Tralhas do Porão: Fuchsia
Por Ronaldo Rodrigues
O Fuchsia é um obscuro grupo folk/prog que merece ser descoberto por um leque mais amplo de ouvintes. Sua trajetória consta de apenas um único disco gravado e um único show ao vivo, mas ainda sim garanto ao leitor afeito aos estilos que o Fuchsia merece uma audição.
A história toda começa com um jovem inglês de nome Tony Durant, cuja trajetória musical havia começado com a bateria na escola primária. Pouco tempo depois, a bateria lhe pareceu pouco desafiadora e ele migrou para a guitarra. No início de sua trajetória, Durant curtia surf-rock e logo em seguida abraçou a nova fase do rock inglês que surgia com Beatles, Rolling Stones, Yardbirds, e todas as referências de blues/r&b que ganharam luz quando esses nomes ficaram famosos. Sua primeira banda chamava-se Louise, formada em na primeira metade dos anos 60, na qual ele entrou respondendo um anúncio. Era um grupo dedicado a covers de r&b norte-americano, do qual também fez parte Chris Cutler, futuro membro do grupo prog/experimental Henry Cow. O Louise foi gradativamente migrando para as experiências psicodélicas que emergiram a partir de 1966-1967 em Londres e chegou a tocar várias vezes nas principais casas noturnas que fomentaram essa cena, como o UFO Club e o Middle Earth. A banda gravou um par de canções para um compacto, mas não conseguiu um contrato e então, ficou apenas na lembrança de quem os ouviu ao vivo.
Em 1969, Durant deixou o Louise e decidiu dar um tempo na música para ingressar na universidade de Exeter, no condado de Bristol, no oeste da Inglaterra. Apesar da música não estar nos planos do garoto, os concertos e as apresentações musicais que aconteciam semanalmente na universidade o motivaram novamente a tocar guitarra e compor. No ano seguinte, Tony Durant passou a dividir apartamento com outro músico, o baterista Michael Gregory. A ideia de formar uma banda com o colega de quarto então veio naturalmente e através de um anúncio eles encontraram um baixista – Mick Day. Durante a elaboração do repertório para esse novo grupo, Durant começou a pensar que seria uma boa ideia incluir arranjos de cordas nas canções e os demais membros concordaram. A inclusão de violino, violoncelo e viola no grupo surgiu com certa facilidade, através de três garotas que estudavam também em Exeter – Madeleine Bland, Janet Rogers e Vanessa Hall-Smith. Nenhuma delas era musicista de fato, mas sim estudantes de ciências, letras e direito, respectivamente, e não tinham nenhum envolvimento prévio com rock, mas sim, alguma formação em música erudita. Sendo assim, como um sexteto, faltava o nome para o grupo, que veio como sugestão do baixista Michael Gregory – Fuchsia. Tony Durant cuidaria dos vocais principais, com o apoio das garotas.
O grupo não tinha nenhuma influência muito marcante, era música que simplesmente brotava daquelas cabeças e se acomodava em algum lugar entre o folk e rock. O grupo fez um show em uma sala da universidade de Exeter, no qual havia uma primeira seção de canções executada como trio e outra seção como sexteto. Durant reconhecia a enorme dificuldade em fazer uma boa liga entre instrumentos elétricos e acústicos sem ter uma boa aparelhagem disponível e o quanto isso era um enorme obstáculo para a banda. Logo após essa apresentação e a boa repercussão entre os alunos decorrente desta, o Fuchsia gravou uma demo em um pequeno estúdio, praticamente ao vivo e sem overdubs. A fita ficou com um amigo de Tony Durant dos tempos do Louise, chamado Paul Conroy e este conseguiu deixar a fita na mão de Terry King (empresário do Caravan e de outras bandas da chamada cena de Canterbury), que contratou o grupo logo após ouvi-la, pela Pegasus Records. Ele convocou o grupo para um estúdio em Chelsea, junto com David Hitchcock e Vic Gamn, que estavam trabalhando com diversas bandas e artistas da cena folk/prog, como Fairport Convention, Nick Drake, East of Eden, Caravan, Mellow Candle, etc. O álbum, autointitulado, chegou ao mercado britânico em outubro de 1971 e foi lançado também na França.
O álbum gravado é um primor de musicalidade e, mesmo transitando em um território do qual se associavam tantas bandas na época, o Fuchsia conseguia soar como nenhum outro. O mais interessante é que a parte elétrica do álbum é bastante densa, com uma bateria pesada e ideias muito inteligentes de guitarra. Seria como o Curved Air com uma dose extra de pegada. Já a parte acústica do álbum, por conta do trio de cordas, é muito inteligente ao se misturar com a parte elétrica, mas adquire o máximo de seu esplendor quando tem seus momentos próprios de destaque. A abertura com “Gone with the Mouse” já dá todo o cartão de visitas da banda; “A Tiny Book” é uma aventura musical muito rica, com muitas variações e ótimas passagens em seus 7 minutos de duração. “The Nothing Song” é outro grande destaque, onde a banda consegue soar pesada mesmo sem usar guitarra distorcida, tendo um toque cinematográfico arrasador no arranjo das cordas.
Apesar de uma turnê estar planejada pela gravadora, por razões desconhecidas ela não aconteceu e, ao que parece, a Pegasus não tinha convicção da melhor estratégia para promover a banda. As definições não vinham, os meses se passavam e foi difícil para Tony Durant manter o grupo engajado aguardando oportunidades após o lançamento do disco. Apenas um único anúncio saiu na conceituada Melody Maker, como parte dos trabalhos de promoção do álbum, e os músicos permaneceram estudando na universidade. Mas os meses se passaram, as promessas continuaram só promessas e cada um foi para o seu canto. Tony Durant permaneceu na música, mas com um nível de atividade baixo para a proporção de seu talento; tocou durante algum tempo com a banda de rock/blues-rock Punchin’ Judy. Já Michael Gregory migrou para o grupo folk britânico Albion Band. As garotas não seguiram na música. Apenas na década de 2000 o legado do Fuchsia ganhou algum reconhecimento, com o relançamento do material em CD.
Descobri o grupo Fuchsia há alguns anos. Fiquei surpreso com a qualidade de seu som. “Gone with the mouse” e “Shoes and ships” são grandes músicas. Recomendo com um sorriso nos lábios!
é uma sonzeira! minha surpresa tb foi parecida quando os descobri há uns anos atrás. Ouvia “The Nothing Song” repetidas vezes. Abraço!
Ronaldo, será que, entre as tralhas de seu porão, não há nenhum disco da banda Sweathog, que lançou dois álbuns entre 1971 e 1972? Som de muita qualidade…