Maravilhas do Mundo Prog: Syrius – Egy Kiáltás Méhében [1971]

Maravilhas do Mundo Prog: Syrius – Egy Kiáltás Méhében [1971]

Por Mairon Machado

Um dos mais importantes grupos da Hungria, e que é muito desconhecido no resto do mundo é o Syrius. Com uma sonoridade muito particular, o Syrius se destacou na década de 70 do outro lado da Cortina de Ferro, e conquistou fãs por países como Polônia, Bulgária, Iugoslávia, URSS e Tchecoslováquia, tocando um jazz rock inspirado no progressivo e com elementos do blues.

A história deste grupo começa no ano de 1962. Naquele ano, o grupo Syrius Baronits era fundado em Budapeste, com a finalidade de ser uma banda de acompanhamento para grupos de dança húngaros e também cantores (as) em carreira solo. O líder e mentor do projeto era o saxofonista e vocalista Zsolt Baronits, responsável por assinar os contratos do grupo, que contava também com Molnár Ákos (sax alto), Rákosi László (guitarra), Gulyás Pál (piano), Pásztor István (guitarra) e Németh István (bateria).
Exatamente quando a Syrius Baronits começava a angariar os primeiros contratos, Zsolt resolve modificar a banda, substituindo três integrantes (Pál e os irmãos István) por Pápai Faragó László (voz, órgão), Varga Dénes (baixo) e Fehér Lajos (bateria). A entrada de Lászlófoi muito importante, pois além de carismático, o cantor era considerado um dos melhores performances da Hungria, montando no órgão como um cavalo (algo no estilo do que Keith Emerson faria anos depois) e também agitando bastante a plateia.
Syrius Baronits
O grupo começou a fazer partes de festivais, tendo como a primeira grande apresentação o show realizado no IX. World Youth, realizado na Polônia em 1966. A banda, que tocava a chamada beat music, passou a ter seu nome requisitado por diversos artistas locais, e começou a frequentar assiduamente o mais famoso festival de música da Hungria, o Táncdalfesztivál (ou Festival de Música e Dança). 
Como um capítulo a parte, este festival equivaleu aos famosos FICs realizados no Brasil, sendo apresentado em rede nacional pela principal emissora de TV húngara durante os anos de 1966 e 1994, revelando alguns dos principais nomes da música húngara como Kati Kovács, Pál Szécsi, Klári Katona e Zsuzsa Koncz.

No Táncdalfesztivál de 1967, o grupo acompanhou Péter Benkő, e também defendeu uma canção própria, intitulada “Tranzisztori”, que se tornou um pequeno sucesso no país, e no festival de 1968, sendo apresentados como Pápay-Faragó László / Syrius Baronits, defendem a canção “Így mulat egy beates magyar úr”, além de acompanhar o cantor Tibor Szigetvári na canção “Hűha”. Essas duas canções foram lançadas em um cobiçado compacto de 7″ pela gravadora Qualiton, e vale muitas libras no mercado da música.
Porém, após o evento, o grupo termina, com alguns membros resolvendo participar da Juventus Orchestra de Budapeste. Mas Zsolt não se deu por vencido, e tendo o apoio do eterno companheiro Rákosi László, reformulou a banda, batizando-a agora somente de Syrius e agregando os novos músicos Pataki László Liversing (órgão), Orszáczky Miklos (baixo, voz), Mogyorósi László (guitarras), que foi rapidamente substituído por Barta Tamás e Veszelinov András (bateria), o qual havia feito parte do grupo Metro.
Essa formação inicial durou apenas um ano, e em 1970, outra reformulação ocorria, com Rákosi e Tamás abandonando a música. Assim, a Syrius chegava à formação considerada clássica, tendo agora Zsolt, Miklos, Pataki, András e Mihály Ráduly (flauta, sax tenor e sax soprano), o qual fazia parte da Václav Zahradník And His East All Stars Band.
Com essa formação, estreiam no Csanádi Street Jazz Club em fevereiro de 1970, tocando para apenas 60 pessoas e voltados para uma sonoridade jazzística. O novo estilo da banda agradou aos poucos presentes, entre eles, um amigo de Frank Claude (organizador do Montreux Jazz Festival) e logo, são convidadas para participar do Montreux Jazz Festival daquele ano, onde ao abrir para Carlos Santana, arregalaram os olhos daqueles presentes no cassino suíço, com Ráduly ganhando o prêmio de melhor solista do festival e rendendo um convite do produtor Charlie Fischer para realizarem uma turnê pela Austrália.
As incríveis performances da Syrius, lotando casas ao redor da ilha dos cangurus, acabou garantindo um contrato com a gravadora húngara Pepita. Como a banda estava ainda realizando shows pela Austrália, começam a gravar o material no Festival Recording Studios já em 1971. Após o término das turnês, retornam para a Hungria como heróis, e partem para a mixagem e lançamento do primeiro álbum intitulado Az Ördög Álarcosbálja, ou Devil’s Masquerade, que saiu em 1972. Um álbum fantástico, do início ao fim, e que deixa o ouvinte de boca-aberta na primeira audição.

Syrius
Nele, temos pauladas prog (“Koncert Háromhúros Hegedűre És Öt Korsó Sörre” e “”Az Ördög Álarcosbálja”), baladas emotivas (“Voltam Már Azelőtt…” e “Egy Becsületes Ember Észrevételei”) e canções bem trabalhadas (“Hitvány Ember” e
“Psychomania”, que lembram bastante o que o Gentle Giant faria meses depois no Reino Unido, mas nada compara-se a Maravilhosa doideira instrumental de “Egy Kiáltás Méhében”.
Sua tradução seria algo como “In The Bosom Of A Shout” (No , e ela começa com barulhos de vento soprando na praia, trazendo um instigante free-jazz. O baixo comanda a canção, junto com a bateria e a percussão, para levar ao interessante tema do sax duelando com o órgão e o piano. Depois da doideira inicial, caímos em um jazz mais tradicional, onde o piano é o responsável pelo solo principal.
As intervenções agonizantes da flauta e da percussão, bem como apitos e gritos servem para ampliar a loucura que está sendo realizada, para então a percussão mandar a ver um estonteante acompanhamento, junto com baixo e bateria, onde o sax sola alternando escalas rápidas na linha dos solos de John Coltrane. Fantástico é pouco! A sessão de acompanhamento é intrincadíssima, alternando momentos jazzísticos com outros bem progressivos. Demais!
Um crescendo leva para a segunda parte da canção, onde os saxofones começam a duelar, abrindo espaço para o solo do órgão. Órgão e sax executam o mesmo tema, e então baixo, percussão e bateria travam uma bela batalha, entrando então na terceira parte, onde os vocais surgem entre intervenções de órgão e flauta. O final da nossa Maravilha se dá sobre a declamação de um pequeno poema, com intervenções de flauta, piano e órgão que vão diminuindo até o encerramento da faixa e do LP.

Contra-capa do CD de 
Az Ördög Álarcosbálja

Az Ördög Álarcosbálja foi lançado também na Austrália, mas nem tudo foram flores. Após o lançamento do álbum, a Syrius fez uma série de concertos pela Hungria, participando também de festivais, onde foram eleitos o melhor grupo no Ljubjlana Jazz Festival daquele ano. Porém, o grupo acabou se dissolvendo no final do ano, com Ráduly indo morar nos Estados Unidos e Miklós voltando para a Austrália, onde formou o grupo experimental Bakery.

Mas ainda existia um disco a ser lançado, já que o contrato com a Pepita Records previa dois LPs, e então, em 1976, o grupo retorna, com Veszelinov, Baronits, Tibor Tátrai (guitarras), Endre Sipos (baixo, trompete), Tamás Turai (percussão) e Ottó Schöck (teclados). Além disso, o grupo ainda contava com a participação de um naipe de metais formado por Siliga Miklós (saxofone barítono), Àkos Molnár (saxofone soprano), László Dés (saxofone tenor), Károly Friedrich e László Gööz (trombone) e Endre Sipos e Rudolf Tomsits (trompete), além da participação da baixista Károly Friedrich, e assim, gravam e lançam o segundo álbum, Széttört Álmok (Broken Dreams), que trás uma sonoridade mais moderna, principalmente pela entrada de Tátrai e Turai, e que é totalmente cantado em húngaro.

Após o lançamento de Széttört Álmok, cada integrante saiu para fazer carreira de alguma outra forma. Da formação clássica que gravou o primeiro álbum, Veszelinov foi trabalhar no grupo Apostol, com quem lançou o álbum 2 em 1980. Miklós acabou abandonando a música, e sua história permanece obscura, bem como Pataki. Miháli retornou para a Václav Zahradník And His East All Stars Band, com quem gravou o disco Interjazz 2 em 1974 (Mihály já havia participado do álbum Interjazz de 1971).


Raro registro húngaro, com participação de Michael Schenker

Tátrai foi o que mais gravou após o fim da Syrius. Em 1977, gravou com o baixista Sipos o álbum Fújom A Dalt, indo parar no grupo General, com quem gravou os álbuns Zenegép (1977) e Heart Of Rock (1978). Em 80 entrou no grupo Skórpio, com quem gravou os discos Új Skorpió (1980) Zene Tíz Húrra És Egy Dobosra (1981). Finalmente, entrou no grupo de blues Deák Bill Gyula, onde registrou Rossz Vér (1984) e ainda participou do k7 Csodálatos Világ, de Koncz Zsuzsa, em 1987, vindo a se firmar com o Hobo Blues Band, onde gravou diversos discos nas décadas de 80 e 90. O guitarrista ainda apareceu no raro álbum Gitárpárbaj, tocando a faixa “A Szerény Macskafarka Blues”. Para os colecionadores, esse álbum trás uma rara música do mestre das 6 cordas Michael Schenker tocando com o s músicos húngaros Papp Tamás, SZücs Antal Gábor e Zselencz László. A saber o nome da faixa é “Az Arénába”, sendo o LP cobiçadíssimo pelos fãs do UFO.
Enquanto isso, Miklós seguia sua carreira, gravando com gente como The Grandmasters, Jump Back Jack, The Godmothers, The Orszaczky Budget Orchestra e The Miklós Orszaczky Band (que Tátrai fez parte), além de ter construído o famoso baixo Piccolo, o qual tinha uma afinação toda especial, seja em D, G, C, F ou E, A, D, G. Sipos também teve uma carreira bem consolidada, lançando o disco solo (citado anteriormente) e participando dos álbuns Zorán (1977, do cantor Zorán), Csak A Zene (1977, Neoton Família) e Mozart Rock (Hamari Júlia, 1985), sendo que no último apenas tocando trompete.
Já o mentor Baronits permaneceu na obscuridade durante muitos anos. Em 1994, um álbum chamado Most, Múlt, Lesz foi lançado pela gravadora Gong com o nome Syrius. Porém, não sei mais informações à respeito do mesmo e nem quem gravou o registro. Já em 1998, um single chamado “You Will See” foi lançado na Itália, dizendo se tratarde um single da Syrius com o cantor Ginger Brew. Sendo um disco technopop, eu creio que seja outra Syrius.
O que realmente acabou sendo registrado foi a volta do grupo em 2000, e que está no maravilhoso bootleg Live in Paks 2001. Comemorando os 30 anos da banda, o grupo fez uma série de shows pela Hungria, e este registro em Paks mostra que o grupo ainda tinha muito a dar. Contando com os 5 membros que gravaram Az Ördög Álarcosbálja, mais a adição de músicos convidados (Tina harrod – voz, Csejtey Ákos – saxofone barítono e Zsemlye Sándor – saxofone alto), o grupo passeia por sons novos e pelas clássicas “Strawberry Fields Forever” (Beatles) e a própria “Az Ördög Álarcosbálja”, mostrando muito vigor e todas as características que consagraram o grupo.


Porém, o tempo acabou passando, e a Syrius sucumbiu novamente. Veszelinov faleceu em 29 de maio de 2007, enquanto Miklós veio a falecer em 3 de fevereiro de 2008 em Sydney. Baronits também faleceu, em data desconhecida, enquanto os demais remanescentes permanecem na obscuridade, mesmo após a queda da cortina de ferro.

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