Queen: Cinco Músicas Injustiçadas
Por Micael Machado
Confesso a vocês que, por muitos anos, a discografia da banda inglesa Queen só me atraía até o primeiro disco ao vivo, o magistral Live Killers, de 1979. Mas, com as sucessivas promoções feitas pelo site da Universal, principalmente ao longo do ano passado, tive a oportunidade de adquirir praticamente toda a coleção da banda, e dar uma “segunda chance” aos álbuns posteriores, os quais “menosprezei” por muitas décadas (embora conhecesse seus hits, é claro). Os registros pós Live at Wembley ’86 ainda não encontraram lugares de destaque em meus ouvidos, mas os álbuns de estúdio entre estes dois discos ao vivo acabaram por me revelar algumas pérolas, as quais eu não tinha dado a devida atenção anteriormente, e que, aparentemente, outras pessoas também não, pois são músicas que, a meu ver, se encaixam bem no adjetivo que dá nome a esta coluna. Sendo assim, resolvi elencar cinco faixas que, a meu ver, deveriam ser mais escutadas/comentadas/destacadas na discografia de um dos grupos mais importantes da música na segunda metade do século passado, e, talvez, levar você a conhecer ou relembrar estas “joias escondidas”. Lembrando que meus critérios para a seleção das faixas foram: as músicas não podem ter sido lançadas como single; não podem constar do track list de álbuns ao vivo oficiais (nem de bootlegs que eu conheça); não podem constar de coletâneas oficiais do grupo (pelo menos, não das mais famosas); não podem ter recebido versões de outros artistas (pelo menos, não ter recebido versões de grande repercussão no meio musical); serem músicas que me agradem mais do que outras bem mais “famosas” do que elas, e que, desta forma, eu julgue que mereciam mais atenção do que receberam por parte tanto da imprensa quanto dos fãs (e, por vezes, da própria banda). Sendo assim, vamos à minha relação (em ordem cronológica), e, se puder, deixe a sua nos comentários!
1. Sweet Lady (A Night at the Opera – 1975)
A Night at the Opera sempre foi meu disco favorito do Queen. Recheado de clássicos, possui em suas faixas algumas músicas que não chegaram a atingir tanto destaque quanto seus grandes hits, mas que não devem nada em qualidade em relação a eles. Uma destas canções “menores” é “Sweet Lady”, faixa que o jornalista André Forastieri certa vez classificou como “a coisa mais Kiss que o Kiss não fez” na sua resenha do disco para a seção Discoteca Básica da saudosa Revista Bizz (edição número 84, publicada em julho de 1992). Pouco mais de 4 minutos de um hard rock pesado (para os padrões da banda) e nem tão rápido assim (exceto no final), mas extremamente divertido e agradável de ouvir. Segundo o Discogs, apareceu em uma edição dupla da coletânea Greatest Hits publicada apenas na Bulgária, e, aparentemente, foi tocada ao vivo em poucas ocasiões entre 1975 e 1976 (uma delas no show do Hyde Park de 1976, que chegou a ser gravado, mas nunca foi lançado oficialmente na íntegra). Sendo assim, pelos meus critérios, isto não a inviabiliza de constar desta lista, e foi um dos principais motivos que me levaram a escrevê-la!
2. Sail Away Sweet Sister (The Game – 1980)
Com o subtítulo “(To The Sister I Never Had)”, é uma espécie de “homenagem” que Brian May, filho único, faz a “irmã que nunca teve”, e que, segundo declarações que encontrei na internet, o guitarrista considera que sempre foi uma grande ausência em sua vida. Composição com todo o jeitão “épico” de outras faixas da banda, e um refrão excelente (e muito grudento!), incompreensivelmente (para mim, ao menos) nunca foi executada ao vivo pelo Queen, embora Brian a tenha interpretado em sua carreira solo, e o Guns and Roses a tenha incluído em seus shows da turnê dos Illusions – inclusive, ela aparece na edição deluxe do segundo Use Your Illusion, o que, pelos critérios, a impossibilitaria de estar aqui. Mas, como a versão do Guns consta apenas de Axl cantando a capella um curto trecho da faixa (normalmente, como uma espécie de “intro” para “Sweet Child O’ Mine”, como pode ser visto no DVD do show de Tóquio de 1992), eu não considero esta uma “cover” verdadeira, então, a desconsiderei para poder elencar esta verdadeira “pérola esquecida” do repertório dos ingleses em minha lista, já pedindo antecipadamente minhas excusas a quem não concordar com a “acomodação” feita pelo autor deste texto!
3. Don’t Try Suicide (The Game – 1980)
Esta é outra faixa de The Game, e entra nesta lista nem tanto por sua parte musical (que, honestamente, nem me atrai tanto assim), mas sim pela temática anti-suicídio de sua letra, que implora para que alguém (não especificado) não cometa tal ato, elencando razões para que o mesmo não se concretize, embora de um jeito até certo ponto controverso, por deixar meio implícita uma interpretação de que “ninguém se importa” se você tentar se matar (através da frase “Nobody gives a damn” em certo ponto da letra), sendo que não é esta a interpretação que eu faço de sua temática. Uma parte mais rápida, onde Freddie canta “você precisa de ajuda, você precisa viver” (“you need help… you need life”), musicalmente, é melhor que o restante da composição, e reaparece como base durante o solo de Brian, executado de um jeito característico e único deste genial guitarrista, além da letra nesta parte específica parecer enfatizar a interpretação que tenho de que a temática da faixa afirma que viver a vida vale mais que acabar com ela por sua própria vontade. Está nesta lista, como expliquei, devido à sua temática, pois foi grande minha surpresa ao constatar que o Queen, cujas letras não costumavam abortar temas tão “controversos” quanto este (pelo menos, não tão controversos a este nível), ter escrito uma faixa com esta temática ainda nos anos 1980, e de ela, também para minha surpresa, ser tão pouco explorada (no sentido de “falada”, “comentada”) mesmo hoje em dia. Nunca foi tocada ao vivo, segundo a wikipedia, mas saiu como lado B de um single americano para “Another One Bites the Dust”, lá em 1992, ou seja, doze anos depois do lançamento inicial do disco, o que, convenhamos, não a inclui nos critérios que a excluiriam desta lista, certo?
4. Football Fight (Flash Gordon – 1980)
Vamos combinar que a trilha sonora do filme do Flash Gordon rendeu muitos momentos “menores” à discografia da banda, com seus temas curtos entupidos de sintetizadores, e que não faziam muito sentido fora das telas. Não conheço quem defenda este disco, o colocando em uma posição “alta” no ranking de preferências da discografia, e, a meu ver, com exceção de “The Hero” e de “Flash’s Theme” (ainda melhor em sua versão single), pouca coisa se salva neste álbum. “Battle Theme” é um destes momentos, mas, como a faixa pouco mais é do que uma reinterpretação do tema de Flash na guitarra (acrescida de um bom tema com sintetizadores “roubado” de “Flash To The Rescue”, outra faixa desta mesma trilha sonora), sobra então “Football Fight”, que, embora levada pelos sintetizadores, tem um ritmo bem agradável e atraente, com boa participação da bateria de Taylor e da guitarra de May (ainda que esta apareça em menos quantidade do que eu gostaria). O EP bônus da edição de 2011 traz uma “versão inicial” mais longa (e ainda melhor) que a oficial, com os sintetizadores substituídos pelo piano de Freddie, e mais com “cara” de uma música do Queen do que a que aparece no disco. Apesar de curta, uma faixa que, a meu ver, poderia ter sido mais explorada pelo grupo, mas que acabou relegada a “mais uma” de um disco quase totalmente esquecível! Uma pena!
5. Man On The Prowl (The Works – 1984)
Quando eu pensava no Queen tocando algo próximo do rockabilly, sempre pensei em “Crazy Little Thing Called Love” como o grande exemplo deste estilo na discografia da banda. Foi portanto com certa surpresa que encontrei esta pérola no track list de The Works, um disco do qual só conhecia os grandes hits, mas que guarda esta faixa meio que “escondida” lá no finalzinho do lado A do vinil. Conduzida pelo piano, é uma faixa relativamente curta (pouco mais de três minutos e meio), que chegou a ser planejada, segundo a wikipedia, para ser lançada como single, mas acabou relegada ao lado B do EP Thank God It’s Christmas (onde ganhou uma “versão estendida” na versão de 12 polegadas), e não achei registros de que tenha sido tocada ao vivo pela banda emalgum momento. Outra faixa que merecia um destino melhor!
Como já coloquei, os discos pós 1986 não são lá muito atraentes para mim, e encontrar nos discos pré 1979 faixas que não tenham sido registradas ao vivo, ou incluídas em coletâneas, ou “coverizadas” por bandas reconhecidas (como o fizeram, por exemplo, o Metallica e o Dream Theater), e das quais eu realmente gostasse, se tornou mais complicado do que eu pensava, portanto, diferentemente do que aconteceu com o Deep Purple, ficou complicado de indicar aqui mais músicas que poderiam ter aparecido nesta lista sem descumprir aos critérios que adotei. Sendo assim, fique á vontade para deixar você as suas indicadas como músicas “injustiçadas” na carreira do Queen nos comentários deste texto, seguindo ou não aos critérios adotados, e “dê voz” às suas músicas “desconhecidas” pela maioria do pessoal! Topam o desafio?
Um problema do Queen é que o Brian May e o Roger Taylor lançaram TANTA coletânea nos últimos anos que fica difícil achar alguma música que cumpra todos os requisitos. Uma que poderia entrar se não existissem as coletâneas Deep Cuts é Was It All Worth It, uma das melhores da discografia pós 86 do Queen.
Mas pegando esse período que tu citou (e uns anos antes também), dá pra catar algumas pérolas, em especial cantadas por May e Taylor, como Fight From the Inside, Leaving Home Ain’t Easy e Some Day One Day.
Em relação a alguma cantada pelo Freddie Mercury, vou recorrer ao controverso (e um pouquinho injustiçado) Hot Space. O lado B tem muito menos eletrônica e sintetizador, e é justamente o lado negligenciado pela banda.
Life Is Real não deve nada para outras baladas mais famosas do Queen, como Save Me ou It’s A Hard Life, por exemplo.
Arthur, realmente, tem tanta coisa de coletânea e ao vivo que atender aos critérios foi bem complicado. Mas eu não quis me prender ao período pré-Live at Wembley, apenas… ´é que, pro meu gosto, as músicas dos discos pós-A Kind Of Magic não estão no mesmo nível do restante da discografia, pelo menos aquelas mais “obscuras”…
As três que você citou (“Fight…”, “Leaving..” e “Some Day…”) não entraram no meu radar, mas, como escrevi, não faz muito tempo que realmente dediquei a atenção devida aos álbuns pós-Live Killers, então, vou dar uma ouvida mais atenta a elas, porque, nas “primeiras audições”, não conseguiram me cativar tanto assim.
Eu concordo com você de que o Lado B do Hot Space é bem melhor que o Lado A, mas, ainda assim, não consigo gostar daquele disco…a não ser “Under Pressure”, claro… mas muito disso deve ser birra minha com o Mairon, que, inexplicavelmente, considera este o melhor disco do Queen, sendo que eu sempre o tive como um dos piores!
Grato pelo comentário!
Eu concordo que Hot Space é um dos álbuns menos inspirados do Queen, mas ainda assim não é essa bomba que todos pintam. Vale ouvir novamente. Esse é aquele álbum que a gente sempre coloca para rolar com um pouco de preconceito por ter sido massacrado pela crítica e por ser bem diferente daquilo que se espera do Queen, mas o disco tem bons momentos como “Put Out The Fire”, “Life Is Real” e “Dancer”. Também gosto de “Las Palabras de Amor” que é uma música que os críticos amam odiar.
Das faixas escolhidas para a matéria, gosto bastante de “Man On The Prowl” e “Sail Away Sweet Sister”. Muito bacana o post, Micael.
Obrigado pelos elogios, Davi!
Como já disse, eu até não achei o lado B do Hot Space tão “bomba” assim, mas o lado A é indefensável!
Sabe que, nessa discussão do Hot Space, eu acho engraçado que os GRANDES culpados do Lado A são o Roger Taylor e o John Deacon, que fizeram escolhas péssimas nos seus instrumentos. Mesmo Put Out the Fire, no Lado B, sofre com tanta eletrônica na bateria. Não é à toa que ao vivo soava bem melhor.
Mas sobre o Lado A, Staying Power e Body Language são difíceis mesmo, mas bota uma boa bateria acústica e um baixo com um timbre mais gordo e mais natural, e pelo menos Dancer e Back Chat melhorariam consideravelmente. O Brian tá tocando guitarra de terno nessas duas e o Freddie tá no auge do timbre e do alcance vocal dele (ali entre 78-82).
Outro ponto que eles erraram muito forte foi a escolha da tracklist. Um disco que não é tão inspirado precisa começar com as mais fortes. Under Pressure tinha que ser a primeira música.
Como fã de Queen, só tenho elogios para as musicas citadas.
Eu teria uma lista diferente, a qual coloco abaixo, mas só destaco que duas do The Game não tem como defender hehehe. Mas como o critério estabelecido pelo Micael é não ter sido lançada ao vivo, ou em coletâneas, daí limita bastante. Independente, vou seguir o Arthur e colocar uma música dele na minha lista, sem uma pesquisa aprofundada se saiu em algum ao vivo ou coletânea
Minha lista
1 – “See What a Fool I’ve Been” (sei que saiu em bootlegs e ao vivo, mas não ter sido lançada em estúdio na época é uma baita injustiça
2 – “She Makes Me (Stormtrooper in Stilettoes)” (Sheer heart Attack é um disco a ser descoberto)
3 – “Teo Torriate” (Mercury cantando em japonês, provando que ele é o melhor vocalista da história em qualquer língua)
4 – “My Melancholy Blues” (depois do desbunde com “it’s late”, que baita encerramento para o News of the World
5 – “Was it all Worth Is” (uma das grandes músicas do excelente Miracle)
E claro, o Hot Space é um disco a ser descoberto e despreconceituado por aí, mas sei que o pessoal ainda tem muito Q com ele, que ainda acho o melhor dos caras
Valeu Micael
Mairon, das músicas que tu selecionou, acho que as quatro primeiras ou tem versões ao vivo ou aparecem em coletâneas, não tenho certeza… mesmo assim, “See What I Fool…” e “My Melancholy Blues” deveriam ser bem mais comentadas/ouvidas/recomendadas do que são! “Teo Torriate” eu considero um clássico do Queen, não a julgo injustiçada, e não cheguei ainda a conseguir apreciar o The Miracle a ponto de indicar alguma dele para esta seção!
Na “linha” de “Teo Torriate”, “The Prophets Song” é outra que merecia muito mais reconhecimento, apesar de aparecer em coetâneas, ter sido gravada pelo Sons Of Apollo (mais ou menos, era o momento solo do J. S. Soto nos shows, mas, ainda assim, era maior e mais reconhecível que o Axl fazendo “Sail Away Sweet Sister”) e ser sempre elogiada pelos fãs da banda!
Grato pelo comentário!
See What A Foll I’ve Been saiu em 74 como lado B do single Seven Seas Of Rhye
E também aparece em alguns bootlegs ao vivo da década de 1970… mas, mesmo assim, não é das músicas mais “famosas” do Queen, então, mesmo não atendendo aos critérios que coloquei, não fica tão “alienígena” assim nesta seção, certo?
E acho que, se alguém quiser incluir uma música que acha que merecesse mais destaque do que possui, pode fazê-lo, mesmo que não atenda aos critérios iniciais! Afinal, é a opinião de quem comentar, não uma “lei” ou “regra” imutável! Não sendo alguma música “carne de vaca” da banda, tá valendo comentar sobre ela!
Não vou seguir o critério do Micael porque vou mais do meu “achômetro” mesmo em termos de composições que acho injustiçadas por serem pouco comentadas, não serem regulares nos shows e que eu considere como “muito maiores do que são consideradas hoje”. Mesmo assim, concordo com duas escolhas cirúrgicas do Micael.
1. Now I’m Here (Sheer Heart Attack): O que Taylor faz na bateria e o que May faz na guitarra nessa faixa e simplesmente absurdo.
2. Ogre Battle (Queen II): Pessoal esquece o quanto o Queen foi pesado no início da carreira. Tire os jogos vocais e esta faixa poderia se encaixar em qualquer disco do Sabbath setentista. Sem contar o fato que essa música inspirou uma das minhas franquias de jogos favoritas de todos os tempos.
3. Sweet Lady (A Night at the Opera): Já vi muita gente dizer que é só uma canção hard rock comum. Para mim, uma das melhores do disco.
4. Sail Away Sweet Sister (The Game): Linda música, como o próprio Micael disse, ignorada pelo restante da banda.
5. It’s Late (News of the World): Demora um pouco para engrenar, mas quando engrena… outra daquelas épicas que o Queen sempre se caracterizou por fazer.
André, de sua lista, acho que apenas “Now I’m Here” não merece o rótulo de “injustiçada”, pois foi muito tocada ao vivo, tem bandas tributo que a tocam, ela não é tão “obscura” assim para receber este rótulo. “It´ s Late” e “Ogre Battle” sim, certamente mereciam uma atenção maior! Aliás, muita coisa maravilhosa dos dois primeiros discos foi esquecida depois da fase “A Night”/”A Day”, e merecia ser “recuperada” por algumas pessoas que acham que o Queen se resume só aos “greatest hits” (pra fazer trocadilho com as coletâneas mais conhecidas).
Pois é… Lembro que meu irmão tinha o primeiro Greatest Hits do Queen, comprado em vinil, com um envelope para o LP que trazia alguns dados sobre as músicas, e ao ouvi-lo pensei que “Sheer Heart Attack” era o primeiro álbum da banda, pois não trazia nenhuma música dos dois primeiros discos. Só depois que um amigo que adorava o grupo me mostrou a coleção completa e vi os dois primeiros discos na casa dele. Sobre as músicas em si eu não tenho nada a acrescentar, afinal, faz mais de quarenta anos que tento gostar do grupo e não consigo, só tenho deles o “Live Killers” e o “Rocks Montreal”.