The Rolling Stones – Hackney Diamonds [2023]

The Rolling Stones – Hackney Diamonds [2023]

Por Marcello Zapelini

HACKNEY DIAMONDS – AINDA ROLANDO APÓS 62 ANOS

Depois de 18 anos, The Rolling Stones lançam um álbum de estúdio de músicas inéditas – se contarmos o álbum de covers de blues, Blue And Lonesome, foram sete anos de espera preenchidos por vários discos ao vivo, uma coletânea oficial, várias reedições, ou seja, material antigo repaginado. A pergunta que não quer calar é: o mundo precisa de um disco novo da banda? Jagger, Richards e Wood perderam, no meio do caminho, a companhia de Charlie Watts (que participa de duas músicas), e a solução foi caseira, trazendo Steve Jordan, velho parceiro de Keith Richards, para ocupar o banquinho, e se mostra perfeitamente adequado para a proposta do grupo. Vários nomes famosos são creditados no álbum: Elton John toca piano em duas músicas (“Get Close” e “Live By The Sword”), Stevie Wonder aparece em “Sweet Sounds Of Heaven” – em que Lady Gaga também diz “presente”, o ex-Tom Petty Benmont Tench contribui em “Depending On You” e “Dreamy Skies”, Matt Clifford colabora com teclados, James King aparece no sax, Bill Wyman volta para uma faixa, e ninguém menos que Paul McCartney toca um baixo cheio de fuzz em “Bite My Head Off”…

DELUXE EDITION, capa lenticular

A promoção em torno do álbum foi grande, em diferentes cidades, e com o lançamento de múltiplas versões (só em vinil há 40 opções), incluindo a Deluxe com capa lenticular. Na parte musical, o grupo volta ao blues, traz rocks fortes e animados, as tradicionais baladas stoneanas, Keith dando sua canjinha como cantor; só não há nada mais experimental – mas para mim isso não é problema, esse lado da banda poucas vezes me agradou. O álbum começa forte com “Angry”, e a bateria precisa de Steve Jordan dá o tom da música, levada nas guitarras de Richards e Wood. Na sequência, mais uma introdução de bateria para “Get Close”, rock animado, mais leve, com solo de James King no sax (que me fez lembrar dos tempos de Bobby Keyes), que não deixa a peteca cair; Elton John participa no piano, mas não altera muito a música, que me recordou “Slave”, do Tattoo You.

“Depending On You”, a terceira música, suaviza um pouco mais, sendo uma baladinha bem tradicional, com belo trabalho de guitarra de Ronnie Wood e arranjo de cordas para acompanhar. Interessante observar que as três primeiras músicas são creditadas a Jagger/Richards e o produtor Andrew Watt. A divertida “Bite My Head Off” traz o velho rival – mas sempre amigo – Paul McCartney no baixo, e Macca não decepciona (fãs do George Harrison me perdoe, mas na minha opinião ele sempre foi o melhor músico dos Beatles), com direito a um break em que ele e Jordan tocam sozinhos antes do solo de guitarra (que mostra o quanto Ronnie consegue emular o estilo do velho Keef). “Whole Wide World” é aquele rock que a banda faz desde que Ronnie Wood entrou, sem grandes surpresas, mas nada que decepcione; seu solo é curtinho e na medida certa. E, de repente, você ouve Keith Richards no violão com bottleneck: “Dreamy Skies” traz os Stones tocando blues novamente – como deve ser, sem frescuras, com Mick Jagger na harmônica e um acompanhamento sutil e leve na bateria.

Ron Wood, Mick Jagger e Keith Richards. Stones em 2023

Nessa altura do campeonato o fã dos Stones está perdido em pensamentos, lembrando dos bons momentos da banda nos anos 60 e começo dos 70, antes deles se desviarem do blues. “Mess It Up” e “Live By The Sword” foram gravadas em sessões em 2019, o que nos permite ter Charlie Watts no seu lugar de direito – e no caso da segunda, Bill Wyman no baixo, recriando a formação da banda que durou da segunda metade dos anos 70 até o início dos 90. São mais dois rocks, o primeiro com um refrão mais puxado para o pop e Mick Jagger arriscando um falsete no vocal, e o segundo com um vocal mais raivoso e o luxuoso acompanhamento de Sir Elton no piano, aqui com mais destaque. Na sequência, “Driving Me Too Hard”, mais leve e mais balada, mas pouco destacada no contexto geral do álbum (e que me trouxe “Tumbling Dice” à cabeça), e “Tell Me Straight”, a música do Keith Richards, com toda a cara de suas músicas feitas para os Stones nos últimos quarenta anos, explorando a fragilidade de sua voz.

Stones ao vivo com Lady Gaga

“Sweet Sounds Of Heaven” traz lágrimas aos olhos, com sua influência de gospel; impossível não lembrar de “You Can’t Always Get What You Want” ou “Let It Loose”, mas não há semelhanças entre as músicas. Lady Gaga estava gravando no estúdio ao lado, e passou para dar um alô quando viu Jagger cantando; uma participação improvisada, um take com os dois na cabine, e a voz da Stephanie dá um gás adicional à música. É bom ver que, quando a música ia acabar, o tape continua rolando e temos dois minutos a mais de uma coda simplesmente maravilhosa, com o grande Stevie Wonder cheio de sentimentos. Para terminar, o único cover do disco: “Rolling Stone Blues”, de Muddy Waters. Parece ser o círculo se fechando para os veteranos…

Edição Clear Diamond

O álbum está vendendo bem para os padrões atuais, e de acordo com a Billboard, na semana de lançamento, vendeu mais do que os outros nove álbuns do top 10 juntos (mais de 70.000 cópias). A banda obteve seu 14º primeiro lugar na Inglaterra (onde recebeu o disco de ouro) – isolando-se no segundo posto em números 1, perdendo apenas para – adivinhem! – The Beatles. Também atingiu o primeiro posto em mais 19 países, mas não nos EUA – alcançou o segundo lugar na Billboard. Na véspera do lançamento, no dia 19 de outubro, eles fizeram um show para 650 convidados num clube em New York, para marcar a data. Agora mesmo, no dia 30 de novembro, uma edição especial do álbum foi anunciada em pré-venda, contendo as sete músicas apresentadas nesse pequeno show: “Shattered”, “Angry”, “Whole Wide World”, “Tumbling Dice”, “Bite My Head Off”, “Jumpin’ Jack Flash” e o encore com “Sweet Sounds of Heaven”. Os vídeos disponíveis mostram a banda bem à vontade, tocando os velhos cavalos de batalha e as músicas novas com aquela mistura de competência e desleixo que caracteriza os Stones ao vivo desde os anos 90, e servem de aperitivo para a anunciada turnê americana de 2024.

Hackney Diamonds não revoluciona, não muda a paisagem da música atual, nem entra para o top 10 dos melhores discos da própria banda, e se houver outra turnê após a do lançamento, provavelmente não contribuirá para setlists futuros. Foi bem recebido por boa parte da crítica, esculachado pelo resto, mas é assim mesmo há décadas: o primeiro LP original deles que comprei quando do lançamento foi Undercover, e cada um deles foi recebido como o “melhor desde Exile On Main St.”, ou como apenas mais um disco dos Rolling Stones. A banda não precisa provar nada para seus fãs e não pretende conquistar novos com este lançamento. Assim, voltando à pergunta do começo, o mundo precisava de um disco novo dos Stones? O mundo, eu não sei, mas eu precisava. Aqui a banda faz o que sempre fez de bom, sem muita frescura, e, mesmo que já tenha feito tudo isso muito melhor antes, não decepciona.

 

Contra-capa do novo lançamento dos Stones

TRACKLIST:

  1. Angry
  2. Get Close
  3. Depending On You
  4. Bite My Head Off
  5.  Whole Wide World
  6. Dreamy Skies
  7. Mess It Up
  8. Live By The Sword
  9. Driving Me Too Hard
  10. Tell Me Straight
  11. Sweet Sounds Of Heaven
  12. Rolling Stone Blues

6 comentários sobre “The Rolling Stones – Hackney Diamonds [2023]

  1. Legal…
    Ainda não ouvi nada mas estou com boas expectativas. Vai mudar a carreira deles? Tenho certeza que não, mas é interessante que tenhamos material e inevitavelmente sempre pensamos que pode ser o último…
    Vou aproveitar que hoje é domingo para ouvir

  2. Terminei a audição do disco agora. Achei um bom disco, com uma reta final sensacional. “Sweet Sounds Of Heaven” é simplesmente incrível, e uma das melhores músicas dos Stones em anos. “Rolling Stone Blues” é uma bela faixa para encerrar o disco e quiçá, encerrar a carreira dos caras. Não é um disco que ficará no Top 10 dos caras, mas se for a despedida, será muito digna, e certamente, está por enquanto no meu Top 10 de 2023

    1. Assino embaixo. Se realmente for o último disco de músicas novas, será um belo fechamento para a carreira da banda. Ano que vem tem turnê americana anunciada, resta cruzar os dedos para ver se vai passar por aqui. Os Stones podiam ter pedido a conta quando Charlie Watts morreu, mas, já que não o fizeram, vamos aproveitar as chances!

    1. Legal, Anderson! Hackney Diamonds está na minha lista dos melhores do ano. Agora é torcer para os velhinhos pintarem por aqui para uns shows!

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