Fresh Fruit for Rotting Vegetables – Os Primeiros Anos [2014]
Klaus Flouride, Jello Biafra, East Bay Ray e Ted, em uma foto icônica do Dead Kennedys. As circunstâncias da noite onde ela foi tirada são relatadas no livro.
Com muito jogo de cintura, fazendo várias concessões e usando do que chamaríamos por aqui de “jeitinho brasileiro”, Ogg conseguiu convencer os componentes do Dead Kennedys a deixá-lo publicar suas entrevistas na forma de um livro, que acabou sendo Fresh Fruit for Rotting Vegetables: Early Years, lançado em 2014, e que ganhou edição brasileira no mesmo ano, a cargo das Edições Ideal (com título traduzido de forma literal, felizmente). Unindo as declarações dos quatro membros originais, além de várias pessoas que, como disse antes, acompanharam este início de carreira do grupo, Ogg acabou obtendo um resultado bastante atraente, e indispensável a quem gostaria de saber um pouco mais sobre a história de uma das mais importantes aglomerações do punk rock norte-americano.
O autor inicia pela formação do Dead Kennedys, com o encontro de Biafra e Bay Ray, que depois se uniriam a Klaus, Ted e o guitarrista 6025 (que sairia antes das gravações de Fresh Fruit) na primeira encarnação do conjunto. A partir daí, traça a trajetória ascendente do grupo, apresentando-se pelos bares de sua cidade natal, San Francisco, até ganhar residência no então importante Mabuhay Gardens, onde o quinteto pode desenvolver sua sonoridade e, principalmente, a presença de palco de Biafra, que agitava a plateia (e com ela), além de desafiá-la o tempo todo, e de se entregar “de corpo e alma” em suas apresentações (leia o livro e entenderá o que quero dizer). As dificuldades destes primeiros tempos, os primeiros registros (com os singles “California Über Alles” e “Holidays In Cambodia”), a consagração pelos palcos da Inglaterra, a oferta de lançar seu primeiro disco (pela gravadora britânica Cherry Red) e o período de gravação e divulgação do mesmo são narrados de uma forma que torna a leitura bastante fácil e atraente, com a história sendo contada pelas próprias pessoas que as viveram, e comentários adicionais aqui e ali feitos pelo autor para contextualizar alguns pontos.
É fácil perceber que, mesmo passado tanto tempo, ainda há uma grande mágoa presente entre Biafra, Ray e Klaus. Não são poucas as oportunidades onde um contradiz o outro ao longo do livro, com Ted por vezes discordando dos dois lados, e apresentando uma terceira visão dos acontecimentos. Ogg fica sempre “em cima do muro” quando das discussões, apresentando sempre que necessário as versões de todas as vertentes envolvidas, sem escolher apenas uma para ser a “verdadeira”, deixando isto a cargo do leitor. As divergências são frequentes e constantes, e vão desde a criação e composição das músicas até o fato de quem selecionou tal foto para o encarte ou quem foi o responsável pela escolha dos singles a serem lançados. Apesar destas várias discordâncias, a leitura não se torna maçante em momento nenhum, e tais fatos só servem para provar como um mesmo acontecimento pode ser encarado de formas totalmente diferentes por pessoas diferentes envolvidas com ele (e atingidas por ele).
A versão em capa dura da edição brasileira
O livro ainda conta com várias ilustrações a cargo do designer original do grupo, Winston Smith (o qual ganha um capítulo a parte tratando sobre a importância de seu trabalho), além de declarações de muitos músicos e personalidades influenciadas pela obra dos Dead Kennedys. Na versão lançada pela Edições Ideal (traduzida com competência por Alexandre Saldanha, e que ganhou uma bela versão especial em capa dura), consta ainda um emocionante texto escrito por Marcelo Viegas, responsável pela edição nacional da obra, e que destaca o impacto do disco para a juventude brasileira da época em que foi lançado (e, por que não, da que veio depois daquele tempo), em tom saudosista e de homenagem a um álbum de importância atemporal.
A obra acaba quando da saída de Ted, no final de 1980, e com o afastamento do Dead Kennedys da gravadora Cherry Red, ocorrido no ano seguinte, sem se alongar mais na biografia de uma das principais formações do hardore norte-americano. Mas, apesar de ficarmos com vontade de saber do restante da história após a leitura do livro, Fresh Fruit for Rotting Vegetables: Os Primeiros Anos é leitura obrigatória aos fãs não só dos Dead Kennedys, mas do punk rock em geral, e altamente recomendada a quem quer saber mais sobre o estilo, que tem no disco, como citei no início, um de seus principais representantes. Pode conferir!
Livros deste tipo sempre me deixam com um pé atrás. Por ser contado majoritariamente na forma de entrevistas com os próprios caras do Dead Kennedys, não temos uma veracidade ali, se realmente podemos confiar na palavra do sujeito ou se ele está distorcendo os reais fatos.
Fico com mais receio ainda neste caso pois não é de hoje que muita gente do meio marca o Biafra como um dos caras mais escrotos do cenário, chamando-o de duas caras e ganancioso (o Aaron Turner do ISIS e a dupla Scott Kelly e Steve Von Till tiveram problemas sérios com o sujeito e não escondem seu desafeto pelo cara). De qualquer forma, se tiver a oportunidade de ler o conteúdo do livro, o farei.
Alisson, claro que o livro é “chapa branca” e não iria denegrir a banda, mas, mesmo assim, se nota que ainda há grande mágoas entre os dois lados da questão, como coloquei no texto. Quem está certo, eu não sei julgar, mas, pelo menos, o autor expõe os dois lados quando necessário, sem tomar partido por nenhum!
Já li falando muito bem desse livro e fiquei com vontade de comprá-lo. Você sabe se a versão em capa dura tem mais páginas que a versão brochura? Abraço!
Marcel, até onde sei, o conteúdo é o mesmo, mas nunca peguei a versão “simples” para observar!
Micael… a primeira presnagem do Lp Fresh Fruit apresenta a foto da banda fake na contracapa com suas respectivas cabeças. A partir da segunda prensagem as cabeças foram cortadas. O que o livro fala a respeito? Já li que houve impedimento legal, tipo não foram pagos os direitos de usarem as fotos, daí as cabeças terem rolado…
Ao que diz no livro, a banda retratada na contracapa processou o DK por não terem pedido autorização de uso da foto, nem pagarem a eles. A coisa é explicada de forma um pouco mais alongada (bem pouco mesmo), mas termina dizendo que a gravadora pagou ao grupo original um valor maior do que tinha pago aos DK pelo contrato com ela… isso e a remoção das cabeças foram fatores que influenciaram Biafra a romper com a gravadora Cherry Red e montar seu próprio selo, o até hoje ativo Alternative Tentacles!
Grato.