Direto do Forno: Allos – Strong Delusion [2024]
Por Anderson Godinho
Allos é uma banda mineira composta por Celso Alves (Vocais); Júnior Oliveira (Guitarras); Edley Winderson (baixo) e Wallace Ryan (bateria). Conforme suas plataformas digitais, se formaram, sem Celso Alves, em 2003 e possuem em seu catálogo dois álbuns, sendo este que vos apresento o segundo: Strong Delusion (04-10-2024). No release da banda enviado para a Consultoria, apresentam-se como uma banda que se destaca por sua habilidade de fundir a velocidade e harmonia do Power Metal com a técnica sofisticada do Prog Metal, além de incorporar elementos agressivos e sinfônicos de forma magistral. O álbum que irei aqui apresentar começou a ser composto em 2017, e se tornou uma das primeiras produções do estúdio Sonastério, já em 2019. Apesar de ouvir muito metal brasileiro, acompanhar bandas e artistas, confesso que fiquei intrigado por não conhecer uma banda tão interessante tecnicamente, posteriormente entendi o motivo, mas deixo para o final.
Strong Delusion é uma primazia na produção, muito bom mesmo, a cargo de Bruno Barros e da própria banda. Ouvindo em diferentes equipamentos de som, a qualidade realmente impressiona. Partindo para o que interessa, não adiantaria nada uma bela produção para algo fraco, e aí é que a banda se avulta! Os caras são bons tecnicamente, são criativos nas composições musicais sem perder de vista suas referências. Sobre suas influências, em minha audição ficou muito forte a presença de Angra (distintas fases, inclusive) tanto no instrumental quanto no vocal de Celso Alves. Outra sonoridade que na primeira metade do álbum encontrei foi Kamelot clássico, aquela ambientação com teclados ao fundo, com a forma de cantar um tanto falada em alguns trechos, muito interessante. Por fim, na segunda parte do álbum principalmente, visualizei algumas coisas de Stratovarius e Rhapsody.
O álbum começa com uma introdução em que um homem em agonia clama por um caminho, uma salvação. “The Pilgrim’s Progress” indica que o álbum irá contar uma história, mesmo que não tão intrincada e evidente na estrutura do material, o que pode ser percebido ao longo do play. Na sequência à intro, começa “Follow Me”, rápida, muito power metal! Nada de novo aqui, mas muito competente para iniciar os trabalhos, e com a participação mais que especial de Christina Liljegren (Narnia)! É daqueles sons direto, sem invenção, agrada bastante, convida e instiga a ouvir o restante. A terceira música, “All Your Days”, segundo single da bolacha, já é mais cadenciada e apresenta alguns elementos mais melódicos principalmente no vocal. Os solos são muito bonitos e o pessoal da cozinha começa a dar suas caras principalmente quando a música cresce no final.
Em alguns momentos a banda pesa a mão, e nesse balaio temos “Tele Visione of Reality”, primeiro single do álbum, que é muito bem construída. Passagens de teclado do meio pra frente fazem a música ganhar intensidade, a criatividade na composição da bateria também é muito boa. Elementos progressivos também aparecem aqui com algumas quebras de ritmo. Outra do time das pesadas é a seguinte “Suffering & Evil”, novamente a bateria é um dos destaques, porém no baixo Edley mostra suas armas. É uma das melhores músicas pela sua complexidade e grandeza. No time das músicas com caráter mais épico, “Inferno” entra de sola. Vocal, principalmente no final, é grandioso, ambientação nota 10, teclados a mil, é uma bela composição que casa perfeitamente com a proposta da história contada. O casamento dessa música se dá, ainda, com a seguinte “Letter from Heaven”, tem que ter uma balada, né!?.
Aqui já estamos na segunda metade do álbum e destacaria a ótima faixa título, os caras se puxaram para mostrar o melhor de si. Para se ter ideia, surge até um proto Djent em meio a passagens progressivas e power. Porém, a essa altura do álbum, as boas “Inhuman Mind” e “System Collapse” demonstram a vertente mais Power da banda. Completa-se o álbum com a dupla “Millenium Kingdom” e “For the Centuries”, a primeira mais rápida, épica, longa, contando com os vocais de Rob Rock (Impellitteri) enquanto a segunda trata-se de um encerramento, curta, tranquila … uma Ode ao Senhor cristão… literalmente…
Destacadas as músicas e toda parte boa, entro agora na questão da temática cristã inerente à banda. A religião aflora de modo bem explícito já na primeira música, e em quase todas o Deus cristão aparece na primeira linha. Se você não gosta daquele papo de moralidade perdida, único caminho, evidências para todo lado… Daquela explicação extremamente simplista das mazelas sociais pelo abandono do ser humano frente ao Deus todo poderoso… aquele papo que começa bem (questões que todos concordam), mas termina mal (cheio de estigmas, conservadorismo e até preconceitos) esse material não é para você.
Essas letras realmente estragam a experiência, infelizmente para quem presta a atenção… é chato demais. O álbum se torna praticamente uma missa… culto… seja lá a cerimônia que for. Além disso, e principalmente, apresenta uma visão muito limitada de mundo, e você pode me criticar, mas quando os tais valores, moralidade (no fundo retórica) se apresentam como solução única, inviabiliza outras formas de perceber o mundo. Isso não gera salvação, gera opressão, fomenta exploração. Fiquei impressionado com a retórica das letras, como utilizar o discurso no sentido de apresentar a fuga do ‘sistema’, a liberdade perante a ‘alienação’ que o mundo atual apresenta, uma salvação… Tudo isso, porém, cultivando a ideia de que uma verdade única, que se não for respeitada levará ao caos, a um inferno. Até Platão entrou na roda… Contradições… Enfim… por essas e outras que tais bandas são de nichos específicos, dos seus mundinhos, e, mesmo considerando apenas o metal nacional não os conhecia.
Track list
01 The Pilgrim’s Progress 2:33
02 Follow Me 4:14
03 All Your Days 4:50
04 Tele Visione Of Reality 4:55
05 Suffering And Evil 5:30
06 Inferno 6:44
07 Letter From Heaven 4:44
08 Inhuman Mind 4:45
09 Strong Delusion 5:45
10 System Collapse 4:42
11 Millennium Kingdom 5:37
12 For The Centuries 3:56