Legião Urbana – Que País é Este [1987]

Legião Urbana – Que País é Este [1987]

Por André Kaminski

Não foi de propósito que resolvi resenhar este disco bem no dia das eleições municipais de 2024. Mas foi uma linda coincidência.

Acho que todo mundo que acessa com regularidade o nosso site conhece bem a história e toda a trajetória da Legião Urbana e seus membros. Renato Russo (vocais, teclado e violão) se uniu a Dado Villa-Lobos (guitarra, violão e percussão), Marcelo Bonfá (bateria) e Renato Rocha (baixo). Lançaram dois discos de imenso sucesso (Legião Urbana de 1985 e Dois de 1986) e dinheiro e shows estavam entrando aos montes na banda. Para cumprir o contrato de lançar três discos em três anos (e que já estava quase 11 meses atrasado quanto ao último) fizeram as pressas este disco Que País é Este e lançaram no final de 1987.

A Legião nunca foi lá uma banda de paz e amizade entre seus membros e problemas entre eles e suas gravadoras sempre foram uma constante. A EMI pressionava pelo terceiro disco que estava em contrato e queria aproveitar o hype pelo qual a banda estava passando.

Sem ter muito material novo naquela época, a banda teve que ir atrás de músicas velhas do antigo Aborto Elétrico de Renato Russo, composições de sua época de trovador solitário e duas músicas que conseguiram compor pouco antes de gravarem o disco. Ou seja, tudo na pressa e nas coxas, em que tudo poderia dar errado e a banda ter um baita patinho feio em sua discografia. Mas não foi o que aconteceu e o disco é o terceiro mais vendido da banda até hoje.

Essa é a vantagem de ter um compositor prolífico como foi Renato Russo. Embora os instrumentais e arranjos não fossem tão elaborados, essa simplicidade aliada a letras marcantes era o que ajudava a tocar suas músicas nas rádios e agradar uma faixa de jovens oitentistas sedentos por uma espécie de “voz” que os representasse. Querendo ou não, para muitos, Renato Russo meio que se tornou essa figura simbólica.

Bem ao estilo punk que caracterizava o Aborto Elétrico, “Que País é Este” já abria com sua crítica e mensagem forte da qual se tornou um hino da banda a partir de então. “Conexão Amazônica”, outra vindo de suas ex-banda e composta com Fê Lemos, inicia com um riff punk de guitarra e os gritos de Renato junto a uma interpretação agressiva ao qual não eram lá tão proeminentes assim nos dois álbuns anteriores.

“Tédio (Com Um T bem Grande pra Você)” era mais uma que veio da antiga banda punk. Com um jeitão bem Ramones, é mais uma com temática crítica em que muitos diziam que, na época em que foi composta, que Brasília apesar de ser a capital do país não tinha nada para fazer. Já “Depois do Começo” é um ska da qual o próprio Renato declarou que não gostava da música e que ela foi baseada em outra composição do velho Aborto. Concordando com ele, é de fato a faixa mais fraca do disco.

Depois veio “Química” considerada a canção que meio que foi a gota d’água para Renato sair do Aborto Elétrico após Fê Lemos ter dito que a música era ruim. Curiosamente, a música acabou no primeiro disco do Paralamas do Sucesso e foi graças a ela que a Legião foi convidada pela EMI para gravarem seus primeiros discos. Os fãs já conheciam a música porque a banda já a incluía em seus shows ao vivo.

“Eu Sei” já sai da fase punk de Renato e entra na de Trovador Solitário cuja a base sempre são os violões para se tocar sozinho, assim como o épico dylanesco “Faroeste Caboclo”, com uma história com momentos sem muito sentido (um boiadeiro dando uma passagem de graça para Brasília só porque precisava visitar a filha?), mas que por licença poética e artística aceitamos porque o enredo ainda é legal.

Para finalizar o álbum, as duas únicas inéditas gravadas para este álbum que são “Angra dos Reis” e “Mais do Mesmo”. A primeira com o gancho em um teclado bem ao estilo oitentista e um acompanhamento simples de baixo e bateria dando um ar de “balada post-punk” apesar da letra crítica à energia nuclear. A segunda é mais uma canção de crítica social e violência, voltando a um ritmo mais rockabilly o que caracteriza o quanto a banda gosta de variar entre diferentes estilos e ritmos dentro do rock.

Pelo próprio fato de metade do disco ser de material do Aborto Elétrico, este acaba sendo o trabalho mais punk e, de certa forma, crítico da Legião. Apesar de eu não gostar muito de punk, eu tenho um carinho especial por este álbum porque foi um dos primeiros que ouvi por inteiro deles quando os conheci lá pelo final dos anos 90. Se formos comparar com os outros discos, talvez excetuando o primeiro álbum que é um pouco mais parecido com este, é o que mais destoa da discografia da Legião. Mas ninguém parece ligar para isso, o que mostra que o álbum envelheceu bem visto que as temáticas destas canções podem facilmente ficarem datadas em décadas posteriores.

E você? O que acha deste disco deles?

Tracklist

01. Que País é Este

02. Conexão Amazônica

03. Tédio (Com um T Bem Grande Pra Você)

04. Depois do Começo

05. Química

06. Eu Sei

07. Faroeste Caboclo

08. Angra dos Reis

09. Mais do Mesmo

5 comentários sobre “Legião Urbana – Que País é Este [1987]

  1. Curioso que essa semana eu andei pensando bastante na Legião, e como esse disco em especial para mim é um álbum divisor de águas na carreira do grupo. Até aqui os caras, por mais sucesso que tivessem, ainda tinham uma veia de grupo. Com a saída do Rocha e o mega-sucesso das quatro estações, a Legião mudou de patamar. É um disco regular em comparação com os antecessores, o que não o impede de ser um belo disco. Tão bom quanto a resenha do André

  2. Foi o primeiro LP do Legião que ouvi do começo ao fim. Não tinha ligado muito para o disco de estreia e as principais músicas do “Dois” tocavam direto nas rádios, e o “Que País é Este?” foi-me emprestado por um amigo meu logo que ele comprou, e eu lembro de ter ficado impressionado com músicas que não tocavam, como “Mais do Mesmo” e “Química”, que me fizeram comprar os três discos do grupo de uma vez só quando achei uma promoção imperdível, logo depois que o “As Quatro Estações” saiu. Hoje em dia raramente ouço Legião, mas a resenha me deu vontade de escutar de novo. Ainda acho este disco o segundo melhor do grupo, só perdendo para “As Quatro Estações”, que é quase um greatest hits!

  3. Falar deste disco hoje é complicado porque ele foi lançado em uma época em que a imensa maioria dos fãs brasileiros de música eram muito desinformados, eu inclusive.

    QUE PAÍS É ESTE para mim tem um valor sentimental imenso, mas não há como negar, por mais que minha memória afetiva tente me cegar, a sua pobreza musical e as chupadas de RENATO RUSSO nos dois maiores sucessos do disco, a faixa título, surrupiada de I DON´T CARE do RAMONES, e FAROESTE CABOCLO, uma junção canhestra e cafona de LIKE A ROLLING STONE e HURRICANE do BOB DYLAN, sem falar em MAIS DO MESMO, constrangedora em sua “inspiração” de resultados raquíticos, tanto na letra quanto na música, em I´M WAITING FOR THE MAN do VELVET UNDERGROUND.

    Apenas 2 músicas do disco resistiram ao teste do tempo e ainda hoje me emocionam: EU SEI, uma das melhores músicas da banda, e ANGRA DOS REIS, etérea e belíssima.

    Com exceção dessas duas obras-primas, tudo em QUE PAÍS É ESTE remete a um punk de butique inofensivo e desnatado, típico de moleques bem nascidos. Na época de seu lançamento eu, em minha adolescência semi ignorante, não tinha vivência e inteligência para perceber isso, mas hoje, com algumas décadas a mais nas costas, centenas de livros lidos e milhares de discos ouvidos depois, não dá para ser ludibriado por essa falcatrua toda…

    1. “Apenas 2 músicas do disco resistiram ao teste do tempo e ainda hoje me emocionam: EU SEI, uma das melhores músicas da banda, e ANGRA DOS REIS, etérea e belíssima”.
      Leste o meu pensamento?
      Penso o mesmo.

  4. Acho que a beleza da arte está, também, na passagem do tempo… Diferentemente do colega do comentário anterior, não só esse álbum como o restante da discografia da Legião Urbana, para mim, não só resistiram bem ao tempo como as letras, atualmente, me dizem mais coisas do que as inúmeras que já diziam ao adolescente que embalava sua vida ao som do rock daqui de Brasília.
    Muito obrigado, André, pela resenha.

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