Shows Inesquecíveis: Rolling Stones (Hollywood Rock, 27/01/1995)
Por Davi Pascale
Embora esteja longe de ser considerado uma pessoa velha, tive a oportunidade de conferir a primeira apresentação do grupo britânico no Brasil. Naquela época, show do Rolling Stones era um desejo que todo fã de rock que se preze tinha. Durante anos, era algo inimaginável devido à todo o status que o grupo de Jagger & Richards tinha atingido. A galera só começou a acreditar que seria possível ver o sonho tornar-se realidade depois que o ex-beatle Paul McCartney veio pela primeira vez ao Brasil para uma série de apresentações no Estádio do Maracanã. Meus pais e meu irmão também são fãs, sendo assim a família toda foi ao espetáculo.
Embora tivesse apenas 13 anos já sabia do valor do grupo e já conhecia toda a discografia do mesmo. Obviamente, tomei conhecimento da banda por influência dos meus pais. Rolling Stones sempre rolou nos alto-falantes de casa. Justamente por ter sido criado por uma família muito ligado à musica, aprendi a gostar de rock desde cedo. Não era meu primeiro show internacional, nem meu primeiro show de rock. Já tinha assistido alguns outros concertos como Paul McCartney (no Pacaembu, durante a turnê do Off The Ground), Aerosmith (meu primeiro festival), Kiss na época desmascarada e o rei do pop Michael Jackson (esse sim, meu primeiro show internacional). Mesmo assim, já tinha a ciência de que me lembraria daquilo pelo resto da vida. Não havia dúvidas de que aquele era um momento histórico. Primeira apresentação da primeira vinda ao país.
Nada era capaz de diminuir a empolgação dos presentes. Nem mesmo uma forte chuva que insistiu nos atormentar durante toda a noite. Desde os números de abertura até a apresentação principal. Sério mesmo! Nunca vi chover tanto na minha vida. Para se protegerem da chuva, aqueles que estavam na pista começaram a soltar os tablados que cobriam o gramado e fazer cabaninhas. Eu estava com meus pais na área das cadeiras. Vendo de cima, todo aquele povo ensopado se enfiando embaixo de cabanas improvisadas com barro para todo lado, na minha cabeça era como se estivesse presenciando um revival do Woodstock.
Toda a popularidade dos Stones também me prejudicou um pouco. Inicialmente, o grupo realizaria duas apresentações no Estádio do Morumbi. Depois do estádio ter sido interditado, os shows foram transferidos para o Pacaembu. O problema é que o estádio do clube do São Paulo era muito maior, então seriam necessárias mais duas noites, para que tudo pudesse ser realizado de maneira eficiente. Por uma questão de agenda, o grupo britânico conseguiu adicionar apenas mais uma noite de espetáculo. Resultado: superlotação, gente com setores diferentes daqueles que haviam adquirido (eu, por exemplo, havia comprado cadeira coberta e acabei sendo transferido para a descoberta. Isso não seria um incômodo se São Pedro não tivesse decidido trabalhar além da conta naquele dia) e, claro, gente passando mal, desmaiando. É verdade que muitos por abuso de álcool e substâncias ilícitas, mas muitos por não estarem agüentando a estrutura, ou melhor, a falta de estrutura. Chegou uma hora em que o publico começou a invadir outros setores. Muitos não se conformavam com o fato de estarem em um setor inferior ao que haviam adquirido inicialmente. A chuva incessante fez os ânimos se exaltarem. Lembro da dificuldade que foi para conseguir chegar na banca de merchandising para adquirir uma camiseta dos Rolling Stones e o VHS que estava sendo vendido no dia.
Era minha segunda vez no festival Hollywood Rock. No ano anterior, marquei presença na noite do Aerosmith. Mesmo com toda a confusão, ainda voltei na edição seguinte para conferir Black Crowes e Page/Plant. Meus pais, dessa vez, não quiseram ir porque ficaram traumatizados com a experiência. O que me possibilitou encarar o famoso gramado para assistir os ex-Zeppelin. Na edição de 94 haviam rolado 3 apresentações, e agora na edição dos Stones teríamos 4 shows. Bem… teríamos já que um deles acabou não rolando.
O primeiro grupo a subir ao palco foi o Barão Vermelho. Milagrosamente uma escolha acertada da produção. Sempre senti uma influência de Stones no trabalho deles. Sei que muitos irão me apedrejar, mas essa é uma das bandas brasileiras que mais curto. Os LP´s Carnaval, Barão Ao Vivo (aqueles de capa vermelha gravado no Dama Xoc) e Na Calada da Noite marcaram minha infância. Na ocasião, os garotos estavam lançando o disco Carne Crua (na minha opinião, o ultimo grande álbum do Barão). Os músicos eram assumidamente fãs da atração principal e fizeram um show extremamente competente, com bastante garra. O publico aproveitava os shows para pularem o máximo que podiam em uma tentativa de se aquecer da chuva que teimava em não passar. Acho que o Frejat nunca viu tanta gente pulando em um show do Barão. Entretanto, nem tudo era alegria para o rapaz. Os rapazes fizeram o espetáculo, literalmente, debaixo de chuva. Lembre-se que numero de abertura nunca tem a mesma estrutura que o artista principal, tendo não apenas direito à menos equipamento, mas também à menos espaço no palco. O show acabou sendo encurtado porque o cantor estava tomando um choque atrás do outro no microfone. Apesar das adversidades, ganharam respeito do publico e fizeram uma apresentação digna.
A segunda apresentação deveria ter sido a Rita Lee. Nunca tinha assistido a cantora, então estava curioso para ver o show dela. No dia, foi anunciado pela produção de que a artista havia optado por não se apresentar por conta de parte do seu equipamento ter sido danificado pela chuva. Uma boa parte de platéia vaiou. Era nítido que havia algo mais. Depois de alguns dias, foi publicado em um famoso jornal impresso de São Paulo, que Rita havia sofrido uma overdose minutos antes de subir ao palco. Ela nega, a dúvida permanece. Realmente, uma pena. Ela estava em uma fase brilhante. Era a época do espetáculo A Marca da Zorra, se não me engano. Um show que adoraria ter assistido.
O primeiro show internacional foi o Spin Doctors. Era a aposta do momento. Haviam estourado nas rádios com “Two Princess” e agora lançavam o CD Turn It Upside Down. Funcionavam nos discos, mas ao vivo deixavam um pouquinho a desejar. O instrumental era bom, mas o vocalista, apesar de ser simpático, desafinava bastante. Mesmo assim, fizeram um show agradável de assistir. A parte que assisti, gostei (não consegui ver o show todo porque minha mãe sofre de claustrofobia e começou a passar mal com todo o alvoroço. Eu e meu pai tivemos que correr com ela para o posto medico. Um dos policiais orientou que levasse ela para lá até que se acalmasse. Honestamente, não sei onde estava mais tumultuado). Nada que impressionasse, mas nada que fizesse ficar contando o tempo nos relógios. Tocaram seus hits, o cantor dançou na chuva (o que arrancou aplausos da platéia), conversaram com o publico. Enfim, cumpriram seu papel. Sem duvidas, uma banda esforçada.
E finalmente chegava o grande momento. Depois de tanta espera, finalmente os Rolling Stones subiam ao palco. A noite iniciou com “Not Fade Away”, mais conhecida na voz de Buddy Holly, mas não demorou para que incendiassem a platéia emendando “Tumbling Dice” na sequencia. No setlist, misturavam canções do excelente Voodoo Lounge com clássicos incontestáveis como “Honky Tonk Women”, “Start Me Up”, “It´s Only Rock n´ Roll”, “Satisfaction”, “Street Fightin´ Man”… O álbum que divulgavam, na ocasião, trazia uma banda renovada. Para mim, o melhor deles em anos. Toda a energia do disco, vinha em dobro no palco. No momento de apresentarem os músicos, algo inusitado, o baterista Charlie Watts foi o mais aplaudido. A platéia não parava, os músicos se entreolhavam perplexos. Jagger até brincou no microfone “vocês gostam do Charlie, né?”.
Os Stones entregaram tudo aquilo que seus admiradores esperavam. Charlie Watts com suas batidas simples, precisas e inconfundíveis; Ron Wood totalmente inspirado; Keith Richards com seu estilo único: com um ar meio desleixado, um cigarro na boca e sua palhetada inimitável; e Mick Jagger rebolando, cantando e correndo de um lado para o outro de uma maneira quase epiléptica. A parte visual também era muito acima dos padrões da época e impressionava os espectadores.
Sem dúvidas, uma noite inesquecível. Apesar de toda a aventura, o show valeu cada centavo e cada minuto de sofrimento. Especula-se que a banda retorne ao Brasil bem em breve. Por enquanto, apenas boatos. Mas caso se concretize, quem tiver a oportunidade, confira. Show dos Rolling Stones é uma experiência única! Eu sei, sem Charlie Watts não é a mesma coisa, mas certamente você estará vivendo uma experiência única. O novo álbum – Hackney Diamonds – mostrou que eles não estão para brincadeira e tenho certeza que no palco também saberão manter o entusiasmo de seus fãs.
Eu assisti um dos shows no Maracanã, no Rio, pouco depois dos shows em SP (meus irmãos foram para um dos de São Paulo). Primeira vez assistindo a minha banda do coração, imagina como eu estava!! No que eu assisti, Rita Lee se apresentou, e fez um baita show. A abertura foi com o Barão, seguido pelo Spin Doctors (que o público fluminense vaiou do começo ao fim e eu, que gostava da banda, parei de aplaudir porque achei que ia apanhar), com a Rita fazendo a terceira apresentação. Ela privilegiou as músicas mais rock, deixando de lado o pop, à exceção de uma ou outra. Quanto aos Stones, foram tudo e mais um pouco, com direito a algumas raridades na época, como “Monkey Man” (apresentada no lugar de “Gimme Shelter”, momento da grande Lisa Fischer brilhar). Ainda vi a banda mais duas vezes, em 1998 na Praça da Apoteose e 2016 no Beira-Rio – e este foi indubitavelmente o melhor show que vi deles. Se vierem novamente ao Brasil, estarei lá! Obrigado por essa viagem ao passado!
Muito bacana, Marcello. Me arrependo de não ter ido nesse show de 98. A tour do Bridges to Babylon acho espetacular. O disco acho razoável, mas os shows que tenho dessa tour são fantásticos. Na noite que eu fui, eles também não tocaram “Gimme Shelter”. Era uma das músicas que eu estava esperando, mas infelizmente não rolou. O Spin Doctors eu curto também. Tenho os discos deles e o disco que eles estavam lançando na época – Turn It Upside Down – acho bem bacana.
O show de 1998 ficou marcado para mim por duas coisas: Bob Dylan subindo ao palco para participar de “Like a Rolling Stone” (o “Bridges to Buenos Aires” dá uma boa ideia de como foi) e a má vontade de Ronnie Wood, que estava irritado com o fato de que a crítica brasileira tinha descascado o sarrafo no seu trabalho numa exposição de pinturas de rockstars (que incluía aquela original que aparece na caixa “Crossroads” do Eric Clapton). Mas de resto a banda estava bem, ainda que, para mim, tenha sido o mais fraco dos três shows que assisti deles. Ouvindo o já citado “Bridges to Buenos Aires”, o “Bridges to Bremen” e o “No Security: San Jose ’99” a gente percebe que os shows eram bem melhores do que esse do Rio (que tenho num CD pirata, aliás); Ronnie Wood perdeu vários pontos em profissionalismo nesse aí…