Maravilhas do Mundo Prog: Procol Harum – In Held ‘Twas In I [1968]
Por Mairon Machado
The Paramounts: Gary Brooker, B. J. Wilson, Robin Trower e Chris Copping |
Brooker era o líder de um quarteto beat chamado The Paramounts, o mesmo que gravou o clássico “Poison Ivy”, de Jerry Leiber e Mike Stoller, em 1964, clássico esse eternizado por bandas como Rolling Stones, The Hollies, Manfred Man e até nossa Rita Lee (que gravou “Poison Ivy” em português, batizada de “Erva Venenosa”, no álbum 3001 (2000).
No The Paramounts, acompanhavam Brooker o guitarrista Robin Trower o baixista Chris Copping e o baterista B. J. Wilson. Porém, apesar de ter gravado outros singles, o The Paramounts não conseguiu alcançar mais nenhum êxito, encerrando as atividades em 1966.Porém, Brooker não queria sair do mundo da música, e decidiu montar um novo grupo. Assim, agregou forças com o organista Matthew Fisher, o guitarrista Ray Royer, e o baixista David Knights, além do poeta Keith Reid. O nome de batismo do novo conjunto, Procol Harum, uma homenagem ao gato do empresário do grupo, Guy Stevens.
Matthew Fisher, Ray Royer, Bobby Harrison, David Knights e Gary Brooker |
O Procol Harum logo conseguiu um contrato com a EMI britânica, e no dia 10 de fevereiro de 1967, entrou no Olympic Studios para gravar o seu maior sucesso comercial, “A Whiter Shade of Pale”, tendo na bateria o músico contratado Bill Eyden. O compacto desta canção foi lançado em 12 de maio do mesmo ano, e se tornou um dos poucos singles a superar a marca de dez milhões de cópias vendidas em todo o mundo (apenas trinta singles conseguiram essa façanha), alcançando a primeira posição no Reino Unido e na Austrália, aonde permaneceu nessa posição por oito semanas.
O incrível sucesso de “A Whiter Shade of Pale” levou o Procol Harum a fazer uma excursão mundial (isso com um único single lançado), a qual teve como abertura um jovem guitarrista negro chamado Jimi Hendrix. Não à toa, é uma das canções mais conhecidas e regravadas ao redor do mundo. Nessa turnê, Robin Trower e B. J. Wilson ingressaram respectivamente na guitarra e na bateria, e com eles, gravaram o segundo single, “Homburg”, lançado em outubro de 1967, alcançando a quinta posição no Reino Undo.
O contato de Trower com Hendrix influenciou diretamente a forma de tocar de ambos, apesar de muitos afirmarem que apenas Trower bebeu da fonte de inspiração que era Hendrix (Hendrix aprendeu a repetir os vibratos de Trower de forma muito similar).
Entre a gravação de “A Whiter Shade of Pale” e “Homburg”, é lançado o primeiro LP do grupo. Procol Harum chegou às lojas em setembro de 1967, através da Deram Records, e como que uma blasfêmia, no Reino Unido, a versão original não contava com “A Whiter Shade of Pale” (o que foi corrigido nas versões americanas e dos outros países europeus). O som do álbum é uma mistura de psicodelia e beat-rock, em um pop simples no geral, carregado pelo órgão inconfundível de Fisher e pelas lindas harmonias instrumentais de Brooker. O disco fez sucesso relativo, e deu a oportunidade para o quinteto seguir seu trabalho.
David Knights, Matthew Fisher, Robin Trower, B. J. Wilson e Gary Brooker |
Uma série de singles sem sucesso, mais uma pequena turnê pelo Reino Unido, e chegou o segundo disco do grupo. Shine on Brightly foi lançado em setembro de 1968, e é um ousado projeto da dupla Fisher / Brooker. Nos seus trinta e nove minutos de duração, temos a chave-mestra do que virou o progressivo anos depois, com a primeira grande suíte criada por um grupo de rock, a linda “In Held ‘Twas In I”.
Dividida em cinco partes (“Glimpses of Nirvana”, “‘Twas Teatime at the Circus”, “In the Autumn of My Madness”, “Look to Your Soul”, “Grand Finale”), é uma ousada suíte musical, que demora para ser assimilada, mas depois de absorvida, se torna uma embriagante sessão de relaxamento e prazer. Além disso, a participação de um pequeno coral deu mais drama a essa emocionante canção.
Gary Brooker |
“Glimpses of Nirvana” abre nossa Maravilha Prog com o som de um instrumento indiando, acompanhando o poema que conta a história. Efeitos de guitarra como microfonias e vibratos aparecem, e após o poema encerrar-se, entra o tema marcado de guitarra, bateria e baixo. As notas da guitarra e do baixo executam um pequeno crescendo, enquanto o piano é martelado por , encerrando essa pequena ponte com os acordes decadentes do piano, intercalado por três intervenções de baixo, bateria e guitarra.
Aqui começa realmente a maravilha musical de “In Held ‘Twas In I”, com a Sitar e o piano executando o tema principal da canção. O baixo faz leves notas, trazendo o coral que entoa a melodia do tema principal, acompanhando o piano. Uma respiração profunda da espaço para um pequeno solo de piano, e mais um trecho do poema é entoado, enquanto a melodia do piano vai envolvendo o ouvinte, em uma melodia triste, mas muito bela.
Matthew Fisher |
Batidas de um sino e rufares percussivos levam para a alegre “Twas Teatime at the Circus”, uma espécie de canção-cabaret, misturando valsa e polcas, destacando as vocalizações e intervenções do baixo e do piano, encerrando essa parte da canção com aplausos e muita festa. Porém, uma grande explosão acaba com tudo, trazendo a letra de “In the Autumn of My Madness”, em um ritmo leve, tipicamente sessentista, no qual o órgão e a guitarra se destacam.
Fisher faz um pequeno tema no órgão, e a letra continua, sempre com o mesmo ritmo, trazendo novamente o tema do órgão, enquanto ao fundo podemos ouvir uma sirene, gritos e diversos efeitos de colagem musical, os quais vão diminuindo o volume da canção para chegar na parte central e mais empolgante. Guitarra e baixo executam um tema marcado, enquanto o órgão delira com acordes longos.
Robin Trower |
Baixo, guitarra, piano e bateria fazem uma marcação tribal, ao mesmo tempo que o órgão delira, e nessa marcação, a guitarra passa a fazer o tema principal de “In Held ‘Twas In”. A guitarra então geme com notas muito tristes, enquanto baixo, órgão e piano repetem o tema central acompanhados pelo ritmo tribal.
Brooker passa a cantar acompanhado pelo cravo e pelo piano, e o ritmo suave é retomado pela bateria, com baixo, cravo e piano acompanhando belamente e dando mais emoção ao já emocionante vocal de Brooker, que com um longo grito, fica sozinho ao piano. O cravo e a marcação no prato mantém a letra em ação, seguindo o ritmo leve de “Look at Your Soul”, para Trower executar um lindo solo, com muitos vibratos, encerrando “Look at Your Soul” com mais um longo grito e o rufar da bateria.
É a marcação no prato, assim como o baixo, que introduz “Grand Finale”, trazendo o piano (aqui tocado por Fisher) e a guitarra executando um tema marcado junto do baixo, para o coral de vozes criar uma bonita melodia enquanto Fisher sola ao piano. Trower passa a solar, e o órgão entra em ação, com a canção ganhando dramaticidade nos acordes do instrumento, e a cozinha Knights/Wilson fazendo um acompanhamento singelo, mas perfeito para as notas rasgadas de Trower, encerrando essa maravilhosa canção com o coral trazendo uma energia positiva para a tristeza que impera em quase toda a suíte, acompanhado pelo ritmo marcial e por um longo acorde do órgão.
Procol Harum: pais do progressivo britânico |
O Procol Harum ainda seguiu uma carreira com altos e baixos, trocando de membros como quem troca de roupas. O terceiro disco do grupo, A Salty Dog (1970) tornou-se o mais bem-sucedido álbum de sua carreira. Em 1972, o álbum Live in Concert with the Edmonton Symphony Orchestra trouxe em todo o seu lado B uma fantástica versão ao vivo para “In Held ‘Twas In I”, a qual certamente deve ser ouvida pelos apreciadores do estilo. O grupo Transatlantic também fez uma regravação para essa maravilha prog.
O grupo encerrou as atividades em 1977, voltando no início da década de 90 para um único álbum (The Prodigal Stranger, de 1991) e definitivamente na década passada, permanecendo na ativa até hoje fazendo shows ao redor do mundo.
Talvez, se não fosse a ousada investida da dupla Fisher / Brooker, jamais teríamos a oportunidade de ouvir suítes como “Echoes” (Pink Floyd), “Close to the Edge” (Yes) ou “Supper’s Ready” (Genesis). “In Held ‘Twas In I”, além de uma Maravilha Prog, é uma peça essencial na história do rock progressivo e da música. Pena que o Procol Harum nunca mais tenha feito algo do porte dessa suíte, sendo reconhecido até hoje apenas pela bonita, mas ingênua, “A Whiter Shade of Pale.
Ótima matéria, digna de uma grande música. Apenas uma correção: na primeira foto colorida da banda, o terceiro músico não é B. J. Wilson, e sim Bobby Harrison, baterista do grupo no lado B ("Lime Street Blues") do single de "Whiter Shade…", que posteriormente seria o vocalista e líder do SNAFU.
Obrigado pela correção Marcello. Já vou modificar amesma. Abraço
A "Supper's Ready" dos anos 60.