Vãn Züllatt – O Casulo [2008]
Vãn Züllatt em 2007 |
Vãn Züllatt em 2010: Marcelo, Cleber, Gabriel e Jonatã |
“Cores” vêm na sequência dos delírios finais de “Sertão Digital”, com um tempero mais brasileiro para o rock progressivo que a banda fez nas duas primeiras faixas, com Cleber solando na flauta, seguido por um belo solo de violão que leva ao solo de piano, levando para um bonito tema na flauta onde o andamento é modificado, com uma marcação mais nos pratos. O piano repete o tema da flauta, e então flauta e piano passam a repetir o mesmo tema, chegando ao trecho final, onde flauta e violão solam em cima de um mesmo tema, lembrando bastante canções do grupo Recordando o Vale das Maçãs, com a faixa encerrando com a pegada do solo de guitarra, onde Jonatã sola distintamente nas caixas de som, o que deu um ganho interessante para o final da canção.
A sequência é destinada para “De Sol a Sol”, com uma introdução ao piano que já mostra o ritmo do que virá pela frente, um excelente jazz rock comandado pelos pratos de Marcelo e pelo baixo de Gabriel, onde o solo inicial é feito pela flauta, em uma linha similar a de Thijs Van Leer (Focus), com Jonatã comandando o segundo solo em um estilo único, com notas e escalas simples. Destaque principal para o solo de piano elétrico, que nos faz voltar aos bons tempos onde Herbie Hancock era o dono do instrumento.
A flauta encerra essa canção, e abre “Utacaram”, uma bela e complicada faixa, onde o andamento da bateria e do baixo é muito estranho, mas as sequências de intervenções de flauta e teclado acabam definindo o rumo da mesma, com uma pegada rápida que leva aos solos alternados de teclado e guitarra, com um pique fantástico, daqueles de fazer a perna não parar de balançar. As viradas do teclado e da bateria levam a uma sequência de curtos solos de baixo e bateria, e a faixa segue com um delirante solo de moog, encerrando com o rápido tema da flauta e o barulho de uma porta se fechando.
Então, surge a doideira “Tarantula”, comandada pelo solo de guitarra e moog. O andamento cavalgante do baixo e o insistente prato latejando ao fundo tornam a canção ainda mais atraente. O único ponto negativo vai para o volume da guitarra, que acabou ficando muito baixo em comparação ao volume do prato, mas da para se perceber claramente os temas clássicos que Jonatã executa durante seu solo. A canção muda completamente para o solo de flauta, o que já se torna uma constante no álbum, a gostosa mudança de sonoridade na mesma faixa, mesmo que ela não seja uma faixa longa, e por fim, mais um solo de piano elétrico encerra o que seria o Lado A do álbum.
O grupo em alucinada apresentação |
A canção vai ganhando ritmo em cima do tema do violão e das batidas de Marcelo, e então começa “Do Pé da Seringueira”, mais um belíssimo jazz rock levado pelo piano de Cleber e pelas escalas de Jonatã. Essa é uma das minhas faixas preferidas no CD, principalmente pelo toque jazzístico de Cleber, Gabriel e mais ainda de Marcelo, um grande baterista sem sombra de dúvidas. A primeira parte apenas é jazzística, já que como a tradição Vãn Züllattiana, a canção muda totalmente na sua segunda parte, ganhando mais ritmo enquanto Jonatã faz seu solo, e infelizmente de novo a mixagem da guitarra peca, com o volume ficando muito baixo para o som da guitarra.
Seguindo a linha jazzística, temos a interessante faixa “Jazzpion”, que apesar do nome satírico, é outra excelente jazz rock agora com destaque maior para as escalas de Cleber e para a complicada e viajante sequência onde sons de guitarra e moog são jogados aleatoriamente entre intrincadas escalas de baixo e sintetizador, levando a um tema circense que resgata a linha jazzística inicial.
A pesada “Tropicando”, com escalas feitas juntas por baixo e guitarra entre intrincadas batidas de bateria, altera novamente o andamento do CD, dessa vez com o som da guitarra no volume ideal. Cleber passa a solar com o piano elétrico, jogando acordes e escalas entre o complicado tema do baixo e guitarra, e então, novamente a canção muda, ganhando peso para o solo rasgado de guitarra.
Então, os violões passam a fazer o tema da guitarra, apresentando “Samba Jacaré”, que apesar do nome, não é um samba, e sim uma fantástica viagem muito bem trabalhada, alternando entre os solos de guitarra e dos sintetizadores, lembrando bastante o Santana do final dos anos 70, chegando a uma parte onde a levada suingada do wah-wah comanda o excelente solo de guitarra, e a canção encerra-se por alguns segundos. Um imenso silêncio é ouvido, até que uma voz dizendo “tem que abrir os poros” apresenta um viajante jazz comandado por um tema no saxofone, em um andamento sensacional de Marcelo e Gabriel, e com um magistral solo de guitarra feito por Jonatã, que encerra o CD em um nível altíssimo de prazer para o ouvinte.
Enfim, como disse no ínicio da matéria, esse CD é excelente, e para aqueles que me acusam de ser um bolha vivendo na poeira dos anos 60/70 (ou ainda antes) e sem vontade de ouvir nada novo, eu digo: “Bandas de hoje, façam algo do nível de O Casulo que eu irei ouvir, adquirir e recomendar com o maior prazer”. E espero que o próximo CD da Vãn Züllatt, que deve sair entre março e abril desse ano, seja do mesmo nível desse maravilhoso CD de estreia.
1. Produto Misto
2. Sertão Digital
3. Cores
4. De Sol a Sol
5. Utacaram
6. Tarantula
7. A Montanha
8. Do Pé da Seringueira
9. Jazzpion
10. Tropicando
11. Samba Jacaré
Mairon, esse papo de apontar o dedo pra quem gosta mais de sonoridades de determinada época e tentar enfiar guela abaixo novidades é bobagem. Ouvimos música para agradar a nossos próprios ouvidos, e não para mostrar aos outros como somos antenados. Que existe coisa boa sendo feita, não há dúvida, basta ter menos preguiça. Só que às vezes (no meu caso na maioria das vezes), eu gosto mesmo é de ouvir as muitas e muitas coisas boas que já foram feitas anteriormente e que eu não conseguirei jamais dar conta de ouvir. Mesmo entre as novidades é normal buscar discos de bandas mais anyigas pelas quais somos apaixonados. Por exemplo, quando saiu o último disco do Ratt, "Infestation", putz… foi uma noite pra atazanar vizinho, ouvindo o disco repetidas vezes, pois foi bom demais ouvir uma banda da qual gosto tanto apresentando aquela avalanche de ótimos riffs e solos.
Nossa , achei que se tratasse de algo Holandês
Cara…como é foda…
são muitas décadas de música… muitos estilos diferentes…. eu me sinto perdido muitas vezes… ainda mais agora com a facilidade que a net trouxe para conhecer novos sons…. mas ainda tenho predileção pelos anos 70… estou tentando controlar isso mas é muito dificil…as vezes entro numas fases tipo…agora só vou ouvir britpop ou pos punk glam metal ou bandas dos anos 2000…mas sempre acabo voltando pros 70
Fala Mairon!
Lendo essa resenha parece até que fizemos tudo isso desse modo de propósito, não foi, O Casulo é o resultado do encontro musical do quarteto, de muita experimentação e liberdade de criação. Na época em que esse repertório se desenvolveu não sabíamos no que ia dar, nunca determinamos territórios nem estilos e se perguntares para qualquer um dos quatro, cada um vai dizer que o álbum é uma coisa diferente pois cada um vê como um disco diferente, a precariedade na qualidade da gravação da bateria, da flauta e do violão (dos instrumentos acústicos em geral) reflete a teimosia e rebeldia do quarteto ao preferir gravar em casa, com equipamento precário, a ter que lidar com os "figurões sabe tudo" dos estúdios de Pelotas, as escolhas incomuns na mixagem/masterização (como o volume da guitarra, por exemplo) são também reflexos da rebeldia do grupo sempre com a insistência de se manter fora dos padrões e tendências da indústria fonográfica.
Ainda nos surpreende o alcance que O Casulo teve e tem pela internet, mesmo esta tendo sido nossa primeira opção de divulgação, pelo que pudemos acompanhar, o álbum já está pelos quatro cantos do globo (se dependesse de vendas de CD ainda estaria abaixo do Rio Camaquã), em alguns fóruns é dito ser um álbum de Fusion, em outros Prog Rock e até mesmo Brazilian Music, a música instrumental é versátil e universal e sua interpretação depende sempre do contexto do ouvinte e, é claro, da própria sonoridade que, no caso de O Casulo é experimental.
Depois desse álbum o grupo flertou com outras linhas de experimentação, samba/fusion para ser mais exato, chegando a desenvolver um repertório para o segundo álbum mas a natureza do material sugere uma gravação ao vivo e isso é sempre mais complicado, assim o material só pode ser conferido nas eventuais apresentações ao vivo, depois disso o grupo resolveu atracar, intencionalmente, no rock progressivo desencavando uma ideia antiga de uma suíte conceitual e de temática espacial, Betelgeuse, atualmente já gravada, o material que compõe o restante do álbum ainda está sendo finalizado mas já se mostra totalmente diferente de O Casulo a não ser pelo fato de conter, basicamente, os mesmos instrumentos pois a multiplicidade rítmica presente no nosso primeiro álbum deu lugar ao contraste entre o Rock eletrificado da suíte Betelgeuse com mosaico eletroacústico que completa o álbum, com a participação de um grande amigo, instrumentista e compositor Eugênio Bassi que trás cores diferentes ao nosso trabalho. Já podemos adiantar que esse álbum, bem como os que se seguirão, se distanciarão de O Casulo e mostrarão a tendência de mudança que permeia a atmosfera do grupo, se será "do mesmo nível desse maravilhoso CD de estreia" não podemos garantir mas que será tão experimental e descompromissado quanto O Casulo, isso podemos afirmar com certeza.
Muito obrigado Mairon, pela força que tu nos dá divulgando nosso som que é feito, antes de mais nada, para ser ouvido.
Enquanto o novo álbum não sai do forno, quem quiser ouvir O Casulo em mp3 pode pega-lo aqui http://rapidshare.com/files/198762795/O_Casulo.rar
Baixando o disco, já1
É sempre bom ouvir música boa, ainda mais quando é feita pelo pessoal que mora "ao lado" da casa da gente…
Um belo álbum, e que venham mais!
Fala Diogo
Velho, quanto a essa tua frase:
"esse papo de apontar o dedo pra quem gosta mais de sonoridades de determinada época e tentar enfiar guela abaixo novidades é bobagem."
É perfeito. Concordo plenamente contigo. Quando saiu o Death Magnetic, o Accelerate e o Nostradamus, eu ouvi direto os dois, e achei muito melhor do que estava sendo lançado por bandas novas na mesma época. Eu até não tenho preguiça em ouvir nada novo, o problema é que a maioria do que eu ouço é repetição.
Quanto ao Vãn Züllatt, é uma baita banda, e Cleber, muito legal ver teu comentário aqui, fico feliz que tenhas lido a matéria. O trabalho de vocês merce ser divulgado principalmente por que vocês tem talento e qualidade para fazer música de bom gosto, e perto de outras tantas porcarias como NX_Zero, For Fun e sei la mais o q anda rolando por ai, é vergonhoso que bandas como a tua não tenham um espaço maior do que essas panaquices que os adolescentes emo ouvem por ai.
Abraço e sucesso para vocês!
Frank Zappa e Focus? Só isso é motivo pra correr atrás. Mas, além disso, a atitude da banda de darem duros sozinhos pra não serem padronizados à força já vale mais um ponto! O nome das músicas não serem em inglês, pra fazer marketing, já valem mais ainda!
Uma coisa que eu reparei, Mairon: nessas suas últimas duas resenhas, tem música que encerra com uma porta fechando! Pink Floyd fazendo escola, hein?! (Apesar de que "We Have Heaven", do Yes, de 1971, também parece encerrar com uma porta fechando, e depois passos num corredor..)