Death Metal Melódico: A cena de Gotemburgo
At The Gates em 1995 |
Por Leonardo Castro
Após a primeira onda do estilo, sediada firmemente na Flórida, os ventos do death metal se espalharam pelo mundo todo. E foi de um país cujos expoentes musicais mais famosos eram o pop do ABBA e o hair metal do Europe, a Suécia, que uma segunda leva de bandas do estilo se destacou, principalmente o trio Entombed, Dismember e Unleashed, baseado na região de Estocolmo, que atingiu a fama principalmente devido à rispidez e agressividade do seu som, que não deixava nada a dever aos ícones norte-americanos do estilo.
Contudo, alguns anos mais tarde, outra cidade começaria a se destacar na cena metálica do país. Bandas como o At The Gates, In Flames e Dark Tranquillity, formadas no fim dos anos 80 ou no começo dos anos 90, passaram a misturar em seu som a agressividade dos pioneiros norte-americanos e suecos à riffs e estruturas típicas do Iron Maiden e de toda a NWOBHM, criando assim um death metal mais acessível e melódico. Ainda que outras bandas já estivessem fazendo o mesmo, como o Carcass na Inglaterra, o Atheist e até mesmo o Death nos EUA, a quantidade de bandas e álbuns lançados na primeira metade dos anos 90 acabou definindo esse estilo como o som de Gotemburgo.
At The Gates
Formado das cinzas do Grotesque, o At The Gates lançou seu clássico disco de estréia, The Red In The Sky Is Ours, em 1992, unindo estruturas típicas do death metal sueco a arranjos mais sofisticados, influenciados por música clássica, como se percebe em “Windows“. Após lançarem mais um disco seminal, With Fear I Kiss The Burning Darkness, o guitarrista Alf Svensson deixou a banda, sendo substituído por Martin Larsson, o que afetou diretamente o som do grupo, como pode ser visto em Terminal Spirit Disease, de 1994, que contém músicas mais simples e diretas.
Contudo, foi com Slaughter Of The Soul, de 1995, que a banda atingiu o seu ápice. Com riffs fortes e uma produção espetacular, o disco levou o At The Gates ao topo do cenário sueco, e o videoclip da música “Blinded By Fear” teve bastante exposição em todo o mundo.
Infelizmente, após a turnê do disco a banda decidiu se separar, com alguns membros formando o The Haunted. O grupo voltou a fazer shows em 2007, lançando inclusive um DVD ao vivo, mas nenhum material novo foi gravado desde então.
Dark Tranquillity e In Flames
Apesar de possuírem estilos bastante distintos, a história do In Flames e do Dark Tranquility tem tantos pontos em comum que se torna mais fácil analisá-las em conjunto.
Formada em 1989 pelo guitarrista e vocalista Mikael Stanne e pelo guitarrista Niklas Sundin, o Dark Tranquillity se estabilizou com a entrada do vocalista Anders Friden, do baterista Anders Jivarp e do baixista Martin Henriksson. Com essa formação lançaram algumas demos e o disco de estréia, Skydancer, em 1993. O disco mesclava uma agressividade típica do black metal com passagens acústicas e alguns vocais femininos, como em “A Bolt Of Blazing Gold“. Apesar de extremamente bem recebido, o vocalista Anders Friden acabou deixando a banda após o lançamento do disco, indo para o In Flames. Com isso, Mikael Stanne abandonou as guitarras e assumiu os vocais, e um novo guitarrista, Fredrik Johansson, foi recrutado.
Dark Tranquillity em 1992, com Anders Friden |
Com a nova formação, o grupo lançou o EP Of Chaos And Eternal Night e, em seguida, o disco que muitos consideram a obra prima da banda, The Gallery. Neste lançamento, a banda apresentava um death metal extremamente técnico e complexo, repleto de riffs empolgantes e mudanças de andamento, somados aos vocais únicos de Mikael Stanne. A primeira faixa do álbum, “Punish My Heaven”, já deixava explícita a nova sonoridade da banda. Há ainda no disco momentos épicos e emotivos, como na música “Lethe”. Em resumo, The Gallery é um clássico do death metal de Gotemburgo.
Em seguida, a banda lançou The Minds’ I, em 1997, um disco mais direto e não tão complexo, mas ainda assim bastante interessante. Nos lançamentos posteriores, o grupo adotou um tecladista e deixou de lado a agressividade do death metal, optando por passagens mais melancólicas e no uso maior de vocais limpos. A banda segue na ativa até hoje, entretanto, poucas músicas dafase inicial da sua carreira são incluídas em seus shows hoje em dia.
Já o In Flames foi formado por Jesper Stromblad em 1990, que logo recrutou Glenn Ljungstrom (guitarra) e Johan Larsson (baixo). No início, Jester assumiu a bateria da banda, que ainda sem um vocalista fixo, convidou Mikael Stanne, então guitarrista do Dark Tranquillity, para gravar os vocais de seu disco de estréia, Lunar Strain. Ao contrário da complexidade do Dark Tranquillity, o In Flames se destacava pela simplicidade da sua música, que sempre tinha riffs e melodias marcantes, apesar da agressividade latente. Isso fica claro em um dos clássicos do primeiro disco, “Behind Space”.
In Flames em 1993,, com Mikael Stanne |
Para o lançamento seguinte, Jester decide ficar nas guitarras com Glenn, e o baterista Daniel Erlandsson, na época no Eucharist e hoje em dia no Arch Enemy, foi convidado para gravar o EP Subterranean. Os vocais, ainda sem um integrante fixo, foram gravados por Henke Forss. Subterranean mostrava um In Flames ainda mais melódico, com linhas de guitarra ainda mais marcantes, como na faixa “Stand Ablaze”.
Contudo, foi no disco seguinte, The Jester Race, de 1995, que a banda se estabilizou, trazendo o baterista Bjorn Gellote e oficializando o vocalista Anders Friden, ex-Dark Tranquillity. Com essa formação, o grupo gravou um disco inovador, que mesclava vocais guturais e duetos de guitarra típicos do Iron Maiden à passagens semi-acústicas, de uma forma simples e marcante. Para muitos, o In Flames abandonou o death metal em The Jester Race, mas a beleza e qualidade de suas composições são inegáveis. A faixa-título, “Artifacts Of The Black Rain” e “Moonshield” são os seus principais destaques.
A banda ainda gravaria mais um disco com a mesma formação, Whoracle, de 1997, onde seu som passou a contar com mais teclados, mas ainda assim mantendo as suas características principais. Com Colony, de 1999, e Clayman, de 2001, o grupo modernizou bastante se som, mas conseguiu manter sua sonoridade e identidade, aumentando muito a sua popularidade.
Contudo, após o lançamento de Reroute To Remain, em 2002, seu som sofreu uma grande mudança de estilo, aproximando-o do que estava em voga nos Estados Unidos na época. Desde então, a banda tem crescido bastante em todo o mundo, mas praticamente ignora os trabalhos lançados antes de 2000, raramente incluindo algo desses discos em seus shows.
A riqueza do heavy metal sueco é assombrosa, ainda mais se compararmos com países normalmente mais influentes em termos de música e de população bastante superior. As duas ondas death metal suecas são formadas por bandas de qualidade indiscutível e personalidade suficiente para se destacarem perante outras cenas locais. Das três citadas, conheço bem mais o In Flames, aliás, grupo que preciso voltar a ouvir com mais frequência. Desde "Reroute to Remain" a banda se perdeu um pouco e se deixou influenciar por grupos que possivelmente eles mesmos haviam influenciado, mas até "Clayman" o In Flames só tem material bom. Conheço discos das outras bandas, em especial o ótimo "Slaughter of the Soul", mas estou devendo uma exploração melhor…