U2 – Songs Of Surrender (SUPER DELUXE EDITION) [2023]
Por Marcello Zapelini
SONGS OF SURRENDER”– VENCER PELA BELEZA OU PELO CANSAÇO?
Como muita gente da minha geração, conheci o U2 por meio de sua performance no Live Aid em 1985. Fiquei impressionado com o então desconhecido Bono inserindo clássicos do rock numa longa interpretação de “Bad”, e pouco depois essa impressão favorável foi comprovada ao assistir ao vídeo do show em Red Rocks (“Under a Blood Red Sky”), que a rede Globo exibiu num sábado à tarde num programa de aproximadamente uma hora. Ou seja, faz quase 40 anos que sigo a carreira dos irlandeses. Os dois últimos álbuns de material original, Songs of Innocence e Songs of Experience não ranqueiam muito alto na minha lista de favoritos da banda, então, quando o grupo anunciou o lançamento de um álbum com clássicos reinventados, seguindo os capítulos da autobiografia de Bono, não fiquei muito entusiasmado.
Após ouvir a versão normal na Internet, decidi que queria mais e comprei a versão Super DeLuxe em 4 CDs, e é esta que passo a resenhar aqui. As quarenta regravações cobrem quase todos os álbuns da banda, pois apenas October e No Line in the Horizon não são representados, e Pop o é por apenas uma música; The Joshua Tree, Achtung Baby, All That You Can’t Leave Behind, How to Dismantle An Atomic Bomb e Songs from Innocence, por outro lado, têm quatro músicas cada um regravadas. Por fim, “11 O’Clock Tick Tock” e “Invisible” foram originalmente lançadas como singles; “Electrical Storm” veio da coletânea The Best of, 1990 – 2000 e “Ordinary Love”, da trilha sonora de Mandela: Long Walk to Freedom. A impressão geral é que o disco tornou belas algumas músicas que não funcionavam muito para mim em suas versões originais, não chegou a prejudicar aquelas que já gostava, na maioria dos casos, e errou em algumas regravações. Mas a versão completa, com mais de 165 minutos (cabia em três CDs, mas o U2 é um quarteto, não um trio…), acaba sendo um pouco cansativa. Por quê? Porque na maior parte do tempo o que se tem é a dupla Bono/The Edge sozinhos, sem a participação de Adam Clayton e Larry Mullen Jr.; o baterista, com problemas de saúde, contribuiu com a percussão em algumas músicas, e o que se ouve nas músicas com bateria, na maior parte do tempo, são loops previamente gravados.
Alguns convidados especiais dão as caras em várias músicas, com destaque para Bob Ezrin, Duncan Stewart e o baterista de Paul McCartney, Abe Laboriel Jr. Mas o que impera é um clima intimista que remete a uma dupla de amigos sentada na sala de sua casa, tocando as músicas que mais gostam, o que na versão completa acaba ficando um pouco monótono. De acordo com The Edge, foram regravadas cerca de cinquenta músicas, com dezesseis selecionadas para o CD, vinte para a versão DeLuxe e quarenta para a Super DeLuxe. Isso significa que quando o álbum aniversariar, fãs podem esperar uma Super Ultra Special DeLuxe Box Set com as músicas que faltaram (provavelmente com um preço exorbitante; afinal Bono precisa sobreviver para denunciar a pobreza do mundo)…
Mas, falemos do álbum atual. Algumas músicas antigas cresceram no meu conceito. Uma música que nunca gostei, “Who’s Gonna Ride Your Wild Horses?”, beneficiou-se muito do novo arranjo, em especial pela interpretação mais contida de Bono; “Stories for Boys”, do primeiro álbum, também não chamava muito minha atenção e saiu-se bem aqui. “Out of Control” era uma que não gostava do final e aqui ficou na medida exata. “Stuck in a Moment You Can’t Get Out Of” era uma música que gostava, passei a achar mais ou menos, e neste álbum, voltei a gostar. A vida não é ponteiro de relógio, mas dá muitas voltas. E “Lights of Home”, que não me chamava a atenção, é um destaque de Songs of Surrender.
Outras já eram boas e tiveram ganhos com as regravações. Gosto muito de “Sunday Bloody Sunday” unplugged, ainda que não seja novidade. “Dirty Day” é uma que sempre achei linda, e aqui, com o arranjo dos violoncelos, conseguiu ficar ainda melhor. “Two Hearts Beat as a One”, é apresentada num arranjo mais atraente que o original e se beneficiou da voz madura de Bono; seria legal tê-la no setlist dos shows que estão sendo feitos para promover o álbum. “Pride (In the Name of Love)” é outra que ganhou com a nova versão, pois a interpretação contida de Bono e The Edge fez a música ressuscitar; não sou muito fã de corais infantis, mas o que colocaram no final foi um detalhe atraente. “Red Hill Mining Town”, com seu novo arranjo de metais, ficou fantástica e é possivelmente o melhor argumento em favor do álbum que alguém pode apresentar. Essa música sempre esteve entre as minhas favoritas em The Joshua Tree, e aqui se mostra à altura do passado.
“Walk On”, com sua letra reimaginada para tratar da guerra na Ucrânia, é mais uma música boa que se saiu bem na regravação. O clima intimista de “Sometimes You Can’t Make it on Your Own” também tornou melhor o que já era bom no original. “Until the End of the World” continua impressionante como em Achtung Baby, só que agora com um belo trabalho de violões. Ainda tem aquelas que não consigo me decidir. “11 O’Clock Tick Tock” está à altura da versão de estúdio, mas perde muito para a definitiva em Under a Blood Red Sky. Já “The Miracle (of Joey Ramone)”, que era uma das melhores em Songs of Innocence, ficou no empate; o novo arranjo não acrescentou muito, mas não piorou a música. “City of Blinding Lights”, com um piano proeminente, melhora um pouco sem a guitarra irritantemente aguda do original, mas a versão não acrescenta muito. “All I Want is You” continua linda, mas sinto falta da extensa coda da original – poderia ter sido incluída uma nova, ou rearranjar a antiga.
Há casos no mínimo difíceis de se tratar. Por exemplo, “One” não precisava ser regravada; a versão original ainda é a melhor que se pode ter, e embora a nova não seja ruim, ela não acrescenta nada, apesar de a melodia ter ficado bonita no piano. Um problema semelhante acomete “With or Without You”, produzida (?) por Bono; acredito que não encontrarei um fã sequer do U2 que vá preferir a nova versão à original – mesmo que, mais uma vez, a nova não seja ruim! “Bad” é outra que não foi prejudicada pela nova regravação, mas também não conseguiu fazer a gente desistir de ouvir a original – e particularmente, a versão ao vivo em Wide Awake in America permanece minha favorita. Por fim, temos as bolas fora – felizmente em menor número do que as que foram chutadas no gol. “Desire”, cantada em falsete pelo The Edge, perdeu muito. A nova versão não tem energia – que é o que realmente tornava a música boa! “Stay (Faraway, So Close)” foi outra que perdeu muito, pois a bateria de Larry conferia à música boa parte do seu charme.
“Vertigo”, sem as guitarras pesadas do original, é outra que só consegue ser comparada desfavoravelmente. “Get Out of Your Own Way” era ruim no original, e conseguiu piorar. Quando penso nas músicas que poderiam ser regravadas e colocadas no lugar dessa bomba… Todo fã do U2 provavelmente tem sua lista das músicas que gostaria de ver regravadas, e eu não sou exceção. Fico pensando em como teria sido bela uma “The First Time” em versão voz e piano. Teria adorado “Last Night on Earth” e “Wake Up Dead Man” sem a produção de Pop (a última ficaria fantástica num violão de corda de aço!). Ou “Seconds” com a voz atual de The Edge. Nenhum deles escolheu essas músicas, fazer o quê?
Em suma, entre erros e acertos, Songs of Surrender revela a beleza oculta em algumas melodias, perde um pouco em outras, e certamente não faz milagres, mas merecerá muitas audições por parte dos fãs do U2. Quem não gosta vai ter motivos de sobra para esculachar a banda, mas não creio que eles tenham feito o álbum pensando nos seus detratores. Eu, que sempre apreciei a banda, embora tenha gostado do disco como um todo, até hoje não consegui ouvir os quatro CDs numa sequência. Renda-se à beleza ou renda-se ao cansaço; estranhamente Bono e The Edge conseguiram as duas coisas.
Track list (Edição SUPER DELUXE)
- One
- Where The Streets Have No Name
- Stories For Boys
- 11 O’clock Tick Tock
- Out Of Control
- Beautiful Day
- Bad
- Every Breaking Wave
- Walk On (Ukraine)
- Pride (In The Name Of Love)
- Who’s Gonna Ride Your Wild Horses
- Get Out Of Your Own Way
- Stuck In A Moment You Can’t Get Out Of
- Red Hill Mining Town
- Ordinary Love
- Sometimes You Can’t Make It On Your Own
- Invisible
- Dirty Day
- The Miracle (Joey Ramone)
- City Of Blinding Lights
- Vertigo
- I Still Haven’t Found What I’m Looking For
- Electrical Storm
- The Fly
- If God Send His Angels
- Desire
- Until The End Of The World
- Song For Someone
- All I Want Is You
- Peace On Earth
- With Or Without You
- Stay (Faraway, So Close)
- Sunday Bloody Sunday
- Lights Of Home
- Cedarwood Road
- I Will Follow
- Two Hearts Beat As One
- Miracle Drug
- The Little Things That Give You Away
- ”40”
Confesso que não me animei a ouvir esse disco ainda. Medo é a palavra certa, por que não quero me decepcionar com o U2 (o mesmo ocorre com a regravação do Dark Side of the Moon).
Aliás, o que está passando na mente de velhos artistas em regravar canções que já são atemporais, criando obras totalmente deletáveis (para a maioria dos fãs) e sem a mínima propriedade perante a grandiosidade dos originais? É tanta necessidade de dinheiro mesmo, como bem citado no texto do Marcello?
Certamente o motivo não é dinheiro! Quem ganha grana com disco hoje em dia? Aliás, o produto disco caminha para a extinção e pouquíssimos, que não justificam um lançamento dessa magnitude, se importam com o formato. Então, para que isso, U2? Para que lançar uma porcaria dessa que nem o fã mais xiita de vocês tem coragem de elogiar? Bono, The Edge, Adam Clayton e Larry Mullen Jr., se um de vocês ler isso, me responda, por favor…Será que vocês não tem ninguém próximo à banda que podia ter sido sincero sem risco de perder o emprego e dizer “Pessoal, não lancem essa merda, não! Isso não condiz com a carreira da banda, que vocês lutaram tanto para construir!”…Será que Paul McGuinness permitiria uma burrada dessas?
Eu não sei o que motiva essas regravações. Para ser honesto, o único disco de regravações que eu realmente gosto é o 3º CD da box set do 25º aniversário do Jethro Tull, “The Beacons Bottom Tapes”. Oficialmente, a explicação do U2 é adaptar as músicas à voz atual do Bono – mas em alguns casos não parece ter tanta mudança assim na voz do mancebo…
Recomendo esse disco como soporífero. Aliás, o U2 deve fazer uma parceria com a ANVISA para incluir SONGS OF SURRENDER como remédio contra insônia. Temos aqui músicas muzak da pior qualidade, sem gana, cansadas e insípidas, ou seja, músicas para serem ouvidas por quem já viveu o melhor de sua vida, não tem energia para mais nada e está sentado, com a boca escancarada cheia de dentes, esperando a morte chegar. Que disco chato, meu deus do céu!!!!!!! Me arrisco a dizer que esse projeto é o maior fracasso artístico do U2, e de longe, muito longe, e bota longe nisso. A pressão sobre Bono & cia para que o próximo disco de inéditas da banda faça o mundo esquecer desse abacaxi chamado SONGS OF SURRENDER, tenha guitarras chiando por todo lado e seja de fato rock´n´roll é grande! E o U2 sabe disso.
Obrigado pelos comentários, Cleibsom! Sempre opiniões bastante fortes… Como mencionei, gostei do disco o suficiente para ouvi-lo várias vezes, mas não creio que um dia seja a minha primeira escolha se eu estiver com vontade de ouvir U2 e não tiver nenhum álbum em especial para pegar.
Os shows do U2 na Sphere de Las Vegas têm sido bastante elogiados – e não só pela produção – e tem coisa nova estreando. Como mencionei na resenha, os dois “Songs” (“Experience” e “Innocence”) anteriores não foram muito do meu agrado; some-se a isso os problemas de saúde de Larry Mullen Jr., e eu penso que o próximo álbum corre risco de ser o último. Se for, que seja bom e traga mais rock.
Consegui uma promoção deste disco na versão quádrupla em CD na semana da Black Friday, e o dito cujo chegou hoje (peguei pq no fim cada CD saiu 15 reais, o que é dificil para um disco lançamento).
1° A descrição do Marcello é perfeita. Bono e The Edge parece que resolveram brincar de tocar algumas músicas e gravaram isso. Adam Clayton não existe e o Larry Mullen é uma incógnita se é ele ou um Pro-Tools qualquer
2° Vou ter que discordar do Marcello quanto a qualidade das músicas. penso que nenhuma ficou melhor que a original. As que mais se aproximam disso são “The little Things That Give You Away” e “Peace On Earth”, mas no máximo um empate aí. O resto todas ficaram abaixo ou bem abaixo
3° Das bem abaixo, impossível não citar “Desire” e Two Heart Beat as One” como as piores. Essa versão dance de “Two Heart beat as One” é no mínimo para levar os dois presos por alguns meses.
4° Como fã do Pop e do Zooropa, achei tenebrosa as versões de ambos os discos, com admirável raiva para o que os dois fizeram com “If God Will Send His Angels”, que me deu vontade de socar o aparelho de som
5° “Cedarwood Road”, “Vertigo” e “Until The End of the World” ficaram tão desnecessárias que a prisão citada no 3° poderia se ampliar por mais alguns dias
Resumo. Disco totalmente esquecível
Comentário cirúrgico, Mairon. Se eu imaginasse que teria essa oportunidade de comprar o disco em promoção teria esperado também… Não me lembrava de “If God…” e fui ouvir as duas em sequência, de fato o chute foi para fora do estádio. E continuo sem conseguir ouvir os quatro discos na sequência!