Selos Lendários: O Rock nas Majors (Parte 2)
Por Ronaldo Rodrigues
Na segunda parte desta matéria (veja a primeira parte aqui) nosso foco continuará a ser escrever sobre bandas que assinaram e tiveram seus lançamentos concretizados diretamente pelas grandes majors fonográficas ao longo dos anos.
A diversidade de companhias fonográficas até os anos 60 era muito maior do que os 4 grandes conglomerados musicais que dominam o mercado e resistem até hoje (Warner, Sony, Universal e EMI). Portanto, era natural que a competição e a disputa por talentos e nome emergentes entre elas fosse até mais acirrada no território do rock. Em meados da década de 60, após a beatlemania, havia um mercado vultuoso de consumo para a música.
Mercury
A Mercury foi fundada em 1945, em Chicago, nos EUA. Logo no início de suas operações possuía duas unidades produtoras de discos que, com um ritmo frenético de trabalho e equipamentos de ponta, já competia em condições de igualdade com outras gigantes fonográficas como a Columbia, a RCA-Victor, a Decca e a Atlantic.
Nos anos 50 e 60 o foco da Mercury era o jazz e o blues. Integravam seu portfólio nomes como Sarah Vaughan, Max Roach, Cannonball Aderley, Buddy Rich, Charlie Mingus e Quincy Jones.
No início dos anos 60, a Phillips havia perdido seu contrato de distribuição com a Columbia, para lançar os títulos desta fora dos EUA. A Philips, a partir de uma série de acordos comerciais de parceria, junta-se a Mercury. Em 1972, a Siemens se funde com a Philips e a Deutsche Gramophon para criar o grupo Polygram. Então, a Mercury passaria a atuar dentro deste agrupamento de marcas. Em 1967, a Mercury foi o primeiro selo americano a lançar fitas cassete no mercado.
A primeira atenção que a Mercury deu ao rock aconteceu pelos idos de 1965, com o lançamento de títulos dos Blues Magoos e do Left Banke. Também em 1967 a Mercury contratou Chuck Berry, que na época já gozava do prestígio de veterano do rock. Um grande sucesso demorava a pintar na porta da Mercury, mas ainda sim, no fim dos anos 60 a Mercury concentrou suas forças no pop e no rock. As coisas começaram a melhorar um pouco com o grupo grego Aphrodite’s Child, que teve seus dois primeiros discos lançados pelo selo.
A prova de que a Mercury estava mesmo interessada no rock foram os lançamentos do Sir Lord Baltimore, pessadíssimo trio norte-americano, cujo disco Kingdom Comeadquiriu o status de cult ao longo dos anos e do sinistro grupo Coven, que apesar de soar como um Jefferson Airplane genérico, apresentava uma temática declaradamente satânica (e talvez tenha sido o verdadeiro pioneiro nesse território).
Devido à Philips ser detentora da Vertigo, alguns dos lançamentos do selo britânico saíram pela Mercury nos EUA. E um deles logo se tornaria o primeiro estouro, após oficializar contrato com a estampa americana – Rod Stewart. Os discos que o livraram de ser apenas o ex-vocalista do Jeff Beck Group e o lançaram para o estrelato mundial foram produzidos e distribuídos pela Mercury, até 1974.
Muitos grupos de rock lançados pela Mercury não atingiram sucesso e reconhecimento. Mas nos anos 70, a Mercury colheu os louros com Buddy Miles, Bachman-Turner Overdrive, Rush, 10cc, Captain Beefheart e com as The Runaways. Também o Kiss na metade dos anos 70 passou a integrar o cast da Mercury, pois seu selo Casablanca Records havia sido adquirido pela Polygram.
No início dos anos 80, a Mercury investiu forte também no hard rock de arena. Os Scorpions estavam com ela desde 1980, bem como Def Lepard, Bon Jovi e Cinderella. O envolvimento com o rock foi diminuindo ao longo da década e as novas caras de sucesso do selo eram o Tears for Fears e o INXS.
Polydor
A Polydor surgiu na Alemanha, em 1924, a partir da Deutsche Gramophon, primeiro como um selo destinado às exportações e depois, em 1946, dedicado à música pop, já que a Deutsche focava-se em lançamentos de orquestras, big-bands e música clássica. Uma filial britânica surgiu 10 anos depois e vários escritórios regionais também foram criados.
A pisada no rock para a Polydor aconteceu pra valer em 1966. Ela, em parceria com uma pequena gravadora britânica, a Track, lançou para o mundo os primeiros acordes de Jimi Hendrix, The Who e Cream. Só por aí, a Polydor já tinha ajudado a escrever boa parte da história do rock nos anos 60.
A Polydor também tratou de distribuir, fora dos EUA, os discos de James Brown. Pela Polydor brasileira, chegaram até nossos ouvidos os primeiros discos dos Mutantes.
Em acordos de distribuição e contratos pelo selo, a Polydor estampou lançamentos do The Move, Fairport Convention, The Creation, Golden Earring, Shocking Blue, Velvet Underground, Taste, Procol Harum, Blind Faith, Jack Bruce, John Mayall, Tony Williams Lifetime, Focus, Derek and the Dominos, Rory Galagher, Slade, Rainbow, entre outros.
No fim dos anos 60 e início dos anos 70, a Polydor lidava praticamente apenas com rock e o volume de lançamentos era imenso. A partir de 1973, a Polydor começa a lidar mais intimamente com a música pop, o funk e a soul music. Nos anos 80, a quantia maior era de relançamentos e lançamentos oriundos de acordos de distribuição com outros selos.
Warner/Reprise e outros selos
A Warner enquanto gravadora e selo foi fundada em 1958 a partir dos estúdios Warner de cinema. Em seus primeiros anos de atividade, eram lançadas basicamente trilhas sonoras e álbuns falados que não obtiveram sucesso. A Warner, acompanhando a explosão do rock n’ roll contratou o emergente Bill Halley, porém no selo, Bill Halley não conseguiu emplacar mais nenhum hit. Outra aposta, mais bem sucedida, foi com os Everly Brothers. No início dos anos 60, um trio folk também agitou um pouco o caixa da Warner – Peter, Paul & Mary. Mas naquela época, os negócios iam muito mal, com sucessivas apostas que não rendiam.
Outro que não estava apostando bem seu dinheiro nessa época era Frank Sinatra, que criou um selo próprio, para seus lançamentos e para capturar novos talentos – a Reprise Records. Sinatra e Warner criaram um acordo que permitiu aliviar a barra de ambos os lados e nascia então a Warner/Reprise.
A partir daí, com diversos acordos de distribuição com selos britânicos, a Warner/Reprise foi colocando no mercado disco que estavam fervilhando do outro lado do Atlântico – The Kinks e Jimi Hendrix Experience eram os nomes principais. A filha de Sinatra, Nancy Sinatra, também ia bem nas paradas naquela metade dos anos 60.
A Reprise começou a constituir um cast próprio, que tinha Arlo Guthrie, Family, Electric Prunes, Joni Mitchell, Neil Young e Fleetwood Mac.
Um lançamento muito importante para a Warner foi o segundo disco de Van Morrison, ex-vocalista do Them, Astral Weeks em 1968. Apesar de vendas relativamente fracas na primeira prensagem, o disco permaneceu quase que ininterruptamente em catálogo, devido a uma demanda constante. Outros discos do cantor irlandês tiveram melhor desempenho nos charts e o garantiram por muito tempo no selo.
Já na virada dos anos 60 para os 70, a Warner oferecia aos ouvintes de rock os lançamentos de Alice Cooper, Little Feat, Montrose e Curved Air, e uma vertente maissoft que fez muito sucesso nas FMs norte-americanas, com o som de grupos como o Doobie Brothers, America e a dupla Seals & Croft. Doobie Brothers e America garantiram muitos topos de paradas e discos dourados para a Warner.
Em 1973, a Warner adquiriu a Elektra e um cast respeitável veio a reboque (veja matéria desta série sobre o selo Elektra aqui). Em 1975, apenas Neil Young e Frank Sinatra continuavam tendo a estampa da Reprise Records. Os demais nomes do selo foram transferidos para a Warner. O Fleetwood Mac, que em 1977 lançou o famosíssimo Rumors foi um deles. Em 1974, Rod Stewart pula da Mercury para a Warner e já numa roupagem mais pop, emplaca um sucesso atrás do outro na estampa.
A Warner passou batida da onda punk, mas tentou abraçar a new-wave com lançamentos do Devo e do B-52s. Mas no fim dos anos 70, o principal acontecimento para o selo em termos de rock foi o contrato com o Van Halen. A banda já sacudiu o mercado logo em sua estréia, colocando novamente em evidência um rock sólido com uma guitarra virtuosa. Nos anos 80, também a Warner bancou o ressurgimento do trio ZZ Top, que atingiria seus maiores feitos comerciais naqueles tempos e lançou a poderosa banda Dio, do lendário vocalista que emprestou seu sobrenome à banda.
Depois dos anos 80, R.E.M, Jane’s Addiction e Red Hot Chili Peppers foram as maiores contribuições que a Warner apresentou aos novos formatos de rock que surgiam.
Das majors, faltou citar a EMI, que apesar de pouco envolvimento com o rock tratou de prensar as bolachas do Queen, a partir dos anos 70, e do Iron Maiden. Nada mal, não é mesmo?
Matéria muito legal! Mas só uma correção, quando você se refere aos quatro grandes conglomerados (Warner, Sony, Universal e EMI), é importante frisar que a EMI já não existe mais como gravadora independente e hoje faz parte da Universal. Porém, a BMG ressurgiu e hoje ocupa o 4º lugar, então as quatro grandes são: Universal, Sony, Warner e BMG.