Deep Purple: Cinco Músicas Injustiçadas

Deep Purple: Cinco Músicas Injustiçadas

Por Micael Machado

Seguindo a ideia do nosso colega André Kaminski, que, há poucos meses, elencou cinco músicas do Iron Maiden que, na sua opinião, seriam “injustiçadas”, venho listar aqui cinco canções do seminal grupo Deep Purple que considero que podem ser “encaixadas” na mesma categoria. Os critérios que segui ao selecionar as faixas foram: as músicas não podem ter sido lançadas como single; não podem constar do track list de álbuns ao vivo oficiais (nem de bootlegs que eu conheça); não podem constar de coletâneas oficiais do grupo (pelo menos, não das mais famosas); não podem ter recebido versões de outros artistas (pelo menos, não ter recebido versões de grande repercussão no meio musical); serem músicas que me agradem mais do que outras bem mais “famosas” do que elas (o que, no caso de Deep Purple, nem é tão difícil assim, pois tem muito hit da banda que nem chega a chamar minha atenção), e que, desta forma, eu julgue que mereciam mais atenção do que receberam por parte tanto da imprensa quanto dos fãs (e, por vezes, da própria banda). Sendo assim, vamos à minha relação (em ordem cronológica), e, se puder, deixe a sua nos comentários!


1. The Painter (Deep Purple – 1969)

O terceiro registro da MKI foi o que levei mais tempo para obter uma versão em vinil (embora tenha conseguido uma cópia em CD ainda na década de 1990), e sempre foi o meu favorito desta fase. Uma das faixas de maior destaque do disco, para mim, é “The Painter”, onde, em pouco menos de quatro minutos, a banda antecipa a sonoridade da MKII alguns meses antes de oficializar a troca de seus integrantes. Com um ritmo que me remete à “Black Night” (tendo também algo de “Hush” ali no começo), a última faixa do lado A (que vinha emendada à “estranha” “Fault Line”) dá espaço tanto para Blackmore quanto para Jon Lord deixarem solos marcantes, ainda que curtos para os padrões que o grupo adotaria pouco tempo depois. Segundo o Discogs, a faixa apareceu em uma coletânea chamada The Best Of Deep Purple em 1972, numa edição lançada apenas nos Estados Unidos. Como eu nem sabia da existência desta compilação, e como ele não foi lançado mundialmente, vou “burlar” a regra que diz que a música não pode constar de lançamentos deste tipo, e incluir esta faixa que, a meu ver, deveria ser mais ouvida e comentada pelos fãs do grupo!


2. Flight Of The Rat (Deep Purple In Rock– 1969)

In Rock foi um dos primeiros discos do Purple que ouvi, sendo, ainda hoje, o meu favorito em sua discografia. “Flight Of The Rat” é, possivelmente, a minha faixa favorita não só deste disco, como de toda a carreira da banda, e, que eu saiba, nunca foi interpretada ao vivo pelo grupo (nos discos ao vivo que conheço da turnê do álbum, tanto oficiais quanto bootlegs – e olha que são vários -, ela nunca apareceu, pelo menos). Uma das poucas faixas do grupo com solos (ainda que curtos) de quase todos os instrumentistas (apenas Glover não tem seu momento “solitário”), além de uma excelente performance vocal por parte de Gillan, nunca entendi porque ninguém parece considerar os quase oito minutos desta faixa no mesmo nível de excelência que eu! Novamente, segundo o Discogs, ela chegou a ser lançada como single na Nova Zelândia, e fazer parte da coletânea tripla The Platinum Collection, de 2005. Como no caso anterior, vou fingir que não sabia desta informação, e incluir esta pérola (que, para mim, é a mais injustiçada desta lista) nesta relação! Espero que compreendam…


3. ‘A’ 200 (Burn – 1974)

Esta faixa sempre chamou minha atenção não só por ter sido um dos primeiros temas instrumentais do grupo que ouvi (Burn foi um dos primeiros álbuns da banda que conheci), mas, principalmente, pelo trabalho de Jon Lord ao longo de sua duração. O músico, sempre mais lembrado por mim por suas mágicas “peripécias” no órgão Hammond, aqui brinca e (se) diverte com diversos sintetizadores, numa faixa onde a marcação quase “marcial” da cozinha deixa espaço para ele brilhar como poucas vezes na carreira da banda. E o que é o solo de Blackmore na parte final? Nunca entendi porque ela não constava das apresentações ao vivo do Purple, e nem mesmo Glenn Hughes, que, nos últimos anos, tem feito shows “especiais” em tributo ao seu tempo no grupo e a este álbum específico, se dedicou a incluí-la nos repertórios de suas apresentações. Se é para reclamar de algo nesta faixa, é apenas do “fade out” no final, que parece ter nos privado de mais alguns segundos (ou minutos) nesta viagem musical que encerra o melhor álbum da MKIII.


4. Comin’ Home (Come Taste the Band – 1975)

Come Taste the Band, o único registro em estúdio da MKIV, é um álbum que levei anos para realmente entender e gostar. Muita gente o acusa de ser muito bom, mas não se parecer com um “disco do Deep Purple”. Seja lá o motivo desta afirmação, ela certamente não pode se aplicar à sua faixa de abertura. Hard rock direto, pesado e sem muitas variações, com um piano muito bem colocado por Lord e partes de guitarra mais “pesadas” do que o restante do disco, “Comin’ Home” foi, ao que consta, executada pouquíssimas vezes pela banda durante a turnê de divulgação do álbum, e não aparece em nenhum dos discos ao vivo desta época. Pelos meus critérios iniciais, não poderia constar aqui, pois, novamente segundo o Discogs, aparece na coletânea The Collection de 1997 (além de ter sido lado B do single para “You Keep On Moving” no Japão, de ser faixa bônus em algumas edições do The Purple Album, do Whitesnake, e de fazer parte de outra coletânea, Purple Hits – The Best Of Deep Purple, lançada na Finlândia em 2003). Mas, quer saber, não tinha como eu deixar esta faixa de fora desta lista, então, pro espaço (mais uma vez) com as regras!


5. The Spanish Archer (The House of Blue Light – 1987)

Na minha opinião, The House of Blue Light é um dos piores registros da carreira do Deep Purple. Pouca coisa se salva de seus sulcos, e, deste pouco, boa parte está nos quase cinco minutos desta faixa. Para mim, a melhor participação de Blackmore neste retorno da MKII (que inclui o disco anterior, Perfect Strangers), com passagens de música clássica no refrão, e solos e mais solos do “homem de preto”, que parece estar participando, nesta faixa, em um disco do “seu” Rainbow, e não do de uma banda “coletiva” como o Purple sempre foi. O que o genioso (e genial) guitarrista faz ao longo da duração desta faixa é digno de figurar bem alto nos melhores momentos de sua carreira. Mesmo assim, ela não aparece no álbum ao vivo oficial da turnê (o também fraquíssimo Nobody’s Perfect, de 1988), e, que eu saiba, nem chegou a ser executada ao vivo. Novamente me valendo do Discogs, vi que esta faixa aparece na coletânea The Universal Masters Collection – Classic Deep Purple, de 2003, e em uma outra chamada The Deep Purple Collection, lançada na Alemanha, Áustria e Suíça em 2011. Mais uma vez, fiz de conta que não sabia disso, porque simplesmente tinha de incluir “The Spanish Archer” nesta relação.

Não incluí nenhuma música da fase Steve Morse (seja com Lord ou Airey nos teclados) na lista, pois há muitos discos ao vivo desta época, e quase todas as músicas que eu considero realmente boas gravadas pelo Purple com este guitarrista podem ser encontradas em algum destes registros (embora uma das melhores, “The Aviator”, só conste em um deles, ao que eu saiba – o bastante recomendável Live In London 2002, de 2021). Slaves and Masters não merecia sequer ter o nome Deep Purple na capa, que dirá ter uma música nesta lista, e a Mark IX, com o guitarrista Simon McBride, ainda não lançou nenhum álbum oficial, portanto, não se “habilitou” a ter algo na lista.

Havia algumas faixas que eu gostaria muito de ter incluído aqui, mas os critérios que adotei me impediram. Por exemplo:

– Da MKI, “Listen, Learn, Read On” ou “Shield” foram minhas escolhas iniciais, mas a primeira chegou a ser lançada como single (além de aparecer em algumas coletâneas), e a segunda aparece nas bem conhecidas coletâneas Anthology, de 1991, e Purple Passages, de 1972, o que as desqualificou;

– Da primeira fase da MKII, “Rat Bat Blue” sempre foi uma faixa que penso que merecia mais atenção do que recebe. Mas, como ela aparece na famosa coletânea A Fire In The Sky, de 2017 (além de ter sido “lado A” de EP na Tailândia, e “lado B” do single para “Woman From Tokyo”, segundo o Discogs), acabou desqualificada para aparecer na lista;

– A segunda versão da MKII, nos anos 1980, deixou uma espetacular faixa instrumental chamada “Son of Alerik”, que pouca gente ouviu, infelizmente. Eu a conheci na coletânea Knocking at Your Back Door: The Best of Deep Purple in the 80’s, de 1992, mas, segundo o Discogs, ela foi lado B tanto do compacto para “Knocking at Your Back Door” quanto para o de “Perfect Strangers”. Sendo assim, não preencheu os requisitos necessários para estar nesta lista, embora tenha qualidades para tal;

– A lindíssima “Holy Man” poderia muito bem representar a MKIII nesta lista, mas, como ela aparece em várias coletâneas (segundo o Discogs), e foi regravada pelo Whitesnake no já citado The Purple Album, acabou ficando de fora;

– “Drifter” ou “Love Child” poderiam ser as representantes da MKIV na lista, pois são tão pouco lembradas quanto a que escolhi. Mas ambas tem versões ao vivo oficiais nos discos que registram a passagem de Tommy Bolin pelo grupo, além de aparecerem aqui e ali em coletâneas do grupo, o que acabou as afastando da lista final (embora para ser honesto, “Comin’ Home” sempre tenha sido minha escolhida para representar esta fase).

Como bem escreveu o André na sua lista de “injustiçadas” do Iron Maiden, tenho certeza que o caro leitor também tem as suas faixas favoritas que nem a banda, nem a imprensa e nem outros fãs do Purple dão tanta atenção e dedicação quanto você. Fique a vontade para comentar as minhas escolhas e, claro, colocar as suas também no campo de comentários abaixo. Seguindo os critérios que estabeleci, ou não! Topam o desafio?

6 comentários sobre “Deep Purple: Cinco Músicas Injustiçadas

  1. Escolhas muito interessantes! “Deep Purple”, o terceiro álbum, também é meu favorito da MK I, e eu acho “Painter” muito bacana; outra música pouco conhecida e injustiçada deste álbum é a abertura, “Chasing Shadows”, que traz o Paice detonando em múltiplas percussões. “Flight of the Rat” é um caso à parte: quando comprei o “In Rock”, não percebi que tinha colocado o lado B para rodar antes do lado A, e a música me pegou de um jeito tal que se tornou minha favorita do LP. Na década de 80 um amigo meu apareceu com um LP pirata que afirmava conter a única versão ao vivo conhecida dessa música – e que se revelou uma fraude, pois era a de estúdio com aplausos acrescentados no começo e no final. Da MK III eu acho “Hold On” uma ótima música esquecida por quase todo mundo – “A 200” era uma das favoritas do meu irmão, então sempre me foi muito familiar – e quanto a “Spanish Archer”, essa era uma música que eu costumava tocar para quem duvidava do talento de Ritchie Blackmore como guitarrista. Sobre a MK IV, gosto muito de “Dealer”, única música de estúdio do Purple a contar com uma canjinha de Tommy Bolin no vocal principal, mas “Comin’ Home” é uma boa representante, sem dúvida.
    Por fim, lembro da MK VII com o Morse uma música matadora, “Somebody Stole My Guitar”, que parece ter sido a única música do “Purpendicular” a não ter sido executada ao vivo, e, da MK VIII com Morse e Airey, a faixa-título de um dos álbuns mais criticados do grupo, “Bananas” – gosto do riff de guitarra, da gaitinha do Gillan e do órgão do Airey no final.

  2. Muito obrigado pela menção, Micael!

    Eu concordo que suas escolhas são de fato bem injustiçadas. Minha lista um pouco seria diferente e acho essas aqui tão injustiçadas quanto:

    1) Flight of the Rat (In Rock): concordo em gênero, número e grau com o que escreveste.

    2) Hungry Daze (Perfect Strangers): Um dos melhores riffs que o Blackmore compôs em anos, descartada assim como “Flight of the Rat”.

    3) Too Much is not Enough (Slaves and Masters): malham este disco, eu o acho bem irregular, mas gosto muito desta faixa, principalmente por seus teclados e jeitão de AOR, que soa bem diferenciada dentro da discografia deles.

    4) Don’t Make Me Happy (Abandon): outro disco muito malhado, mas este blues rock aqui… poxa… como pode alguém desgostar dela?

    5) Rat Bat Blue (Who Do You Think We Are): apesar de não ter considerado ela para pôr na sua lista, é uma das canções mais pesadas do Purple e, no mínimo, serviria para agitar ainda mais os shows. Mas preferem tocar pela bilionésima vez a batidíssima “Space Truckin'”.

    1. Gostei dessas lembranças também… “Don’t Make me Happy” é um belo blues que me faz pensar no slide que Blackmore gostava de usar em várias músicas, e “Hungry Daze” é uma música que ficou deixada de lado por todo mundo. Já “Rat Bat Blue” está fora do alcance vocal do Ian Gillan faz bastante tempo. Aliás, “Who Do We Think We Are” é um disco esquecido: na época, acho que só “Mary Long” fez parte dos shows, e depois que a banda voltou só “Woman from Tokyo” foi recuperada para os shows. Mas além de “Rat Bat Blue” o blues “Place in the Line” e a pesada “Smooth Dancer” bem que poderiam reaparecer.
      Por fim, concordo totalmente com o comentário sobre “Space Truckin'” – faz tempo que Gillan não tem mais condições de cantá-la, e o grande charme dela ao vivo era a jam, que foi abandonada depois dos anos 80.

  3. Valeu pelos comentários, pessoal! Belas escolhas também, hein? Sobre elas, alguns comentários meus (que, de modo algum, invalidam o que vocês escreveram):

    – “Chasing Shadows”: Chegou a estar na minha lista de alternativas para ser escolhida, pois é uma música que sempre gostei. Mas, quando vi no Discogs que ela estava na coletânea Purple Passages, acabei a excluindo devido às “regras” que eu mesmo criei. O mesmo vale para “Hold On”, que está na coletânea Anthology (embora eu sempre tenha tido na cabeça que a MKIII seria representada por ‘A’200) e para “Hungry Daze” (que eu, confesso, nem cheguei a considerar, pois a vaga da MKII-Parte 2 (A Missão) sempre foi de “Spanish Archer”), que aparece em mais de uma coletânea, sendo a mais “conhecida” uma chamada “Child In Time”…

    – Dealer e “Somebody Stole My Guitar” foram belas lembranças, que poderiam ser consideradas, sim! Mas, Marcello, nem eu sabia, mas a música chegou a ser tocada ao vivo sim, aparecendo, segundo o Discogs, em vários bootlegs desta tour… o que, pelos meus critérios, a inviabilizaria de estar aqui!

    – Essa “versão ao vivo falcatrua” de “Flight Of The Rat” me deixou chateado aqui sem sequer chegar a ouvi-la! Sempre quis escutar essa música ao vivo, mas nem banda cover do Deep Purple parece se lembrar dela nos set lists. Uma pena lastimável! – mas bom saber que mais alguém no mundo sabe que ela existe, rsrsrsrs…

    – “Don’t Make Me Happy” foi escavada das profundezas, hein, André? Nem eu lembrava dela… de todo modo, segundo o Discogs, foi single do disco (com versão “edit” pra rádio e tudo), portanto, pelas minhas regras, não poderia estar na minha lista…

    – Já quanto a “Too Much is not Enough”, me desculpe, meu amigo, mas não vou machucar meus ouvidos ouvindo de novo o Slaves and Masters pra ver se essa música podia estar aqui ou não… como diz o Mairon, “joguem as pedras”, mas o preconceito é maior que a vontade!

    E “Rat Bat Blue num show atual do Purple também seria muito bom, hein? Falando em shows, Marcello, depois que o Airey entrou, eles andaram tocando Mary Long, sim, inclusive ela aparece em vários “ao vivo” daquela série com capas de papelão (e, por isto, também não poderia estar na minha lista, apesar de ser outra música que eu adoro e que merecia mais reconhecimento por parte dos fãs).

    Mais uma vez, grato pelos comentários, e aguardem que outras matérias desse tipo aparecerão por aqui nos próximos meses!

  4. Zeus seja louvado!! Sempre achei que era o único em todo o universo que gostava de Flight of The Rat! Com essa matéria e os comentários já da pra começar uma confraria de admiradores!! Parabéns pelo texto!

    1. Obrigado pelo comentário, Jorge! Pelo jeito que a coisa vai indo, logo logo teremos número suficiente de apreciadores de “Flight Of The Rat” pra poder fazer um abaixo assinado pedindo a inclusão dela nos set lists futuros do Purple! (se é que haverão, né? Na idade dos caras, vá saber…)

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