Faith No More – The Real Thing (1989):
Por Davi Pascale
Em 20 de Junho de 1989 chegava às lojas The Real Thing, álbum que mudaria para sempre a vida dos músicos do Faith No More. Misturando elementos do rock alternativo, do funk, do rap e do heavy metal, os rapazes criaram uma sonoridade única ajudando a dar uma nova cara para os anos 90. Um dos grandes responsáveis por todo o sucesso foi, certamente, o novo cantor Mike Patton.
“Assim que terminamos as gravações de Introduce Yourself, sabíamos que havíamos ido o tão longe quanto poderíamos com Chuck (Mosley)”, declara o baterista Mike Bordin em entrevista à Billboard Magazine. O tecladista Rody Bottum foi mais além: “Ele era incrível, talentoso, mas sua habilidade vocal era bem específica, ele não cantava de um modo tradicional. Com Chuck, nunca teríamos entrado nas rádios pop”.
Para bom entendedor, meia palavra basta. Eles queriam explorar novos horizontes musicais e, para isso, precisavam de um vocalista mais versátil. A solução foi encontrada em uma fita que o guitarrista Jim Martin estava ouvindo bastante na época, uma fita do grupo de death metal, Mr. Bungle.
“Nós havíamos tocado no Humboldt County, ainda na época do Chuck, e Trey (Spruance), guitarrista do Mr. Bungle, nos entregou a fita demo deles”, relembra o baixista Billy Gould. “Nós a tocamos no ônibus e Jim Martin pirou. Então, quando as coisas não deram certo com Chuck, Jim sugeriu que fossemos atrás de Mike (Patton). Nós não o conhecíamos ainda, não sabíamos nada sobre ele”.
A história começou a tomar forma em um show que o Faith No More realizou, em São Francisco, como número de abertura do Red Hot Chili Peppers e Mike Patton foi assistir. “O Mr. Bungle havia feito novas demos e o som mudou completamente daquela fita que o Faith No More tinha. Nós havíamos nos cansado daquilo, que era um death metal, e caímos naquela onda do Fishbone e Chili Peppers. Então, nós contratamos um setor de metais e mudamos toda a história”, comenta o cantor.
A banda ouviu as novas fitas. De fato, a sonoridade era totalmente diferente, trazendo influências até de ska. Isso fez com que abrissem, de vez, os olhos para o garoto. Eles viram que Mike Patton estava buscando evoluir, explorar novas sonoridades e tinha um bom alcance. Enfim… tudo o que precisavam. Foi aí que, finalmente, surgiu o convite para entrar no FNM. Os músicos lhe enviaram as demos que estavam trabalhando e perguntaram se havia interesse em fazer um teste. O resto é história.
Quando Mike Patton entrou na banda, todos os arranjos de The Real Thing já haviam sido criados. O cantor acabou colaborando apenas na criação das linhas vocais e nas letras do disco. O que, certamente, explica a mudança na sonoridade do grupo a partir de Angel Dust. “Depois desse disco, a noção de satisfazer o público foi pela janela, nós só queríamos nos divertir pra cacete e fazer o que tivéssemos vontade. Mike fez com que encarássemos tudo de maneira diferente”, reconhece Bottum.
The Real Thing foi minha porta de entrada no universo do Faith No More. Lembro que comprei o LP em 1990, quando a banda estourou aqui no Brasil, por conta do sucesso de “Epic”. Talvez por isso, esse ainda seja meu álbum favorito do grupo. De todo modo, mesmo que você prefira o Angel Dust ou o King For a Day, Fool For a Lifetime (e não há nada de errado com isso, são grandes discos também) não há como negar o impacto que esse LP causou na época. Seja no público, seja na banda.
O vinil já abre com tudo, emendando 3 canções que se tornaram clássicas: “From Out of Nowhere”, “Epic” (quem não se lembra do clipe com o peixinho morrendo lentamente fora do aquário?) e “Falling To Pieces”. A música seguinte, “Surprise! You´re Dead” traz os músicos se aproximando de um heavy metal menos moderno. Apesar do rap continuar presente na melodia vocal, é perceptível a influência de thrash metal no trabalho de guitarra de Jim Martin. “Zombie Eaters” é a responsável por fechar o lado A, mais um grande som, dessa vez com um arranjo oscilando entre o limpo e o pesado. A introdução com o dedilhado de violão é bem interessante.
O lado B abre com a empolgante faixa-título (uma das minhas favoritas do disco), emendando em “Underwater Love”, provavelmente a que mais se distancia do restante do álbum. Embora não esteja entre minhas favoritas, é interessante a quebra de clima com um arranjo mais alegre antes de cair na pesada “The Morning After”. Não sei porquê, mas a levada de bateria dessa música me remete bastante ao clássico “We Care a Lot”. O vinilzão se encerrava com “Woodpecker From Mars”, ótimo número instrumental com destaque para a levada insana de Mike Bordin e o trabalho criativo do tecladista Rody Bottum.
Como vocês devem ter notado, eu escrevi que ‘o vinilzão se encerrava’. Para quem não viveu essa época, vale mencionar que o fim dos anos 80 e início dos anos 90 é a fase onde as gravadoras incentivavam a compra do CD. Com isso, muitos artistas incluíam faixas adicionais para incentivar o fã a comprar o compact disc ao invés do LP. Como o mundo dá voltas, não é mesmo?
Os bônus ficavam com “War Pigs”, classicão do Black Sabbath que recebeu uma versão extremamente competente, além da balada “Edge Of The World”, que fez bastante sucesso no Brasil com a versão de Live at Brixton Academy. Embora os arranjos sejam bem similares, ainda acho a gravação ao vivo mais impactante. Não sei se por ter tocado bastante nas rádios e ela ter ficado na cabeça, se pela participação intensa do público, ou se pelas 2 situações juntas.
Surreal notar que esse trabalho já está completando 35 anos de existência. O mais bacana de tudo é notar que o material não se tornou datado e ainda soa extremamente empolgante depois desses anos todos. Sendo assim, que tal colocarmos o disco para tocar mais uma vez e relembrarmos os bons e velhos tempos?
Faixas:
- From Out of Nowhere
- Epic
- Falling to Pieces
- Surprise! You´re Dead
- Zombie Eaters
- The Real Thing
- Underwater Love
- The Morning After
- Woodpecker From Mars
- War Pigs
- Edge Of The World
Bateu a nostalgia… Também comprei o LP na época em que foi lançado no Brasil, e lembro de ter ficado p*** da vida porque um amigo comprou o CD importado e tinha as músicas adicionais. Até hoje é o meu favorito do Faith No More, ainda que o “Angel Dust” traga algumas das minhas músicas favoritas da banda, “RV”. “Midlife Crisis” e “Everything’s Ruined”.
Pior que eu não lembro porque comprei o meu em LP, na época. Provavelmente, era mais em conta. CD, nessa fase, ainda era meio caro no Brasil. Depois que popularizou…
Bela resenha para um excelente disco, Davi! Um disco que eu sempre considerei como clássico! Algumas observações sobre alguns de teus comentários:
“The Real Thing foi minha porta de entrada no universo do Faith No More” – a minha também! Muito por causa de “Epic”, comprei o vinil na época do lançamento no Brasil, e demorei anos pra saber que o CD tinha duas faixas extras. Ainda tenho a mesma cópia daquela época!
“Talvez por isso, esse ainda seja meu álbum favorito do grupo.” – Angel Dust cresceu muito no meu conceito durante esses anos, mas acho The Real Thing mais coeso. Agora, favorito mesmo é o Live at Brixton! Já chego nele…
“O vinil já abre com tudo, emendando 3 canções que se tornaram clássicas” – que pena que muitos pararam nelas, né? Porque o que vem depois é tão bom ou melhor do que estas três faixas!
““Zombie Eaters” é a responsável por fechar o lado A, mais um grande som” – na época, eu, ainda não acostumado às muitas variações e gêneros como o rock progressivo, ficava alucinado de como uma canção podia alternar entre o singelo e a porradaria da forma que o Fenemê faz nesta faixa!
“O lado B abre com a empolgante faixa-título (uma das minhas favoritas do disco)” – para mim, uma das favoritas da discografia inteira
“O vinilzão se encerrava com “Woodpecker From Mars”” – só eu que escuto um “quê” de King Crimson nesta faixa? Se trocasse os teclados por mellotrons ou pelo violino do Cross, eu colocava ela fácil, fácil no meio do track list do Starless And Bible Black e acho que ninguém notaria a diferença!
““War Pigs”, classicão do Black Sabbath que recebeu uma versão extremamente competente” – como eu fiquei decepcionado quando descobri que a versão do tributo Nativity in Black era a mesma deste CD. Por muitos anos, pensei que se tratavam de gravações diferentes, mas a aquisição do CD (e a internet) vieram me mostrar que não!
“ainda acho a gravação ao vivo (de “Edge of the World”) mais impactante” – para mim, todas as versões do Brixton são melhores do que no estúdio, e as que constam só no DVD “You Fat Bastards” também! Li certa vez que o Patton não gosta dos arranjos vocais do disco de estúdio, porque não teve tempo de trabalhar neles, como mencionado no texto. Então, já na turnê do disco ele mudou muita coisa, e este show é um registro disto! Para mim, um dos melhores discos ao vivo da década de 1990, se não for “O” melhor!
“Surreal notar que esse trabalho já está completando 35 anos de existência.” – estamos ficando velhos! Pior eu que, sem querer, quando vi a data de lançamento calculei que o disco estava fazendo 25 anos… acho que estou querendo negar a idade, hehehehe!
“Sendo assim, que tal colocarmos o disco para tocar mais uma vez e relembrarmos os bons e velhos tempos?” – depois de ler, coloquei um bootleg da turnê que possuo, gravado poucos dias antes do ao vivo “oficial”, mas com um track list diferente! Bons momentos!
Valeu pela lembrança, Davi!
Discão, né Micael? Queria entender o que rola com Falling to Pieces. A música fez um puta sucesso e a banda faz de tudo para não tocar ela…
Meu Deus… 35 anos… Como eram boas as tardes vindo do colégio e com horas e horas de MTV… Bons tempos. Nunca fui muito fã do Faith No More, mas a nostalgia fala mais forte, vou escutá-lo hoje. Boa resenha, abraços!
Sim, tb assistia muita MTV, mas a primeira vez que vi o clipe de “Epic” acho que foi no Clip Trip…