Rolling Stones e suas influências

Rolling Stones e suas influências

Por Fernando Bueno

Em 2016 quando Blue & Lonesome foi lançado os anúncios promoviam o disco com algo como:“os Rolling Stones estão mostrando ao mundo suas influências para o mundo”. Caso você não saiba, o disco é uma coleção de covers de artistas que os influenciaram e foi vendido como o primeiro disco totalmente de covers de sua longa carreira.

Porém avaliando todos os lançamentos da banda mais atentamente chegamos à conclusão de que se eles não tinham gravado um disco totalmente de covers, foi por muito pouco. Seu primeiro lançamento em formato LP, The Rolling Stones (1964), tem 12 faixas com nenhuma delas sendo creditadas à alguém da banda. Entretanto existem duas músicas creditadas à Nenker Phelge – um pseudônimo para os músicos em composições próprias nesse período – e pode levar o leitor a falar “então não era covers”. Porém a curiosidade é que, segundo seu empresário Andrew Loog Oldham, eles preferiram creditar um autor que não existia, pois, as músicas foram criadas utilizando padrões musicais que ouviram em sua visita à Chess Records. Ou seja, como não sabiam quem creditar e por não estarem usando ideias totalmente próprias, preferiram fazer dessa forma. O interessante é que o material dos ensaios que a banda fez nos estúdios da Chess Records existem e já saíram com uma infinidades de capas e organização, é só escolher uma já que é uma ótima aquisição para os fãs.

Já em seu segundo disco – e aqui cabe a explicação que estou usando como referência as edições inglesas, pois sabemos que nos lançamentos americanos as músicas nem sempre era as mesmas – praticamente o mesmo expediente usado, das 12 músicas, 9 covers e apenas 3 faixas próprias, sendo que nesse caso o crédito foi para Jagger e Richards mesmo. No álbum seguinte The Rolling Stones, Now (1965) já tínhamos 4 faixas próprias, o mesmo número se manteve em Out Of Our Heads, lançado no mesmo ano, em December Childrens foram 5 composições próprias até que em Aftermath (1966) finalmente um disco todo de músicas de Jagger e Richards. Coincidência ou não o início da fase de ouro do grupo que durou seus bons dez anos.

Muitos dizem que essa prática enfraquece a carreira inicial da banda e tiraria muito do mérito dos músicos. Isso era uma característica comum em bandas iniciantes, que muitas vezes buscam se inspirar em músicas já populares para conquistar o público. Os Rolling Stones, assim como outras bandas da época, como os Beatles, também gravaram versões de músicas de artistas como Chuck Berry, Muddy Waters e Howlin’ Wolf. Claro que para manter a comparação podemos pegar Please Please Me (1963) com suas 14 faixas sendo 6 delas regravações. Um número bem menor do que os Stones estava fazendo. Confesso que demorei bastante tempo para ir a fundo nesses primeiros discos por conta disso.

Rolling Stones na Chess Records

Esses covers ajudaram os Rolling Stones a construir sua identidade musical e a desenvolver seu próprio estilo. Com o tempo, a banda passou a compor suas próprias músicas, explorar novos estilos e temas em suas letras e se tornou uma das bandas mais influentes e icônicas da história do rock. É interessante observar como os covers dos primeiros discos dos Rolling Stones refletem suas influências musicais e como eles conseguiram reinterpretar essas músicas de forma única, contribuindo para a evolução do rock ‘n’ roll.

E aqui voltamos para Blue & Lonesome. Como vimos os covers nunca foram uma novidade para os Stones, mas a forma que eles fizeram no início da carreira, adaptando as músicas à uma sonoridade própria, não foi a mesma desse disco que tem uma maior fidelidade em relação às versões originais. No fim das contas os primeiros álbuns dos Stones são bem interessantes até para conhecer toda a paleta de influências que a banda teve, para ter uma boa ideia do que os músicos gostavam, o que ouviam com frequência e qual espelho que usavam para sua própria carreira. E de uma maneira mais ampla vemos como a música americana influenciou os grupos ingleses a se desenvolveram e serem eles os que influenciariam a cena americana um tempo depois fazendo a troca.

A partir dos anos 70, a prática de gravar covers como forma de preencher álbuns e conquistar o público começou a diminuir entre as bandas. Nessa época, as bandas passaram a valorizar mais a autenticidade e a originalidade, buscando criar músicas próprias e explorar novos estilos e sonoridades.

Muitas bandas dos anos 70, como Led Zeppelin, Pink Floyd, Queen e Deep Purple, focaram em composições autorais e em experimentações musicais, consolidando suas identidades e influenciando gerações futuras de artistas. Essa mudança de foco para composições próprias contribuiu para a diversidade e a inovação no cenário musical da época.

Embora covers ainda fossem ocasionalmente gravados por bandas nos anos 70, a ênfase estava cada vez mais na originalidade e na expressão artística individual. Isso reflete uma evolução na mentalidade das bandas e na valorização da criatividade e da autenticidade no processo de composição musical. Os discos de covers se tornaram normais algumas décadas depois e Blue & Lonesome é mais um exemplo, várias bandas fizeram o mesmo anteriormente, de Ramones ao Rush. É bastante divertido compreender as influências de nossos ídolos, saber que eles também tem seus próprios. No caso dos Stones o material de seus ídolos os ajudou num momento inicial de sua carreira e acredito que todo mundo que está lendo concorda que eles se deram muito bem após isso.

2 comentários sobre “Rolling Stones e suas influências

  1. Ótimo texto lembrando as influências dos Stones em seu começo de carreira. Um pequeno reparo se faz necessário: tanto na edição inglesa autointitulada quanto na americana (“England’s Newest Hitmakers”) há uma composição de Jagger e Richards, “Tell Me”. Keith Richards admitiu que as primeiras composições dos dois eram baladas porque eram “mais fáceis de compor”. Vários autores apontam que Andrew Oldham forçava Mick e Keith a comporem juntos porque queria criar seu próprio duo como Lennon e McCartney, e não viu potencial nos demais (Wyman, Jones e Watts) para desenvolver uma parceria. Isso era bem diferente de Brian Epstein, que encorajava George Harrison a compor. E é uma pena que depois que a estratégia deu certo não houve como voltar atrás: “Paint it Black” começou como um folk acústico de Jagger e Richards que Bill Wyman reproduziu – e modificou – no órgão, e Brian e Charlie decidiram acompanhar. Uma composição que deveria ter sido assinada pelos cinco músicos.
    Se a gente olhar para os créditos nos primeiros LPs dos artistas ingleses dos anos 60, percebe-se que os Beatles eram a exceção, pois sempre lançaram discos com mais músicas originais do que covers. No caso dos Stones, já na gravação do primeiro EP (“The Rolling Stones”), a mão pesada do empresário e produtor Andrew Oldham se fez sentir, pois ele exigiu que gravassem uma balada de Arthur Alexander (se os Beatles faziam sucesso com músicas dele, os Stones também podiam…), “You Better Move On”. E a partir dali os Stones se viram gravando músicas da Motown como “Can I Get a Witness” ou “Hitch Hike”, que não faziam parte das influências de nenhum deles. Eles estavam mais à vontade com coisas como “I Can’t be Satisfied” ou “Little Red Rooster”, mas, como dizer não ao empresário?

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