Guarapuava/PR – Sim, nós temos uma forte cena local
Por André Kaminski
Guarapuava é uma cidade de quase 180 mil habitantes que fica na região centro-sul do Paraná. Tirando o fato de ser uma cidade de clima frio e bastante ventosa, o município nunca se caracterizou muito por algum tipo de grande ponto turístico ou algum tipo de atividade econômica forte que a tornasse conhecida no Brasil. Nos noticiários, o máximo que acontece é aparecer imagens de geadas e de algumas raras quedas de neve, como aquela que ficou famosa em julho de 2013. O pessoal de fora normalmente só vem para estudar na universidade pública, se formar, e retornar ao seu município de origem ou ir para alguma cidade com maior potencial de crescimento.
Mas a impressão que tenho é que são nesses climas bucólicos e sem muitas opções de lazer é que fazem os jovens a ter interesse em se expressar através do rock. Desde o início dos anos 2000, Guarapuava tem tido um crescimento notável da cena rockeira local, com muitas bandas surgindo e um aumento dos festivais de bandas locais que fizeram com que a cena esquentasse no decorrer dos anos. O apoio e o investimento de alguns empresários locais, que nada mais são do que integrantes de várias dessas bandas, também foi fundamental para que essas bandas que nada mais surgiram de sonhos de jovens que só tocavam em suas garagens pudessem exibir seus trabalhos, tanto alguns tributos como também de vários trabalhos autorais que são bastante conhecidos pelo pessoal que conhece a cena local.
E para escrever este texto, nada melhor do que entrar em contato com um desses caras que está batalhando na cena, seja tocando ou produzindo, para buscar informações mais detalhadas e precisas sobre o rock guarapuavano. Alessandro Küster é proprietário da Heaven Studio, produtor da mesma empresa e baterista das bandas SatisFire e OverGrunge e o mesmo conversou comigo contando como tudo começou e o que pensa da atual situação da cena local.
Sobre o início de tudo, “não pensei como um investimento e sim como a tentativa de criar um movimento“. Sempre curti o fato de que vários do grandes feitos surgiram de sonhos simples aos quais muitos não imaginam no que podem se tornar. “Começamos pelo ano 2000 fazendo festivais underground. Desde essa época já tínhamos a mentalidade de unir vertentes do Rock na tentativa de fortalecer a cena. Fazíamos festivais com bandas de metal, de rock n roll, punk e hardcore“. Aqui eu lembro porque nesse período eu já ouvia muito falar desses festivais aos quais comecei a ir em alguns poucos a partir de 2005.
Uma das ideias que veio surgindo com o tempo foi fazer de Guarapuava a capital paranaense do rock. De acordo com Alessandro a ideia “foi desenvolvendo com o tempo. No início, como éramos muito jovens, o desejo principal como eu disse era fortalecer a cena de alguma forma e consequentemente criar oportunidades das nossas bandas se apresentarem aqui e fora da cidade através de intercâmbios. Não tínhamos essa mentalidade de empresa que veio com a Heaven, Guarapuava Rock City e Saia da garagem.“
Os resultados de todo esse trabalho durante os anos apareceu em 2013, na época do Guarapuava Rock City III, evento que junta várias bandas locais tocando músicas primariamente autorais. “Tivemos uma dificuldade enorme para fechar o cast dessa edição que precisava apenas de 16 bandas de rock. Em menos de 1 ano contabilizamos 70 bandas. Acho que ressuscitar o Rock City foi o incentivo que os rockeiros precisavam”. Confesso que aqui fiquei embasbacado com o número. Vou repetir: SETENTA BANDAS AUTORAIS. Que me perdoem os caras de Curitiba, Pato Branco e Cascavel que possam estar lendo este texto e sei que possuem também bandas locais, mas fica complicado não considerar a possibilidade de realmente Guarapuava ser a capital paranaense do rock.
Além de tudo, o trabalho dos caras também dá oportunidades para pequenas bandas sem qualquer tipo de estrutura ou grandes contatos profissionais a terem um espaço para se apresentarem “O Guarapuava Rock City não é a salvação do mundo, mas com certeza é uma ótima vitrine para qualquer banda autoral pois se trata de um evento com estrutura grande, público de mais ou menos 2000 pessoas, coletânea de excelente qualidade para valorizar exclusivamente o autoral“. “
Creio que nesse molde, o Rock City esteja entre o 3 maiores festivais do sul do Brasil. Por causa desse boom, criamos o Saia da Garagem, porque a maioria das 70 bandas não tinham nível profissional ou nunca tinham se apresentado.”
Neanderdogs
Se você curte o rock sulista americano típico de bandas como ZZ Top e Black Label Society, você tem que ouvir o som desses caras. Cantado em português, os caras contam com quatro músicas próprias que acredito que logo devem vir mais para fazerem seu primeiro full leght. Muito conhecidos na cena local, os frutos estão chegando já que recentemente abriram para um show do Matanza na cidade. A mais nova das bandas da lista, foi formada em 2012 por Gabriel “Pinhão” Ramos (vocais), Vinícius Hermann (guitarras), Felipe “Zoboo” Kosouski (guitarras), Luan Gomes (bateria) e Vítor Hermann (baixo).
Ultra Violent
As camisetas dos caras da foto já dizem o nível das influências deles. O trio se reuniu em 2008 para fazer um heavy metal pesadíssimo com uma boa influência do hardcore sendo a primeira banda que me vem a mente ao ouví-los seja o Ratos de Porão. O primeiro EP contava com canções em inglês, mas o último single deles chamado ” I.N.E.R.T.E” conta com vocais em português e aparentemente, será com o nosso idioma que eles irão seguir. Pela última atualização da página da banda, eles entraram recentemente no estúdio para gravarem coisa nova. Não tem jeito, com esse tipo de sonoridade é abrir a roda de mosh e cair dentro. Formada por Rudy Alves (baixo), Guilherme Rocha (guitarra e vocais) e Rafael Pelete (bateria).
Ainda há muitas bandas que faltou citar com trabalho autoral. Tem o heavy tradicional do Desert Eagle, o hard rock do Dzarmy, o white metal do Honorificah, o death metal do Open Scars, o folk metal com guturais do Futhärk e tantas outras. Há também várias que infelizmente acabaram, sendo o exemplo mais lamentável o thrash metal do Necropsya, com dois full lenghts gravados (não eram da cidade, mas eram praticamente parte da cena).
Uma das razões pela qual escrevi o texto é que eu gostaria muito que tivessem tantas outras cenas como a nossa em vários pontos do Brasil. Sei que algumas existem, talvez maiores, talvez menores, mas o que falta é divulgação. Sei também que há muitos lugares do nosso país com gente disposta a tocar rock e fazer seu som próprio. Você que é músico e gostaria de fazer algo similar na sua cidade, conversem e unam-se. Aqui deu certo, aí também pode dar.
Acho que não é tão exclusividade de Guarapuava o surgimento de novas bandas aqui pelo Paraná. Pelo que me lembro, aqui em Londrina (cidade próxima a minha) também surgem várias bandas, algumas até com boa projeção (não vou saber uma média de quantas bandas, mas sei que existem algumas).
Agora, quanto ao que se falou sobre o fortalecimento da cena: “Não costumo ser um cara pessimista, só que não estou vendo muita possibilidade de crescimento para os próximos anos. Os pequenos e médios eventos cada vez com menos público e nos grandes os ícones estão morrendo”. Um ponto chave é: as bandas que estão surgindo são realmente boas? Você citou cerca de 70 bandas, mas realmente quantas dessas bandas são boas? Acredito que quando o som é de qualidade e o trabalho de divulgação é eficiente, as bandas conseguem angariar seguidores e levar um público considerável a seus shows (tem uma banda na minha cidade chamada Ases Atrozes. O som é horrível, com cara de alt. rock dos Los Hermanos. Mas o público comprou o som e, pelas cidades que eles passam, conseguem até levar um público bom nos shows).
Ainda não ouvi as citadas, farei isso com mais tempo hoje a tarde. Eu sempre acreditei em apoiar as boas bandas de qualquer lugar que for, e não a cena como um todo. Alguns podem até dizer: “mas pô, cu de onça, e a cena norueguesa de black metal, ou a cena de Minas Gerais?”. Levaram bandas estupidamente boas para visibilidade, mas cada cena também tinham outras tantas bandas de qualidade inferior ou péssima (pra cada Sarcófago e Sepultura, existia um Holocausto ou Sextrash, que são pavorosas).
Acho legal a iniciativa de tentar incentivar novos artistas a mostrarem seu trabalho autoral (porque festival com banda cover é de fuder), e realmente isso deve ser feito, mas é bom um pouco de discernimento para separar o joio do trigo e não cometer gafes como a que aquele maleta do Angra cometeu anos atrás, dizendo que era obrigação apoiarmos toda banda brasileira e pararmos de chupar a rola das bandas gringas. Ora, se eu curto a banda internacional e ela vir fazer show, farei um esforço pra ir. O mesmo pra banda brasileira. Agora se a banda for ruim, ela pode ter vindo da China com o maior esforço que eu não irei perder tempo. O mesmo com a banda aqui da minha cidade que citei mais acima. Não saio de casa pra assistir show dos caras só porque são da minha cidade. Não sei se me fiz entender, mas é basicamente isso aí.
No mais, um ótimo documento, André. Mandou bem.
“O som é horrível, com cara de alt. rock dos Los Hermanos.” Então deve ser bom pra caralho!!
Se tiver saco pra ouvir isso: https://www.youtube.com/watch?v=P2cGJvTdn7c
Po, gostei do som dos caras
Nossa senhora…
Sério. Não é uma Maravilha como Los Hermanos, mas é bom
Lozzzzzzzzzzzzz hermanozzzzzzzzz uma maravilha? Nem Jesus & Mary Chain explicam. Recomendo doses diárias de The Shaggs para curar esse surto.
Não curto Los Hermanos. Técnica vocal é uma coisa, agora desafinação pura não dá pra aguentar. Essa banda aqui da minha cidade ainda leva créditos por ter vocais melhores.
“Agora, quanto ao que se falou sobre o fortalecimento da cena: “Não costumo ser um cara pessimista, só que não estou vendo muita possibilidade de crescimento para os próximos anos. Os pequenos e médios eventos cada vez com menos público e nos grandes os ícones estão morrendo”. Um ponto chave é: as bandas que estão surgindo são realmente boas? Você citou cerca de 70 bandas, mas realmente quantas dessas bandas são boas? Acredito que quando o som é de qualidade e o trabalho de divulgação é eficiente, as bandas conseguem angariar seguidores e levar um público considerável a seus shows (tem uma banda na minha cidade chamada Ases Atrozes. O som é horrível, com cara de alt. rock dos Los Hermanos. Mas o público comprou o som e, pelas cidades que eles passam, conseguem até levar um público bom nos shows).”
Discordo apenas dessa parte aqui “Você citou cerca de 70 bandas, mas realmente quantas dessas bandas são boas? Acredito que quando o som é de qualidade e o trabalho de divulgação é eficiente, as bandas conseguem angariar seguidores e levar um público considerável a seus shows”. No Brasil e agora também em boa parte do mundo, isso não ocorre mais. Há tempos que contatos profissionais, dinheiro para gravação, jabás, em alguns casos até uma certa influência política e muito investimento em divulgação são os principais meios de se conseguir um público para si. O que se consegue sem tudo isso é um público que não consegue muitas vezes sustentar a banda a longo prazo. Gostaria que fosse diferente, mas vejo mais isso acontecer de um talento ser reconhecido em alguma parte do país e chegar a fama. Se isso ocorre, é a exceção e não mais a regra.
Quanto a uma cena local, primeiro é necessário compreendermos que a quantidade é tão ou talvez até mais importante que a qualidade. Porque duas ou três bandas locais não fazem uma cena, fazem fãs ou seguidores. Uma cena precisa de um ambiente de muita gente de uma mesma região para tocarem juntos e tentarem se fortalecer juntos e claro aí costuma-se ter os destaques que normalmente conseguem um algo a mais. Mesmo que Sepultura e Sarcófago sejam os grandes destaques da cena mineira oitentista, eles não chegariam onde estão sem ter aquelas outras dezenas de bandas locais, independente de serem ruins ou não, ali juntos para promoverem festivais e mesmo comprarem materiais uns dos outros. Por isso a importância do Holocausto e Sextrash na cena local é tão grande quanto as duas outras grandes citadas.
Cenas são diferentes por isso: precisam de quantidade, precisam de gente para tocarem juntos. E o que eu admiro muito na cena de Guarapuava é que são 70 bandas tentando fazer seus sons autorais, e nisso vai surgir coisa boa e ruim, e mesmo os ruins hoje podem melhorar e se tornarem bons amanhã.
Quanto a citação ao Falaschi, eu concordo que não dá para seguir o que ele fala apenas porque dá. Mas no caso da fala do Alessandro, ele só foi realista e não choroso para obrigar que alguém apoie a cena.
Guarapuava, a Boston do Paraná. O Alessandro Kuster está de parabéns. Juntar 70 bandas autorais em um evento independente, em uma cidade de quase 200 mil habitantes, é uma BAITA FAÇANHA. Tenho o CD do Guarapuava Rock City IV, e também o CD do Kingargoolas, e ambos são muito bons. O Kingargoolas tem um som de surf music excelente. Não estou com o CD do Guarapuava Rock City em mãos no momento, mas lembro de uma postagem que fiz na página do grupo da Consultoria, que destaquei além do Kingargoolas as seguintes bandas: Dzarmy, Hard Rockers, Adoc, Neanderdogs, Disaster Boots e Desert Eagle. Porto Alegre e Pelotas também são berços de muita banda boa. Na década de 90, tinha um ótimo festival em Pelotas (o saudoso 277), que fazia com que as bandas se apresentassem em um teatro toda segunda-feira. A casa lotava. Porém, a administração que ganhou as eleições para a prefeitura, e que não era do mesmo partido que idealizou o projeto, acabou com tudo. Nunca mais houve algo parecido, mas mesmo assim, para quem ainda vive nos bares da cidade, encontra ótimos músicos. Guarapuava mostra que é possível fazer som bom e se destacar, e tomara que não parem. Parabéns pelo texto André.
Ta me devendo aquele War Room o primeiro disco do Kingargoolas (agora pode ser com o segundo)
Mairon, o que acho legal das cenas locais é justamente o fato de que as bandas, empresários e público dependem muito uns dos outros para que a criatividade da música possa fluir. Por isso sou muito interessado na história das cenas, justamente por ter essa diferença grande da questão “grande gravadora, grande mídia, lançamento de cd, público opinando”. É uma relação diferente com a música, pode não dar certo, pode depois de um tempo uma dessas partes não ir pra frente e a cena como um todo acabar, mas que as histórias e as músicas produzidas naquele período ficam pra sempre.
E eu sou um que adoraria ler mais textos sobre cenas locais diferentes espalhadas pelo Brasil.
Pois é Mairon, tínhamos conversado sobre isso. Precisávamos de mais uns dois para fazermos.
putz, moro relativamente perto de guarapuava ( 240 km ) e nunca tinha percebido que tem bandas e uma cena interessante acontecendo, a minha cidade ( cascavel) teve uma cena forte nos anos 90 com bandas de qualidade ( kreditor – hammerdown – steellord ) e com shows de todas as principais bandas do brasil ( dorsal – rdp – overdose ), e sempre temos shows aqui pena que o publico nao comparece como o evento merece .
Eu ouvi falar da cena de Cascavel, uma pena realmente que teve essa queda de público.
https://www.youtube.com/channel/UCuHHLTPcOqk_l3EtOuTsXCg
Prazer brother, banda RockRevive, de Guarapuava, existe desde de 2008m, lançara seu 1° CD ainda no primeiro semestre de 2016, gravação HeavenStudio