A Consultoria do Rock estreia hoje mais uma sessão, “Resenha de Livro”, na qual traremos críticas a respeito de obras impressas que contenham material relacionado à música em geral, começando com uma das mais recentes biografias dos britânicos do Led Zeppelin.
Por Mairon Machado
Que o Led Zeppelin foi uma das maiores bandas da história do rock, disso ninguém duvida. Da mesma maneira, muitas pessoas sabem que o grupo recebeu diversas homenagens através de álbuns-tributo e covers, além de revistas especializadas que abordaram a curta carreira da banda, com pouco mais de 11 anos de história.
O mais recente livro carregando o nome do grupo foi lançado em 2009. Trata-se de “Led Zeppelin: Quando os gigantes caminhavam sobre a Terra”, do escritor, radialista e jornalista musical britânico Mick Wall. Em uma obra de mais de 500 páginas, o autor narra a história do quarteto de um ponto de vista pessoal, através de fatos que o próprio autor presenciou e pesquisou com o passar dos anos.
Logo na apresentação, o autor revela que demorou muito tempo para concluir sua obra, e não é por menos. Caprichando em detalhes, Wall passeia por fatos até então não tão esclarecidos para os fãs, como a famosa história do “mud shark”, na qual uma groupie foi penetrada por dois peixes por um dos funcionários da empresa Led Zeppelin, Richard Cole, em uma das várias orgias realizadas por Robert Plant (vocais), Jimmy Page (guitarras), John Paul Jones (baixo) e John Bonham (bateria).
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Foto para publicidade nos primórdios do grupo, em 1968 |
Outro fato que chama a atenção é a riqueza de detalhes a respeito da construção do gigante Led Zeppelin após o término do The Yardbirds, tratando Page como um semideus da música o tempo todo, responsável por cada passo dado. Também revela com perfeição as canções plagiadas por Page e Plant, as discussões entre Jeff Beck e Page sobre quem fez a primeira versão de “You Shook Me”, assim como mergulha fundo no ocultismo que Page preservou no início da década de 70, influenciado diretamente por Aleister Crowley, detalhando as supostas explicações para um dos mais célebres ícones a respeito do Led, o famoso símbolo de Page, “Zoso”.
Se o guitarrista é o centro das atenções no livro, Plant acaba parecendo uma ovelha negra. Tratado como um riponga que teve a sorte de estar ao lado de Page, o vocalista – apesar disso não ser dito com todas as letras – acaba recebendo a culpa pelo fato do Led ainda não estar na ativa, inclusive com palavras por vezes surpreendentes em relação às atitudes de Plant após o fim da carreira do Led Zeppelin, chegando a insinuar que o cantor acabou com a dupla Coverdale/Page por simples ciúmes.
A respeito de Jones, Bonham e do empresário Peter Grant, curiosidades e mais curiosidades são levantadas e reveladas com o passar da leitura – de fácil assimilação –, o que torna o livro mais atraente. Enquanto o primeiro é um pacato músico, que conservava uma certa independência dos demais, vivendo seus momentos particulares praticamente longe de Page, Plant e Bonham, o baterista é uma figura completamente amorosa ao lado de sua esposa Pat e seus filhos, mas um ser incontrolável durante as turnês. Várias são as brutalidades e absurdos que o baterista cometeu nos hotéis e bares espalhados pelo mundo, e Wall apresenta ao leitor alguns deles com bastante precisão. Quanto a Grant, a figura gorda que mandava por trás dos bastidores, sua história chega a comover, já que ele é o homem que levou o Led Zeppelin ao status de maior banda de rock da década de 70. Para isso, teve que pagar com a separação de sua esposa e dois filhos, deixando-o muito abalado, refletindo também no final da carreira do zeppelin de chumbo, junto à morte de Bonham.
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Robert Plant e Richard Cole em uma cama de casal no avião Starship, em 1973. A fase mais bem sucedida do grupo. |
Mais momentos interessantes aparecem através da influência do glam rock no Led, levando-os a usarem roupas extremamente chamativas após 1973; como realizar Presence foi uma questão de superação para Plant, assim como o total domínio que Page empregou para sua gravação; os gravíssimos problemas com heroína que o guitarrista enfrentou a partir de 1975, entre outros fatos por vezes surpreendentes até para os fãs mais aficionados.
Além das citações a entrevistas, livros e conversas pessoais, seja com os membros do Led Zeppelin ou com pessoas diretamente ligadas e/ou influenciadas por eles, caso de Ace Frehley (Kiss), Pamela des Barres (ex-namorada de Page), David Bowie, Bev Bevan (ELO), Bill Ward (Black Sabbath), Jeff Beck, Ron Wood (Rolling Stones) e outros, o autor constrói textos imaginativos, que representam uma espécie de ego conversando com cada um dos personagens principais do livro, ou seja, Plant, Page, Jones, Bonham e Grant. Por vezes, faz o leitor viajar no tempo e sentir-se exatamente como os personagens em questão. Complementa tudo um pequeno apanhado de fotos*, cobrindo desde o início da carreira de Page até a última apresentação do grupo em 2007, no O2 Arena, em Londres.
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Jimmy Page em 1977, consumido pela heroína: “Eu realmente não curto alimentos sólidos”, dizia ele nessa época |
Por outro lado, não sei se é a tradução para o português ou o livro em si que comete alguns pequenos erros, como a citação à famosa festa de entrega dos discos de ouro referentes às vendas dos quatro primeiro LPs do grupo na Suécia, realizada em uma casa de sexo explícito, que, no livro, é dita como ocorrida em função do álbum Led Zeppelin II. Cita também que a festa de aniversário dos treze anos de “Stairway to Heaven” ocorreu em 2001 (a canção foi lançada em 1971) e chama o fundador da Band of Joy de Vernon Perara (Vernon Pereira é seu nome verdadeiro). Erro mais absurdo: diz que o baterista Aynsley Dunbar era baixista (?!) do Journey, bem como, por vezes, parece que a história vai e volta alguns anos, dificultando a compreensão de determinado capítulo, além de vários erros de digitação e/ou prensagem.
Detalhes sobre as capas dos livros, a quase saída de Jones (sim, isso ocorreu após Houses of the Holy), que por pouco não tornou-se mestre no coral da catedral de Winchester, os incidentes com Page, Plant e as groupies que faziam de tudo para dormir em suas camas, a morte de Bonham, enfim, a carreira de um gigante esmiuçada em um bom livro, que desmistifica o lado negro do quarteto, glorificando-o com palavras dignas de um grande grupo de rock.
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Contracapa do livro de Mick Wall |
“Led Zeppelin: Quando os gigantes caminhavam sobre a Terra”, é fortemente aconselhado para os fãs mais fieis e também àqueles que gostam de ler sobre música, principalmente jovens que perambulam por sites a respeito de teorias da conspiração em torno do nome Led Zeppelin, já que, nesse caso, verão que o que Page, Plant, Jones e Bonham faziam era nada mais nada menos do que a melhor parte do rock ‘n’ roll, ou seja, pura diversão!
* As imagens que ilustram este artigo estão presentes na parte final do livro.
Mairon muito legal a idéia das resenhas.
Eu ja comprei o livro e espero que faça justiça a carreira do Led.
Sobre os erros nesses livros: eles existem e são muitos, infelizmente.
Lembro quando eu comprei a biografia do Sepultura e fui correndo ler…
Quando cheguei no Beneath the Remains estavam faltando dois capítulos no livro!
Que raiva! E o pior é que o livro inteiro tinha um monte de erros, super mal escrito!
Vamos torcer para que as editoras tenham mais capricho nos lançamentos.
Abraço
Vlw pelo comentario meu caro, e poxa, livro sem capitulo eu nunca tinha visto
Abração
Estou lendo o polêmico "Starway to Heaven: Led Zeppelin Uncensored", do Richard Cole. É um livro muito divertido, parece que a gente tá lendo uma revista Caras do mal. Mas não dá pra dar credibilidade à esses livros. Vamos esperar que Page, Plant ou Jones resolvam se coçar e escrever uma bio decente.
Marco, o Stairway eu não conheço, mas esse livro do Mick Wall traz como principal atrativo o fato de ele ter convivido com a banda durante um bom tempo, e muito do que é citado é por entrevistas documentadas no final do livro.
Mas q tem muito livro bomba por ai, isso tem
Sim, Mairon. Não estou bem criticando o livro que você resenhou. Na realidade, acho todo material bem-vindo, seja de onde for. E se o Mick Wall conviveu com a banda, o que dizer do Richard Cole, que foi tour manager do Led enquanto o grupo existiu e o cara responsável pelo episódio do peixe na groupie? No entanto, bastou lançar esse livro (Starway to Heaven) para ser crucificado em praça pública pelos três componentes restantes da banda, principalmente o Robert Plant.
Terminei de ler o livro agora pouco. Um pouco menos de um mês de leitura. Lento e prazeroso. Muito boa a resenha.
Devo dizer que a construção da imagem do Plant como o homem que impede a reunião da banda é ambígua, pois, além de que você abordou na resenha, Mick Wall, no fim, acaba meio que tratando isso de forma positiva, mostrando que Plant seguiu com a vida e construiu uma bela carreira solo. Nesse sentido, a crítica acaba caindo sobre Page, que, segundo o autor, vive sempre à espera da reunião, sem capacidade pra seguir em frente.
Li o livro faz uns três anos, mas não concordo com a desconstrução da imagem do Plant, de que ele era só um riponga que teve sorte em entrar pra banda. Se bem que posso estar sendo influenciado pela biografia do Plant que li faz pouco tempo, em que ele é descrito como um cara muito consciente de sua carreira e que, principalmente na segunda metade da década de 70 foi muito importante na condução da carreira do Led. Até porque Page estava afundado em heroína e Bonham também tinha sérios problemas com drogas e bebida.
Olá Rafael, obrigado pelo comentário. Pois então, eu reli o livro nesse ano de 2016, e segui com o mesmo pensamento. Li outro livro (que terá resenha aqui no site provavelmente em novembro) e também cheguei na mesma conclusão. Claro que o Plant foi importante para o Led pós-1976, mas acho que muito mais para manter a banda unida do que para a importância do grupo em si. Afinal, Presence é um disco muito contestado (particularmente, adoro ele), e In Through the Outdoor é muito fraco comparado com os demais, e são os dois discos que tem a mão exclusiva do Plant.
Trocando em miúdos, o fato do acidente de Plant na Grécia e a morte do seu filho em seguida, o deixaram com o status de “deixa ele fazer o que quiser”, e como o Page tava mais pra lá do que para cá e o Bonham NUNCA deu bola para produção e criação musical, sobrou para ele e o Jones, esse sim, o cara que ainda tentou criar música com o Led. Será que estou errado?
John Paul Jones era a coluna cervical do Led Zeppelin.
Terminei o livro este fim de semana. Bela fonte de informações, não vejo como acrescentar nada aos demais comentários. Mas achei desnecessariamente longo o capítulo (quase) inteiro dedicado a Alister Crowley. Sem dúvidas que foi uma grande influência, mas porra, texto chato e especulativo demais.