Dez bandas em que os músicos que gravaram o disco de estreia já faleceram

Por Micael Machado
Embora as raízes do estilo venham de bem antes, não seria errado considerarmos a década de 1950 como o início do rock and roll, com o surgimento de nomes como Elvis Presley, Little Richard, Fats Domino, Chuck Berry e Jerry Lee Lewis, dentre outros. Sendo assim, são pelo menos setenta anos do estilo no mundo da música, e é natural que, durante este período, muitos músicos tenham falecido ao longo deste tempo. O que não é tão comum é que um grupo ou banda tenha todos os seus membros já falecidos, pois, geralmente, pelo menos um dos membros originais ainda está entre nós, muitas vezes na ativa. Desta forma, listo neste artigo dez bandas onde os músicos que registraram o disco de estreia do grupo (mesmo que não fossem os membros originais) já não estão mais entre nós, fazendo parte daquela famosa “jam session no céu” a qual às vezes os fãs se referem (e, com um line up destes, daria para fazer um grande festival “do outro lado”, e ainda chamar um monte de “músicos convidados” para participar). Vamos à lista (por ordem de lançamento dos discos de estreia):
The Jimi Hendrix Experience (Are You Experienced – 1967)
Jimmy James era um guitarrista tentando se destacar no circuito de shows de Nova Iorque quando Linda Keith, a então namorada do guitarrista dos Rolling Stones, Keith Richards, o viu tocar no Cheetah Club, naquela cidade. Linda o indicou a Chas Chandler, que assumiu o papel de empresário de Jimmy e o levou para a Inglaterra, onde o músico foi rebatizado como Jimi Hendrix, e foi formada a The Jimi Hendrix Experience, com o também guitarrista Noel Redding (deslocado para o baixo) e o excelente baterista Mitch Mitchell. Este trio gravou três discos entre 1967 e 1968, e mudou para sempre a história da guitarra na música, com muitos (eu inclusive) afirmando que Hendrix foi o melhor guitarrista que já passou pela face do planeta em todos os tempos. Ele foi o primeiro a partir, em 1970, oficialmente “asfixiado após ter aspirado seu próprio vômito enquanto estava intoxicado com barbitúricos” (supostamente após ter ingerido um remédio para dormir usado pela então namorada Monika Dannemann), em circunstâncias que são discutidas e debatidas até hoje. Redding partiu em 2003, de problemas decorrentes de cirrose, com Mitchell vindo a falecer em 2008, de causas naturais, fazendo, desta forma, que o trio pudesse novamente ter condições de se reunir “no além”, onde devem estar fazendo intermináveis jams ainda hoje.
Canned Heat (Canned Heat – 1967)
Formada em Los Angeles em 1965, o Canned Heat foi um dos principais divulgadores do blues rock nos EUA no final da década de 1960 e início da seguinte, gravando álbuns que viraram clássicos com a passagem do tempo. Embora não seja a original, a formação com Bob Hite (vocais), Alan Wilson e Henry Vestine (guitarras), Larry Taylor (baixo) e Frank Cook (bateria) registrou o disco de estreia em 1967, com Cook sendo substituído por Adolfo “Fito” de la Parra no final do mesmo ano, completando uma formação que ficaria unida por mais três álbuns entre 1968 e 1969. Da formação do primeiro registro, Alan Wilson foi o primeiro a partir, em 1970, por overdose de barbitúricos, seguido por Bob Hite em 1981 (por overdose de heroína), Henry Vestine em 1997 (problemas cardíacos), Larry Taylor em 2019 (câncer) e, finalmente, Frank Cook em 2021 (não encontrei o motivo de sua morte em minhas pesquisas, mas, aparentemente, foi por causas naturais). Fito de la Parra mantém o grupo na estrada ainda hoje, porém, sem o mesmo destaque que o Heat já teve em décadas passadas.
Silver Apples (Silver Apples – 1968)
Considerado um dos pioneiros no uso de recursos eletrônicos no mundo do rock, o duo Silver Apples (formado por Danny Taylor na bateria, percussão e vocais, e Simeon Oliver Coxe III nos sintetizadores, vocais e “demais instrumentos”) é, ao lado do Kraftwerk, um dos mais influentes grupos da história quando tratamos de música eletrônica, sendo citados e lembrados ainda hoje em dia (por exemplo, o filme Guerra Civil, de 2024, apresenta com destaque em sua trilha sonora uma das músicas da banda, “Lovefingers”, deste mesmo disco de estreia). Tendo lançado dois álbuns no final da década de 1960, o duo se separou em 1970, após gravar um disco rejeitado pela gravadora, o qual só seria lançado em 1998, quando a dupla já havia voltado a se apresentar junta, após a retomada do grupo apenas com Simeon e outros músicos em 1996. Taylor faleceu em 2005 (não encontrei o motivo de sua morte em minhas pesquisas), com Simeon dando continuidade sozinho ao nome (e às atividades) do grupo até sua morte, em 2020, por fibrose pulmonar, o que finalmente encerrou o capítulo da banda nos livros de história.
Lynyrd Skynyrd (Pronounced ‘Lĕh-‘nérd ‘Skin-‘nérd – 1973)
A formação que registrou o disco de estreia do Lynyrd Skynyrd, um dos pioneiros e mais importantes grupos do southern rock, composta por Ronnie Van Zant (vocais), Gary Rossington e Allen Collins (guitarras), Ed King (baixo e guitarras), Billy Powell (teclados) e Bob Burns (bateria), também não é a original da banda, mas gravou este e o segundo álbum (onde teve o acréscimo de Leon Wilkeson no baixo, deixando King livre para focar apenas nas guitarras) antes de Burns ser substituído por Artimus Pyle (bateria), que, entre idas e vindas, permaneceu no posto até 1991. Como sabemos, Ronnie faleceu no trágico acidente de avião em que a banda se envolveu em 1977 (e que também ceifou a vida do guitarrista Steve Gaines e de sua irmã, a “backing vocalist” Cassie Gaines, além de outros membros da equipe da banda), com Allen Collins fazendo a passagem em 1990 (por causa de complicações de um acidente automobilístico que o deixou paralisado da cintura para baixo, ocorrido em 1986). Os demais membros que gravaram o disco de estreia faleceram já nos anos 2000, sendo Powell em 2009 (ataque cardíaco), Burns em 2015 (acidente de carro), King em 2018 (câncer) e Rossington mais recentemente, em 2023 (de causa não revelada). Leon Wilkeson também faleceu, em 2001 (por causas naturais), deixando Artimus Pyle como o único músico vivo (enquanto escrevo) dentre os membros da banda citados neste texto.
Som Nosso de Cada Dia (Snegs – 1974)
Formado na cidade de São Paulo em 1971, o trio composto por Manito (teclados, saxofone, violino e flauta), Pedro “Pedrão” Baldanza (vocais, guitarra e baixo) e Pedrinho Batera (bateria e vocais) foi um dos mais importantes nomes do rock progressivo nacional nos anos 1970, tendo lançado o seu disco de estreia, o sensacional Snegs, em 1974, com Manito deixando o grupo no ano seguinte. Entre idas e vindas, Pedrão manteve vivo o nome do Som Nosso até sua morte, em 2019 (de causas não divulgadas), sendo que, neste meio tempo, a formação original chegou a se reunir e gravar um disco ao vivo, lançado em 1994 (com o acréscimo de Jean Trad na guitarra e Homero Lotito nos teclados), com Pedrinho vindo a falecer no ano seguinte, vítima de uma isquemia cerebral, forçando o grupo a uma nova parada. Manito ainda participou de um novo retorno em 2008, onde ele e Pedrão tiveram a companhia dos músicos de apoio Thiago Furlan e Jorge Canti (vocais), Marcelo Schevano (guitarra e flauta), Fernando Cardoso (teclados) e Edson Guilardi (bateria), mas, em 2011, viria a sucumbir a um câncer na laringe. Como escrevi acima, Pedrão seguiu tocando e gravando como Som Nosso de Cada Dia até falecer, chegando a lançar um terceiro disco de estúdio do grupo pouco antes de sua passagem, em 2019, e até a dar uma entrevista exclusiva para este nosso site em 2017.
Ramones (Ramones – 1976)
Um dos precursores do punk rock, o quarteto novaiorquino formado pelos “irmãos” Joey Ramone (vocais), Johnny Ramone (guitarra), Dee Dee Ramone (baixo, backing vocals) e Tommy Ramone (bateria) gravou três discos de estúdio entre 1976 e 1977, além de um ao vivo lançado em 1979 (mas gravado em 1977), antes de Tommy dar lugar a Marky Ramone em 1978, com o grupo seguindo carreira (entre mudanças de formação e muitos shows ao redor do mundo) até sua separação, em 1996. Joey faleceu em 2001 por causa de um linfoma, com Dee Dee o seguindo no ano seguinte, devido a uma overdose de heroína. Em 2004, Johnny sucumbiu a um câncer de próstata, e Tommy faleceu em 2014, vítima de um câncer do ducto biliar. Marky, CJ (baixista que substituiu Dee Dee em 1989) e Richie (baterista que tocou com o grupo entre 1983 e 1987) seguem na ativa, cada um com sua própria carreira solo, e, de certa forma, mantendo a música do grupo viva pelos palcos do mundo!
Motörhead (Motörhead – 1977)
A estreia oficial de uma das mais influentes bandas da história (tanto do heavy metal quanto do punk e do hardcore) não foi, na verdade, o primeiro registro do grupo, pois o baixista e vocalista Ian Fraser “Lemmy” Kilmister já havia gravado, com outra formação, um disco rejeitado pela sua gravadora no ano anterior. Com a entrada de “Fast” Eddie Clarke nas guitarras e Phil “Philthy Animal” Taylor na bateria, a “formação clássica” do Motörhead surgiu em 1977, permanecendo junta até 1982 e lançando cinco discos, sendo o primeiro registro colocado no mercado naquele mesmo ano de 1977. O disco “rejeitado” de 1976 apareceria nas prateleiras do mundo (inicialmente, sem a permissão nem o aval da banda) apenas em 1979, tendo as partes de bateria regravadas por Animal (sendo que as originais foram registradas por Lucas Fox, que teve suas linhas mantidas apenas em uma música) e as linhas de guitarra registradas por Larry Wallis (que também integrou o Pink Fairies). Animal e Lemmy faleceram em 2015 (o primeiro de problemas no fígado, e o segundo de problemas cardíacos, além de sofrer de câncer de próstata), com “Fast” Eddie indo lhes encontrar em 2018, vitimado por uma pneumonia. Larry Wallis faleceu em 2019 (de causas não divulgadas), deixando Fox como o único músico vivo (enquanto escrevo) dentre os membros da banda citados neste texto (cabe citar que outro músico que passou pela banda, o guitarrista Michael “Würzel” Burston, que tocou com o Motörhead entre 1984 e 1995, também já faleceu, vítima de problemas cardíacos, em 2011).
Emerson, Lake & Powell (Emerson, Lake & Powell – 1986)
Keith Emerson (teclados) e Greg Lake (baixo, guitarras e vocais) fizeram fama e fortuna nos anos 1970 como parte do Emerson, Lake & Palmer, um dos principais nomes do rock progressivo naquela década. Após a separação do trio, em 1979, havia por parte dos músicos uma ideia de reunião em 1984, mas o baterista Carl Palmer estava preso a obrigações contratuais com sua banda de então, o supergrupo Asia. Sendo assim, Emerson e Lake começaram a testar novos bateristas, chegando ao renomado Cozy Powell, amigo de longa data de Emerson, e que já havia tocado, dentre outros, com nomes como The Jeff Beck Group, Rainbow, Michael Schenker Group e Whitesnake. O trio Emerson, Lake & Powell lançou apenas um disco autointitulado em 1986, e fez uma bem sucedida excursão de divulgação que abrangeu o ano seguinte, antes da separação do grupo, com Powell vindo a falecer em 1998, vítima de um acidente de carro. Emerson, Lake e Palmer voltariam a se reunir sob o nome ELP na década de 1990, sendo que tanto o tecladista quanto o baixista viriam a falecer em 2016, Emerson devido a um suicídio por arma de fogo, e Lake vítima de um câncer de pâncreas, sendo que Carl Palmer ainda continua vivo e na ativa como instrumentista enquanto escrevo este texto.
BBM (Around the Next Dream – 1994)
Jack Bruce (baixo, vocais) e Ginger Baker (bateria e percussão) já haviam tocado juntos nos grupos Alexis Korner’s Blues Incorporated e The Graham Bond Organisation, mas alcançaram fama e fortuna mesmo durante seu período com o Cream, entre 1966 e 1968. É notório que os dois nunca se entenderam bem pessoalmente, mas sempre admiraram um ao outro como músicos. Porém, não dá para negar que foi com certa surpresa que o mundo viu surgir em 1993 o power trio BBM, que unia os dois “B’s” ao “M” do guitarrista Gary Moore, à época um reconhecido músico, com passagens por bandas como Skid Row (que não é aquela que você está pensando, mas sim uma que se formou na Irlanda no começo da década de 1970) e Thin Lizzy, além de sua própria carreira solo. O único disco do BBM foi lançado em 1994, e, após uma curta turnê promocional, as “tretas” entre Bruce e Baker voltaram à tona, e o trio logo se separou. Moore faleceu em 2011, vítima de um ataque cardíaco, com Bruce o seguindo em 2014, por câncer no fígado, e Baker partiu em 2019 com problemas respiratórios causados por uma doença nos pulmões.
Mamonas Assassinas (Mamonas Assassinas – 1995)
Considerado um dos maiores fenômenos musicais já vistos no Brasil (comparável apenas aos Secos e Molhados na década de 1970 e ao RPM na década de 1980), os Mamonas Assassinas surgiram em 1995, a partir de mudanças de visual e estilo musical da banda Utopia, que chegou a lançar um disco em 1992. Com letras engraçadas e escrachadas e um estilo musical onde cabia de tudo e mais um pouco, Dinho (vocais), Bento Hinoto (guitarras), Júlio Rasec (teclados) e os irmãos Samuel Reoli (baixo) e Sérgio Reoli (bateria) venderam mais de três milhões de copias de seu disco de estreia nos pouco mais de oito meses em que ficaram na ativa, antes de falecerem em um desastre aéreo na Serra da Cantareira, no dia 2 de março de 1996, encerrando a curta mas marcante trajetória do grupo pelo cenário musical nacional.
Infelizmente, em janeiro de 2025 a The Band também juntou-se a esta lista, com a morte de seu último membro sobrevivente, o tecladista Garth Hudson. Outras bandas estão “quase” lá, como a Allman Brothers Band, na qual apenas o baterista Jai Johanny Johanson, o “Jaimoe”, ainda está entre nós enquanto escrevo, os já citados Emerson, Lake & Palmer (que só tem Carl Palmer entre nós) e Cream (do qual apenas Eric Clapton ainda vive) e os brasileiros d’Os Incríveis, que tem apenas Netinho ainda na ativa. Que demore ainda um tempo para estes e outros grupos virem a fazer parte desta lista, e que possamos curtir nossos ídolos ainda por muito tempo, tanto nos estúdios, quanto nos palcos pelo mundo!
The great gig in the sky tem cada vez mais grandes músicos… De todas as citadas, eu não sabia dos casos do Canned Heat (desconhecia a morte de Frank Cook), do Silver Apples e do Som Nosso (na verdade, não acompanhava a carreira das duas bandas). Acho que o caso mais triste é mesmo o dos Mamonas, em que todo mundo partiu naquele fatídico acidente. E com os velhos rockers nos deixando, cada vez mais bandas vão entrar nessa triste lista, infelizmente. Por isso que eu gostaria de ver Martin Barre de volta no Jethro Tull. Jon Anderson de volta ao Yes, por exemplo – cada dia a gente chega mais perto do “tarde demais”.