Discografias Comentadas: Bee Gees – Parte I

Discografias Comentadas: Bee Gees – Parte I
Barry Gibb, Robby Gibb, Vince Melouney, Maurice Gibb e Colin Petersen. Bee Gees nos anos 60

Por Rafael Bonatto

“Massachusetts”, “Staying Alive”, “You Win Again”, “Alone” e “Man In The Middle”. Poucas bandas possuem em seu currículo, sucessos incríveis em 5 décadas distintas, atingindo o público dos anos 60 aos anos 2000. Pois neste caso, os Bee Gees carregam com honra essa marca nos hit parades. A história começa no final dos anos 50, na Inglaterra, quando os irmãos Barry Gibb (Guitarra e Vocais), Maurice Gibb (Baixo, Teclados, Guitarra e Vocais) e Robin Gibb (Teclados e Vocais) ainda crianças, impressionaram seus pais pela capacidade de cantarem em harmonia tão perfeita quanto os discos que possuiam em casa. Por questões financeiras, toda a família Gibb migrou para Austrália e foi onde o sonho começou. Desde então, atravessaram gerações e estilos musicais e se tornaram uma das bandas mais importantes no cenário musical, no mundo todo, vendendo mais de 200 Milhões de Cópias.

Aqui apresentaremos a discografia completa, divida em três partes, com uma profunda análise ao catálogo da banda, contendo informações e algumas curiosidades sobre o processo de criação de cada sucesso. Nesta primeira parte, traremos os primeiros álbuns, onde encontram-se grandes clássicos, e que culminou a “Primeira Fama” dos Bee Gees.


The Bee Gees Sing & Play 14 Barry Gibb Songs [1965]

Logo que a família Gibb mudou-se para Austrália, os irmãos começaram a se apresentar em programas locais no rádio e na TV. Isso chamou a atenção do DJ Bill Gates (não aquele…) e por sugestão dele, a banda deveria se chamar Bee Gees, pois as letras B e G eram as que mais se repetiam em nomes dos envolvidos e da família. Com isso, Bill em conjunto com Col Joye e Kevin Jacobsen conseguiram que os irmãos assinassem com a Festival Records em 1963, e a gravadora propôs o lançamento de alguns singles para testá-los no mercado. Após altos e baixos e alguns covers de sucessos da época, em 1965 a gravadora concordou em lançar um LP completo, acompanhados pela banda de apoio de Col Joye e pelos arranjos de Bill Shepherd, que consistia em algumas gravações já disponiveis em singles nos anos anteriores e composições novas de Barry Gibb, que naquela época já acumulava alguns prêmios por melhor compositor. Daí vem a escolha em colocar o nome dele em evidência no disco. As influências dos Beatles, dos Everly Brothers e no sons da Motown e Country são bem claras nas primeiras gravações dos Bee Gees. A faixa de abertura “I Was a Lover, A Leader Of Men” mostra essa versatilidade nos sons. Com uma batida Valsa-Rock, e sons acústicos gravados em um equipamento 2-Track, indica uma maturidade nas composições e aposta em um estilo diferente mesmo para época. O mesmo pode-se dizer do grande sucesso do álbum, a faixa “Wine and Women”, que dessa vez traz Robin como vocalista principal. Os arranjos são simples, acompanhados de uma orquestra ao fundo, apenas como base. O diferencial aqui é o espaço para solos de guitarra bem purista. Geralmente os Bee Gees apostavam mais na linha vocal do que na instrumental. As faixas “To Be Or Not To Be” e “Claustrophobia” baseavam-se em um rock’n roll bem próximo do que Elvis Presley e Chubby Checker faziam, com detalhes ao piano e letras simples que retratavam relações amorosas. A faixa mais Beatles do álbum, sem dúvida é “Could It Be”. Para quem é fã do Fab-Four, essa é uma excelente música de entrada para conhecer os Bee Gees. Os arranjos lembram “Love Me Do” mas incrivelmente é simples no quesito vocal, sem harmonias difíceis. “And the Children Laughing” segue o padrão que os Bee Gees sempre mantiveram em suas composições ao longo dos anos, com introdução marcante, ritmo wave, sem muitas mudanças e refrão-chiclete. Típico Pop-Barroco. No quesito baladas, os Gibbs sempre foram mestres, tanto nas letras quanto na harmonia dos acordes e vozes. “I Don’t Think It’s Funny” é um folk que Robin domina, indicando que sua voz era um diferencial do que já havia no mercado. “How Love Was True”, com a guitarra usando o efeito tremollo aposta em arranjos vocais que inspirados nos anos 40, mas que caberia perfeitamente com qualquer artista da Jovem Guarda, por seu arranjo atual para época. Uma das melhores faixas do disco sem dúvida é “Take Hold of That Star” que mistura um som clássico de piano, que remetem a Ray Charles ou Dean Martin. É uma canção romântica, simples, mas que faz você querer aprender a cantar o refrão. O grupo indicava estar mais livres musicalmente e entendiam a mensagem de cada canção. Um exemplo de evolução é a faixa final “Follow the Wind”, um folk que poderia ser interpretada facilmente por Bob Dylan, na qual violões e uma percussão bem leve são apresentados. O álbum em si não foi um grande sucesso comercial, mas foi onde de fato tudo começou! A porta para fama estava aberta! O disco foi remasterizado e relançado em 2013.


Spicks and Specks [1966]

Após um reconhecimento mediano por parte do público e dos críticos australianos sobre o primeiro álbum, os Bee Gees tentaram ouvir o que estava acontecendo no mundo da música naquela época. Tal situação gerou uma mudança de empresário, de produtor e de selo. Aos ouvidos de Ossie Byrne, os irmãos apresentaram algumas canções novas e foi aqui que começaram a experimentar novos instrumentos, divisões vocais e abriram espaço para Robin e Maurice comporem. O objetivo era estar o mais confortável possível com diversos estilos musicais em um mesmo disco. A intenção era também criar músicas rápidas que expressavam a atualidade da época e romances. Para isso Ossie convidou Colin Petersen para tocar bateria, Vince Melouney para as guitarras e John Robinson para tocar baixo em algumas canções, a fim de dar um frescor ao som produzido. A faixa de abertura, “Monday’s Rain” já demostra essa maturidade musical. Barry e Robin dividem os vocais, mais em tons graves, com arranjos simples que impressionam pela semelhança com o grupo The Animals e pelo estilo melódico do The Hollies. Ainda mais incrível é a identificação gótica com a canção “Oh Happy Day”. Puro pop barroco. Para quem espera pelo verdadeiro Rock raiz, pode ficar feliz com a faixa seguinte, “How Many Birds”, com riffs de guitarra, vocais lineares dobrados sem muitas nuances e uma bateria marcante. É aquela música que faz você ter vontade de pegar a estrada, com o volume bem alto! “Playdown” é um prelúdio do que fariam um ano depois com “New York Minin Disaster 1941”, o primeiro hit internacional da banda. Nitidamente focado nas harmonias dos brothers, é uma faixa diferente, no estilo storyteller, que destoa do restante do álbum. Mas lembre-se, eles queriam tentar de tudo! Voltando a programação normal, eles encontram em “Second Hand People” uma oportunidade para abusar do soft-rock, mas com os pés em 1966. “I Don’t Know Why I Bother With Myself” é a primeira composição exclusiva de Robin e totalmente inspirada no que Simon & Garfunkel vinham fazendo, tanto no estilo da letra quanto nos arranjos instrumentais. Quem espera o reforço do estilo Beatles no disco, pode encontrar facilmente em “Big Chance”, que poderia ter sido escrito por George Harrison, em “Glass House” e também em “Where Are You?” que foi a primeira chance de Maurice mostrar suas habilidades vocais e como compositor. Não se assuste se ao ouvir “Jingle Jangle”, você se lembrará de alguma cena de filmes Western, baseados no México ou em lutas com índios americanos, mas na verdade a letra é sobre uma garota que usa pulseiras prateadas e o amor platônico do personagem principal por ela. Incrivelmente é uma das poucas músicas da era australiana que os Bee Gees cantaram em turnês internacionais até 1971. Elvis Presley também influenciava os Bee Gees, e isso fica mais evidente em “Born A Man”. A faixa que dá o nome ao álbum foi a grande responsável pelo primeiro Top 5 dos Bee Gees nas paradas de sucessos. Gravada aos 45 do segundo tempo, quase ficou fora do disco, mas apostaram tanto nela que a gravadora teve que mudar a logística das prensagens que já estavam sendo feitas. Diferente do que eles haviam produzido até então, a canção mais Pop-Rock da Austrália naquele ano era focada em arranjos ao piano, bem marcantes e alegres, com uma entrada da bateria em marcha e Barry dominando os vocais. Deu certo, pois foi aí que garantiu a confiança ao grupo de voltar para Inglaterra, o maior cenário musical daquela época. A canção é lembrada até hoje pelos australianos e recentemente fez parte do episódio da série americana The Walking Dead que fez crescer a procura pelos brothers e suas origens. E isso era só o começo!

Ainda é possivel citar a compilação da Leedon/Festival Records, Turn Around…Look At Us de 1967, que reúne alguns singles e covers que não entraram para o primeiro álbum da banda, e contava com “I Am The World”, um pop folk, lado B do compacto com “Spicks And Specks” que futuramente seria retrabalhada por Robin Gibb para um disco solo. E também o sucesso esmagador no Brasil em 1970, “Cherry Red”. O sucesso tardio deste soft rock romântico, que lembra The Association e seu hit “Never My Love”, se deu porque muitas músicas da era australiana foram lançadas internacionalmente em 1969 e 1970 e possuiam a livre escolha das gravadoras responsáveis sobre os singles que seriam trabalhados. Outras épocas (não tão distante já que as rádios faziam isso até pouco tempo).

Bee Gees em 1965. Robin, Barry e Maurice

First [1967]

Os Beatles, Eric Clapton e Rolling Stones dominavam as paradas musicais naquele ano. E todos vieram da Inglaterra. Inpirados por isso e pelo recente sucesso na Austrália, os Bee Gees decidem voltar para o país de origem, em busca de firmar o reconhecimento a nível mundial. Sendo assim enviaram, ainda da Austrália, um lote com gravações e discos para a NEMS, escritório que cuidava dos Beatles, a espera de um possível contato. Por sorte, um dos sócios de Brian Epstein era Robert Stigwood, um australiano radicado na Inglaterra, que se interessou pelo som dos irmãos vindos de sua terra-natal e assinou com os irmãos Gibb. Para registrar as novas canções, Robert convidou Colin Petersen, na bateria e Vince Melouney nas guitarras para se juntar oficialmente à banda e transformar os Bee Gees em um quinteto. Bill Shepherd voltou a comandar a orquestra de fundo e Klaus Voormann, o mesmo que concebeu a arte da capa do disco Revolver dos Beatles, fez também a arte para o First. A primeira faixa, “Turn Of The Century”, abre de forma impecável a nova fase dos Bee Gees. Com flautas ao estilo gregoriano, e próximo ao ritmo folclórico, este rock psicodelico com vocal afiado difere de tudo que já tinham feito. Na primeira ouvida, talvez não o prenda, justamente por esta mudança, mas ouça mais algumas vezes e o refrão grudará na mente. Quem gosta de “Yellow Submarine”, vai gostar desta canção. Outro destaque vai para “Holiday”. Nesta época, os Bee Gees apreciavam “brincar” com as palavras, usando-as para dar ênfase ao personagem central. Puramente orquestral, foge do comum, pois não há um ritmo básico, lembrando trilhas sonoras de filmes de guerra. Aqui, Maurice arrisca junto à orquestra com seu teclado Mellotron. O Mellotron volta a ser usado na romântica “Red Chair, Fade Away”, mas aqui lembra mais uma canção de parque de diversões. Não é um primor musical, mas muda o clima do disco. Por falar em canções românticas, “One Minute Woman” traz a pureza da mistura orquestral com o soft rock, e a habilidade de Barry Gibb dispor de sua voz blue-eyed-soul na melhor forma, assim como em “To Love Somebody”, grande clássico que na época não ganhou a atenção das rádios, mas que com o tempo conquistou a todos, pois aqui está a fórmula para um sucesso: letras que contam uma história verdadeira, introdução marcante, som de cordas ou metais dando a base, refrão “chiclete”, na qual você dificilmente esquece e a “cozinha” (baixo, bateria e guitarra), levando o ritmo ao mais pop possivel. Não é a toa que é a música dos Bee Gees mais regravada por outros artistas. O Rock sessentista, de arranjos simples e um riff de guitarra puxando a música está presente em “In My Own Time” e de uma forma mais sutil e harmonioso em “Please Read Me”. Robin ainda nos presenteia com seus vocais, ainda em desenvolvimento, mas mesmo assim fortes em “Close Another Door” e a clássica “I Can’t See Nobody”. Esta ultima possui arranjos orquestrais incríveis, principalmente no final. Mas o melhor está no refrão com a harmonia vocal dos Bee Gees. Com certeza o som mais americanizado do álbum. Em “Every Christian Lion Hearted Man Will Show You” a banda atinge um nivel extremo no rock psicodélico. Talvez os Bee Gees nunca mais fizeram algo tão arriscado e original como esta canção. Lembram do Mellotron? Pois ele está presente na introdução, fazendo com que o som fosse representado de uma forma melancólica e gótica. Era época em que tudo era válido para trazer algo novo para as gravações. A estrutura da música após isso segue no convencional, com guitarras ritmicas e a bateria dando a ilusão de um sonho. Magical Mistery Tour passou por aqui! E por fim, o primeiro hit internacional dos Bee Gees, “New York Mining Disaster 1941”. A ideia aqui era prevalecer a música da forma mais simples possível, seguindo a máxima que “menos é mais”. Baseando-se no que os Beatles poderiam fazer, os irmãos escreveram essa canção quando faltou luz no estúdio, em Londres. Os acordes da guitarra do Barry guiam a canção, quase que acusticamente, em conjunto a violinos, baixo e uma bateria sem muitas nuances, mas que é indispensável para o crescimento, no refrão. O destaque vai para bela harmonização vocal. Não é a música mais indicada para começar a ouvir os Bee Gees, mas ela acaba se tornando a surpresa do álbum. Em 2006 o disco ganhou uma edição especial com bonus e material inédito.


Horizontal [1968]

Os Bee Gees escrevam muitas músicas no período 1967/1968, abrindo a possibilidade de um álbum duplo. Por questões comerciais, decidiram lançar um disco simples, mas foi o primeiro que popularizou a carreira dos Gibbs. Aqui as canções demonstram um aperfeiçoamento do som que a banda gostaria de produzir, bem como letras mais profundas, a parte do que foi feito em First. Influências americana, inglesa e australiana permitiram um álbum que mistura o pop barroco, com rock, soul e country. O disco abre com “World”, com Barry e Robin dividindo os vocais principais. O piano está mais presente, com uma letra reflexiva, sombria e repetitiva e arranjos orquestrais mais altos na mixagem. É apresentado o primeiro “solo” de guitarra do grupo, que até então mantinham as canções em um formato mais convencional. Uma balada totalmente contagiante, é uma das melhores do álbum. Vale a audição, principalmente no refrão final. Outra grande balada do disco é “And The Sun Will Shine”, na qual Robin canta sozinho, sem os irmãos, outro feito inédito até então. Robin foi reconhecido naquela época, como a voz do grupo, pois não existia no mercado outra igual. Mais emocional, a canção mantém o padrão de “World”, mas em destaque às guitarras, com dedilhado incrível na introdução. Clássico! Já “Lemons Never Forget” possui grande influência do som que John Lennon gostava de produzir, com base no piano, bateria e baixo. Preste atenção nos solos harmônicos da guitarra, bem próximo ao que Eric Clapton fazia, deixando-a mais completa. “Really and Sincerely” foi lançada como lado B, e Robin, em momento raro, toca um piano-órgão, trazido por ele de Paris. A música, mas emotiva que as anteriores, refletem um acidente de trem que Robin e sua futura esposa sobreviveram em 1967. Não é um grande atrativo do disco. “Birdie Told Me” é o que mais representa o som do final dos anos 60. Mais hippie, solos que lembram musica havaiana, com um coral de fundo, é uma canção alegre, no sentido instrumental. O que dá ritmo aqui é uma percussão simples e uma bela orquestra de fundo. Incrivelmente linda. O álbum não foge de músicas esquisitas, como “Harry Braff” por exemplo, mas garante belas melodias como em “Day Time Girl”, claramente inspirada em “Eleanor Rigby” e no blues “The Change Is Made”, com uma introdução na guitarra que poderia ser do Eric Clapton. O grande destaque do álbum está justamente na música mais simples do disco: “Massachussetts”. Indo totalmente contra ao que se ouvia nas rádios em 1968, a canção tem acordes básicos, mas com arranjos incríveis. Sem abusar da guitarra elétrica, ela aposta em violinos e o contra baixo como guias principais, e um ritmo constante que contagia. Some isso com uma letra que encaixa perfeitamente na melodia, vocal dobrado de Robin e Barry e um refrão chiclete e o resultado seria no primeiro grande sucesso dos Bee Gees, o primeiro a atingir o topo das paradas! Outro grande sucesso dos Bee Gees, “Words” entrou neste álbum como bonus track, por ser um lançamento apenas em um single. Levada pelo piano e pelo vocal soul de Barry, já demonstrava os novos rumos que a banda iria tomar em seguida. O que vem logo depois, é história!


Idea [1968]

Ainda em 1968, os Bee Gees lançaram mais um disco, tamanha era a quantidade de composições (de qualidade) em estúdio. Nessa época eles usavam o estúdio IBC em Londres, o mesmo que os Beatles usaram até mudarem para o Abbey Road. A banda já tinha atingido uma coesão nas produções e composições, criando um som distinto, único, apesar dos desentendimentos e egos inflados entre eles, que agravariam no próximo ano! Mas ainda era clara as influências tanto do passado quanto do momento em que viviam. O álbum, que era mais para a família toda ouvir, do que em festas, abre com “Let There Be Love”, um soft rock acústico que trazia sons de harpas e violinos ao fundo e Robin nos teclados Hammond, fato raro ao longo dos anos. A estrutura não era de um hit single, mas mostra a suavidade que o disco queria apresentar. Incrivelmente, Tom Jones fez uma versão desta canção em 1970. Um ótimo começo! “Kitty Can” foi escrita no apartamento da cantora Lulu, esposa de Maurice na época e foi gravada sem Robin. Barry e Maurice acabaram criando um arranjo vocal único com influencias do country americano. Por ser a primeira faixa do grupo a ser gravada em um equipamento de 8 pistas, abusaram dos elementos extras, incluindo uma percussão vocal. Ainda sim é simples, mas audível. “In the Summer of His Years” lembra músicas natalinas, mas demonstra o porque Robin ser o vocalista principal daqueles anos. Seu vocal vibrato e carregado de emoção, complementa a orquestra que predomina a canção em um casamento perfeito. “Down to Earth” é aquela canção que se ouve no fim de noite, com os pensamentos longe, que lembram muito cenas de filmes. O que prende a atenção aqui, não é a melodia triste, carregada de violinos, saxofones e um belo piano, mas o vocal bem construído que apenas os Bee Gees conseguiam fazer. “Such a Shame” é a única cançao dos Bee Gees que não tem um Gibb no vocal principal e sim o guitarrista Vince Melouney. Com certeza deveriam ter dado mais espaço a ele, mas o propósito sempre foram Barry, Robin e Maurice como Bee Gees, apesar de não declarado na época. Aqui é impossível não gostar da música, com ritmo bem construido e contagiante e um solo de harmônica incrível! Um típico country rock, tão popular com a banda Eagles, anos mais tarde. A canção mais Rock’n Roll do disco é a faixa-título “Idea”. Uma faixa não tão convencional para época, por abusar mais de sons acústicos que elétricos. Mas não se engane: ela vai ficar grudada na mente, principalmente pelo solo psicodélico incrível da guitarra Gibson ES-335 que Vince usava. É possível destacar uma música que chegou aos ouvidos dos fãs apenas em 2006, no relançamento do álbum em edição especial: “Gena’s Theme”. Um belo instrumental, com influências latinas, algo raro pelos Bee Gees. Colin na bateria e Maurice no baixo, Barry na guitarra ritmica, Vince no violão principal, e até Robin no órgão Hammond, acompanhados por uma seção orquestral arranjada por Bill Shepherd. Os grandes sucessos do álbum se concentram em “I’Ve Gotta Get a Message To You”, que tem uma pegada mais soul, principalmente pela influência de Percy Sledge que os irmãos ouviam bastante e “I Started a Joke”, uma brilhante canção pop-barroca, sucesso no Brasil e Estados Unidos, que tem uma profunda melodia misturada com uma letra melancólica. No meio de tantas invenções, as vezes as canções mais simples podem se destacar. No caso duas músicas que Robin ainda dominava nos vocais, recurso que cada vez menos era utilizado pela banda, criando problemas no paraíso musical em seguida.


Odessa [1969]

Listado como um dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, o álbum Odessa é classificado por muitos fãs como o Sgt. Peppers … dos Bee Gees, um projeto ambicioso, por ser uma tentativa de aprofundar o som, misturando novos instrumentos, formando uma ópera rock, com letras intensas e conceituais. Infelizmente por problemas pessoais entre os membros do grupo, egos e desavenças, o disco não foi terminado como eles gostariam. Lançado originalmente como disco duplo (e editado a um disco em alguns países), aqui há pérolas, favoritas dos fãs e que podem cativar até aquele que não ouve Bee Gees com frequência. Ultimo álbum com a presença do guitarrista Vince Melouney. O disco abre com a faixa-título “Odessa”, uma canção longa (7:36), que mistura influências flamencas e orquestrais, que remetem a letra melancólica que conta a história de um sobrevivente de um navio, que colidiu com um Iceberg. Canção pouco usual na carreira da banda, mas essa é a chave para captar todos os públicos. “You’ll Never See My Face Again” é praticamente uma canção acústica, com teor folclórico nos arranjos, no melhor estilo storytellere e vocais de Barry Gibb. Simples, mas algo que nos traz à realidade após a primeira faixa. Vale cada minuto da canção! Já “Black Diamond” parece um eterno refrão. A estrutura até que funciona, mas a voz de Robin não se encaixa na canção. Por ser tão potente, acaba não equilibrando com os arranjos. “Marley Purt Drive” é sem dúvida uma das melhores canções dos Bee Gees. Daquelas que a gente não gostaria que acabasse. Na verdade ela é um bubble gun pop, por seguir a linha de três acordes, em toda música e mescla um ritmo incrível da bateria, violão, banjo e a orquestra ao fundo. Isso dá uma identidade mais bluegrass a ela, que se tivesse guitarras elétricas, poderia ter sido gravada pelos Rolling Stones. “Melody Fair” é um grande hit para os Bee Gees, mas que nem sempre foi lembrada por eles mesmos. Pop barroco com influências country, é uma canção típica da banda. Arranjos simples mas que dá grande destaque aos vocais. É romântica na medida certa. “Suddenly” tem Maurice nos vocais principais e as vezes lembra as canções da banda Kansas e as vezes músicas de Saloon do velho oeste americano. Não é uma das melhores do disco, mas Maurice sempre nos presenteia com uma bela voz, que deveria ter sido melhor aproveitada. “Lamplight” possui a essência de um grande hit, com direito a refrão chiclete, um arranjo refinado e letra em francês. Sem contar a voz primorosa de Robin. Mas foi o estopim para a separação dos Bee Gees. Enquanto egos inflados discutiam qual single seria trabalhado, a canção perdeu o posto para o grande sucesso do álbum: “First Of May”, na voz de Barry. Típica canção storyteller, “First Of May” apresenta uma melodia melancólica, com xilofones representando o som da infância, na memória do personagem. Enquanto a música cresce ela vai se tornando mais soul, aos moldes de “Words”, hit de 1968, mas com um peso a mais na letra. Sem dúvida, é um sucesso atemporal. “Give Your Best” provavelmente é a primeira canção country que os Bee Gees lançaram. Estilo que eles eram muito fãs. Sons de violinos, e conversas ao fundo, é típica música de saloon, que cairia bem com Dolly Parton ou Glen Campbell. Letra otimista e arranjos “felizes”, traz um diferencial para o álbum, talvez o maior para carreira até então. “I Laugh in Your Face” impressiona pela qualidade nos arranjos orquestrais e vocais ao estilo Beatles. Já “Never Say Never Again” é típica Bee Gees e caberia em qualquer álbum anterior, mas claro, com qualidade de um bom soft rock. Neste álbum os Bee Gees se esforçaram para criarem peças instrumentais temáticas, como se fossem trilha-sonora de algum filme, mas o destaque está para “Seven Seas Symphony”, mas o mérito mesmo vai para o maestro e arranjador Bill Shepherd. O esforço para criar um disco conceitual foi tão grande , que desgastou a banda a um ponto de não terminarem a produção do jeito que planejavam e resultou na saída Vince Melouney e por desanvenças, Robin Gibb.


Cucumber Castle [1970]

Este disco foi lançado após a separação dos Bee Gees. Robin e Vince haviam deixado o grupo em 1969, Colin Petersen foi demitido no meio das gravações e por fim, Barry e Maurice resolveram seguir carreiras solo. De qualquer forma, todo os percalços não fazem o álbum perder seu brilho. Na verdade ele foi gravado em 1969, mas para coincidir com um especial de TV, com o mesmo nome, a gravadora decidiu lançá-lo em 1970. Os arranjos possuem mais participação de Maurice, bem como na construção da harmonia das vozes. O disco abre com “If Only I Had My Mind on Something Else”, um soft rock na qual o estilo marcaria muitas cançoes de sucesso do início dos anos 70 (no Brasil, o grupo Pholhas ficou famoso por seguir a mesma linha). Melodias clássicas sem surpresas, mas com uma visão diferente, em termos musicais. Vale a pena cada ouvida. “I.O.I.O.” lembra músicas africanas pela batida, mas na verdade é um Pop chiclete misturado com World Music, escrito na época em que Robin ainda fazia parte da banda. Apesar de não ter sido amplamente divulgada pela banda, fez um enorme sucesso na Europa e na América do Sul. Sem dúvida, é um dos pontos altos do disco. “Then You Left Me” é a grande balada do álbum, ao estilo do single Words, mas com pausas no meio da canção, que lembram hits da banda “Aphrodite’s Child”. É linda do começo ao fim e de fato, por mais que Robin não fazia mais parte da banda, as músicas eram inspiradas e tinham arranjos inéditos dos Bee Gees. “The Lord” tem um dos melhores arranjos vocais da banda, mas pode ser definida com uma mistura de música gospel com Country-Rock. Maurice mais uma vez se destaca aqui. “I Lay Down and Die” é a que mais lembra os Bee Gees dos antigos discos, mais psicodélico, mas ao invpes de rock, aqui soa mais pop. Os Bee Gees repetem a fórmula de “If Only I Had My Mind on Something Else”, na canção “Sweetheart”, de uma forma incrível, pois desta vez os vocais são arranjados ao estilo Country, mas com melodias Soft-Rock. Uma das melhores canções da banda. No início dos anos 70, os Bee Gees gravariam muitas músicas ao estilo Soul, com refrões fortes, daqueles que todos querem juntar as mãos para cantar juntos, no melhor estilo “paz e amor”. “Bury Me Down By the River” é uma delas. Mas tem um brilho a mais, vocalmente falando. “My Thing” é canção de Maurice no álbum. Inspirada pelos amigos Ringo Starr e George Harrison, que Maurice estava sempre junto, ela tem um conceito Jazz, mas sem se prender ao estilo. Totalmente acústica, todos os instrumentos foram tocadas por ele. “Don’t Forget to Remember” é o grande sucesso do disco. Foi lançada como single ainda em 1969 e rivalizou com Robin Gibb nas paradas (Robin lançou um disco solo naquele ano, com o sucesso “Saved By The Bell), atingindo o #02 nos charts. Seu estilo romantico difere um pouco das demais canções do álbum, mas ainda sim mantém o clássico Soft-Rock misturado ao Country. É uma das favoritas dos fãs, e conta com um registro mais grave nos vocais de Barry, trazendo um Blue-Eyed-Soul para a canção . Ela foi construída com a idéia da banda continuar, mas não teve força para isso, mesmo sendo um grande sucesso. Elton John gravou um cover dela, no início da carreira. Os anos 70 chegaram sem os Bee Gees existirem como banda. Mas tal fato estava prestes a mudar, bem como uma montanha-russa, com altos e baixos, que eles embarcariam nesta década, ainda mais incrível que suas canções. Tudo isso e muito mais na parte 2. Até lá!

12 comentários sobre “Discografias Comentadas: Bee Gees – Parte I

  1. Queria saber se no final de 2018 o grupo consultoriadorock.com irar escolher os melhores álbuns de 2018?
    É que eu tenho umas idéias permeando na minha cabeça para a escolhas do álbum. É um regulamento alternativo
    A idéia é o seguinte. Cada participante escolhe 20 melhores álbuns da sua lista particular. O primeiro da lista ganha 20 pontos, o segundo 19 e sucessivamente. Até chegar no penúltimo com 2 pontos e último com 1 ponto.os 50 álbuns mais pontuados classificaria para segunda fase .
    Nesta segunda fase seria mata mata , por ex: 1×50 o primeiro lugar enfrentaria o quinquagésimo lugar , 2×49 o segundo enfrentaria o quadragésimo nono e assim sucessivamente.
    Os 25 melhores álbuns estaria classificados para a final.
    Na final a regra seria outra .
    Elegeria o melhor álbum por letra e não por pontuação. Álbum tipo A,B,C,D,,E,F,,H e finalmente I.
    Aquele que tiver mais letra A é o vencedor.

  2. Que bela surpresa encontrar uma DC do Bee Gees por aqui, com o espaço que merece. Obrigado ao Rafael por fazer o favor de mostrar a mais pessoas como a discografia desse grupo é diversa e mais importante do que muita gente pensa. Tenho especial apreço pelo material do fim dos anos 1960 e do início da década seguinte, então grande parte do fino do Bee Gees se encontra abordado por aqui, principalmente “Odessa” “1st”. Não concordo com todas as afirmações feitas, mas acho que isso é detalhe menor em relação a incentivar a descoberta desses álbuns. Só achei uma pena que uma das melhores canções do grupo não foi citada, “Swan Song”, talvez um tanto eclipsada em razão da magnífica “I Started a Joke”. Acho uma pena que essa verve do pop mais barroco tenha ficado no passado. Gosto muito daquilo que se encaixa sob esse rótulo e enxergo sua influência em músicos de outros estilos.

    1. Diogo, muito obrigado pelas palavras!
      Uma discografia tão vasta merece ser analisada. E muita gente só lembra dos Bee Gees pelos sucessos da era Disco, mas possuem grandes pérolas no catálogo.
      Swan Song é uma bela canção, mas as chaves daquele disco, já estavam bem definidos. Talvez se estivesse em outro álbum, faria mais diferença.
      O engraçado é que os Bee Gees de vez em quando ainda resgatavam o pop barroco, mesmo de um conceito diferente.
      Grande abraço!

  3. Tenho uma grande admiração pelos Brothers Gibb. Eles foram uma verdadeira usina de hits e, com certeza, marcaram profundamente a música pop. Essa primeira parte da discografia, que mostra a fase mais psicodélica do grupo, é uma indicação de como eles, de olhos abertos para o que acontecia ao seu redor, construíram uma obra perfeitamente identificável. Grande artigo! (Aguardo a polêmica: será que “Another brick in the wall”, do Pink Floyd, chupou mesmo algumas ideias de “Stayin’ alive”?)

    1. Francisco, muito obrigado!
      Provavelmente foram a banda que mais se reinventou na carreira, não se prendendo a um estilo, boa parte por causa do Robin, que ficava antenado as paradas musicais.
      O que será que a segunda parte irá revelar? Aguardemos, rs!

  4. Legal o texto! só conheço o disco de 1967 (que gosto parcialmente) e acho esses três caras bastante talentosos pra dizer o mínimo! vou atrás dos demais discos.
    Abraço,

    1. Ronaldo, muito obrigado! Escolha um estilo musical. Qualquer um. Com certeza dará para fazer uma playlist com músicas dos Bee Gees no meio…rs
      Tamanha a versatilidade!
      E os anos 60 foram incríveis nessa parte!

  5. Essa fase magnífica dos Bee Gees merecia ser mais conhecida por grande publico no pais. Foi um ponto crucial de talento e criatividade. Quem deve gostar dessa matéria é o Rafael Biscaro, com quem já troquei algumas ideias e é fã do grupo.

    1. Olá Manoel! Este que vos fala é o Rafael Bonatto Bíscaro…kkkkk
      Pois é, fui eu quem escreveu esta DC. Realmente é uma fase que merece reconhecimento, principalmente pela diversidade musical. Agradeço demais pelo comentário e logo sai a parte 2! Grande abraço!

  6. Parabéns amigo! Eu procurei muito por uma matéria bem escrita, detalhada e abrangente sobre os fantásticos brothers Gibb. E, sem dúvida seu trabalho superou, de longe à todas as que eu encontrei. Fiquei plenamente satisfeito. Muito obrigado, abraço!

    1. Agradeço demais por seu feedback amigo! Espero poder contribuir ainda mais para que todos conheçam essa obra incrível que os Bee Gees construiram.
      Abraço!

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