Review Exclusivo: Licks & Maltz & Os Engenheiros Sem CREA (Porto Alegre, 21 de Abril de 2024)

Review Exclusivo: Licks & Maltz & Os Engenheiros Sem CREA (Porto Alegre, 21 de Abril de 2024)

Por Micael Machado

Fazia pelo menos trinta anos que o guitarrista Augusto Licks e o baterista Carlos Maltz não tocavam juntos no mesmo palco, desde a saída do primeiro da mais clássica formação do grupo gaúcho Engenheiros do Hawaii, conjunto que arrecadou milhares de fãs pelo país e (por que não?) pelo mundo. Um deles é o baixista/vocalista/tecladista Sandro Trindade, que desde 2016 mantém na ativa o tributo Engenheiros Sem CREA, tendo ao seu lado o guitarrista Jeff Gomes. O grupo de Sandro e Jeff chegou a tocar, em ocasiões separadas, tanto com Licks quanto com Maltz, até que surgiu a ideia de convidar os dois para tocarem ao mesmo tempo com o tributo de Sandro. Proposta aceita, o show de “reunião” de 2/3 da “formação GLM” dos Engenheiros foi anunciado em fevereiro deste ano, tendo data, hora e local marcados para acontecer: 21 de abril, às 20h, no Bar Opinião, em produção da Abstratti Produtora. Quando soube da notícia, comprei meu ingresso nas primeiras horas em que os mesmos foram disponibilizados, e fiquei quase dois meses na expectativa de um show que, eu sabia, seria histórico! Sou fã dos EngHaw desde minha adolescência (lá por 1986, 1987), mais precisamente, desde que ouvi “Toda Forma de Poder” na trilha sonora da novela Hipertensão, da Rede Globo. Cheguei a assistir ao grupo ao vivo na fase do disco ¡Tchau Radar!, já sem Licks e Maltz, e assisti Humberto Gessinger em carreira solo algumas vezes, em uma delas até com a presença de Carlos Maltz junto a si, na gravação do que resultaria no CD/DVD Ao Vivo Pra Caramba, A Revolta Dos Dândis 30 Anos (mas, nesta ocasião, o baterista apenas cantou e tocou percussão em uma única música – ainda que a mesma tenha sido repetida duas vezes naquela noite, por problemas técnicos na gravação). Mas ainda não havia assistido Augusto Licks, um dos melhores guitarristas do chamado BROCK, ao vivo sobre um palco, e havia, então, chegado a hora de corrigir esta “falha” no meu “currículo”.

Foi com esta expectativa que rumei ao Opinião na tarde/noite de domingo, pronto para presenciar um reencontro que tinha tudo para nunca acontecer, se pensarmos na história dos envolvidos. Ainda antes de chegar ao local, um fato curioso: para quem não conhece o Opinião, o bar fica na esquina de duas ruas do bairro Cidade Baixa, na capital dos gaúchos. Pois em ambas as ruas que levavam ao local, no lado de fora mesmo, foram montadas as bancas de merchandising dos produtos do show, com copo (dez reais), pôster (vinte reais, e, “supostamente”, autografado pelos músicos) e camiseta (noventa reais – infelizmente, não tinha confecção do meu tamanho) disponíveis para os fãs que iam chegando e rumando para a fila, numa atitude que achei muito interessante, pois permitiu que, quem quisesse garantir sua “lembrança do show”, como anunciavam os vendedores, o fizesse sem precisar entrar na casa, enfrentar longas filas já no local do show, e ainda correr o risco de “perder o lugar” para ver ao show enquanto garantia seus itens. Excelente sacada da produtora (ou de quem foi o responsável pela ideia)!

Excelente também foi a organização do evento, com os portões abertos na hora marcada, permitindo às pessoas que estavam na fila (ainda em número pequeno perto de outras que já vi no local) que adentrassem confortavelmente no bar. A Abstratti separou o local em três setores (“pista vip”, “pista comum” e “mezanino”, algo que, devido ao tamanho do Opinião, sempre me parece algo bastante ridículo, pois a diferença entre um setor e outro não é tão significativa para justificar a diferença cobrada no preço dos valores entre os setores), e eu rumei para a pista comum, da qual tinha comprado ingresso. Pois foi com enorme surpresa que vi, passando ali pelo meio, o primeiro baixista dos Engenheiros, Marcelo Pitz, que circulava praticamente incógnito pelos poucos presentes que já estavam dentro do local. Confesso que não o reconheci de imediato, mas, alertado por alguém, logo o chamei e solicitei uma (hoje quase obrigatória) foto e seu autógrafo na capa do meu vinil de Longe Demais Das Capitais, único álbum da banda do qual ele participa. Ao lhe agradecer a atenção e disponibilidade, recebi de volta um “eu que agradeço a vocês, que ainda mantém a lembrança da gente com vocês!”! Achei muito bacana a atitude e a humildade de Pitz, além de sua imensa simpatia com aqueles que lhe abordaram!

Marcelo Pitz e o “bolha” que lhes escreve

Exatamente na hora marcada, às 20 horas, uma moça (da qual não guardei o nome, peço desculpas pela mancada) subiu ao palco, anunciou o show, agradeceu a presença “de gente do Brasil inteiro aqui esta noite”, e disse que, depois do show, os músicos estariam recebendo os presentes para autógrafos e fotos, me fazendo sentir bem por ter levado meus vinis para o Opinião naquela noite. Os oito primeiros discos da banda já haviam tido sua capa autografada por Humberto na turnê do citado ¡Tchau Radar!, e Pitz havia acabado de assinar o primeiro deles. Parecia que eu conseguiria, enfim, “fechar” os demais membros do grupo, e “completar” minha coleção de autógrafos da banda, mas trataremos disso depois.

Primeiro, cabe dizer que, ainda com a “mestre de cerimônias” sobre o palco, Jeff, Sandro, Maltz e Licks subiram ao mesmo, iniciando o show, sem muita enrolação, com “Toda Forma de Poder”, sucesso do disco de estreia dos EngHaw, ainda sem Licks, mas presente em toda a trajetória da formação GLM ao longo de sua duração. Já na segunda canção, veio aquela que, possivelmente, fosse a música que eu, particularmente, mais aguardava na noite: “Variações Sobre um Mesmo Tema”, que os Engenheiros nunca (ou raramente) tocaram ao vivo, mas que eu já havia visto um vídeo de Licks e o grupo de Sandro tocando ao vivo em certa ocasião no passado. Infelizmente, na terceira parte da música, a qual conta com os vocais de Licks, o microfone do guitarrista falhou, e os dois primeiros versos ficaram sem serem ouvidos pelo público que, nesta altura, já lotava o Opinião (que ficou muito cheio ao longo de toda a noite, mas não ficou “completamente lotado” como em outras ocasiões que já presenciei no mesmo local). Augusto se moveu então para a frente do microfone de Sandro, completando a canção sem maiores transtornos, e, logo em seguida, emendou “A Revolta dos Dândis I”, causando um novo alvoroço no pessoal. O final com arranjo mais “bluesístico” desta versão (como no disco Alívio Imediato, cuja capa, inclusive, estampava a camiseta que eu estava usando) trouxe Licks ao teclado, instrumento no qual ele continuou naquela que seria a grande “surpresa” do set list na noite: “Canibal Vegetariano Devora Planta Carnívora”, música do álbum Gessinger, Licks & Maltz que foi a única da noite que não teve a letra cantada a plenos pulmões pela imensa maioria dos presentes ao bar, embora tenha sido reconhecida (e cantada) por boa parcela do público!

Um certo “bolha” curtindo o show no meio do público

Sandro direcionou o obrigatório “Boa noite, Porto Alegre!” ao pessoal e, a partir daí, os músicos partiram para o “jogo ganho”, e o restante do set list foi só de “hits” enormes dos Engenheiros do Hawaii (talvez “Muros e Grades” ou “Ando Só” sejam “hits menores”, na realidade, mas não para mim!). Uma sequência mais “lenta” com Sandro ao piano, englobando “Terra de Gigantes”, “Pra Ser Sincero” (novamente com Licks nos teclados) e “Refrão de Bolero” (precedida por Licks tocando um trecho de “Besame Mucho” na guitarra, segundo o que li, algo que já havia sido feito na turnê de Várias Variáveis) “baixou” um pouco a empolgação da galera, mas, convenhamos, não tinha como estas três músicas ficarem de fora da noite (talvez se elas não tivessem sido “agrupadas”, mas sim “espalhadas” pelo set list, a minha percepção teria sido diferente). A galera voltou a vibrar com a versão do quarteto para “Alívio Imediato” (outra onde Licks se dedicou às teclas em boa parte da execução), e o clima de empolgação continuou “lá em cima” até a execução de “O Exército de Um Homem Só I”, que, com seu final “apoteótico”, parecia que iria encerrar o show ali mesmo (e confesso que eu, de tanto ouvir Gessinger “emendar” as duas partes da canção em suas apresentações ao vivo, pensei que o quarteto iria fazer o mesmo, algo que, infelizmente, não ocorreu). Mas, logo depois do final da canção, Sandro puxou a faixa título do álbum O Papa é Pop, sendo outra canção deste álbum, a versão “EngHawlística” para “Era um Garoto que como Eu Amava os Beatles e os Rolling Stones”, a encarregada de fechar os trabalhos regulares da apresentação!

Claro que o pessoal não arredou pé do Opinião tão fácil assim, e, sem muita enrolação, os quatro voltaram para interpretar outra cover, agora a versão de “Herdeiro da Pampa Pobre”, presente no citado disco Várias Variáveis. Também deste álbum, veio em sequência “Piano Bar” (onde Sandro perdeu a oportunidade de cantar que “no táxi que me trouxe até aqui Humberto Gessinger me dava razão”, preferindo se manter à letra original, que coloca Julio Iglesias no rádio do carro), com uma nem tão longa versão para “Infinita Highway” finalmente encerrando o show, para alegria e enorme empolgação de todos os presentes!

Em termos de performance, Jeff foi bastante discreto, chegando a sair do palco em certas músicas, deixando apenas o trio restante interpretarem as músicas, e Sandro foi um frontman efetivo, tocando muito bem tanto o baixo quanto os teclados (e até arriscando alguns toques nos bass pedals instalados à sua frente, tal qual Humberto fazia tanto solo quanto com a banda), além de ter um timbre de voz que se assemelha (mas não copia) o do líder dos Engenheiros. Licks e Maltz pareciam estar se divertindo bastante, alegres mas concentrados, e nem um pouco surpresos com a resposta extremamente positiva do pessoal ao reencontro dos dois. Tecnicamente, por parte dos dois músicos, a noite não foi livre de falhas, sendo que Carlos perdeu algumas batidas, e Licks chegou a dar umas “derrapadas” bastante perceptíveis (a maior delas, a meu ver, durante o solo de “Ninguém = Ninguém”). Mas, como Maltz disse a um fã depois da apresentação (quando o mesmo o elogiou pela performance na noite, dizendo que “parecia que ele – Maltz, no caso – nunca havia parado de tocar”), “hoje não era pra tocar tudo certinho, porque a emoção estava muito alta, não tinha como se concentrar para tocar perfeitinho!”. Realmente, não teve quem não se emocionasse ao longo do show; um sujeito chegou a berrar, num dos raros intervalos mais prolongados entre as músicas, a frase “eu vivi pra ver esse show!”, arrancando aplausos até de Licks, com Sandro lhe respondendo em seguida “nós também”! Depois do show, em rápida conversa com o CEO da Abstratti, quando o elogiei pelo excelente espetáculo que a produtora havia proporcionado a todos nós, o mesmo me falou “e tudo isto com apenas três ensaios. Imagina se eles estivessem mais entrosados”! Foi uma celebração e um clima de nostalgia tão positivo que envolveu a todos, e que, certamente, não será esquecido tão cedo por quem esteve presente ao bar naquele domingo!

O Set List da noite (ou o que sobrou dele)

Mas a noite ainda não havia acabado. Depois de muito insistir com os roadies para conseguir uma cópia do set list (que ficou um pouco rasgada, mas, tudo bem), rumei para o local indicado para o encontro com a dupla principal da noite. Na saída da área de backstage do Opinião, foi montado uma espécie de “cercadinho” à frente da porta de saída do bar, tendo esta em um extremo, e a van da banda no outro. Sendo assim, o pessoal se colocou, sem ordem alguma, em ambos os lados que sobravam da área delimitada. A longa espera de quase uma hora, pelo menos, serviu, pelo lado bom, para diminuir um pouco a quantidade de gente que aguardava a vinda dos músicos (pois a fila dobrava a esquina do bar logo depois de encerrada a apresentação), e também para conversar com alguns fãs que haviam vindo de longe especificamente para ver este show, como o sujeito de Fortaleza que possui quatro tatuagens com desenhos que remetem às capas de alguns discos do grupo espalhadas pelo corpo, ou o simpático trio de Maceió, ou ainda o senhor de Manaus que sofria com o “frio” gaúcho – agradáveis vinte e poucos graus – protegido por uma grossa jaqueta de couro e luvas, ou mesmo o casal que tinha passagem marcada para voltar a Miami na semana do show, mas trocou a data de embarque só por causa desta apresentação – cabe citar que, pelo que ouvi, havia gente de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Paraná, pelo menos, espalhados pelas dependências do bar naquela noite. Já passava das onze da noite quando Sandro, Licks e Maltz vieram encontrar o pessoal, começando pelo canto oposto ao que eu estava, o que causou a movimentação do pessoal que estava mais para trás no lado em que eu me encontrava para o ponto onde os artistas estavam, algo que, felizmente, não chegou a gerar um tumulto maior, mas acabou atrasando ainda mais o atendimento do pessoal por parte dos músicos. Quase duas horas depois do final da apresentação, finalmente, consegui ficar frente a frente com Maltz, e, depois de pedir seu autógrafo no livro “O último rei do rock”, de sua autoria, praticamente “joguei” em suas mãos as capas dos oito vinis que havia levado, e soltei um “se você tiver paciência…” meio constrangido, ao qual Maltz respondeu com um largo sorriso, assinando pacientemente todos os itens logo depois. Mais um tempo se passou, e consegui chegar em Augusto Licks, repetindo a tática já usada com o baterista, iniciando a “sessão de autógrafos” com a entrega se sua autobiografia para ele assinar, e lhe entregando depois as capas dos sete discos nos quais ele tocou (deixei o primeiro de fora) e repetindo a frase “se você tiver paciência…”, a qual ele respondeu com uma careta que deixou claro seu desgosto, sem, no entanto, se furtar de assinar todos os álbuns, um deles, inclusive, duas vezes! Como ainda havia muita gente por ali, e já estava quase passando da meia noite, não quis pedir para tirar as “famosas” fotos com os músicos, pois as “lembranças” desta noite memorável já estavam garantidas, e rumei então para casa, feliz e satisfeito, com a discografia da banda (em vinil), finalmente, autografada pelos quatro músicos que, em épocas diferentes, passaram pelos EngHaw naquele período! Pare ser melhor, só se esta noite se repetir algum dia no futuro, e, se não for pedir demais, com a presença de Humberto Gessinger novamente junto à dupla Carlos Maltz e Augusto Licks, dois sujeitos que, neste domingo de abril, proporcionaram um momento, sem dúvidas, histórico para seus fãs! Que os deuses da música (e o reticente 1berto) assim o queiram!

Um certo “bolha” tentando pegar alguns autógrafos de Carlos Maltz…
… e aguardando enquanto Augusto Licks autografa alguns LPs.
A discografia em vinil dos Engenheiros, finalmente, com os autógrafos de todos os envolvidos

Set List:

1. Toda Forma de Poder

2. Variações Sobre um Mesmo Tema

3. A Revolta dos Dândis I

4. Canibal Vegetariano Devora Planta Carnívora

5. Muros e Grades

6. Ninguém = Ninguém

Somos Quem Podemos Ser

7. Terra de Gigantes

8. Pra Ser Sincero

9. Refrão de Bolero

10. Alívio Imediato

11. Nau à Deriva

12. Ando Só

13. O Exército de Um Homem Só

14. O Papa é Pop

15. Era um Garoto que como Eu Amava os Beatles e os Rolling Stones

Bis:

16. Herdeiro da Pampa Pobre

17. Piano Bar

18. Infinita Highway

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