrança simpática mesmo. Em entrevista recente Jimmy Waldo chega a falar que White seria mais adequando ao som da banda que Bonnet, mas não deu entender se é algo pontual, de momento, ou se ele quis falar de uma maneira mais ampla. Cada um que fique som sua conclusão.
Não sabia que o Alcatrazz estava circulando com Doogie White no vocal… A resenha despertou a curiosidade, vou conferir!
Boa Marcello
Depois volta aqui e diz o que achou,
Só ouvi os dois discos uma vez cada um, mas foram agradáveis surpresas. O Alcatrazz não precisa mais do Graham Bonnett… E que bom guitarrista, esse Joe Stump!