Danzig – Danzig [1988]
Por Micael Machado
Texto escrito originalmente em 2013
Em meados de 1986, o vocalista Glenn Danzig já havia entrado para a história do rock com o Misfits, grupo que influenciou muita gente ao misturar sua sonoridade punk com letras que abordavam temáticas ligadas a filmes de terror, monstros e assombrações. Após deixar o grupo em 1983, Glenn montou o Samhain, com quem já havia gravado três álbuns, mas andava descontente com a sonoridade do grupo. Foi quando encontrou o produtor Rick Rubin, que queria lhe contratar para seu então novo selo, chamado Def American Recordings (mais tarde, apenas American Recordings). Trazendo consigo o baixista do Samhain, Eerie Von, Glenn partiu em busca dos membros certos para a formação de sua nova empreitada musical, chegando ao baterista Chuck Biscuits (ex-Black Flag) e ao excepcional guitarrista John Christ, logo adicionados ao novo grupo do cantor, que, por sugestão de Rubin, teria apenas seu próprio sobrenome como epíteto.
O primeiro registro do novo conjunto (também o primeiro lançamento do selo de Rubin) viria em 1988, levando apenas o nome do grupo. Curioso é que a edição original nem isso tinha, mostrando apenas um crânio branco (retirado da capa da revista em quadrinhos da Marvel “The Saga of Crystar, Crystal Warrior”, edição 8, e que já havia aparecido em artes de discos do Samhain) sobre um fundo preto. O logo do grupo na parte inferior direita da capa foi acrescido apenas nas edições em CD já nos anos 1990, enquanto as mesmas ainda exibiam o famoso selo de “Parental Advisory”, devido à temática sombria das letras do cantor, o que é curioso, visto as mesmas não conterem palavras de baixo calão, que normalmente são o principal alvo deste tipo de selo. Se as letras chamaram a atenção, a parte musical não ficou para trás. Mesmo com o trabalho da cozinha podendo ser considerado apenas como “correto”, sem muitos destaques apesar da qualidade, os vocais de Glenn e os riffs de John bastam para colocar o álbum como um dos melhores discos de estreia já lançados.
Pelo menos três faixas essenciais do repertório do grupo foram registradas aqui, sendo que foram lançados vídeos promocionais para todas elas: “Mother“, possivelmente o maior clássico do disco, aparecendo depois em diversas compilações ligadas ao hard rock, em trilhas de filmes (como “Se Beber Não Case-Parte 3″) e jogos de computador (como “Guitar Hero” e “Grand Theft Auto: San Andreas”), e cuja versão ao vivo lançada no EP de 1993 Thrall: Demonsweatlive (e rebatizada como “Mother ’93″) se tornou um hit na MTV, inclusive tocando muito no extinto Fúria Metal da versão brasileira do canal; “Twist of Cain“, cujo marcante riff de guitarra abre os trabalhos do álbum, em uma composição cadenciada e marcada que se tornou uma das preferidas dos fãs da banda, com sua letra baseada na história bíblica dos irmãos Caim e Abel, e que conta com um final em clima apocalíptico; e “Am I Demon“, uma das composições mais velozes do disco (embora nem tão rápida assim), em muito graças ao riff criado por Christ, que conduz a música inteira, explodindo no matador refrão, que parece feito sob medida para ser berrado a todo pulmão pelos fãs presentes aos shows, além de apresentar dois solos técnicos e velozes do guitarrista, onde podemos ouvir um dos pouquíssimos overdubs de guitarra do disco, algo que sempre me chamou a atenção no trabalho deste talentosíssimo músico, que preferia não utilizar este recurso em suas gravações.
O começo a capella de “Soul On Fire” (outra composição cadenciada, mas com um final bastante veloz) evidencia a semelhança da voz de Danzig com a de Jim Morrison (dos Doors), algo que também aparece em “She Rides”, um blues com letra tratando de uma mulher que “cavalga à noite para lhe abater”, e um certo clima “sensual”, explicitado pelo vídeo clipe, cheio de mulheres atraentes e em trajes mínimos. “Not of This World”, a segunda faixa do track list, começa emendada à composição anterior, trazendo outro riff marcante de guitarra, desta vez apresentando um pouco de velocidade no excelente refrão, além de um breve mas muito interessante solo de Christ, novamente amparado por overdubs do instrumento. Já “The Hunter”, apesar de creditada no encarte a Glenn Danzig, foi composta por Carl Wells junto ao grupo Booker T. & the M.G.’s, sendo originalmente gravada por Albert King. Na versão do grupo, apenas algumas linhas da letra foram modificadas, e a faixa é outra que apresenta traços de blues em seu arranjo, embora desta feita seja mais veloz que “She Rides”, sendo uma composição bem “estradeira”, evidenciando o trabalho de guitarras de Christ e a voz de Danzig, que mais uma vez nos traz a lembrança de Morrison à mente.
“End of Time” é outra composição que apresenta um ritmo cadenciado, além de trazer algo de gótico em sua melodia. Já “Possesion”, mesmo marcada pela intro com teclados “macabros” (na única vez em que este instrumento aparece no álbum), pelo riff “nervoso” e um pouco mais veloz que os demais, e pelos backing vocals em latim no meio da composição (que parecem rezar uma espécie de “missa negra”), não escapa da sina de ser uma das músicas mais fracas do álbum, que se encerra com “Evil Thing”, que fecha tudo com um ritmo quebrado no início, caindo depois para um andamento mais marcado, e apresentando um belo trabalho de Eerie Von, além de um dos melhores riffs de Christ no disco (e olha que, como o leitor mais atento pode perceber, estes são muitos!).
Esta formação ainda lançaria mais três discos, os também essenciais Danzig II: Lucifuge, de 1990, e Danzig III: How the Gods Kill, de 1992, além do mais fraco Danzig 4p (ou apenas Danzig 4, como é mais conhecido), de 1994, antes de se dissolver melancólica e rapidamente, restando no line up apenas o próprio Glenn Danzig, que mantém o grupo ativo e relevante ainda hoje, embora sem as mesmas glórias do passado. Mas, para os fãs, isto talvez seja irrelevante, pois eles sabem que os três primeiros discos são imbatíveis na discografia do conjunto, a começar pela estreia, um álbum essencial na prateleira de qualquer um que goste de ouvir um hard rock bem tocado!
Mother / Tell your children not to hear my words / What they mean, what they say / Mother…
Track List:
1. Twist of Cain
2. Not of This World
3. She Rides
4. Soul On Fire
5. Am I Demon
6. Mother
7. Possession
8. End of Time
9. The Hunter
10. Evil Thing
com certeza uma das melhores estreias, junto com grave digger, helloween e running wild